Consulta: Descumprimento dos contratos de venda antecipada de commodities agrícolas. Conseqüências jurídicas.



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Transcrição:

Porto Alegre, 08 de abril de 2008. Consulta: Descumprimento dos contratos de venda antecipada de commodities agrícolas. Conseqüências jurídicas. 1. Da consulta. Relata a consulente que, na safra 2003/2004, firmou diversos contratos de compra antecipada de soja, fixando o preço, em média, a US$ 10 a saca de 60 kg. No vencimento dos contratos, contudo, a saca de soja estava cotada a quase US$ 17, o que motivou alguns produtores a não entregar o produto. Informa a empresa que diversos produtores ingressaram com demandas judiciais para resolver os contratos em face da onerosidade excessiva e desequilíbrio econômico causados pelo aumento inesperado do preço do commodity, desobrigando-os de entregar o produto. No final de 2007, novamente, foram firmados contratos de venda de soja verde, travando o preço, em média, a US$ 16,00 a saca, e há rumores de que alguns produtores não honrem os contratos, preferindo vender a produção a terceiros pelo preço atual de mercado, aumentando a margem de lucro. Diante das considerações acima, pergunta-nos a consulente qual a previsão legal e o posicionamento atual da doutrina e da jurisprudência acerca das questões abaixo: a) Descumprimento do contrato frente à valorização substancial e superveniente do produto; b) Possibilidade de compra de produtos agrícolas por preço inferior ao mínimo fixado pelo Governo Federal; c) Aplicação do Código de Defesa do Consumidor; d) Necessidade de constituição em mora do vendedor para exigir a entrega do produto;

e) Validade da estipulação de multa pelo descumprimento da obrigação e da cláusula que fixa a indenização por perdas e danos; e f) Necessidade de depositar em juízo o valor da compra como pressuposto para exigir o cumprimento da obrigação por parte do produtor. Frente a estes questionamentos, passa-se a expor os dispositivos de lei aplicáveis, os ensinamentos doutrinários e o entendimento da jurisprudência dos Tribunais Estaduais e do Superior Tribunal de Justiça. 2. Resposta à consulta a) POSSIBILIDADE DE DESCUMPRIMENTO DOS CONTRATOS DE COMPRA ANTECIPADA DE SOJA EM FACE DA VALORIZAÇÃO SUBSTANCIAL SUPERVENIENTE DO PRODUTO. Conforme refere a consulente, os produtores que não cumpriram, total ou parcialmente, a sua obrigação de entregar o produto da safra 2003/2004, alegaram em juízo que a grande valorização da soja era fato extraordinário e imprevisível, e trouxe lucro excessivo apenas para uma das partes, em prejuízo do produtor. A base legal destas demandas judiciais está na Teoria da Imprevisão, Função Social do Contrato, Princípio da Boa-Fé e Instituto da Onerosidade Excessiva, materializadas nos seguintes artigos do Código Civil Brasileiro: Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação. Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente 2

onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação. Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido. Entretanto, a aplicação dos preceitos legais acima aos casos de inadimplemento contratual pelo aumento significativo e inesperado do preço da soja é controvertido na jurisprudência dos Tribunais Estaduais e do Superior Tribunal de Justiça. O Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, por exemplo, tem posicionamentos em ambos os sentidos. As Segunda, Terceira e Quarta Câmaras Cíveis, e a Primeira Seção Cível, formada pela Primeira e Segunda Câmaras, têm decidido que as oscilações de preço e os fatores climáticos não constituem fatores imprevisíveis capazes de justificar a resolução contratual, como demonstram as decisões abaixo: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. COMPRA E VENDA DE SOJA. SAFRA FUTURA. AUMENTO DO PREÇO DE MERCADO. FERRUGEM ASIÁTICA. TEORIA DA IMPREVISÃO. NÃO APLICAÇÃO. No contrato de compra e venda de soja para entrega futura, a oscilação do preço, bem como a eventual contaminação da safra pela praga denominada 'ferrugem asiática', não são motivos que justifiquem a aplicação da teoria da imprevisão, tendo em vista que esses acontecimentos são previsíveis e inerentes a esse ramo de negócios." (AC nº. 104353-8/188, TJGO, Segunda Câmara Cível, Rel. Amélia Netto Martins de Araújo, DJ 24/01/2008) APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE SOJA. PREÇO PRÉ-FIXADO E ENTREGA FUTURA. PRELIMINAR. VIOLAÇÃO DO ART. 514, CPC. VARIAÇÃO CAMBIAL E DOENÇA NA LAVOURA. FATOS SUPERVENIENTES, IMPREVISIVEIS E EXTRAORDINÁRIOS. ONEROSIDADE EXCESSIVA. APLICAÇÃO DA TEORIA DA IMPREVISÃO E INCIDÊNCIA DO ART. 478, CC/02. IMPOSSIBILIDADE. (...) 2 - Nos contratos de compra e venda de soja para entrega futura com preço prefixado, não há se que se falar em imprevisibilidade e extraordinariedade de posterior variação 3

