Uma Europa sem Deus. Geoval Jacinto da Silva*

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Transcrição:

Uma Europa sem Deus Geoval Jacinto da Silva* Michael H. Weninger (editor). Uma Europa sem Deus. A união européia e o diálogo com religiões, igreja e comunidades confessionais. Portugal, Edições 70, 2009, 510 p. O livro Uma Europa sem Deus. A união européia e o diálogo com religiões, igreja e comunidades confessionais, de Michael H. Weninger (editor), publicado em alemão e traduzido para o português, em sua primeira parte aborda o seguinte tema: A questão fundamental: Europa um projeto de dimensão religiosa?. A preocupação é lembrar que depois das terríveis devastações causadas pela II Guerra Mundial na Europa, os políticos responsáveis, na sua maioria cristãos, deram as mãos no sentido de reconstruírem a Europa, eliminarem as consequências desastrosas da guerra e devolverem às pessoas a esperança e as perspectivas de futuro. A presença da Igreja e de organizações religiosas na Comunidade Europeia é vista em três perspectivas. Primeiro é feita uma análise dos últimos cinqüenta anos do processo de integração européia, e para se perceber o fundamento da política que articula as relações entre a Igreja e o Estado. A segunda perspectiva trata em detalhes as dificuldades, bem como as oportunidade para um diálogo entre religiões, igrejas e comunidade confessionais no seio da União Européia. Na terceira o Tratado que estabelece a Constituição européia é analisado no contexto de um diálogo inter-religioso necessário, tal como o desafio que as diversas tradições do Islão representam para a construção européia. O tema da União Europeia em sua gênese político-econômica constitui agenda de importância para os executores dos ideais da unidade dos diversos países. Nesse universo geográfico há de considerar a presença religiosa vivenciada pelas diversas tradições cristãs, protestantes e católicos romanos e até mesmo a tradição ortodoxa e outros movimentos religiosos de real * Professor na Universidade Metodista de São Paulo, no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião e na Faculdade de Teologia.

Uma Europa sem Deus 199 significação. Assim sendo é necessário considerar que as igrejas e as organizações religiosas desempenham um papel especial neste processo, visto que são umas vezes mais outras menos constituintes decisivos da sociedade civil e, por conseguinte, do processo de construção da européia! O tema é visto por diversos olhares e com diversas reações chegando até mesmo através das organizações não confessionais, com orientação extremamente secular e anti-eclesiástica, com postura de rechaço e até mesmo de desprezo pelo tema do religioso-eclesiástico. Para diversos segmentos mais céticos a União Européia é uma organização exclusivamente política, político-econômica e financeira, talvez apenas enriquecida por elementos de política de segurança e defesa, mas com os quais as religiões e as Igrejas certamente não têm de interferir. O livro pretende oferecer subsídio de prevenção a uma situação de tensão que num futuro que se aproxima pode se tornar realidade. Face ao exposto apresentado, o interesse da obra é indicar a importância das Igrejas e organizações religiosas no processo de integração européia e as possibilidades que se lhes deparam, mas também a que conflitos estão sujeitas. Por outro lado, pretende-se tornar claro que só com elas é que a UE pode servir aos seus parceiros religiosos em harmonia com os interesses comuns. A obra está composta de sete capítulos. O primeiro Resumo da História da Integração Européia, procura apresentar os dados mais importantes sobre a criação das Comunidades Européias, começando pelos esforços pósguerra no sentido do entendimento entre os povos, até ao alargamento da UE para os atuais 27 membros, em vigor desde primeiro de janeiro de 2007. Através da apresentação das mais importantes etapas da inacreditavelmente bem sucedida política de integração, deverá demonstrar-se de forma suficientemente clara, que uma Europa unida é possível através de um esforço comum entre as Igrejas e as organizações religiosas enquanto parceiros. Também são apontadas de forma clara as deficiências político-religiosas e eclesiásticas, bem como a problemática deste processo, que até hoje ainda não foi resolvido. Desenvolve também a ideia de que o processo em seu início é marcado por diversas dificuldades que só serão equacionadas no decorrer da execução do projeto. O segundo capítulo, O Direito Eclesiástico do Estado e a União Européia, por sua natureza, vai demonstrar que o trato deste objetivo tem alguns limites, já que se ocupará, de forma explícita, da questão dos fundamentos legais para uma política capaz de satisfazer as necessidades religiosas dos cidadãos. Com isso, torna-se evidente que o enquadramento legal para generalizar uma política religiosa e eclesiástica obedece a limites muito apertados e que as respectivas competências das Instituições da União Européia

