O COTIDIANO DO EDUCADOR: INSPIRAÇÕES FREIREANAS Coordenadora: Isabel Cristina Nacha Borges Expositoras: Clarice Dirshnabel e Cristina Maria Salvador



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Transcrição:

O COTIDIANO DO EDUCADOR: INSPIRAÇÕES FREIREANAS Coordenadora: Isabel Cristina Nacha Borges Expositoras: Clarice Dirshnabel e Cristina Maria Salvador O PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO COMO UMA POSSIBILIDADE DE RECRIAÇÃO DO CURRÍCULO E DA ESCOLA Clarice Dirschnabel 58 Introdução Considera-se que a escola, hoje, constitui-se em espaço privilegiado do desenvolvimento humano em sua totalidade, envolvendo aspectos de socialização, de cultura, de propostas pedagógicas. Destaca-se, neste contexto, a relevância no projeto político pedagógico das instituições escolares, uma vez que este, pode representar um eixo regulador de práticas pedagógicas promotoras da cidadania. Enquanto processo de construção coletiva, o projeto político pedagógico pode explicitar os objetivos de uma comunidade escolar, dando forma a um mosaico de experiências que contrapõem ou reproduzem o currículo oficial. O diálogo que pretende-se estabelecer nesta direção, contempla a releitura de uma experiência vivida em uma comunidade escolar no município de Brusque, Estado de Santa Catarina. Esta experiência, que na escola se evidenciou a partir de um movimento compartilhado da comunidade escolar, possibilitou o repensar e a resignificação da estrutura organizacional e as ações desenvolvidas neste contexto. Neste sentido, o projeto político pedagógico apresentou-se como uma das possibilidades de recriação do currículo e da escola. Junto a este processo a formação permanente manifestou-se como um dos elementos de libertação e de autonomia intelectual para gerir e gerar o projeto político pedagógico. A formação permanente no âmbito da própria escola, constituiu-se em um dos elementos de acompanhamento da ação-reflexão-ação dos educadores, na busca de sua auto-formação. Nesta perspectiva, considera-se que seja de fundamental importância, nos determos sobre a formação permanente do educador, visto que, o exercício de uma convivência mais integrada no seio da comunidade escolar tem se apresentado como uma das alternativas possíveis na apreensão de novos conhecimentos: saberes reelaborados pela comunidade escolar que possibilitaram novos olhares para a formação e para o currículo. 1.1 A Formação Continuada como Elemento da Libertação e da Autonomia Intelectual para Gerir e Gerar o Projeto Político Pedagógico. As ações intencionais que se desencadeiam entre os sujeitos, no contexto do projeto político pedagógico do Colégio Municipal João Hassmann, revelam a criação de um ambiente interativo, cuja participação é caracterizada pela liberdade de projeção dos 58 Doutoranda no Programa de Educação e Currículo pela PUC/SP. 143

sujeitos, e de suas particularidades, na formulação de proposições diferenciadas em relação aquilo que se encontrava instituído no currículo da escola. Os encontros pedagógicos possibilitam esta interação, e constituem-se em espaços democráticos de diálogo, cujas tensões, resistências, contradições, conflitos e desequilíbrios emergiam de questões polêmicas da vivência e prática pedagógica. Ao mesmo tempo em que esta atividade causava medo, desconforto e inquietação nos professores, também possibilitava a eles um prazer enorme na concretização de uma relação mais dialógica, levando-os a uma interação e troca significativa de suas experiências. Podemos considerar que, no início deste processo, tal influência era minimizada pelas práticas individuais, resultado de uma tendência burocrática e centralizadora na cultura organizacional da escola. No entanto, a dinâmica da participação vai se concretizando, a partir da manifestação subjetiva de cada um, 59 e de cada um a seu tempo. Na ação e reflexão permeadas pelo diálogo, a troca, permitia aos professores exercitar, neste cotidiano, uma relação mais próxima e afetiva. O diálogo os levava a um conhecimento e entendimento maior da prática pedagógica, desenvolvida no interior da escola. A partir do diálogo, como essência do ato educativo, o processo foi sendo desencadeado, no coletivo, como um processo criativo de ensino-aprendizagem. Aos poucos, os professores iam percebendo que a relação, que até então estabeleciam com especialistas, técnicos e direção, começava a modificar-se. Esta interação, se dava nos encontros pedagógicos e levava o grupo de professores a entender que cada um era sujeito de sua prática. Os professores começavam a perceber que, no grupo, todos eram diferentes e que, portanto, as concepções e práticas divergiam. Foi possível, no grupo, reconhecer que eles não estavam ali apenas para executar as ações, mas que eram todos responsáveis pelas práticas desenvolvidas. Que a reflexão, o pensar sobre suas práticas, faziam parte desta organização pedagógica e que o encontro pedagógico constituía-se na superação desta ação no cotidiano escolar. Esta realidade começava a ser desvelada, então, a partir dos encontros pedagógicos, que passaram a fazer parte do currículo da escola.tal processo possibilitou a conscientização dos professores sobre o seu poder de aprender e ensinar. Esta aprendizagem vai sendo construída no diálogo, por meio de discussões que se intensificam no enfrentamento das diferenças. Os professores, diante das igualdades e diferenças, avanços e retrocessos, iam se apropriando de uma aprendizagem que tinha um sentido maior sobre aquilo que estavam fazendo em seu local de trabalho. As particularidades de cada um e as singularidades do grupo se incorporam, aos poucos, na vida e na profissão. Assim rompiam com uma relação até então individual, para o estabelecimento de relações negociadas, validadas por um contexto dialógico, participativo. A participação, agora coletiva, e de reflexão sobre o trabalho pedagógico da escola, desencadeia uma série de dinâmicas, que oportunizam ao grupo de professores sua 59 Aqui subentende-se os diversos segmentos envolvidos no Projeto Político Pedagógico: Professores, Alunos, Pais, Administração, Estagiários, entre outros. 144