cambial, uma vez que tal negócio é regido pelo dinâmico mercado internacional de grãos, sobretudo pela bolsa de Chicago, estando, pois, sujeito as oscilações do mesmo, que são até freqüentes num mundo capitalista e globalizado como o atual. 3 - Ademais, há que se ressaltar que o posterior aumento do preço da soja em razão da valorização do dólar frente ao real não lhe acarreta prejuízo, de forma que apenas deixa de auferir lucro maior do que aquele previamente calculado. (AC nº. 110600-5/188, TJGO, Terceira Câmara, Rel. Regina Teodoro Reis, DJ 13/09/2007) APELAÇÃO CÍVEL. RESOLUÇÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE SOJA. INAPLICABILIDADE. 1 - No contrato de compra e venda de soja com entrega futura de mercadorias atrelado o seu valor ao dólar norte-americano, a contaminação da safra pela praga denominada 'ferrugem asiática', não e motivo ensejador da aplicação da teoria da imprevisão, tendo em vista que fatores desta natureza sao previsíveis. 2 - O contrato de compra e venda de produção de soja em grãos e negocio de coisa, com a perspectiva de risco para ambas as partes. 3 - A emissão de Cédula de Produto Rural desviada de sua finalidade tipica, a de servir como instrumento de credito para o prudutor, é nula. 4 - Apelo conhecido e provido em parte, com reforma parcial da sentença. (AC 113075-1/188, TJGO, Quarta Câmara Cível, Rel. Kisleu Dias Maciel Filho, DJ 04/03/2008) EMBARGOS INFRINGENTES. CONTRATO. COMPRA E VENDA. SOJA. ENTREGA FUTURA. OSCILAÇÃO DO MERCADO. RESCISÃO. ONEROSIDADE EXCESSIVA INEXISTENTE. I- Nos contratos agrícolas de venda para entrega futura, o risco e inerente ao negocio e não se cogita de imprevisão. Ademais, não há onerosidade excessiva. II- Tem-se por descabida a alegação de violação dos princípios da probidade e da boa-fé objetiva, se por ocasião da celebração do contrato o preço combinado era o vigente no mercado. III- A ocorrência de lesão na avenca pressupõe premência ou inexperiência de uma das partes contratantes que teria se obrigado a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta, o que não se observa no caso. Embargos Infringentes conhecidos, porem rejeitados. (EI nº. 1153-0/196, TJGO, Primeira Seção Cível, Rel. Abrão Rodrigues Faria, DJ 15/11/2007) Contudo, a Primeira Câmara Cível, recentemente, julgou procedente ação intentada por produtor para resolver o contrato de compra e venda de soja com entrega futura, voltando as partes ao estado anterior à celebração do contrato, como se não o tivessem firmado. 4

