Influência do movimento da responsabilidade social empresarial para o surgimento do empreendedorismo social - processos e estratégias: o Brasil como



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Transcrição:

Influência do movimento da responsabilidade social empresarial para o surgimento do empreendedorismo social - processos e estratégias: o Brasil como caso exemplar. Prof. Dr. Edson Marques Oliveira (UNIOESTE), pesquisador do Grupo Gepec, emo@professoredson.com.br, Rua Guairá, 1.100 Jd. Panceira Toledo-PR, (45) 278 38 33 ou 277 4600

Influência do movimento da responsabilidade social empresarial para o surgimento do empreendedorismo social - processos e estratégias: o Brasil como caso exemplar. RESUMO Objetivamos apresentar as principais características da responsabilidade social empresarial e sua influência quanto ao surgimento do empreendedorismo social, como um novo paradigma na gestão social, onde a lógica de mercado é utilizada para resolver problemas sociais. Tal constatação é fruto do estudo no doutorado sobre empreendedorismo social no Brasil, onde se percebe a relação e proximidade entre ambas as categorias, tanto no campo teórico como no campo prático. Para tanto apresentamos alguns parâmetros teóricos a partir da obra de MELO NETO e FROES, e de um caso exemplar, que vem destacando o Brasil como uma referência internacional de empreendedorismo social que é influenciado pela lógica que vem sendo disseminada pela participação das empresas no campo social. PALAVRAS-CHAVE: responsabilidade social empresarial, empreendedorismo social, franquia social. INTRODUÇÃO 1) Principais características da responsabilidade social empresarial (R.S.E) e sua relação com o empreendedorismo social. O conceito e formatação da R.S.E, após a metade dos anos e 1990, apresenta uma configuração diversificada, dependendo do porte da empresa e sua visão quanto a intervenção no campo social. Mas via de regra, esta relacionado a postura ética de fazer negócios num cenário de grandes mudanças, tanto globais como locais, mas principalmente quanto a crescente conscientização dos consumidores, quanto a postura das empresas face aos problemas sociais e sua postura responsável, o que vai além de pagar impostos e contratar pessoas. A R.S.E esta relacionada a coerência, pois nada adianta uma empresa apoiar projetos sociais, se os seus funcionários não são atendidos em suas necessidades e estão insatisfeitos, ou pior, só é marketing social, e não agregar em sua política e estratégia os valores e as ações que compõem a R.S.E. Logo, a R.S.E, apresenta duas dimensões, interna e externa. Internamente, diz respeito ao tratamento dos funcionários, e a política de gestão de pessoas, onde são feitas ações que vão além da legalidade, e centram esforços na educação, na qualidade de vida, na valorização do indivíduo, na liberdade de expressão, etc. Externa, diz respeito as ações voltadas para a comunidade, em especial a que esta diretamente ligada a missão da empresa. Dá visibilidade a sua política de R.S.E, de forma direta e indireta. Direta, quando abre uma ONG, ou Fundação e através desta, dinamiza as suas ações. Indireta, quando faz parcerias com organizações já consolidadas, e estabelece critérios de investimento social, que é diferente da mera doação e que requer um sistema de monitoramento da aplicação dos investimentos e seus resultados. Na atualidade a R.S.E, de forma efetiva se dá quando deixa de ser filantropia ou caridade e se torna uma política de gestão estratégica para a empresa. Que pode ser caracterizada, pelo que chamamos de mix da R.S.E, que é composta de: a) Política de

gestão da R.S.E, interna e externa, b) Certificação Social, c) Balanço Social, d) Marketing social, e e)alianças institucionais. Destes, vamos dar maior ênfase no primeiro. A política é um conjunto de princípios, diretrizes, critérios e valores para melhor expressar uma ação e decisão da empresa em determinada área, como: atendimento ao cliente, gestão de pessoas, industrialização, entre outras, e também de R.S.E. Desta forma a política de R.S.E deve ser uma decisão que vá além da mera filantropia, não pode ser de uma só pessoa, deve envolver mais pessoas, pois deve ser concebida como uma ação estratégica do negócio da empresa, desta forma é preciso definir três elementos