Uma Visita a Museu e a Possibilidade de Inclusão de Surdos



Documentos relacionados
O PROCESSO DE INCLUSÃO DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA VISUAL: UM ESTUDO DE METODOLOGIAS FACILITADORAS PARA O PROCESSO DE ENSINO DE QUÍMICA

PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO: ELABORAÇÃO E UTILIZAÇÃO DE PROJETOS PEDAGÓGICOS NO PROCESSO DE ENSINO APRENDIZAGEM

POLÍTICAS INSTITUCIONAIS DE ACESSIBILIDADE. - Não seja portador de Preconceito -

QUADRO DE EQUIVALENTES, CONTIDAS E SUBSTITUTAS DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO

JANGADA IESC ATENA CURSOS

PIBID: DESCOBRINDO METODOLOGIAS DE ENSINO E RECURSOS DIDÁTICOS QUE PODEM FACILITAR O ENSINO DA MATEMÁTICA

EMENTAS DAS DISCIPLINAS OFERECIDAS NO CURSO DE PEDAGOGIA Catálogo 2012

SIGNIFICADOS ATRIBUÍDOS ÀS AÇÕES DE FORMAÇÃO CONTINUADA DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DO RECIFE/PE

O COORDENADOR PEDAGÓGICO COMO MEDIADOR DE NOVOS CONHECIMENTOS 1

AS CONTRIBUIÇÕES DAS VÍDEO AULAS NA FORMAÇÃO DO EDUCANDO.

MÍDIAS NA EDUCAÇÃO Introdução Mídias na educação

ADAPTAÇÕES NECESSÁRIAS PARA O ALUNO SURDOCEGO ADQUIRIDO NA ESCOLA DE ENSINO REGULAR

Projeto Bem-Estar Ambiente, educação e saúde: sustentabilidade local. Tema 9 - Elaboração de projetos de intervenção nas escolas

A PRODUÇÃO DE VÍDEOS COMO RECURSO METODOLÓGICO INTERDISCIPLINAR

DIFICULDADES ENFRENTADAS POR PROFESSORES E ALUNOS DA EJA NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM DE MATEMÁTICA

A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR DE PEDAGOGIA DA FESURV - UNIVERSIDADE DE RIO VERDE

AIMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO CONTINUADA COLABORATIVA ENTRE PROFESSORES QUE ATUAM COM PESSOAS COM AUTISMO.

MANUAL DE TRABALHO INTERDISCIPLINAR TI - INTEGRADOR FAN CEUNSP

Pedagogia Estácio FAMAP

III SEMINÁRIO EM PROL DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA Desafios Educacionais

ATIVIDADES DESENVOVLIDAS PELO LABORATÓRIO DE ENSINO DE MATEMÁTICA LEM- FOZ

FACULDADE INTERNACIONAL DO DELTA PROJETO PARA INCLUSÃO SOCIAL DOS SURDOS DA FACULDADE INTERNACIONAL DO DELTA

ESPAÇO INCLUSIVO Coordenação Geral Profa. Dra. Roberta Puccetti Coordenação Do Projeto Profa. Espa. Susy Mary Vieira Ferraz RESUMO

RESULTADOS E EFEITOS DO PRODOCÊNCIA PARA A FORMAÇÃO CONTINUADA DOS PROFESSORES DO INSTITUTO FEDERAL DE ALAGOAS RESUMO

A NECESSIDADE DA PESQUISA DO DOCENTE PARA UMA PRÁTICA PEDAGÓGICA INCLUSIVA, PRINCIPALMENTE NA EDUCAÇÃO ESPECIAL E NO TRABALHO COM AUTISTAS

OS SABERES PROFISSIONAIS PARA O USO DE RECURSOS TECNOLÓGICOS NA ESCOLA

CLASSE ESPECIAL: UMA ALTERNATIVA OU UM ESPAÇO REAL DE INCLUSÃO?