Entendeu o relator da Apelação Cível, Desembargador João Ubaldo Ferreira, que a oscilação do preço dos insumos e as variações climáticas são fatores imprevisíveis ao produtor, e justiçam o seu inadimplemento. Cumpre transcrever: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESOLUÇÃO DE CONTRATO. COMPRA E VENDA DE SOJA COM ENTREGA FUTURA. INVOCAÇÃO DA TEORIA DA IMPREVISÃO. CONTRATO ALEATÓRIO. NECESSIDADE DE EXTINÇÃO DO PACTO. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ OBJETIVA E DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO. I - Procedente e a pretensão de resolver contrato de compra e venda de soja com entrega futura, sob a alegação de superveniência de fatores externos imprevisíveis e onerosos, tais como as variações climáticas, como o excesso de chuvas, pragas (ferrugem asiática) na lavoura, alteração de preços de insumos aplicáveis na plantação, porquanto afiguram-se estes fatos situações imprevistas, principalmente porque, em sendo o contrato aleatório, por se referir a coisas ou fatos futuros, cuja álea de não virem a existir e previsível para ambos os contratantes, onde a contratante assume a possibilidade de nada ser colhido bem como o risco conseqüente. II - De mais a mais, confirma-se que, in casu, como no contrato de compra e venda celebrado para entrega futura de soja, a adquirente, ao lançar as despesas, riscos e todos os encargos a conta do produtor, contém desequilíbrio entre as partes não admitido na nossa legislação, visto que deixou ao critério da compradora a fixação do preço e lançou os custos sobre o agricultor sem nenhum risco para a adquirente. III - O arbítrio de um dos contratantes não pode prevalecer na compra e venda, que exige o consenso das partes sobre o preço, ou no mínimo, sobre o modo eqüitativo de fixá-lo. Também deixar ao arbítrio de uma das partes a fixação do preço e responsabilizando-se a outra, no caso o produtor alienante, todos os riscos decorrentes de casos fortuitos e de forca maior, ate a efetiva entrega do produto no prazo e condições estabelecidas, acarreta a nulidade do contrato, máxime se estaria faltando, alem da equidade, um dos seus elementos essenciais. IV - Neste caso, há que se homenagear a mutabilidade ou rescindibilidade dos contratos onerosos (por conta do principio da boa-fé objetiva e função social do contrato) em detrimento do principio do pacta sunt servanda, cujos efeitos, embora ainda não banidos pelo ordenamento jurídico, encontram em fase de relativização. V - Em havendo parte de pagamento a titulo de antecipação pela adquirente do produto, esta o alienante obrigado a restituir-lhe o valor correspondente devidamente corrigido e com a incidência de juros legais e de 1(hum por cento) ao mês (...). (AC 109958-0/188, TJGO, Primeira Câmara Cível, Rel. João Ubaldo Ferreira, DJ 21/09/2007) O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por sua vez, tem posicionamento firme de que a oscilação do preço não constitui fato extraordinário 5

e imprevisível que justifique o inadimplemento do contrato, pois a variação do preço do produto, tanto para mais como para menos, é risco do contrato e não altera os deveres assumidos pelas partes 1, conforme se infere das decisões abaixo: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. COMPRA E VENDA DE SOJA. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. PERDAS E DANOS. ESTIAGEM. A estiagem que se abateu sobre o Estado no período de dezembro de 2004 a janeiro de 2005, durante o período de desenvolvimento da cultura de grãos, não constitui justificativa para o inadimplemento das obrigações contratuais assumidas. Ausência do elemento caracterizador de onerosidade excessiva a uma das partes em contraposição ao benefício exagerado do contraente adverso. (...) (AC nº. 70022527246, TJRS, Décima Sexta Câmara Cível, Rel. Ergio Roque Menine, julgado em 19/03/2008) APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MATERIAL. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. COMPRA E VENDA DE SOJA PARA ENTREGA FUTURA. RISCO INERENTE AO NEGÓCIO. INOCORRÊNCIA DE ONEROSIDADE EXCESSIVA. (...) 3. Nos contratos de compra e venda de gêneros alimentícios para entrega futura considera-se ou o preço futuro do produto, deduzidos custos financeiros projetados, ou o preço atual decrescido de encargos financeiros incidentes até a data de entrega do bem. Trata-se, pois, este tipo de compra e venda, de contratação essencialmente de risco, em que as possíveis variações em torno do preço são da essência do negócio, de modo que não há falar em acontecimento extraordinário ou imprevisível. APELO DESPROVIDO. UNÂNIME. (AC nº 70020068730, TJRS, Nona Câmara Cível, Rel. Iris Helena Medeiros Nogueira, julgado em 08/08/2007) (...) II - Teoria da imprevisão. Inaplicabilidade por tratar-se de compra de safra para entrega futura, onde a álea em torno do preço é da essência do contrato. III - Manutenção da mora. Encargos e forma de aplicação. Inexistência de abusividade ou ilegalidade. Encargos de acordo com o art. 1.062 do Código Civil de 1916, c/c art. 1, do Decreto 22.626/33. Embargos improcedentes. Apelação improvida. (AC nº 70013618913, TJRS, Rel. Luís Augusto Coelho Braga, julgado em 13/09/2006) Neste sentido também é o entendimento do Tribunal de Justiça do Paraná: 1 Apelação Cível nº 70020068730, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em 08/08/2007. 6