fundamentais: 1) foco da ação, 2) estratégia e 3) papel. O foco da ação social pode ser: meio ambiente, terceira idade, desenvolvimento sustentável, etc. A necessidade de focar esta relacionada a construção da identidade da empresa em relação a causa social escolhida, bem como, os demais fatores estratégicos. Nesta fase, é preciso que a empresa opte por um foco o qual além de estar relacionado aos interesses da empresa (de seu negócio), também e principalmente seja, de maior necessidade e importância para a comunidade local, e não só favorável à imagem da empresa, como infelizmente muitos fazem. Na seqüência é preciso definir a estratégia de ação ( negócios, parcerias, alianças, marketing, programas e projetos, etc.). Com isso já é possível se ter uma visão de R.S.E e assim definir o terceiro elemento, o seu papel social, que esta relacionado aos valores que serão defendidos e difundidos ( cidadania, conhecimento, promoção humana, etc.). A política de R.S.E, se materializa em duas dimensões, interna junto aos funcionários e externa junto a comunidade. A mesma deve ser bem desenhada e neste processo pode é deve contar com a participação interna dos funcionários e com a participação externa da sociedade, tal processo não tem sido comum, mas é de bom tom, na medida que se quer desenhar uma política séria e verdadeira e não só de fachada. Saber a opinião dos funcionários, é abrir espaço para o comprometimento dos mesmos nesta política, e da comunidade, é atender a mesma em suas reais necessidades, bem como, os demais interessados neste processo, em causas que são significativas, e desta forma, agregam valor a marca e ao negócio da empresa, indo além da mera filantropia. Logo, este processo tem influenc iando profundamente a gestão no campo social, principalmente pela busca por inovação, ações de impacto, maior visibilidade de suas ações, integração com os vários segmentos da sociedade, o que faz surgir um novo padrão de intervenção social, onde não se exclui o Estado de suas funções, mas não se espera que o mesmo dê conta de tudo, e as empresas cumpram com seu papel de gerar produção e emprego, mas que vão além deste processo e tenham uma maior participação no processo de combate à pobreza e desigualdade, sendo este processo não mais uma ação de caridade e filantropia mas de investimento social, o que apresente um grande desafio na construção de alianças ( Cf. FISCHER, 2002 ) e que a sociedade civil participe mais ativamente de modo mais organizado e propositivo. Neste contexto, e na busca pelo entendimento, formatação, princípios, conceitos e estratégias da R.S.E, verificamos que emerge o conceito e a prática do empreendedorismo social, onde o mesmo esta imbricado a uma lógica de mercado, que vem sendo introduzida no campo da gestão social através do crescimento dos projetos de R.S.E., em específico e do empreendedorismo empresarial, em geral. No entanto, nossa investigação sobre o tema (Cf. OLIVEIRA, 2004) aponta que o empreendedorismo social vem se configurando com especificidades próprias e distintas da R.S.E.

Tal constatação ficou mais evidente no conjunto da obra de dois autores, os professores Francisco P. de Melo Neto e César Froes do Rio de Janeiro. Os autores apresentam três obras principais que foram publicadas em 1999, 2001 e 2002 (doravante serão referidas como trilogia de Melo Neto e Froes), no conjunto, as mesmas, sintetizam os principais elementos evolutivos do pensamento sobre a influencia da responsabilidade social empresarial, na gestão social em geral e nas organizações do terceiro setor em específico, e a transição do entendimento sobre o empreendedorismo social e sua contribuição para geração de uma sociedade sustentável, e por fim, de uma nova lógica e padrão de intervenção social. Em outras palavras, estes elementos ressaltam a presença da lógica de mercado usada para resolver problemas sociais, mas também distingui as especificidades tanto do empreendedorismo social, como da R.S.E., mas destacando que em ambos esta a influencia de uma lógica que vem alterando o padrão de intervenção social, onde se alia o espírito de engajamento e comprometimento social, típico dos movimentos e organizações contestatórios dos anos de 1960 e 1970, com a objetividade, inovação e tenacidade do empreendedor empresarial do século XXI. Os