Aula-passeio: como fomentar o trabalho docente em Artes Visuais

A INCLUSÃO NO ENSINO SUPERIOR: CONTRIBUIÇÕES DE LEV VIGOTSKI E A IMPLEMENTAÇÃO DO SUPORTE PEDAGÓGICO NO IM-UFRRJ

SÍNDROME DE DOWN E A INCLUSÃO SOCIAL NA ESCOLA

EMENTÁRIO DAS DISCIPLINAS DO CURSO DE PEDAGOGIA: DOCÊNCIA E GESTÃO EDUCACIONAL (Currículo iniciado em 2009)

INTERPRETANDO A GEOMETRIA DE RODAS DE UM CARRO: UMA EXPERIÊNCIA COM MODELAGEM MATEMÁTICA

7 Conclusões e caminhos futuros

EDUCAÇÃO PATRIMONIAL A PARTIR DE JOGOS DIDÁTICOS: UMA EXPERIÊNCIA EXTENSIONISTA NO MUNICÍPIO DE RESTINGA SÊCA/RS/Brasil

O JOGO COMO INSTRUMENTO FACILITADOR NO ENSINO DA MATEMÁTICA

Prefeitura Municipal de Santos

O USO DAS TECNOLOGIAS EDUCACIONAIS COMO FERRAMENTA DIDÁTICA NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM

Projeto em Capacitação ao Atendimento de Educação Especial

PROJETO DE VIVÊNCIA

I SEMINÁRIO POLÍTICAS PÚBLICAS E AÇÕES AFIRMATIVAS Universidade Federal de Santa Maria Observatório de Ações Afirmativas 20 a 21 de outubro de 2015

CASTILHO, Grazielle (Acadêmica); Curso de graduação da Faculdade de Educação Física da Universidade Federal de Goiás (FEF/UFG).

Composição dos PCN 1ª a 4ª

A Educação Bilíngüe. » Objetivo do modelo bilíngüe, segundo Skliar:

A UTILIZAÇÃO DE RECURSOS VISUAIS COMO ESTRATÉGIA PEDAGÓGICA NO PROCESSO DE ENSINO - APRENDIZAGEM DE ALUNOS SURDOS.

A DANÇA E O DEFICIENTE INTELECTUAL (D.I): UMA PRÁTICA PEDAGÓGICA À INCLUSÃO

ASSISTÊNCIA SOCIAL: UM RECORTE HORIZONTAL NO ATENDIMENTO DAS POLÍTICAS SOCIAIS

Pós graduação EAD Área de Educação

Organização Curricular e o ensino do currículo: um processo consensuado

Carla de Carvalho Macedo Silva (CMPDI UFF)

O INTÉRPRETE EDUCACIONAL DE LIBRAS: O DESAFIO DE ATUAR NO ENSINO FUNDAMENTAL I 1 Flávia Cristina V. Bizzozero UNINTER

RESUMO. Palavras-chave: Educação matemática, Matemática financeira, Pedagogia Histórico-Crítica

Educação Acessível para Todos

A IMPORTANCIA DOS RECURSOS DIDÁTICOS NA AULA DE GEOGRAFIA

FORMANDO PEDAGOGOS PARA ENSINAR CIÊNCIAS NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

CONSTRUÇÃO DE QUADRINHOS ATRELADOS A EPISÓDIOS HISTÓRICOS PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA RESUMO

Iniciando nossa conversa

DESCRIÇÃO DAS PRÁTICAS DE GESTÃO DA INICIATIVA

USO DAS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES PRESENCIAL E A DISTÂNCIA

REGULAMENTO ESTÁGIO SUPERVISIONADO CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA FACULDADE DE APUCARANA FAP

O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO -AEE E O ALUNO COM SURDOCEGUEIRA E OU COM

ACESSIBILIDADE E FORMAÇÃO DE PROFESSORES: EXPERIÊNCIA COM UM ALUNO CEGO DO CURSO DE GEOGRAFIA, A DISTÂNCIA

EEFM Raimundo Marques de Almeida

PEDAGOGIA ENADE 2005 PADRÃO DE RESPOSTAS - QUESTÕES DISCURSIVAS COMPONENTE ESPECÍFICO

Monitoria como instrumento para a melhoria da qualidade do ensino em Farmacotécnica

ISSN ÁREA TEMÁTICA: (marque uma das opções)

O MATERIAL DIDÁTICO PEÇAS RETANGULARES

QUANTO VALE O MEU DINHEIRO? EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PARA O CONSUMO.

Breve histórico da profissão de tradutor e intérprete de Libras-Português

Palavras-Chave: Competência Informacional. Fontes de Informação. Pesquisa Escolar.

ENSINO DE CIÊNCIAS PARA SURDOS UMA INVESTIGAÇÃO COM PROFESSORES E INTÉRPRETES DE LIBRAS.

