Telefone via internet? Uma empresa de base tecnológica na onda da convergência digital



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Transcrição:

105 Telefone via internet? Uma empresa de base tecnológica na onda da convergência digital Empresa: ComunIP Incubadora: Inova-UFMG Autoria: Lívia de Carvalho Furtado Tutoria: Claudio Afrânio Rosa Introdução A tecnologia de Voz sobre IP não era nada, apenas uma idéia, uma promessa. Foi o que contou Erik Cavalcante, sócio-fundador e Diretor de Operações da ComunIP Soluções de Mídia em Tempo Real S/A, situada em Belo Horizonte, Minas Gerais. Era o ano 2000 quando os colegas de faculdade, Erik Cavalcante e Guilherme Balena resolveram criar uma empresa para oferecer produtos e serviços baseados na tecnologia de transmissão de voz via Internet, chamada de Voz sobre IP, ou VoIP. Ambos eram ainda estudantes de Engenharia Elétrica na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e procuraram a incubadora do Centro de Inovação Multidisciplinar (CIM) que, mais tarde, se tornaria a Inova-UFMG. Naquele mesmo ano, o Skype 1 seria lançado mundialmente pela empresa global de mesmo nome. Pela primeira vez, tornava-se fácil e acessível falar pelo telefone via Internet, como num telefone comum. Daí o nome voz sobre IP (Internet Protocol). O mais atraente era a imensa economia nos custos de ligações à distância ou internacionais. A visão de Erik, de que a transmissão de voz via Internet era um mercado promissor, se confirmava. 1 O Skype é um programa instalado no computador que permite ampla comunicação via Internet, conversas por e-mail e em grupo, ligações para telefones fixos e celulares de qualquer lugar do mundo, transferência de arquivos, participação em chat etc. A empresa de mesmo nome, Skype, foi a responsável por desenvolver e popularizar a primeira rede de telefonia ponto a ponto e a tecnologia VoIP. Fonte: www.skype.com

106 E M P R E S A C O M U N I P Com essa convicção, os dois jovens empreendedores iniciaram a elaboração do Plano de Negócios e participaram do Programa de Pré-Incubação oferecido pelo CIM. O primeiro protótipo era muito simples: dois computadores ligados entre si por um sistema de transmissão de voz via Internet, que foi exposto no Minastec 2 daquele ano. Não era um produto comercial, longe disso, mas mostrava que, no Brasil, a gente tinha capacidade de criar a tecnologia para isso, explicou Erik. No Plano de Negócios, os novos empreendedores haviam definido que os produtos da empresa seriam voltados tanto para o mercado corporativo quanto para o usuário doméstico, como o famoso Skype. Em 2002 e 2003, a empresa passou pelo Programa de Incubação. No ano seguinte, os desafios de um negócio de base tecnológica começaram. Como oferecer aos potenciais compradores uma tecnologia para a qual ainda não estavam preparados? No decorrer de 2004, a empresa, nas palavras de Erik, patinou sem saber como acessar um mercado ainda tão conservador. Eles haviam passado quatro anos desenvolvendo uma plataforma tecnológica tendo como princípio inovação e qualidade, formatando uma família de produtos, mas sempre que procuravam possíveis clientes os negócios não andavam. Cabos, redes, softwares... e riscos O lançamento mundial do Skype, em 2000, foi o pontapé inicial para a popularização da tecnologia de transmissão de Voz sobre IP. Voltado para o usuário final, o Skype cresceu muito pela redução de custos com ligações à distância e internacionais, substituindo a linha telefônica, os tradicionais DDD e DDI, porém as pessoas e também as empresas só identificavam o VoIP com redução de custos telefônicos, sem vislumbrar o que essa tecnologia poderia proporcionar: a transmissão, em tempo real, 2 O Minastec é considerado o maior evento de tecnologia de Minas Gerais, com feira de tecnologias, espaço para as incubadoras, realização de cursos e workshops. É promovido pelo Sebrae Minas com apoio de parceiros.

