Élida Zuffo Doutorado em Arquitetura e Urbanismo 148



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Transcrição:

3.3 Edifícios de apartamentos P ode-se considerar que por somente trinta e cinco anos o bairro de Higienópolis teve o seu projeto original respeitado em relação à paisagem urbana: período que se estendeu de 1898, data da implantação do loteamento, até 1933, data da construção do primeiro edifício de apartamentos (GAGETTI, 2000, p. 27). As décadas de 1930 e 1940 são consideradas um período de descaracterização de Higienópolis (fenômeno também ocorrido com outros bairros da cidade constituídos na Primeira República), resultante da perda de alguns traços peculiares. Embora ainda fosse considerado um bairro de elite, nessa época o bairro perdeu o antigo prestígio para a Avenida Paulista, para o Jardim América e para o Pacaembu. A partir dos anos de 1930 o bairro entrou num período marcado por um processo constante de construção, reforma e deterioração dos volumes construídos, quando muitos casarões foram reformados e modernizados para atender os modismos da época. Outros foram apenas restaurados e pintados de modo a não serem descaracterizados e outros tantos foram demolidos para ceder lugar a novos edifícios de apartamentos (MACEDO, 1982, p. 130). Para entender a evolução do bairro de Higienópolis é preciso conhecer o contexto do desenvolvimento da cidade. Com o progresso e o aumento acelerado da população, a mancha urbana da cidade estava se expandindo, sendo que grande parte se encontrava a mercê de investidores que visavam lucro. Nesse panorama a cidade crescia de forma irregular, carente de planejamento e infraestrutura, permanecendo desconexa e compartimentada (HOMEM, 1980, p. 146). Élida Zuffo Doutorado em Arquitetura e Urbanismo 148

A oferta de trabalho na indústria somada às crises na lavoura acarretava a intensificação do crescimento demográfico na capital e, por conseqüência, a grande demanda de moradia. A população operária ocupava os bairros periféricos ou os subúrbios, enquanto a elite dava seqüência a sua marcha em direção ao oeste da cidade. A casa própria era quase uma exclusividade dos mais ricos, pois a grande maioria vivia de aluguel, sendo que os mais pobres viviam em vilas operárias ou em cortiços. A procura por moradia era grande, o que tornava a construção civil um negócio muito rentável. Esse cenário possibilitou a industrialização da construção em São Paulo. As áreas propícias para a construção de novas residências no centro e nos seus bairros vizinhos se tornavam cada vez mais escassas. Em Higienópolis existiam poucos lotes vagos, que eram preteridos pela elite que dava prioridade à Avenida Paulista ou aos bairros-jardins que surgiam. A partir da década de 1940, um dos fatos marcantes do crescimento da cidade foi a compactação da área edificada que se verificava através do acentuado crescimento vertical do centro e de vários bairros próximos, como Santa Ifigênia, Campos Elíseos, Santa Cecília, Vila Buarque, Higienópolis, Consolação, Vila América, Paraíso, Liberdade, Aclimação e outros em menor escala (LANGENBUCH, 1971, p. 179). No período da Segunda Guerra os investimentos no setor imobiliário se fortaleceram na cidade, pois em época de guerra e, conseqüentemente, época de inflação, eram considerados uma forma segura de aplicação de capital. Portanto, era esse o destino dos excedentes da agricultura e da indústria. Nelson Mendes Caldeira, fundador da Bolsa de Imóveis de São Paulo, tinha uma visão expansionista e afirmava que um dos índices mais expressivos da vitalidade econômica de um país é o número de novas construções (CAMPOS, 2002, p. 595). A guerra havia demonstrado a fragilidade do modelo agroexportador e a indústria havia encontrado a oportunidade de desenvolvimento voltando-se para o mercado interno. Resultado: a cidade estava em plena fase de industrialização e em ritmo inédito de expansão urbana. Embora persistissem os defensores do modelo agroexportador e fossem denunciados os perigos da urbanização desenfreada, a visão do crescimento urbano unia-se ao industrialismo, que se tornava motor da expansão imobiliária (CAMPOS, 2002, p. 596). O avanço da indústria gerava o aparecimento de profissionais de posições laterais, ou seja, aquela parcela de trabalhadores que estavam entre os patrões e os Pioneiros Modernos: verticalização residencial em Higienópolis 149