referidos autores, lançaram o primeiro livro enfocando o tema em 1999, com o título: Responsabilidade Social & Cidadania empresarial: a administração do terceiro setor defendem, como indica o próprio titulo da obra, que há uma relação intrisenca entre a responsabilidade social empresarial e a gestão do terceiro setor. Os mesmos ressaltam o crescimento do terceiro setor, face aos problemas sociais e a gestão social para o enfrentamentos da pobreza e miséria. Enfocam o conceito de cidadania empresarial e composição de ações empresariais no campo social que se materializam com a Responsabilidade Social empresarial, sendo que a principal característica a questão do desafio de integrar esforços de todos os segmentos para a resolução dos problemas sociais do país. Na segunda obra, lançada em 2001, os autores abordam a mesma temática, mas apresentando outros conceitos, o que já se nota pelo título: Gestão da responsabilidade social corporativa: o caso Brasileiro. Dando continuidade ao trabalho anterior, com ênfase no tocante a participação das empresas no campo social, mas ressaltando, o processo de gestão, ou seja, de como implantar e processar a gestão da responsabilidade social empresarial. Apresentam além de conceitos e estratégias, casos de empresas Brasileiras que tem desenvolvido esta modalidade de gestão. Enfatizam a relação existente entre o crescimento do terceiro setor e a crescente participação das empresas em ações sociais. Além destes aspectos, apresentam um novo conceito que esta relacionada a esta ação, chamado de novo paradigma da gestão da responsabilidade social empresarial, o que é denominado pelos autores como sendo, empreendedorismo social e filantropia de alto rendimento. A partir deste conceito e principio, apresenta sua definição de responsabilidade social empresarial e cidadania corporativa que esta ligada ao crescimento do terceiro setor e a sua profissionalização e aperfeiçoamento técnico através das empresas. Na terceira obra, mais recente, lançada em 2002, os autores já não se referem a R.S.E como centralidade, e nem o empresário como um empreendedor social, mas como fator complementar para o que eles chamam de uma nova transição paradigmática, o que é ressaltado e diferenciado já no próprio título da obra: Empreendedorismo social: a transição para a sociedade sustentável., nesta obra, que fecha o que estamos denominando de trilogia, o conceito e foco no empreendedorismo social é mais acentuado do que nas outras duas obras.

Também se percebe que há pouca conotação sobre a questão empresarial como sendo centralidade analítica e propositiva, mas avança para o conceito de sociedade sustentável, numa perspectiva de desenvolvimento da comunidade sendo a empresa e o empresário um dos elos deste processo, mostrando assim que a R.S.E influencia no surgimento do empreendedorismo social, mas ambos se distinguem em suas ações e impactos. O trabalho é constituído de oito capítulos, dos quais, seis falam diretamente sobre o empreendedorismo social, além de outros conceitos como: capital social, desenvolvimento sustentável, tecnologias sociais, entre outros. O eixo, principal desta vez, é o empreendedorismo social, e desta forma, os autores apresentam vários conceitos, e associações do entendimento do que seja empreendedorismo social. Até onde conseguimos alcançar nossa pesquisa bibliográfica no Brasil, e isto até setembro de 2003, quando encerramos a busca por obras com esta temática, não encontramos outra obra de âmbito nacional que venha tratar diretamente e com maior profundidade como este trabalho. Diga -se de passagem, nem a Ashoka, que é referencia nacional e internacional, produziu algo de tamanha envergadura. Estes elementos ficaram mais evidentes, quando apresentarmos os dados sobre um dos casos mais exemplares deste processo, como veremos a seguir. 