intervenção nesta realidade. Era necessário não só discutir os problemas detectados, mas buscar, no coletivo da escola, alternativas para os problemas apresentados. Assim, a consciência que os professores tinham, na época, dos deveres, compromissos e espaço a ser conquistado, exigia a sua organização interna, e o seu reconhecimento de que uma das causas da crise educacional poderia estar no enfraquecimento de sua classe, enquanto grupo. Nesta direção, a integração na escola seria uma pré-condição teórica, necessária para que eles avançassem em suas discussões. A constatação desta realidade proporcionou ao grupo de professores o fortalecimento de um movimento coletivo, em direção a uma prática mais integradora. A investigação sobre as ações, sobre a organização da escola, não se reduzia mais a um ato mecânico, mas a um processo de busca de conhecimento, de criação, que exigia, a cada momento, uma reflexão e interpretação daquela realidade. Esta investigação que, dentro de um movimento pedagógico, caminhava em direção a uma visão mais ampla e crítica da realidade escolar, começava a sair de um esquema de visão parcial sobre este cotidiano. Neste processo, os professores passaram a identificar a totalidade que fazia parte deste contexto, sinalizando as temáticas significativas, bem como, a preocupação pela problematização destes temas Na concepção de Freire (1987), o oprimido se educará quando tomar consciência de sua condição, intervindo nesta condição que o produz, que o faz oprimido. Neste sentido, quando os professores, nos encontros pedagógicos, tomavam consciência de sua realidade, das condições desumanas em que ela se encontrava, buscavam esta realidade como ponto de partida para a reflexão e, neste momento, não somente a tomada de consciência, mas um movimento contrário, em direção a busca de alternativas, para melhorar estas condições. Aqui reside um aspecto importante do pensar sobre nossa prática, que diz respeito à consciência crítica. Como vimos, todo trabalho crítico é um mergulho, uma inserção maior na realidade, não para observá-la de longe, refleti-la somente, mas para mudá-la, através da prática. Não se trata de sair do real e refletir criticamente, mas refletir, criticamente, na prática, o real. Significa que a práxis é permanente no processo (FREIRE, 1987). Toda ação inovadora, que surgia no grupo, carregava um saber que era resultante desta ação. Portanto, o objeto da reflexão crítica era o saber que os professores iam acumulando na prática interventora. As temáticas identificadas e discutidas de modo significativo, diziam respeito a questões pedagógicas como: o alto índice de repetência nas classes iniciais do ensino fundamental; as práticas individualizadas e metodologias confusas; a falta de uma concepção de educação; a baixa auto-estima dos alunos em relação ao processo ensinoaprendizagem; a falta de compromisso e participação dos pais na vida escolar de seus filhos, dentre outros aspectos. A problematização destas questões permitiu aos professores identificar que esta realidade se apresentava bastante complexa e que existiam outras interferências ligadas às causas deste fracasso escolar. Porém, as limitações teóricas não possibilitavam a leitura crítica e intervenção sobre estas possíveis interferências. As manifestações e falas dos professores se apresentavam contraditórias, ligadas à discordâncias e justificativas sobre determinadas práticas. Não se conseguia perceber que as causas deste fracasso escolar, por exemplo, poderiam estar ligadas aos aspectos como: a intervenção de políticas educacionais, o papel do professor, sua prática social e formação. 145