operários, como por exemplo, os técnicos, os artesãos e os profissionais liberais. Muitos imigrantes ocupavam tais posições. Tratava-se, portanto da expansão da classe média, composta por camadas predominantemente urbanas que estavam motivadas pelo consumo e aspiravam ascensão social, procurando seguir os caminhos dos mais bem sucedidos (HOMEM, 1980, p. 143). Devido a sua localização próxima ao centro e ao antigo prestígio, o bairro de Higienópolis surgia como alvo do assédio da especulação imobiliária e da classe média, ávida por usufruir dos lugares até então privativos à elite. Alguns fatores foram determinantes para a alteração da dinâmica do bairro e o abandono dos casarões, tais como: o falecimento de alguns moradores importantes, a mudança de algumas famílias para outros bairros e a divisão das fortunas pelos herdeiros. Além de estarem obsoletos, os casarões demandavam grande quantidade de empregados para o bom funcionamento, realidade não mais compatível. Sendo assim, muitos deles permaneceram fechados por longos períodos e outros foram transformados em escolas, pensões e até em cortiços. Muitos foram vendidos pelos herdeiros, que não tinham interesse em arcar com o alto custo de manutenção e preferiam desfazer-se, negociando os mesmos com as construtoras que pretendiam construir edifícios. Alguns terrenos remanescentes também foram vendidos inteiros ou retalhados por herdeiros (RIGHI e GAGETTI, 2001, p. 69). As primeiras iniciativas referentes à expansão vertical do bairro de Higienópolis partiram de seus próprios moradores ou proprietários, visando tanto a exploração para renda quanto para o uso de suas próprias famílias. Mantendo a tradição dos familiares residirem próximos, em torno da autoridade patriarcal, foram construídos alguns prédios com um apartamento destinado para cada membro da mesma família, constituindo verdadeiros clãs (HOMEM, 1980, p. 154). O bairro começou a apresentar mudança de ocupação do solo a partir de 1933 com a construção do primeiro edifício, o Condomínio Alagoas, erguido para Abel Drummond pela Construtora Barreto Xande & Cia, na rua de mesmo nome, esquina com a Avenida Angélica. Este foi o primeiro edifício da cidade a contar com um apartamento por andar e lojas no térreo. Esse tipo de ocupação mista era uma forma de driblar a legislação que impedia o comércio no bairro, sendo posteriormente seguida por outros tantos edifícios de Higienópolis. Com cinco andares e mais o térreo com duas lojas, o Condomínio Alagoas era uma superposição de palacetes agrupados na vertical, com quatro dormitórios e demais dependências em cada apartamento. Mesmo com tantas críticas feitas pela imprensa, contrárias à construção de edifícios Élida Zuffo Doutorado em Arquitetura e Urbanismo 150

em bairros residenciais, o prédio foi um sucesso comercial e rapidamente todos os apartamentos foram alugados (GAGETTI, 2000, p. 48). Figuras 76 e 77: Fotos do Edifício Alagoas, primeiro edifício do bairro. Fotos: Luciana Capoccia, 2009. Em 1935, Andrea Matarazzo encomendou a construção do Edifício Santo André, o segundo edifício do bairro, localizado na esquina da Avenida Angélica com a Rua Piauí, em frente à Praça Buenos Aires. A construção foi feita pela empresa Matarazzo e Pilon, de seu filho, o engenheiro Francisco Matarazzo Neto, e do arquiteto francês Jacques Pilon. O edifício contava com sete andares e uma loja no térreo, que logo foi ocupada por uma barbearia. Os apartamentos eram de luxo e rapidamente foram também todos alugados (GAGETTI, 2000, p. 48). Livre de uma ornamentação superficial, sua estética se destacava pela volumetria criada pelas curvas e pelos amplos terraços. Embora ele apresente uma planta tradicional compartimentada, é possível perceber a adoção de alguns princípios racionalistas, como por exemplo, a modulação dos cômodos. Também são adotadas aberturas mais generosas, garantindo boa luminosidade interna. O hall de entrada ostenta um mural atribuído ao artista Antonio Gomide. Pioneiros Modernos: verticalização residencial em Higienópolis 151

Figura 78: Edifício Santo André. Foto de Luciana Capoccia, 2009. Figura 79: Planta do Edifício Santo André. Fonte: FIGUEROA. 2002, P1.F06. Élida Zuffo Doutorado em Arquitetura e Urbanismo 152

Em 1936 foi construído o Edifício Higienópolis, de autoria do arquiteto Rino Levi, localizado à Rua Conselheiro Brotero, 1092. O projeto conta com sete pavimentos ao todo, sendo que apenas quatro repetem a planta tipo. Os dois primeiros são modificados para permitir a entrada principal e o acesso lateral para as garagens aos fundos e o último tem somente duas amplas coberturas com terraços. Este edifício posteriormente foi demolido provavelmente devido a sua pequena altura em uma área tão valorizada (RIGHI e GAGETTI, 2001, p. 77). Figura 80 e 81: Edifício Higienópolis de Rino Levi fachada frontal e fachada dos fundos.. Fonte: Acrópole, n. 27, 1940, p. 107 e 108. Pioneiros Modernos: verticalização residencial em Higienópolis 153