Palavras-chave: Deficiência Visual. Trabalho Colaborativo. Inclusão. 1. Introdução

PROFESSORES DE CIÊNCIAS E SUAS ATUAÇÕES PEDAGÓGICAS

UMA PROPOSTA DE ATIVIDADE DE MODELAGEM MATEMÁTICA PARA O DESENVOLVIMENTO DE CONTEÚDOS MATEMÁTICOS NO ENSINO FUNDAMENTAL I

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES 1

PROJETOS DE ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA: DO PLANEJAMENTO À AÇÃO.

ÁGUA E ENERGIA: CASAS MINIMAMENTE SUSTENTÁVEIS

SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ CONSELHO SUPERIOR DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO RESOLUÇÃO N , DE 27 DE FEVEREIRO DE 2013

A MODELAGEM MATEMÁTICA E A INTERNET MÓVEL. Palavras-chave: Modelagem Matemática; Educação de Jovens e Adultos (EJA); Internet móvel.

O USO DO TANGRAM EM SALA DE AULA: DA EDUCAÇÃO INFANTIL AO ENSINO MÉDIO

Avaliação-Pibid-Metas

LIBRAS: A INCLUSÃO DE SURDOS NA ESCOLA REGULAR

A INFLUÊNCIA DOCENTE NA (RE)CONSTRUÇÃO DO SIGNIFICADO DE LUGAR POR ALUNOS DE UMA ESCOLA PÚBLICA DE FEIRA DE SANTANA-BA 1

CURSO: EDUCAR PARA TRANSFORMAR. Fundação Carmelitana Mário Palmério Faculdade de Ciências Humanas e Sociais

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES NO CONTEXTO TECNOLÓGICO: DESAFIOS VINCULADOS À SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO

X Encontro Nacional de Educação Matemática Educação Matemática, Cultura e Diversidade Salvador BA, 7 a 9 de Julho de 2010

ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM INCLUSIVAS: ENTRE ENCANTOS E DES(ENCANTOS) PALAVRAS-CHAVE: Estratégias. Aprendizagem. Inclusão

O ESTÁGIO SUPERVISIONADO COMO ESPAÇO DE CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DOCENTE DE LICENCIANDOS EM MATEMÁTICA

O mundo lá fora oficinas de sensibilização para línguas estrangeiras

A IMPORTÂNCIA DO PIBID NO CONTEXTO ENSINO APRENDIZAGEM REPORTADA POR ALUNOS DO 1º ANO DO ENSINO MÉDIO

As contribuições do PRORROGAÇÃO na formação continuada dos professores da Rede Municipal de Educação de Goiânia.

E GE HARIA SOCIAL: UMA OVA DIME SÃO PARA A FORMAÇÃO DO E GE HEIRO. Santos, D. C.

A ENERGIA NOSSA DE CADA DIA: CONHECER PARA PRESERVAR

DITADURA, EDUCAÇÃO E DISCIPLINA: REFLEXÕES SOBRE O LIVRO DIDÁTICO DE EDUCAÇÃO MORAL E CÍVICA

INCLUSÃO E ACESSIBILIDADE EDUCACIONAL: PERSPECTIVAS SOB O OLHAR DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

OS NOVOS PARADIGMAS DA FORMAÇÃO CONTINUADA: DA EDUCAÇÃO BÁSICA À PÓSGRADUAÇÃO

OFICINA DE JOGOS MATEMÁTICOS E MATERIAIS MANIPULÁVEIS

ÁLBUM DE FOTOGRAFIA: A PRÁTICA DO LETRAMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL 59. Elaine Leal Fernandes elfleal@ig.com.br. Apresentação

Transcrição:

Uma Visita a Museu e a Possibilidade de Inclusão de Surdos A Visit to the Museum and the Possibility of Inclusion of Deaf Fernando Barcellos Razuck 1 Erika Zimmermann 2, Renata Cardoso de Sá Ribeiro Razuck 3 1. UnB, Faculdade de Educação, FE, CAPES, razuckdabrasilia@hotmail.com 2. UnB, Faculdade Faculdade de Educação, FE 3. UnB, Faculdade UnB Planaltina, FUP, renatarazuck@unb.br Resumo Pode-se dizer que os museus e suas respectivas exposições museológicas têm um papel crucial no processo de inclusão social. No caso de exposições que envolvam temas ligado a questões científicas, podem também auxiliar na formação de conceitos na área. Dessa maneira, neste trabalho, estudou-se a visitação de um grupo de alunos surdos do Ensino Médio a uma exposição museológica científica, acompanhados por uma guia surda, da própria instituição, bem como por seus professores. Esta pesquisa teve como objetivo então examinar de que maneira o conhecimento apresentado era compreendido pelos alunos, levando-se em consideração o impacto 1 que um funcionário com as mesmas necessidades especiais, no caso um guia surdo, poderia causar no grupo de visitantes. Nesse sentido, entende-se que para facilitar o processo de inclusão de sujeitos com necessidades especiais, deve-se garantir a sua participação não só como espectadores, mas também como parte integrante do grupo de profissionais envolvidos no processo. Palavras-Chave: Inclusão, Surdez, Popularização da Ciência Abstract We can say that museums and their exhibitions in museums have a crucial role in the process of social inclusion. In the case of expositions involving issues related to science, it can also assist in the formation of concepts in the area. Thus, in this work, we studied the visitation of a group of high school deaf students at a science museum exhibition, accompanied by a guide deaf, that works ate the museum, as well as their teachers. This research aimed to examine how the knowledge presented was understood by the students, taking into account the impact that an employee with the same special needs, a guide deaf, could cause in the group of visitors. In this sense, it is understood that to provide the process of inclusion of individuals 1 O termo impacto foi utilizado no sentido adotado por Porto (2008), que observou que o impacto causado por uma exposição museológica remete á motivação para aprender.

with special needs, should ensure their participation not only as spectators, but also as part of the group of professionals involved in the process. Key words: Inclusion, Deaf, Popularization of Science Introdução De acordo com Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM, 2010, p.8), é objetivo da Política Nacional de Museus Promover a valorização, a preservação e a fruição do patrimônio cultural brasileiro, considerado como um dos dispositivos de inclusão social e cidadania, por meio do desenvolvimento e da revitalização das instituições museológicas existentes e pelo fomento à criação de novos processos de produção e institucionalização de memórias constitutivas da diversidade social, étnica e cultural do país Nesse sentido, entende-se que os museus, com suas exposições museológicas, podem exercer um papel crucial para o processo de inclusão social. Segundo Ribeiro (2007), a partir da década de 1990, programas de inclusão sócio-educacional vêm ganhando visibilidade nos museus e centros de ciência e cultura, sensibilizando a sociedade sobre o assunto e estimulando iniciativas inclusivas em outros ambientes. Além disso, os processos inclusivos também são de grande importância com relação aos eventos de cunho científico. Assim, uma das possibilidades que se abre vem a ser a correlação existente entre a inclusão e a Popularização da Ciência e da Tecnologia (C&T). Isto porque, de acordo com Tenório, Oliveira e Miranda (2009), a perspectiva de promover inclusão social, concebida como a participação direta da sociedade, vem buscando colaboração das práticas de Popularização da Ciência (PC), para além dos espaços da Educação Formal. Para isso, faz-se necessário que a escola adote políticas que promovam a diversidade, não apenas como a integração de alunos diferentes no espaço escolar regular, mas sim com práticas e metodologias que favoreçam a aprendizagem do saber científico para todos. Assim, a correlação existente entre os processos inclusivos e a PC em museus se apresenta como uma grande possibilidade, conforme destacado pelo próprio IBRAM, segundo o qual, dentre as características e funções de um museu, cita no seu item III a utilização do patrimônio cultural como recurso educacional, turístico e de inclusão social, mostrando assim a preocupação com a questão. Especificamente com relação a alunos surdos, Marchesi e Martín (1995) defendem que a sua aprendizagem é diferenciada quando comparada a alunos ouvintes, devido ao que as possibilidades interativas de surdos acabam sendo menores. Para Lacerda (2006) os alunos surdos não conseguem participar de eventos escolares discursivos fundamentais para a constituição plena do sujeito. Os eventos discursivos proporcionam o desenvolvimento de aspectos lingüísticos, sociais, afetivos, de identidade, entre outros. Assim, uma das possibilidades apresentadas para minimizar esse problema, é PC, pois, como defende Moraes (2009), ela possibilita a apropriação do discurso científico pelo cidadão, levando-o a se constituir como sujeito ao adquirir um domínio dos temas de C&T, conduzindo-o a participar de forma ativa, do contexto em que vive. Para o autor, portanto, os museus de C&T têm se destacado na implementação da PC visando à inclusão social dentro de novas perspectivas.