107 não apenas de voz, mas de imagens e dados de qualquer tipo, com interatividade superior à de outras mídias. Era um meio de comunicação eficiente para ser usado pelo internauta, em sua casa, mas também entre funcionários de uma companhia e entre empresas e clientes, ou seja, inicialmente, tanto os usuários domésticos quanto as grandes empresas, incluindo as corporações do setor de Telefonia e Tecnologia da Informação, ainda possuíam uma visão limitada da tecnologia. Era uma prática a se conhecer. Contudo, outros indícios já demonstravam as condições de implementação do VoIP no mercado brasileiro: o crescente número de usuários de Internet em banda larga (um dos requisitos para o uso de voz sobre IP); a abertura do mercado de telecomunicações, cada vez mais competitivo; a expansão da telefonia celular e do acesso à Internet; a tendência à convergência midiática, a exemplo do acesso a vídeos, música, e-mail e Internet via aparelho de telefone celular, ou sons, imagens e comunicação instantânea na Internet, entre muitos outros exemplos. Em 2000, cerca de cinco milhões de brasileiros possuíam acesso residencial à Internet, mas apenas 671 mil utilizavam acesso via banda larga, conforme pesquisa da empresa Ibope/NetRatings, porém, a expectativa de crescimento era grande porque a Internet em alta velocidade se expandia em outros países e, no Brasil, o computador e a Internet eram cada vez mais acessíveis para as classes B e C. Os provedores já lançavam os primeiros produtos e pacotes de acesso em banda larga, com destaque para o Vírtua, da NET Serviços, pertencente à Rede Globo. Antes do boom na Internet brasileira, ainda no ano 2000, um estudante de graduação em Engenharia Elétrica da UFMG, chamado Erik Cavalcante, começou a refletir sobre o potencial mercadológico da transmissão de voz via Internet (VoIP). O rapaz conhecia profundamente essa tecnologia e, durante seu curso, já trabalhara em três pesquisas acadêmicas sobre o VoIP. Iniciou a busca

108 E M P R E S A C O M U N I P por pessoas interessadas em desenvolver e comercializar produtos baseados nessa tecnologia, pois queria um parceiro. Guilherme Balena, também estudante de Engenharia Elétrica da UFMG e conceituado na escola por sua capacidade, aceitou o convite de Erik. A nossa aposta era de que o VoIP, como o telefone ou o computador, se tornaria comum, seria usado por todos. Estávamos nos antecipando a uma nova cultura de mercado no setor, contou Guilherme. Na UFMG, como em muitas instituições de ensino superior brasileiras, a cultura do emprego era ainda muito forte. Todos queriam se graduar e procurar um emprego, mas eu não queria ficar limitado às metas de uma grande organização, relembrou Erik. Quando cursava o ensino médio profissionalizante, ele havia trabalhado em empresas e adquirido certa visão de mercado. Na sua família, havia casos de empreendedorismo bem sucedido. Eu e Guilherme havíamos decidido, abriríamos uma empresa. Abrindo o negócio Sem idéia do que era ter um negócio próprio, os estudantes procuraram a incubadora do Centro de Inovação Multidisciplinar CIM, na UFMG. Ali, alguém que viria a ser um importante parceiro os atendeu: Paulo Renato, diretor do CIM. Com o auxílio dele, Erik e Guilherme passaram seis meses estudando a visão do empreendimento, preparando documentos e elaborando um Plano de Negócios. Orientados pelo CIM, os estudantes inscreveram seu projeto no Programa de Apoio Tecnológico Micro e Pequenas Empresas (Patme) 3, uma parceria entre o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e o Governo Federal. O recurso do Programa foi destinado à elaboração do EVTE (Estudo de Viabilidade Técnica e Econômica) e à construção do protótipo. Com essa verba inicial, Erik e Guilherme criaram a primeira idéia do 3 O Patme, atual Sebraetec, oferece financiamento para projetos de desenvolvimento de novas tecnologias realizados por micro e pequenas empresas.