Cédula de produto rural. Venda futura de soja. Preço pré-fixado. Contrato aleatório. Onerosidade excessiva e desequilíbrio contratual não configurados. Inaplicabilidade da teoria da imprevisão. Princípio da boa-fé. Manutenção da avença. O contrato de venda futura de soja em grão envolve riscos para ambas as partes, na medida em que o preço da saca de soja praticado no mercado à época da colheita possa ser maior ou menor do que o estipulado à época da contratação, com o objetivo de poupar as partes das incertezas e oscilações do mercado. Assim, é inaplicável a teoria da imprevisão pela supervalorização do preço de mercado à época da entrega do produto, por ser risco previsível e inerente à atividade, não caracterizando onerosidade excessiva do contrato e devendo valer a intenção das partes, a boa-fé e os costumes. Apelação provida. (AC nº. 0350906-8, TJPR, Décima Quinta Câmara Cível, Rel. Hamilton Mussi Correa, julgado em 12/12/2007) O Superior Tribunal de Justiça também entende que a alta da soja é fator previsível e não justifica o descumprimento do contrato: DIREITO CIVIL E AGRÁRIO. COMPRA E VENDA DE SAFRA FUTURA A PREÇO CERTO. ALTERAÇÃO DO VALOR DO PRODUTO NO MERCADO. CIRCUNSTÂNCIA PREVISÍVEL. ONEROSIDADE EXCESSIVA. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO, BOA-FÉ OBJETIVA E PROBIDADE. INEXISTÊNCIA. - A compra e venda de safra futura, a preço certo, obriga as partes se o fato que alterou o valor do produto agrícola não era imprevisível. - Na hipótese afigura-se impossível admitir onerosidade excessiva, inclusive porque a alta do dólar em virtude das eleições presidenciais e da iminência de guerra no Oriente Médio motivos alegados pelo recorrido para sustentar a ocorrência de acontecimento extraordinário porque são circunstâncias previsíveis, que podem ser levadas em consideração quando se contrata a venda para entrega futura com preço certo. - O fato do comprador obter maior margem de lucro na revenda, decorrente da majoração do preço do produto no mercado após a celebração do negócio, não indica a existência de má-fé, improbidade ou tentativa de desvio da função social do contrato. - A função social infligida ao contrato não pode desconsiderar seu papel primário e natural, que é o econômico. Ao assegurar a venda de sua colheita futura, é de se esperar que o produtor inclua nos seus cálculos todos os custos em que poderá incorrer, tanto os decorrentes dos próprios termos do contrato, como aqueles derivados das condições da lavoura. - A boa-fé objetiva se apresenta como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse modelo, agindo como agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal. Não tendo o comprador agido de forma contrária a tais princípios, não há como inquinar seu comportamento de violador da boa-fé objetiva. Recurso especial conhecido e provido. 7

(REsp 803481/GO, STJ, Terceira Turma, Rel. Ministra Nancy Andrighi, DJ 01/08/2007) AGRAVO REGIMENTAL. COMPRA E VENDA. SOJA. PREÇO FIXO. ENTREGA FUTURA. ONEROSIDADE EXCESSIVA. BOA-FÉ OBJETIVA. - "Nos contratos agrícolas de venda para entrega futura, o risco é inerente ao negócio. Nele não se cogita em imprevisão" (REsp 783.520/HUMBERTO). (AgRg no REsp 884.066/GO, STJ, Terceira Turma, Rel. Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ 18/12/2007) COMERCIAL. 1. COMPRA E VENDA DE SAFRA FUTURA A PREÇO CERTO. A compra e venda de safra futura, a preço certo, obriga as partes se o fato que alterou o valor do produto agrícola (sua cotação no mercado internacional) não era imprevisível. 2. CÉDULA DE PRODUTO RURAL. A emissão de cédula de produto rural, desviada de sua finalidade típica (a de servir como instrumento de crédito para o produtor), é nula. Recurso especial conhecido e provido em parte. (REsp 722130/GO, STJ, Terceira Turma, Rel. Ministro Ari Pargendler, DJ 20/02/2006) Como visto, o resultado de eventual demanda judicial dependerá das circunstâncias do caso concreto e da jurisdição a qual estará submetido o processo. Caso prevaleça o atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça, os contratos de compra antecipada de soja deverão ser cumpridos, independentemente da oscilação do preço do produto no mercado ou ocorrência de quebra em virtude de fatores climáticos ou biológicos. b) COMPRA DE COMMODITIES AGRÍCOLAS POR PREÇO INFERIOR AO PREÇO MÍNIMO FIXADO PELO GOVERNO FEDERAL. A consulente informa ter firmado contratos de compra de produtos agrícolas, especialmente de milho, por preço inferior ao mínimo fixado pelo Governo Federal 2, e questiona a validade do negócio. As decisões existentes sobre o tema, proferidas pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul e pelo Superior Tribunal de Justiça, vedam a fixação do preço de compra abaixo ao mínimo estabelecido pelos órgãos governamentais, admitindo a revisão dos negócios realizados nestas condições, como se infere das ementas abaixo: 2 Os preços mínimos atuais estão regulamentados no Decreto nº. 6.266, de 22 de novembro de 2007. 8