A sinalização de um rumo, de um norte para as ações de modo compartilhado, na busca de novos conhecimentos, representava mais do que uma necessidade, era um compromisso que o grupo necessitava assumir no coletivo do cotidiano escolar. Assim a sistematização do Projeto Político Pedagógico 60 na escola, era fundamental e desafiava os professores a projetar novas ações por um caminho metodológico que agora passava a ser construído na própria ação. A participação na escola, como todo processo democrático, é um caminho que se faz ao caminhar. Ela somente se efetiva por atos e relações que se dão em nível da realidade concreta. Portanto, é neste chão que o projeto político pedagógico começa a se delinear favorecendo a criação de estruturas e processos democráticos no currículo da escola. A mudança de ações individuais no agenciamento de ações coletivas, permitiu aos professores o exercício de vivências e experiências democráticas que podem ser traduzidas por: A coletividade na direção da ação solidária; A valorização de habilidades e competências dos professores; O compromisso de assumir responsabilidades no coletivo e o respeito as diferenças, na viabilização de consensos: A ação coletiva, o espírito de equipe se colocam hoje como o grande desafio no processo de implementação de um projeto político pedagógico. A prática individualista e competitiva que, em sua maioria, são expressadas de modo sutil e camuflada, devem ser superadas gradativamente por uma ação coletiva na qual, no final, todos saem ganhando. O comprometimento dos sujeitos em assumir responsabilidades no coletivo da escola, pressupõe a existência de um espaço que contemple a participação de todos, independente da função que ocupem. Quando todas as funções atuam em conjunto podemos dizer que a responsabilidade será assumida no contexto. A apreensão, o reconhecimento e o respeito as diferenças, no contexto escolar, se transformam em um ambiente favorecedor de experiências e trocas, onde um aprende com o outro, discutindo e compartilhando idéias. Neste caso o grupo de professores começava a exercitar por meio da ação-reflexão a apropriação da lógica de diversos conhecimentos. Esta integração permitia ao grupo uma compreensão maior sobre a constituição deste percurso e o seu significado. O exercício de uma convivência integrada no projeto político pedagógico, colocou em evidência um dos aspectos que, no meio educacional, tem se constituído numa das maiores limitações, em direção ao desafio de uma formação mais profissinal: a formação permanente. Este movimento de ação-reflexão permanente, permitiu a projeção de um pensamento mais autônomo de auto-formação. Os encontros de estudo, que na escola surgiam de uma necessidade da prática, representaram um amplo campo de possibilidades para a produção de novos saberes e levavam os professores a um desenvolvimento profissional. A formação não se constrói por acúmulo de conhecimentos, de cursos, ou de técnicas, mas, sim por meio de um trabalho reflexivo, sobre as práticas. este sentido, os professores conseguiram mobilizar junto a este processo, uma formação permanente, que teve na práxis, um lugar de produção do saber. A vivência coletiva, neste grupo, forneceu- 60 Projeto Político Pedagógico é entendido como um processo permanente de reflexão e discussão dos problemas da escola, na busca de alternativas viáveis à efetivação de sua intencionalidade, que não é descritiva ou constatativa, mas é constitutiva. (Gadotti, 1997) 146

lhes pistas e leituras sobre como retinham o saber de referência, que encontrava-se, ligado às suas experiências e identidades. Como podemos observar, esta experiência possibilitou a produção de novos saberes, passando pela idéia de que são construídos ao longo do percurso. Todo o trabalho desenvolvido no projeto político pedagógico, resultou no estabelecimento de relações, cujas iniciativas dos professores nos projetos de ensino, permitiam maior liberdade de ação e autonomia. A formação permanente, como um pressuposto identificado na trajetória do projeto político pedagógico, apresentou-se diferente da formação inicial do professor. No processo, o que se evidenciava, era o resgate de uma formação que não tinha caráter sistemático, formal, legal. A quebra, dessa lógica institucionalizada, acontecia a partir de uma vivência que agora se estabelecia mediante uma experiência dialogada, negociada com os autores e parceiros, articulada ao compromisso e exigência de uma formação constante. Referências Bibliográficas: ABRAMOWICZ, Mere. Avaliando a Avaliação da Aprendizagem: um novo olhar. São Paulo: Lúmen, 1996. APPLE, Michael & BEANE, James.(Orgs).Escolas Democráticas. São Paulo: Cortez, 1997. APPLE, Michael. W. Conhecimento Oficial: a educação democrática numa era conservadora. Petrópulis, RJ: Vozes,1997. DIRSCHNABEL, Clarice. Construindo A Rede Do Projeto Político Pedagógico: fios trançados da avaliação e da participação. Dissertação de Mestrado. PUC/São Paulo,2000. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 26ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987. FREIRE, Paulo & SHOR Ira. Medo e Ousadia: o cotidiano do professor. 7ª Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986. A Educação na Cidade. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 1995. Educação como Prática da Liberdade. 22ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra.1996. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido.4ª ed.rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. Pedagogia Da Autonomia: saberes necessários à prática educativa.são Paulo: Paz e Terra, 1996. GADOTTI, Moacir & ROMÃO, José E. (Orgs.) Autonomia da Escola: princípios e propostas. 2ª ed.são Paulo: Cortez, 1997. GIROUX, Henry A.. Os Professores como Intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem.porto Alegre:Artes Médicas, 1997. SAUL, Ana Maria. Avaliação Emancipatória: desafio à teoria e à prática de avaliação e reformulação de currículo. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 1995. 147