2) Empreendedorismo social afinal do que se trata? Talvez esta seja a primeira indagação que podemos fazer ao ler o título deste trabalho. Desta forma a primeira compreensão que devemos ter, é de nos depararmos com um tema novo, pelo menos em sua atual configuração, mas na sua essência já existe a muito tempo. Alguns especialistas apontam Luter King, Gandi, Cristo, entre outros como empreendedores sociais. Isto decorrente a sua capacidade de liderança e inovação quanto as mudanças que provocaram em larga escala. Em nossa pesquisa sobre empreendedorismo social no Brasil, (Op.cit.), uma das primeiras constatações foi a pouca bibliografia sobre o assunto, tanto aqui no Brasil como no exterior. O que demonstra que o tema é novo e ainda esta em desenvolvimento. Este fato, gera certo grau de confusão entre alguns termos que são semelhantes, mas bem distintos. Esta confusão, diga-se de passagem, é encontrada, tanto por pesquisadores brasileiros como do exterior. Logo, vamos destacar um exemplo típico desta modalidade e em seguida fazer algumas considerações e com isso, contribuir para um melhor entendimento deste tema, bem como, destacar os seus processos, características e estratégias. O exemplo é do CDI Comitê de Democratização da Informática, criado pelo Brasileiro Rodrigo Baggio no Rio de Janeiro. O CDI é considerado hoje, como um exemplo Brasileiro de Empreendedorismo Social. Em 1994, Rodrigo Baggio, percebeu que a tecnologia da informática poderia ser uma grande ferramenta para lutar contra a exclusão social. Primeiramente criou um link para unir todos os jovens de todas as classes sociais, JovemLink. Notou que, só os que tinham computador é que acessavam a rede. Verifico que era necessário levar a tecnologia ao outro lado da fronteira digital. Assim, criou a primeira escola de informática na favela de Dona Marta, no subúrbio do Rio de Janeiro e deu os primeiros passos para a criação da ONG CDI, fundado em 1995. O CDI, é uma organização não-governamental tem como missão promover a inclusão social utilizando a tecnologia da informação como um instrumento para a construção e exercício da cidadania. ). Com sede no Rio de Janeiro, hoje está construída e consolidada uma rede de Escolas de Informática e Cidadania EIC, de forma autônoma e auto-sustentáveis, são cerca de 789. Já foram capacitadas cerca de

461.440 crianças e jovens. Tem atuação em âmbito nacional, em 38 cidades e 20 estados. E internacionalmente se encontra em cerca de 10 países. O CDI mantém uma vasta rede de parceiros para dinamizar suas atividades, tanto a nível nacional como internacional, destaca-se entre elas: BNDES, Fundação W.K.Kellogg, BID, Banco Mundial, Xerox, Fundação EDS, entre outros. Devido aos resultados e impacto social, este projeto é considerado pela ONU como um projeto de exemplo mundial, pois pode ser aplicado em vários lugares e alcançar a um custo baixo, resultados significativos, quanto a inclusão, não só digital, mas social e de exercício da cidadania. Salientamos que estes dois exemplos, e muitos outros, fazem parte de um movimento considerado ante-globalização neoliberal, ou seja, movimentos, ações, que são emergentes, que procuram dar respostas a um sistema de globalização injusto, centrado na cooperação, na solidariedade e no resgate de valores humanos perdidos, e que estão sendo re-vitalizados na cultura popular, na família e em ações emancipatórios (Cf. KLIKSBERG, 2001). Sem dúvida, o empreendedorismo social, se caracteriza como uma destas ações, como procuramos demonstrar a partir do exemplo apresentado. 3) Empreendedorismo social algumas considerações sobre o que não é. Antes de dizermos o que é empreendedorismo social, vamos inicialmente apresentar o que não é empreendedorismo social. O empreendedorismo social não é R.S.E, pois a mesma, como demostramos, supõe um conjunto organizado e devidamente planejado de ações internas e externas, e uma definição centrada na missão e atividade da empresa, face as necessidades da comunidade. Também não e Economia Solidária, pois a mesma é de natureza organizativa diferenciada quanto aos aspectos ideológicos, e tem como principal ponto a auto-gestão e a socialização do processo de produção e seus resultados. Não é uma profissão, pois não é legalmente constituída não há formação universitária ou técnica, nem conselho regulador e código de ética profissional legalizado; também não é uma organização social que produz e gera receitas, a partir da venda de produtos e serviços, e muito menos um empresário que investe no campo social, o que esta mais próximo da R.S.E. Desta forma, a investigação realizada sobre o assunto, permite fazer esta distinção, e também captar um entendimento mais específico sobre o significado e formatação do empreendedorismo social, destacamos os segntes pontos: a) é um novo paradigma, b) é um processo, c) é uma ciência e uma arte, d) é um indutor de auto-organização social, e) uma nova tecnologia de gestão social. Estes elementos podem ser identificados no caso apresentando do C.D.I, como ressaltamos em seguida. 