Revisão judicial do contrato. Não é contrato aleatório, por isso excluído da possibilidade de revisão, a venda a futuro de feijão soja, cujo preço contratado veio a tornar-se inferior ao mínimo oficial por força da inflação e da aplicação da tabela deflatora Cruzeiro/Cruzado. De preferência à resolução ou anulação, cabe aí a revisão da condição preço, que se deve, pela intervenção judicial elevar à igualdade com o preço mínimo de garantia. As normas instituidoras de preços mínimos não se destinam a privilegiar determinado setor da economia, mas a mantê-lo mínimamente capitalizado e produtivo, no interesse de toda a sociedade. Trata-se, pois, de regras de ordem publica. (...) Apelação sem provimento, rejeitadas as preliminares. (AC nº. 586053548, TJRS, Sexta Câmara Cível, Rel. Adroaldo Furtado Fabrício, julgado em 24/03/1987) Obrigações. Ocorrendo desequilíbrio financeiro evidente e não previsto, pode o contrato ser revisado de modo a restabelecer igualdade que corresponde a base justa na qual deve ser mantido. Preço mínimo não obedecido justifica o pagamento da diferença. Ação procedente. Recurso desprovido. (AC nº. 594093346, TJRS, Quarta Câmara Cível, Rel. Perciano de Castilhos Bertoluci, julgado em 17/05/1995) Venda a futuro de feijão-soja. Revisão judicial do contrato, com o intuito de se assegurar preço mínimo. Peculiaridade da espécie, ante a inflação então verificada. Precedente da 3ª Turma do STJ: REsp 53.342. Recurso especial não conhecido. (REsp nº. 14.971/RS, STJ, Terceira Turma, Rel. Ministro Nilson Naves, DJ 31/03/1997) Consigna-se, por fim, que não há manifestação recente do Poder Judiciário sobre o tema, tendo em vista que, habitualmente, os preços mínimos do Governo Federal estiveram abaixo do preço de mercado. c) APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. O artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078/90, assim define consumidor: Art. 2 Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. O conceito de consumidor foi bem delineado em acórdão da lavra do Desembargador Rogério Gesta Leal, transcrito, em parte, abaixo: APELAÇÃO CÍVEL. VÍCIO REDIBITÓRIO. DECADÊNCIA. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO 9