Cabe ressaltar aqui que entende-se o processo de inclusão como um processo social, conforme defendido por Vygotsky (1997, 2001), na qual a interação do aluno com o meio social, com seus pares, seria a responsável por acionar o processo de aprendizagem. Em seus estudos sobre a defectologia, Vygotsky (1997) defende que a deficiência não deve ser vista em função das suas dificuldades, mas sim de suas possibilidades. Vygotsky (1997) critica a visão tradicional de educação que identifica o defeito como uma carência, um dano ou uma insuficiência, como algo que limita e restringe o desenvolvimento. O autor apresenta uma abordagem inovadora, passando a entender a deficiência como uma especificidade ou uma característica singular e diversa das pessoas. Posiciona-se então criticamente, sugerindo que qualquer característica individual que fuja daquilo que é mais comum, no ambiente social, tende a causar uma rejeição. Nessa análise, as deficiências são socialmente instituídas, aparecem como uma construção social, na medida em que não podem ser compreendidas na perspectiva da eclosão da diversidade e em uma possibilidade não anormal do desenvolvimento. Dessa forma, ressalta que a concepção da deficiência deve ser substituída por outra, que considere a dinâmica do desenvolvimento, partindo da posição fundamental de que o defeito implica em uma dupla influência. Ou seja, é uma insuficiência e atua diretamente como tal, criando prejuízos e obstáculos. No entanto, para Vygotsky (1997), as deficiências servem também de estímulo ao desenvolvimento de caminhos de rodeio para a adaptação, ao desenvolvimento de funções substitutivas ou sobre-estruturadas, que tendem a compensar a insuficiência e a introduzir uma nova ordem em todo o sistema, introduzindo um novo equilíbrio. Especificamente com relação aos surdos, Góes (1996) defende que eles apresentam, em sua maioria, desenvolvimento lento e incompleto do pensamento abstrato. Isto se deve ao fato de não possuem domínio consistente da linguagem, devido à pobreza de experiências envolvendo trocas comunicativas. Para a autora, na direção do enfoque histórico-cultural, o pensamento está subordinado à linguagem e, portanto, o desenvolvimento cultural só pode constituir-se na linguagem. Então, os surdos são prejudicados em seu desenvolvimento por serem introduzidos à LIBRAS e/ou à Língua Portuguesa muito tardiamente. Nesse sentido, as visitações museológicas podem ser uma importante ferramenta para o processo não só de aprofundamento e desenvolvimento da língua de sinais LIBRAS, mas para favorecer o contato do surdo com outras linguagens e cidadãos surdos incluídos. Essas visitas são importantes para os surdos, pois lhes dão maior domínio de pensamento verbal, favorecendo não só a comunicação, mas também a estruturação do pensamento e a constituição da identidade. Justificativa De acordo com Ribeiro (2007), movimentos de caráter político e social têm dado sinais de uma nova cultura em museus, uma delas é a inclusiva. Os debates sobre os processos inclusivos têm sido estimulados, sendo inegável que a inclusão social das pessoas está na agenda do governo. Políticos diretamente envolvidos com a Ciência e Tecnologia tem se comprometido com essa agenda. Um exemplo disso é a implantação, no último governo, de um Departamento de Popularização e Difusão de Ciência e Tecnologia, no Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), que, a despeito de qualquer coincidência, está ligado à Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social. No Brasil, e em outros países da América Latina, as novas políticas de inclusão acabaram por deflagrar reuniões científicas e didáticas para discussão de projetos e iniciativas de inclusão