4) Empreendedorismo social: caracterização, processos e estratégias. Primeiramente o empreendedorismo social, pode ser considerado como uma derivação do empreendedorismo empresarial, e que recebeu forte influencia da R.S.E, mas atualmente apresenta diferenças significativas, entre elas, a busca por resultados não individuais mas coletivos, como no dizer de Dolabela, um empreendedor de sonhos coletivos, e pela busca de retorno social e não só financeiro, tal perspectiva conduz a uma leitura diferenciada tanto em relação ao mundo como dos seres humanos, ou seja é um novo paradigma. Caracteriza-se por uma ação inovadora voltada para o campo social, é neste sentido um processo. Por processo entendemos a sucessão ordenada e inter-relacionada de ações que intencionalmente objetivam uma finalidade, utilizando para tanto meios e princípios técnicos e científicos para execução desta ação. No caso do empreendedorismo social o processo se inicia com a observação de uma determinada situação-problema local, em

seguida procura-se elaborar uma alternativa para enfrentar está situação. Esta idéia tem que apresentar algumas características fundamentais. A primeira é ser uma idéia inovadora, a segunda uma idéia que seja realizável, terceiro que seja auto-sustentável, quarto que envolvam várias pessoas e segmentos da sociedade, principalmente a população atendida, quinto que provoque impacto social e que possa ser avaliada os seus resultados. Os passos seguintes visam colocar esta idéia em prát ica, institucionalizar e gerar um momento de maturação até ser possível a sua multiplicação em outras localidades, criando assim um processo de rede de atendimento ou de Franquia Social, e até mesmo se tornar numa política publica. As características e especificidades dos empreendimentos sociais e dos empreendedores sociais, fazem com que este processo seja considerado uma arte é uma ciência. Ciência pois no desenvolvimento de seu processo utiliza elementos técnicos e científicos que podem ser aprendidos e aplicados pro que estuda e se empenha em dominar tal conhecimento. É uma arte, pois além do fator técnico o mesmo terá formas e resultados diversos a depender do fator e talento humano, em outras palavras, o toque humano, único que cada pessoa tem, faz diferença na ação sistematizada. Tais fatores podem ser observados no caso apresentado, do CDI, onde encontramos todos estes elementos: 1º) é uma idéia inovadora, ninguém havia realizado tal ação; 2º) uma idéia que foi realizada; 3º) se tornou auto-sustentável; 4º) envolveu várias pessoas e segmentos da sociedade ( principalmente a população atendida); 5º) provocou impacto social, local e global, e que podem ser avaliados os seus resultados e retorno do investimento aplicado; 6º) foi multiplicada e aplicada em outras regiões e até em outros países; 7º) se transformou em exemplo na elaboração de políticas públicas em vários Estados. Em nossa pesquisa (op.cit 2004) sintetizamos este processo num modelo inspirado na metáfora da metamorfose da lagarta que se transforma em borboleta. chamamos esta metodologia de Casulo Sócio-tecnológico. O mesmo tem as seguintes características: fase 1) Lagarta, representando a idéia, fase 2) o casulo, representando a idéia em movimento, consolidação, institucionalização, maturidade, e a fase 3) a borboleta, representando a multiplicação e impacto da idéia transformada em ação interventiva de impacto e com possibilidade de replicabilidade, como é o caso do CDI. Estes elementos e a perspectiva de integração e inovação social, fazem como o empreendedorismo social também seja considerado como um indutor de autoorganização social, ou seja, são ações que se iniciam no local e numa situação localizada, no entanto o seu desenvolvimento processual conduz necessariamente a geração de capital social, empoderamento dos envolvidos e conseqüentemente a emancipação social, tais ações e efeitos, são possíveis a partir do entendimento de um processo de autopoiese, no dizer de Maturana (1999) onde um dos principais fatores é a capacidade de