CONSUMIDOR. Ausente a relação de consumo quando o adquirente da coisa vise lucro ou tenha fito profissional em sua aquisição. O destinatário final é o que retira o bem ou serviço do mercado ao adquirir ou simplesmente utilizá-lo (destinatário final fático), aquele que coloca um fim na cadeia de produção (destinatário final econômico) e não aquele que utiliza o bem ou seguro para continuar a produzir, utilizando-o como parte, insumo, ou garantia de sua produção. APELO DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA (AC Nº 70009176785, TJRS, Décima Quarta Câmara Cível, Rel. Rogério Gesta Leal, julgado em 30/06/2005) A toda evidência, as partes contratantes em negócio de compra e venda de commodities agrícolas não se enquadram na definição de consumidor, sendo que a operação essencialmente mercantil, como já consagrado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul e do Superior Tribunal de Justiça: EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE FEIJÃO SOJA. MULTA MORATÓRIA. NÃO- INCIDÊNCIA DA LEGISLAÇÃO CONSUMEIRISTA, PORQUANTO O CONTRATO É REGIDO PELAS REGRAS DE DIREITO OBRIGACIONAL E COMERCIAL. CLÁUSULA PENAL. INAPLICABILIDADE DA LIMITAÇÃO DA LEI DE USURA. INCIDÊNCIA DO ART. 412 DO CÓDIGO CIVIL. SENTENÇA MODIFICADA. APELO PROVIDO. (AC nº 70006078026, TJRS, Décima Câmara Cível, Rel. Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira, julgado em 28/10/2004) CIVIL E PROCESSUAL. COMPRA E VENDA DE SOJA POR EMPRESA AGROINDUSTRIAL. INADIMPLEMENTO INTEGRAL. PRODUTO NÃO FORNECIDO. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. MULTA. CONTRATO, ADEMAIS, CELEBRADO ANTES DO CDC. REDUÇÃO DA MULTA PENAL COM BASE NA LEI N. 8.078/90. IMPOSSIBILIDADE. I. Relação jurídica que além de não se enquadrar no Código de Defesa do Consumidor, em face da destinação da mercadoria, é oriunda, também, de contrato de compra e venda de produto agrícola celebrado antes do advento da Lei n. 8.078/90, pelo que incabível o seu emprego, mesmo por analogia, para impor a redução da multa imposta em cláusula penal pelo inadimplemento integral da obrigação. II. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 435.038/SC, STJ, Quarta Turma, Rel. Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ 14/02/2005) Portanto, o contrato de compra e venda de grãos não está sujeito às normas do Código de Defesa do Consumidor, e sim à legislação civil e comercial aplicável à espécie. 10

d) MULTA MORATÓRIA. CLÁUSULA PENAL. VALIDADE. LIMITES. Nos contratos de compra e venda de grãos, comumente há duas espécies de multa para o caso de descumprimento da obrigação, a moratória e a compensatória. A multa moratória objetiva conduzir o devedor ao cumprimento da obrigação no seu termo, e a compensatória, ou cláusula penal, é uma indenização prévia pelas perdas e danos advindas do descumprimento. As referidas penalidades incidem tanto em caso de inadimplemento absoluto da obrigação, quando o vendedor não entrega o produto, quanto nos casos de mora, quando há atraso na entrega do produto. Quando não há cláusula penal, ou quando o prejuízo é superior ao valor desta, pode a parte prejudicada requerer o pagamento de indenização pelas perdas e danos. Em diversas decisões, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e do Paraná 3 acolheram a pretensão indenizatória em montante apurado com base na diferença do preço do produto na data da assinatura do contrato e no dia do vencimento da obrigação: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. COMPRA E VENDA DE SOJA. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. PERDAS E DANOS. ESTIAGEM. (...) perfeitamente cabível ao caso em tela a condenação da empresa demandada ao pagamento do valor referente à soja comprada pela autora e não entregue, bem como a diferença do valor que a parte autora teve que pagar a mais perante outros fornecedores do produto, tendo em vista que o prejuízo sofrido pela demandante foi decorrente do descumprimento contratual da demandada, em face da quantidade de sacas contratadas. Ademais, o art. 627 do CPC e arts. 389, 402 e 475, ambos do CC, autorizam ao credor a receber, além do valor da coisa, as perdas e danos. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ E DERAM PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA. UNÂNIME. (AC nº. 70022527246, TJRS, Décima Sexta Câmara Cível, Rel. Ergio Roque Menine, julgado em 19/03/2008) INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. AGRAVO RETIDO. DESNECESSIDADE DA APURAÇÃO DOS PERCENTUAIS COLHIDOS EM SAFRAS ANTERIORES. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE SOJA PARA ENTREGA FUTURA. INADIMPLEMENTO. NÃO ENTREGA DO PRODUTO QUE SE RESOLVE POR PERDAS E DANOS. COMPROVADO QUE O REQUERENTE COMPROU O PRODUTO NO MERCADO POR 3 AC 4197, TJPR, Décima Câmara Cível, Rel. Wilde de Lima Pugliese, julgado em 13/07/2006. 11