sócio-educacional emergentes de instituições públicas, privadas e de organizações nãogovernamentais. Ou seja, representam ações concretas, surgidas de um movimento coletivo de toda a sociedade. A lei de acessibilidade foi promulgada há mais de 10 anos e diz: O Poder Público promoverá a eliminação de barreiras na comunicação e estabelecerá mecanismos e alternativas técnicas que tornem acessíveis os sistemas de comunicação e sinalização às pessoas portadoras de deficiência sensorial e com dificuldade de comunicação, para garantir-lhes o direito de acesso à informação, à comunicação, ao trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao esporte e ao lazer. Dessa maneira, museus de ciências podem ser espaços com tremendo potencial educativo e, em especial, podem ser locais propícios no que se refere à inclusão, em especial a de pessoas com necessidades especiais. No entanto, muitos museus ainda não estão preparados para atender visitantes com necessidades especiais. Há exceções e algumas instituições não tem poupado esforços para assegurar a acessibilidade de pessoas cegas e surdas às suas instalações e coleções. Existem museus organizados para receber surdos, diversos espaços estão contratando guias que sabem Libras, como também guias surdos para atender as escolas de surdos e visitantes surdos adultos. Essa ação é um incentivo para que os surdos participem mais desses espaços e sintam satisfação ao visitar museus. Defende-se aqui que, para que os museus sejam de todos e para todos, é necessário que seus semelhantes façam parte do grupo de profissionais dessas instituições. Assim, ao identificar seus semelhantes trabalhando nessas instituições, os visitantes se sentem mais confortáveis durante a visitação, uma vez que têm a possibilidade de interagir por meio de sua língua, favorecendo com isso não só a participação, como a própria aprendizagem e a constituição da identidade surda, por exemplo. Essa participação deve ocorrer, portanto, desde o planejamento, organização até a execução das exposições. Metodologia Neste trabalho, acompanhou-se a visitação de um grupo de alunos surdos, a uma exposição museológica do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) em Brasília, acompanhados por seus professores e por uma guia da própria instituição, também surda. A guia teve o papel de apresentar a exposição, enquanto que os professores correlacionavam os conteúdos escolares com a visitação. A visitação ao Centro Cultural Banco do Brasil é extremamente facilitada, pela estrutura que é oferecida ao visitante, contando com transporte para os visitantes e com profissionais surdos graduados em Artes, que atuam como guias. A exposição visitada apresentava a mostra O Mundo Mágico de Escher, composta por cerca de 90 obras, entre gravuras originais e desenhos. Essa mostra foi escolhida pelo grupo de professores e pela intérprete que organizaram a visitação devido ao fato de apresentar variadas obras do autor, conhecido por suas surpreendentes gravuras (xilografias imagens feitas em uma matriz de madeira - e litografias matriz de pedra) e por suas relações matemáticas com a arte, envolvendo questões como o infinito e perspectivas, representando construções com padrões geométricos que se transformam em novas formas, propiciando efeitos de ilusão de óptica. Dessa forma, entende-se a possibilidade de se explorar aspectos relacionados à Matemática e a outras esferas do saber, como Artes, Ciências, Química, Sociologia, História, Geografia e Filosofia, de forma lúdica e interativa.

A pesquisa teve como objetivo examinar como a presença de funcionários, também com necessidades especiais, contribui para o processo de engajamento com a exposição participação de um grupo de alunos surdos. Para isso acompanhou-se à exposição um grupo de dez alunos que cursavam os anos finais do Ensino Fundamental e sete alunos que cursavam o Ensino Médio. Suas idades variavam entre 11 e 22 anos. Essa visita foi planejada pela equipe de professores que, para isso, realizaram uma visitação prévia à exposição com o intuito de definir estratégias para um melhor aproveitamento pedagógico do passeio. Assim, os professores decidiram iniciar a abordagem do tema da exposição em aulas prévias à visitação. Decidiram também fazer uma abordagem interdisciplinar, na qual os conteúdos de Matemática, História, Artes, Geografia, Ciências, Filosofia, Sociologia e Química puderam ser abordados de forma integrada. Assim, a exploração que os professores fizeram das técnicas utilizadas pelo artista permitiu a correlação com conteúdos de Ciências e Química. A visualização das obras permitiu várias correlações com a Matemática. Já as disciplinas de História, Geografia, Sociologia, Filosofia e Artes, foram contempladas com a correlação feita entre a época vivida pelo autor (segunda Guerra Mundial) e suas obras, nas quais a interpretação favorecia a reflexão sobre os fatos históricos, a sociedade e suas formas de expressão. Esses dados foram coletados por observação, gravação e posterior transcrição dos dados e entrevistas com os professores. Resultados Os dados coletados mostram que o grupo de alunos surdos visitantes demonstrou empolgação e interesse em apreciar as obras expostas. O interesse deles ficou ainda mais evidente ao perceberem que seriam guiados pela exposição por uma guia surda. A identificação imediata com a guia foi clara e a observação mostrou que os alunos passaram a participar ativamente e com interesse. Demonstraram interesse em compreender como as gravuras e de saber como foram elaboradas, o que representavam, como estavam interligadas à realidade social da época, além da evidente curiosidade em saber como a guia havia aprendido sobre as obras e seus contextos culturais. Esse interesse do grupo cria possibilidades de conversação sobre formação acadêmica e cultural. Os dados também mostram que os alunos se engajaram no processo educativo que fora planejado. Ao final da visita os alunos foram questionados sobre quais disciplinas escolares poderiam estar relacionadas à visita. O grupo foi bastante perspicaz ao conseguir identificar disciplinas e relacionar os pontos correlatos. Considerações A análise dos dados coletados mostra que durante a visitação ao Centro Cultural, foi possível propiciar aos alunos surdos a possibilidade de ressignificação do seu entendimento da surdez. O grupo de surdos se sentiu convenientemente apoiado ao ter uma pessoa igual os guiando e, principalmente, conversando com eles e, claramente, por essa familiaridade foi possível a ocorrência de comunicação de duas vias. Percebe-se que a surdez durante a visitação foi esquecida, ou melhor, foi entendida como uma característica normal. Segundo Skliar (1997), a surdez é comumente vista apenas pelo seu lado clínico terapêutico, na qual é entendida como uma impossibilidade. A partir do contato com outros sujeitos surdos atuantes na sociedade possibilita-se a visão sócio-antropológica da surdez segunda a qual esta é entendida como uma diferença na percepção sensorial, e não uma deficiência (SKLIAR, 1997). Assim, a visitação a um espaço museológico quando guiada por portadores de