109 produto, com dois computadores ligados por rede e um sistema de comunicação rudimentar, nada comercial. Em setembro de 2001, a ComunIP foi criada formalmente e permaneceu incubada no CIM de 2002 a 2003. Nesse tempo, o CIM passava a ser Inova-UFMG e um novo sócio entrava na ComunIP, o mestrando e especialista em codificação de áudio e voz, Fábio Lacerda. Ele contou que antes do VoIP existir eu já pensava como seria mais fácil ligar via internet, pois gastava R$ 200 por mês para falar com minha família em Fortaleza. Nessa fase inicial, ouvimos muitos nãos: o VoIP não dá, o Brasil não tem estrutura`, diziam os professores. Os empresários participavam de cursos de capacitação, palestras, feiras de tecnologia, tudo para adentrar o universo empreendedor e conhecer melhor o setor em que atuavam. Com o Skype sendo lançado oficialmente no País, o mercado brasileiro começava a se abrir para a tecnologia VoIP, inicialmente entre usuários domésticos, ainda em pequena escala. Isso se dava, principalmente, por causa do aumento da oferta de serviços e da popularização da banda larga, pré-requisito para uso do VoIP. Em 2003 e 2004, a Internet via banda larga cresceu 90% ao ano no Brasil, superando a média mundial de 50% ao ano (Fonte: Teleco.com). Conhecendo esse cenário favorável, a ComunIP, com três sócios e vários bolsistas, empenhava-se em desenvolver e fortalecer uma plataforma de transmissão de voz e dados via Internet, que gerasse produtos de qualidade, com interface gráfica agradável e com características próprias. Foi criada, então, a família Click Voz, dividida em duas linhas: o Click Voz Comunicador, para uso corporativo e uso final, por exemplo, na rede interna de uma empresa; o Click Voz Call Center, um sistema de comunicação para atendimento, via Internet. Ambos os sistemas permitiam transmissão de dados e comunicação em tempo real, inclusive de imagem. Nessa época, o negócio sobrevivia basicamente do financia-

110 E M P R E S A C O M U N I P mento oferecido por órgãos públicos de fomento, como Sebrae, Fapemig (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais), Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Os sócios não ganhavam nada, todo o dinheiro era direcionado aos bolsistas, equipamentos e produtos. Quando olho para trás, vejo que o suporte desses órgãos foi fundamental, acertaram muito com a ComunIP ao incentivar uma empresa de base tecnológica, diz Erik. Sério desafio Às vésperas da graduação na Inova-UFMG, em 2003, a empresa ainda não havia conquistado nenhum cliente e, praticamente, não possuía receita. Vivia do fomento público e de pequenos trabalhos esporádicos. Não havia atividade gerencial, apenas corpo técnico especializado e empenhado em desenvolver a plataforma de tecnologia VoIP. Os jovens empresários receberam então um convite do Instituto Inovação, acelerador de novos negócios, recém fundado por Paulo Renato, em Belo Horizonte. O primeiro caso de aceleração do Instituto seria a ComunIP. A empresa então graduou-se na Inova e, em 2004, instalou-se no Instituto, onde a equipe começaria a aperfeiçoar a formulação dos produtos e a buscar investidores. O Instituto tornava-se sócio da ComunIP, dividindo com ela as funções administrativa e comercial, com seus membros operando em conjunto nos produtos, na gestão e na conquista da clientela, porém, apesar do esforço, o negócio não decolava. Os três sócios buscavam clientes, mas não havia continuidade nos contatos. Ficávamos sem entender porque a idéia não pegava, não evoluía, e continua: fazíamos reuniões e víamos que a coisa não estava dando certo. Perguntávamos se alguém tinha dúvida sobre o futuro do empreendimento. Mas o interessante é que todos continuavam apostando na idéia, apesar dos problemas, ninguém queria desistir contou Erik. No final de 2004, os três sócios se deparavam com um desafio crucial para a sobrevivência

111 da empresa dali para frente: conseguir compreender por que uma plataforma de produtos com tecnologia nova e mundialmente promissora não era ainda aceita no mercado. 2005, o ano D para a ComunIP Ainda em fins de 2004, a ComunIP, com ajuda do Instituto Inovação, recebeu uma consultoria especializada do MIT (Massachusetts Institute of Technology), centro universitário americano e uma das maiores referências mundiais em tecnologia. A intenção era obter uma orientação qualificada sobre o rumo que a empresa poderia seguir e, também, um olhar externo sobre a inovação tecnológica com que estavam lidando. A equipe do MIT se debruçou sobre a ComunIP durante um mês e, ao final, validou a tecnologia, o caráter inovador do empreendimento e a qualidade dos produtos. Os consultores afirmaram que a tecnologia VoIP possuía grande potencial e que iria estourar mundialmente. Segundo os especialistas, o que a ComunIP precisava era de orientação do mercado. Como lembra Erik, até então nós havíamos desenvolvido produtos baseados na nossa perspectiva, a tecnológica, e não na perspectiva de mercado. A consultoria do MIT foi O primeiro passo para Erik, Guilherme e Fábio compreenderem a crise pela qual o negócio passava, mas ainda não era a solução. Até que, no início de 2005, com o respaldo de uma instituição de peso como o MIT, a ComunIP foi escolhida para receber investimentos do Fundo Novarum, o primeiro fundo brasileiro de investimentos de capital semente, ou seed money, ou seja, um fundo de investidores interessados em empresas nascentes, baseadas em pesquisa e alta tecnologia. Nesse caso, o investidor não recebia garantias de retorno financeiro, mas apostava em um negócio que, se bem sucedido, iria gerar mais lucratividade do que qualquer outra aplicação financeira padrão ou empresa tradicional. Em contrapartida ao investimento, o Fundo tornava-se um dos acionistas do negócio, dividindo os lucros que poderiam surgir.