PREÇO SUPERIOR AO CONTRATADO. INDENIZAÇÃO MANTIDA. AGRAVO RETIDO E APELO DESPROVIDOS. UNÂNIME. (AC nº 70014016901, TJRS, Vigésima Câmara Cível, Rel. Rubem Duarte, julgado em 30/08/2006) (...) a multa é de 10% sobre o valor contrato, valendo destacar sequer ser caso de incidência do Código de Defesa do Consumidor, pois a embargante/apelante não é destinatária final do produto. (AC nº 70001121755, TJRS, Décima Nona Câmara Cível, Rel. Antônio Vinícius Amaro da Silveira, julgado em 22/02/2005) APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DO DEVEDOR. EXECUÇÃO PARA ENTREGA DE COISA FUNGÍVEL. SOJA. CONVERSÃO PARA EXECUÇÃO DE QUANTIA CERTA. (...) - Com relação à multa de 10%, ela é devida, visto que a relação que figurou não é de consumo e sim de compra e venda de soja, não estando, portanto, sujeita ao Código de Defesa do Consumidor. (AC nº 70017697228, TJRS, Décima Segunda Câmara Cível, Rel. Dálvio Leite Dias Teixeira, julgado em 05/04/2007) Importante referir que as cláusulas do contrato são respeitadas pelo Poder Judiciário quando são redigidas de forma clara, permitindo a exata compreensão das obrigações e das penalidades que incidirão no caso de mora ou inadimplemento de cada parte, e há inequívoca ciência de seu conteúdo por ambos os contratantes. e) DESNECESSIDADE DE INTERPELAÇÃO, NOTIFICAÇÃO OU PROTESTO. Decorre das informações prestadas pela consulente que os contratos de compra e venda de grãos têm obrigação líquida, certa e com data de vencimento determinada. Neste caso, o devedor incide em mora pelo simples implemento do termo final, não sendo necessária a adoção de qualquer medida para constituí-lo em mora, conforme dispõe o artigo 397 do Código Civil: Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor. 12

Como no contrato que nos foi submetido há fixação do prazo de vencimento, desnecessário constituir o devedor em mora para exigir o cumprimento da obrigação, como bem explicitam as decisões abaixo: (...) 2. A constituição em mora do devedor não é condição de procedibilidade da presente execução. Ora, no título executado, contrato de confissão de dívida, está definido qual é o prazo do vencimento da obrigação. Com isso, afigura-se desnecessária a prévia interpelação para a constituição em mora, consoante determina o parágrafo único do art. 397 do Código Civil. (Apelação Cível nº 70014407282, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 12/07/2006) APELAÇÃO CÍVEL. RESOLUÇÃO CONTRATUAL.INTERPELAÇÃO. AUSÊNCIA. DESNECESSIDADE. A notificação da incorporadora inadimplente afigura-se desnecessária, pois além de a citação haver suprido tal irregularidade, o próprio decurso do tempo a interpelou.(...). Portanto, a obrigação constante do contrato, qual seja a entrega de produto, pode ser exigida independentemente de interpelação, notificação ou protesto, pois o simples vencimento da obrigação constitui a parte inadimplente em mora. f) REQUISITOS NECESSÁRIOS À PROPOSITURA DE DEMANDA JUDICIAL VISANDO O CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO PELO VENDEDOR. No contrato em apreço, ambas as partes têm obrigações: enquanto a compradora tem o dever de pagar o preço, o vendedor tem que entregar o produto. Por outro lado, cada parte tem o direito de exigir que a outra cumpra sua obrigação na avença 4. A regra vem expressamente prevista no artigo 476 do Código Civil: Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro. Como no contrato aqui analisado não houve adiantamento do pagamento pela compradora, a sua obrigação ainda não foi cumprida. Deste modo, poderá o vendedor negar-se a entregar o produto ou, quando demandado em juízo, justificar o seu inadimplemento na ausência de pagamento do preço. 4 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. Atlas: São Paulo, 2003. vol. II, 3 ed., p. 394. 13

Se, no entanto, o vendedor não cumprir a obrigação de entregar o produto no prazo, e o comprador quiser exigir o cumprimento através de medidas judiciais como o seqüestro e a execução para a entrega de coisa incerta, deverá ele, caso a obrigação dele (pagamento) também esteja vencida, requerer o depósito judicial do valor total do pagamento ou, se já efetuado o pagamento, juntar o comprovante no ato do ajuizamento da ação. Sugere-se, por fim, que seja tentada a solução amigável ao conflito judicial, pois este desgasta a relação com a contraparte, prejudicando a reputação e a confiança, o que pode causar sérios prejuízos econômicos nas negociações seguintes. Sendo estas as considerações, colocamo-nos à disposição para quaisquer esclarecimentos. Atenciosamente, Luís Fernando Barufaldi 14