necessidades especiais favorece o entendimento da surdez como um espaço de desconstrução das diferenças, em oposição à uma visão extremamente clínica. Entende-se dessa maneira que a presença de profissionais, que são portadores de necessidades especiais, em instituições museológicas, possibilita aos visitantes a oportunidade de repensar seu posicionamento e papel social perante as diversidades, estimulando e garantindo a possibilidade de acesso e de engajamento de indivíduos com necessidades especiais, levando assim a uma real inclusão. Referências IBRAM. Instituto Brasileiro de Museus. Definição de Museus. Disponibilizado em < http://www.ibram.gov.br/>. Acesso em 20 de agosto de 2010. GÓES, M. C. R. de. Linguagem, Surdez e Educação. São Paulo: Editora Autores Associados, 1996. LACERDA, C. B. F. A inclusão escolar de alunos surdos: o que dizem alunos, professores e intérpretes sobre esta experiência. Caderno CEDES, v. 26, n. 69. Campinas, 2006. MARCHESI, A.; MARTÍN, E. Comunicação, linguagem e pensamento das crianças surdas. In: COLL et al. (Orgs.) Desenvolvimento psicológico e educação: necessidades educativas especiais e aprendizagem escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. MORAES, R. Incursões no discurso da ciência: a popularização da ciência nos espaços dos Museus. Revista Virtual de Gestão de Iniciativas Sociais, v. 1, p. 1-14, 2009. PORTO, F. de S. O impacto de exposições museológicas na motivação para aprender Ciências. 145 f. Dissertação (Mestrado Profissionalizante em Ensino de Ciências) Universidade de Brasília, Brasília, 2008. RIBEIRO, M. das G. Inclusão social em museus. In: X Reunión de la Red de Popularización de la Ciência y la Tecnologia em America Latina y el Caribe (RED POP UNESCO) y IV Taller Ciência, Comunicación y Sociedad. San José, Costa Rica, 2007. SKLIAR, C. (org.) Educação & exclusão Abordagens Sócio-Antropológicas em Educação Especial. Porto Alegre: Editora Mediação, 1997. TENÓRIO, L.M.F.; OLIVEIRA, L.R. MIRANDA, A.C. O Ensino de Ciências na educação de alunos surdos: a interface com a educação física. In: VII Encontro Nacional de Pesquisa em Ensino de Ciências (ENPEC). Anais do VII ENPEC. Florianópolis, 2009. VYGOTSKY, L. S. Obras Escogidas. Volume V, Fundamentos de Defectologia, Madrid: Visor, 1997. VYGOTSKY, L.S. Pensamento e Linguagem. 10ª edição. Petrópolis: Vozes, 2001.