Figura 82: Edifício Higienópolis planta do andar tipo. Fonte: ACRÓPOLE, n. 27, 1940, p. 110. Em 1937 foi construído o Edifício Augusto Barreto, nome do rico fazendeiro de café de Mococa que o encomendou para abrigar sua residência e de seus descendentes. Ele foi erguido no local antes ocupado por duas casas de sua propriedade, na Avenida Angélica, ao lado do Edifício Santo André e foi construído pela empresa Barreto Xande & Cia, dos engenheiros filhos de Augusto Barreto. O edifício conta com um apartamento por andar e unidades espaçosas com quatro dormitórios cada e mais duas salas conjugadas, cozinha, duas despensas, terraço de serviço e ainda dependência de empregada (quarto e banheiro). Ele possui duas circulações distintas, social e serviço, com um elevador cada. Essa obra impressionava pela altura significativa para época, dez andares, e também pela pureza do estilo Art Déco, tornando-se referência de arquitetura paulista (HOMEM, 1980, p. 155). Élida Zuffo Doutorado em Arquitetura e Urbanismo 154

Figuras 83 e 84: Edifício Augusto Barretto. Foto da fachada e planta do apartamento tipo. Fonte Revista Acrópole, nº 5, 1938, p. 37 Pioneiros Modernos: verticalização residencial em Higienópolis 155

O Edifício Dom Pedro II foi o primeiro edifício da Avenida Higienópolis, mas, por ser construído em estilo neoclássico e contar com apenas três pavimentos (térreo e mais dois), ele se harmonizava perfeitamente com os casarões ao seu redor, sendo inclusive implantado à semelhança dos mesmos, com os recuos respeitados e ajardinados. O edifício foi construído em 1938 para abrigar a família do fazendeiro Nhonhô Magalhães, no local antes ocupado por sua residência (MACEDO, 1982, p. 100). Figura 85: Fachada do Edifício Dom Pedro II. Foto de Luciana Capoccia, 2009. A primeira fase da verticalização do bairro ocorreu de forma tímida e pontual. Somente a partir da década de 1940, a verticalização se intensificou, sendo que a construção dos prédios ocorreu a princípio nas áreas das casas mais antigas do bairro e dos maiores lotes. Os primeiros edifícios surgiram, portanto, nas redondezas da Élida Zuffo Doutorado em Arquitetura e Urbanismo 156

Praça Buenos Aires e Avenida Angélica, pois se tratava da área mais valorizada por constituir um eixo de ligação entre o centro novo da cidade, a região da Paulista e os bairros de Cerqueira Cezar e Pinheiros. Os primeiros inquilinos de apartamentos do bairro faziam parte de uma elite que se dispunha a pagar mais para se beneficiar do status e da localização que o bairro oferecia. O aluguel de um desses apartamentos era alto comparado a uma casa do mesmo bairro. Nos anos de 1940, enquanto o aluguel de uma casa grande do mesmo bairro saía por oitocentos e cinqüenta mil réis mensais, o custo de um apartamento não saía por menos de um conto de réis (HOMEM, 1980, p.156). Alguns estrangeiros prestigiaram a novidade logo de início, pois já conheciam esse tipo de moradia em seus países de origem. Ao mesmo tempo, a população local oferecia resistência em aceitá-los por relacioná-los com moradia coletiva, ou seja, com cortiços. A iniciativa imobiliária se apegava na imagem aristocrática de glamour e prestígio do passado recente de Higienópolis que, desde o seu início, era tido como um bairro elitista e preferido pelos ricos e mantinha assim sua aura de sucesso. A publicidade acenava com a possibilidade de que um maior número de pessoas poderia residir num dos pontos mais nobres da cidade e usava o atrativo das facilidades dos financiamentos, atendendo diretamente os anseios e interesses de uma classe em ascensão, desejosa por status. Nas fachadas e entradas dos edifícios procurava-se repetir a sofisticação dos palacetes do período anterior, com o uso de elementos neoclássicos e de outros estilos históricos, transmitindo uma sensação de opulência aos compradores. Nos anos que precederam a Segunda Guerra, a arquitetura paulista atravessou uma fase heróica em que os arquitetos se empenharam na implantação da arquitetura moderna ou internacional enfrentando o preconceito vigente e contrariando a antiga geração de profissionais do ramo da construção civil (GAGETTI, 2000, p.39). O bairro de Higienópolis se inseriu nessa realidade sendo palco da manifestação dessa nova arquitetura com altíssima qualidade. Grandes personagens atuaram nesse bairro, incluindo os arquitetos mais importantes da época. Tanto os brasileiros, como Rino Levi e Vilanova Artigas, como os estrangeiros, como Jacques Pilon, Lucjan Korngold, Victor Reif e Franz Heep, trouxeram as experiências de seus países de origem onde a moradia vertical já era desenvolvida e bem aceita. O bairro de Higienópolis seguiu em intenso processo de verticalização a partir da década de 1940, destacando-se por concentrar em uma área relativamente restrita da cidade grande quantidade de edifícios residenciais que foram concebidos com a Pioneiros Modernos: verticalização residencial em Higienópolis 157