112 E M P R E S A C O M U N I P Esse investimento foi o marco de uma nova empresa que teria agora a perspectiva da dinâmica do mercado e a capacidade de se adaptar às suas necessidades. Com o dinheiro obtido junto ao Fundo, a ComunIP iniciou uma grande reestruturação. O primeiro passo foi contratar um gestor executivo com talento e experiência de mercado. Entrava em cena o executivo Ronaldo Barreto, pós-graduado em Marketing pela UFMG e com MBA pela Fundação Dom Cabral. Ele trabalhava em uma multinacional de telecomunicações e trazia consigo uma ampla rede de contatos. Ronaldo também foi empreendedor, porque deixou uma grande corporação e salário alto para vir para a ComunIP, dizia Erik. Começaram refazendo todo o Planejamento Estratégico e, também, o Plano Comercial e o Financeiro. Ronaldo dizia: isso não é produto, isso é uma pesquisa acadêmica, se o mercado não aceita, não é produto, lembrou Fábio. Por isso, Ronaldo aproveitou o resultado da consultoria do MIT e reelaborou a visão da empresa. Erik, que sempre tendeu mais para o lado comercial, trabalhava diretamente com ele. Guilherme Balena tornou-se o Diretor de Tecnologia e Fábio Lacerda, Diretor de Pesquisa e Desenvolvimento. Além disso, a ComunIP agora era uma S/A (Sociedade Anônima), com participação societária aberta. A empresa, apesar de ser pequena, começava a seguir uma linha de gestão corporativa bem mais profissionalizada, com divulgação mais rigorosa de resultados e um Conselho Administrativo formado pelos sócios. Com a experiência de várias tentativas de entrada no mercado e com a vivência de Ronaldo Barreto, os empresários definiram novas estratégias para a ComunIP. Concluíram que a empresa não possuía condições de formatar um produto final para o cliente em função da estrutura física e da equipe reduzida, o que não permitia o atendimento direto ao usuário. Por outro lado, o domínio completo sobre a plataforma tecnológica desenvolvida permitia flexibilidade, agilidade e soluções customizadas, da maneira como o cliente precisava. Desse modo, a melhor linha de ação comercial seria identificar parceiros estratégicos para

113 produzir soluções e serviços ao usuário final, ou seja, o produto final, diferenciado, seria desenvolvido em conjunto com o parceiro, que chegaria ao cliente final e compartilharia receitas. Esse era o modelo de negócio ideal não só para eles, como também para as grandes organizações, que queriam trabalhar com voz sobre IP no Brasil, mas não dominavam a tecnologia. Um mercado explosivo Naquele momento, ano de 2005, a tecnologia de transmissão de voz sobre IP começava de fato a se expandir no Brasil. Segundo estudo da Teleco, instituição especializada em pesquisas em telecomunicações, o aumento dos provedores de VoIP, a oferta do serviço pelos provedores de Internet tradicionais, tudo isso já estava impactando a receita das operadoras de telecomunicações. O mercado corporativo, responsável por 25% do faturamento das operadoras de telefonia fixa, já se despertava para as vantagens do voz sobre IP no atendimento aos clientes e na comunicação interna. Conforme pesquisa de outra instituição, a IDC Brasil, para 2005, as empresas brasileiras usuárias de tecnologia já colocavam o VoIP como prioridade de investimentos naquele ano num percentual de 61% a mais do que em relação a 2004 4. Também, em 2005, o número de conexões rápidas (banda larga) no País já chegava a quatro milhões, segundo pesquisa da IDC Brasil e da Teleco. O Brasil já estava entre os quinze primeiros países em conexões banda larga no mundo. As grandes operadoras atuantes, como Telefônica, Telemar, Embratel, Brasil Telecom, precisavam se adiantar ao avanço tecnológico que se iniciava e oferecer também serviços de VoIP aos clientes domésticos e corporativos. A tecnologia podia ser associada a outros serviços, como e-mail, telefones fixos e móveis, envio de dados e arquivos, um mundo de opções e de serviços a explorar. Em 2005 e 2006, fusões empresariais entre operadoras, 4 IDC Brasil, Brazil VoIP and its Impact on Communications Industry 2005.