conservação da espécie humano e preservação do meio ambiente, o que só pode ocorrer quanto se tiver amor entre os seres vivos dentro de um sistema social, ou seja, A mudança social é uma mudança na configuração de ações coordenadas que define e a identidade particular de um sistema social particular. E isso porque a mudança social só acontece quando o comportamento dos sistemas vivos individuais que compõem o sistema social se transformam de maneira a dar origem a uma nova configuração de ações coordenadas que define uma nova identidade para o sistema social. (idem, p. 190). Acreditamos que é isso que o empreendedorismo social tem feito e poderá fazer, a partir da potencialização do poder local, desencadear ações que gerem mudança global em

todo o sistema social e são essas características que diferem o empreendedorismo social da R.S.E, mas que destacam a influencia do segundo sobre o primeiro. 5) Considerações finais. Ao longo deste trabalho, procuramos, mesmo que brevemente, apresentar algumas das constatações da investigação sobre empreendedorismo social no Brasil. Destacando alguns elementos sobre sua caracterização, processos e estratégias e sua aproximação com a R.S.E. Apresentando um exemplo nacional que faz com que o Brasil se apresente na atualidade como caso exemplar na expansão do empreendedorismo social, de modo a ampliar as ações, que inicialmente foram locais e particularizadas, e agora, tornam-se experiências aplicáveis em outros países, como é o caso do CDI e outros como do microcredito, que tem sido referencia para criação de políticas públicas que vem trocando o assistencialismo pela dignidade de viver e superar sua própria condição de exclusão social, no dizer de Singer (1998), em relação ao microcredito, melhor emprestar do que dar. E ao apresentar o exemplo do CDI, procuramos salientar o que mais ressalta a diferença entre R.S.E do empreendedorismo social, destacando sua capacidade de inovação em gestão social empreendedora, que vai além das fronteiras locais e se espalha por todo o mundo, o que difere das metas e objetivos da R.S.E. Existem inúmeros outros exemplos, que dão a certeza que o Brasil é exemplar, e que a cada momento, necessitamos, de pessoas que sejam empreendedores sociais, e que sejam para este mundo, como a flor de lótus,... que nasce da lama e desabrocha em rara beleza, pois vêm conseguindo fazer brotar esperança em meios dominados pela desesperança, fé onde a tônica era a descrença; oportunidades onde havia total carência; e conservação da natureza onde existia devastação. (RAUER e PADUA, 2001, p. 18). Que a exemplo de tantas pessoas, profissionais e cidadãos, possamos despertar, o empreendedor social nato que existe de dentro de si, e com isso, mais do falar e aprofundar os problemas saibamos propor formas criticas-criativas e operativas de resolver estes problemas. E cremos que o primeiro passo é empreendermos uma renovação contextualizada de nossa própria prática profissional, ou seja, sejamos empreendedores de nosso pensar e agir. Esperamos ter contribuído para isso. 6) Bibliografia DEMO, Pedro A educação pelo avesso : assistência como direito e como problema São Paulo: Cortez, 2000 FISCHER, Rosa Maria O desafio da colaboração: prática de responsabilidade social entre empresas e terceiro setor São Paulo: 2002 KLIKSBERG, Bernado Falácias e Mitos do desenvolvimento social São Paulo: Cortez/Unesco, 2001; MATURANA, Humberto A antologia da realidade Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1997 MELO NETO, Francisco Paulo de Melo e FROES, César Responsabilidade Social & Cidadania Corporativa: a administração do terceiro setor Rio de Janeiro: Qualitymark, 1999 MELO NETO, Francisco Paulo de Melo e FROES, César Gestão da Responsabilidade Social Corporativa: o caso Brasileiro Rio de Janeiro: Qualitymark, 2001 MELO NETO, Francisco Paulo de Melo e FROES, César Empreendedorismo social: a transição a sociedade sustentável Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002

OLIVEIRA, Edson Marques Empreendedorismo social no Brasil: fundamentos e estratégias Franca-SP: Unesp, 2004 (tese de doutorado) ROUER, Mônica de e PADUA Suzana Machada Empreendedores sociais em ação São Paulo: Cultura Associados, 2001 SINGER, Paul Globalização e desemprego: diagnóstico e alternativas São Paulo: Contexto, 1998