aplicação apurada dos preceitos modernistas, tornando-se exemplo da consagrada produção de arquitetura moderna brasileira, conforme apresentação do capítulo a seguir. Élida Zuffo Doutorado em Arquitetura e Urbanismo 158

Capítulo 4 - Edifícios residenciais em Higienópolis Pioneiros Modernos: verticalização residencial em Higienópolis 159

Neste capítulo estão apresentados os edifícios selecionados para análise da produção verticalizada do bairro de Higienópolis. Embora a pesquisa tenha detectado a construção de mais de duzentos edifícios residenciais no referido período dentro da área delimitada, foram escolhidos apenas os considerados como mais emblemáticos e aqueles que tiveram matérias publicadas em livros, revistas ou trabalhos acadêmicos,, com o intuito de comprovar a tese de que a qualidade especial e peculiar conferida ao conjunto de edifícios residenciais do bairro de Higienópolis construídos nas décadas de 1940, 1950 e 1960, deriva de dois fatores básicos: as inter-relações existentes entre os edifícios e seu entorno urbano, herdadas em parte da configuração inicial do bairro; e também da apurada aplicação dos preceitos modernistas nos projetos arquitetônicos. Não foi possível, porém, encontrar o projeto de arquitetura de todos, portanto alguns deles estão apresentados somente pelas imagens de fachada. Élida Zuffo Doutorado em Arquitetura e Urbanismo 160

4.1 Pioneiros no horizonte: década de 1940 Neste item estão relacionados os seguintes edifícios: Ficha 1 Ficha 2 Ficha 3 Ficha 4 Ficha 5 Ficha 6 Ficha 7 Ficha 8 Edifício Buenos Aires Edifício Santa Amália Edifícios Piauí I e II Edifício Goiás Edifício Higienópolis Edifício Piauí Edifício Prudência Edifício Louveira Pioneiros Modernos: verticalização residencial em Higienópolis 161

FICHA 1: EDIFÍCIO BUENOS AIRES Planta de localização Dados Foto: Luciana Capoccia Data: 1938-1940 Endereço: Rua Alagoas, 664 Terreno: 352m² - retangular (16x22m) Taxa de ocupação: 41,2% (146m²) Coeficiente de aproveitamento: 2,4 (876m² de área construída) Tamanho das unidades: Tipo1: três dormitórios área: 121m² Tipo 2: dois dormitórios área: 105m² Arquiteto /Construtora: Lindenberg & Assumpção Engenheiros Civis e Construtores Publicações: Acrópole n. 23 / 1940 Fonte: Acrópole, set. 1942. Élida Zuffo Doutorado em Arquitetura e Urbanismo 162

EDIFÍCIO BUENOS AIRES (PLANTAS E REPRESENTAÇÕES) Pavimento Tipo. Fonte: Figueroa, 2002, P1. F10. 8 Pavimento. Fonte: Figueroa, 2002, P1. F10. Pioneiros Modernos: verticalização residencial em Higienópolis 163

FICHA 2: EDIFÍCIO SANTA AMÁLIA Planta de localização Fotos: Luciana Capoccia Dados Data: 1943 (publicação) Endereço: Rua Piauí, 760 Terreno: 1525m² - lote irregular N de pavimentos: térreo mais 10 andares. N apartamentos por andar: dois apartamentos (do 1 ao 7 - com 2 e 3 dormitórios) e um apartamento (do 8 ao 10 - com 4 dormitórios). Estacionamento: coberto e localizado no fundo do lote. Arquiteto/Construtora: Lucjan Korngolg / Francisco Matarazzo Netto Publicações: Acrópole n. 64-1943 Acrópole, n. 64-1943. Élida Zuffo Doutorado em Arquitetura e Urbanismo 164

EDIFÍCIO SANTA AMÁLIA (PLANTAS E REPRESENTAÇÕES) Pavimento Tipo - 1 ao 7 andar. Fonte: Acrópole, n. 64-1943 Pavimento Tipo - 8 ao 10 andar. Fonte: Acrópole, n. 64 1943 Pioneiros Modernos: verticalização residencial em Higienópolis 165