114 E M P R E S A C O M U N I P provedores de Internet, empresas de TV a cabo e VoIP ocorreram, estimuladas pela realidade da convergência tecnológica. A versatilidade do VoIP era determinante para isso: podia ser usado de qualquer computador ou celular com acesso à Internet, permitia a troca instantânea de dados, sons e imagens, oferecia inúmeras possibilidades de colaboração, integração de sistemas, apresentações e reuniões, acesso a e-mail etc., com um nível de interação multimídia e dinamismo muito maior, em relação às formas convencionais de comunicação à distância, mesmo tratando de Internet e telefonia móvel. Sabendo disso, a ComunIP determinou outra estratégia: seu foco não seria mais Voz sobre IP, mas, sim, a transmissão de mídia em tempo real, via Internet (IP). Com a plataforma criada, seria possível unir o mundo das telecomunicações com o da tecnologia da informação (Internet, redes, softwares etc). Ainda em 2005, a ComunIP participou de uma seleção realizada pela Brasil Telecom IG (Internet Group), interessada em conhecer e testar produtos baseados na tecnologia VoIP. A ComunIP apresentava o produto Click Voz Comunicador, porém com nova estratégia mercadológica e grande capacidade de customização, como o cliente queria. Naquele momento, a força e a energia da equipe foi algo sensacional, todos trabalharam muito para conquistar esse primeiro cliente, tínhamos que acertar, contou Ronaldo, que mais tarde se tornaria sócio da ComunIP. O produto passou por todas as etapas de seleção, mas o diferencial da ComunIP era a versatilidade e a rapidez, ou seja, a capacidade de desenvolver-se e de se adaptar ao que o cliente queria, em tempo hábil. Essa capacidade, para Erik, vinha do profundo domínio da plataforma tecnológica. As outras empresas não possuíam isso, por utilizarem tecnologia importada, criada por terceiros. Os anos que passaram mergulhados no desenvolvimento tecnológico, preparando algo próprio, agora se revelavam uma grande vantagem competitiva.

115 Esse foi o primeiro grande cliente da ComunIP. Da parceria, surgiu o Lig, comunicador instantâneo do IG (Internet Group), que realizava ligações Internet-internet ou Internet telefone fixo. Desde então, o IG sempre contratava a ComunIP para desenvolver novas funcionalidades para a plataforma VoIP. A ComunIP vem conquistando uma carteira de clientes e parceiros importantes, com produtos utilizados em toda a região Sudeste e em Brasília. Em 2006, foi convidada para apresentar seu estudo de caso no Minastec, Feira Anual de Tecnologia, promovida pelo Sebrae Minas. A repercussão da virada foi grande. De 2005 para 2006, a ComunIP dobrou o número de projetos em desenvolvimento e aumentou em vinte vezes seu faturamento. A equipe também cresceu, passando de sete empregados em 2005 para doze no ano seguinte, chegando a vinte e dois em julho de 2007. No mesmo mês, a ComunIP firmou parceria com outra gigante do setor: a Global IP Soluctions, multinacional sueca fornecedora de tecnologia para sistemas de VoIP como Google Talk e Skype. Novos horizontes digitais Para os sócios, foi consenso: a história da empresa tem dois momentos. O primeiro, quando a ComunIP era voltada para pesquisa e desenvolvimento. O segundo, quando a ComunIP passa a ter foco no mercado. Relembrando aqueles tempos difíceis, Erik extraiu uma lição útil para toda empresa de base tecnológica: não adiantava ter a melhor tecnologia, era preciso entender o mercado. Para ele, quem definia o desenvolvimento da empresa era o mercado. O principal erro dos primeiros anos foi constituir uma equipe eminentemente técnica que, apesar de ser visionária quanto ao potencial tecnológico, não estava preparada para atuar em um setor emergente e bastante competitivo. Foi preciso tempo para desenvolver a tecnologia e também para conhecer, por meio de erros e acertos, quais eram os clientes potenciais da empresa e o que eles precisavam, mas o grande acerto veio a tempo: a complementação da equipe por um profissional experiente e capacitado, disposto a investir na empresa.

116 E M P R E S A C O M U N I P Para os fundadores da ComunIP, a parceria com o Intituto Inovação e Fundo Novarum e a vinda de Ronaldo Barreto para o grupo foram fundamentais para a reorientação ao mercado que o negócio tanto pedia. Uma rede de relações importante e ampla, fator relevante para qualquer negócio, só surgiu a partir dos contatos de Ronaldo e do Fundo Novarum. Outro recado importante dessa história diz respeito ao investimento de terceiros. Não dá para esconder a tecnologia. Nós divulgamos aos sete cantos e deu certo, afirmou Guilherme. Em certo momento, o fomento inicial do poder público já não era suficiente; a empresa precisava crescer e acessar o mercado, pois, sem isso, o próprio investimento público teria sido em vão. Por isso, é importante destacar a importância de procurar parceiros e investidores que poderiam, de fato, acelerar a empresa. As previsões dos três empreendedores se confirmaram: em 2006, o mercado de negócios em VoIP já apresentava um faturamento de R$ 900 milhões 5 em todo o mundo. O grande nicho eram as empresas interessadas em diminuir custos com telefonia e comunicação interna. Até 2011, a previsão seria de que o número de linhas VoIP cresceria a uma taxa anual de 87,5%, sendo que o Brasil responderia a 49% do faturamento na América Latina 6. O Brasil possuía, até abril de 2007, dez milhões de usuários de Internet via banda larga, segundo a revista Forbes. Mesmo após essa grande virada, a ComunIP, com toda a sua capacidade tecnológica, esperava expandir mais seu horizonte. Seus empreendedores não perderiam tempo e mostrariam mais uma vez estar de olho no futuro: no início de 2007, a empresa foi aprovada no Programa de Subvenção da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos, do Governo Federal) para desenvolver uma plataforma para IPTV (televisão via protocolo de Internet), em 5 Fonte: Frost & Sullivan; IDC Latin; In-Stat; Infonetics; Teleco.com.br; CallCenter.inf; ITU Telecommunications; Thomas Weisel Partners Dados da ComunIP. 6 Segundo pesquisa mundial da Consultoria Frost & Sullivan, publicada em 2007.

117 parceria com universidades e centros de pesquisa. Para Erik, a forma como vemos televisão caminha para uma grande mudança, com maior interatividade e recursos, e isso passa pela Internet. Esse fato ocorreu em um momento muito oportuno, quando o Brasil já havia iniciado os primeiros passos rumo à implantação da TV Digital. QUESTÕES PARA DISCUSSÃO 1. Após análise do caso apresentado, liste os pontos fortes e fracos da ComunIP para enfrentar o mercado de Voz sobre IP (VoIP). 2. Os empreendedores, Erik, Guilherme e Fábio, adotaram uma série de medidas para solucionar a crise da empresa. Para você, qual foi o passo fundamental para a virada da ComunIP? 3. Que outras medidas você adotaria, caso não obtivesse o financiamento de um fundo de capital semente? Qual seria a saída, na sua opinião? 4. Qual é a importância de agentes de fomento públicos (como Finep, Fapemig, Sebrae) e privados (bancos, investidores), para pequenas empresas inovadoras? REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DOLABELA, Fernando. Oficina do Empreendedor. São Paulo: Cultura Editores Assoc., 1999. IDC Brasil, Brazil Voip and its Impact on Communications Industry 2005 www.idcbrasil.com.br Portal Skype www.skype.com.br Revista Eletrônica IDG Now! www.idgnow.uol.com.br Revista ComputerWorld Online www.computerworld.uol.com.br Teleco Informações em Telecomunicações www.teleco.com.br. Portal Sebrae MInas: www.sebraeminas.com.br/casosdesucesso