200 Geoval Jacinto da Silva em prol das competências próprias dos Estados membros são limitadas. A diversidade de sistemas jurídicos que formam a UE e também o sistema eclesiástico que tem vivenciado diversos modelos não podem em hipótese alguma distanciar-se de sua tarefa de ser sinalizador da presença do Reino de Deus. Todos estes valores são elementos a serem considerados no diálogo político-religioso em busca de uma aproximação na União Europeia. O terceiro capítulo, Os fundamentos legais para uma política religiosa e eclesiástica na União Européia, desenvolve estudo de tal maneira que pelo que é exposto, torna-se bastante claro que na UE existem mais tipos de sistema diferentes e mais idiossincrasias estatais e de direito canônico predominantes do que Estados-membros. Nesse sentido o capítulo indica que por causa da variedade de sistemas jurídicos eclesiásticos estatais e das competências nacionais em assuntos fundamentais de âmbito políticoreligioso e político-eclesiástico, estabelecidas pelo direito da UE, e das limitadas condições de base jurídicas que a UE proporciona as Igrejas, religiões e organizações não-confessionais intervieram institucionalmente no processo de integração européia para representarem os próprios interesses, instituindose como parceiros em relação aos órgãos comunitários. A conclusão até então aponta que perante este cenário torna-se claro que as posições das organizações religiosas e das Igrejas no processo de integração européia são muito complexas, já que os interesses nacionais e estatais comuns têm de ser harmonizados com os desígnios locais e das Igrejas do mundo. O capítulo quarto, Os parceiros no diálogo político europeu, aponta a participação dos parceiros no diálogo europeu que vem sendo construído com o elevado e surpreendente número de intervenientes eclesiásticos e religiosos e, por outro, a intensidade da cooperação de cada um dos órgãos comuns, como, por exemplo, a Comissão Européia (CE), o Conselho e o Parlamento Europeus (PE), com as grandes religiões mundiais estabelecidas (acima de tudo, com o cristianismo) que apesar de todas as dificuldades, se desenvolveu de forma lenta, mas segura, e levou já ao estabelecimento de algumas dezenas de Assembléias representativas permanentes nas Comunidades Européias. O capítulo quinto, A constituição para a Europa e a questão de Deus, é marcado por resgate de diversos acontecimentos que vão oferecer especial relevo a uma reprodução exata dos controversos debates e discussões, caracterizados por diversos documentos que conseguem exprimir, de forma bem clara, a problemática do diálogo político-religioso e eclesiástico na UE. Destaca também esse capítulo que desde o início que os favoráveis e os opositores de um diálogo político-religioso e eclesiástico levaram acabou por resultar num compromisso propriamente não satisfatório. Foi impossível aos

Uma Europa sem Deus 201 criadores do Tratado de Reforma chegarem a acordo quanto ao reconhecimento (sem excluir outras raízes) da herança cristã européia, que ninguém, sem seu perfeito juízo, poderá seriamente pôr em causa, e quanto à referência a Deus como suprema instância para os cidadãos da União Européia. Os favoráveis do diálogo conseguiram por fim, impor o seu ponto de vista, se bem que, muitas vezes, só após longas e desgastantes discussões, ao incluírem na Constituição uma quantidade de valores religiosamente fundamentados e, acima de tudo, a determinação explícita de que a União pretende, a partir de agora, levar a cabo um diálogo aberto, transparente e regular com as religiões, as Igrejas e as organizações não confessionais. O capítulo sexto, O Islão enquanto desafio europeu, pode se constituir com toda a clareza em um dos capítulos mais desafiadores para o entendimento que se impõe, a questão sobre se a UE é uma comunidade de valores e, se sim, quais os valores que ela se sente obrigada a cumprir. O caso mais urgente para a resposta a essa questão é o desafio colocado pelo Islãm. Pensa-se que atualmente vivam mais de 30 milhões de mulçumanos na UE. Será possível integrá-los? Deverá. Sequer, tentar-se fazê-lo? E será que os próprios muçulmanos querem ser integrados? Será que uma coexistência próspera entre muçulmanos e não-muçulmanos é sequer possível? E, caso seja, de que forma e em que condições? A europeização das tradições islâmicas em vez da islamização da Europa, eis um dos grandes temas principais deste debate, que, excluindo os círculos elitistas científicos e políticos, ainda não é, na verdade, suficientemente alargado. Finalmente o capítulo sétimo, Uma sociologia teológica européia, se constitui na busca de encontrar postulados para a construção de uma teologia que possa não só ajustar-se à realidade da comunidade como também ser um instrumento de desafio para traçar os contornos essenciais de uma sociologia teológica no contexto político europeu e, ao mesmo tempo, esboçar propostas para um instrumentário de diálogo por parte da UE que funcione, tendo como base os pressupostos teológicos e jurídico-políticos. A título de breves considerações finais, pode-se afirmar que considerável parte da européia é religiosa, independentemente da sua pertença a uma religião ou Igreja em concreto, e também da intensidade de sua vida religiosa. Reconhecidamente, as Instituições Europeias têm de ter em conta o fator religioso dos cidadãos e para os cidadãos, da União Européia, na medida em que elas são, afinal, dos cidadãos e para os cidadãos, ou seja, são suas. Por outras palavras, isso também significa que eles têm que se ver efetivamente reconhecidos nas suas Instituições. Se as Instituições da UE não forem capazes de refletir as confissões fundamentais com que os cidadãos se identificam, e nas quais se incluem, ou seja, as religiosas, e se as pessoas

202 Geoval Jacinto da Silva não se puderem sentir representadas nas suas instituições, não será possível construir uma identidade européia genuína. A sustentação da obra é indicar a importância das Igrejas e organizações religiosas no processo da integração europeia. Para tanto, é necessário registrar não só as possibilidades que se lhes apresentam, mas também os possíveis conflitos a que estão sujeitos por tratar-se de um projeto diversificado nos seus interesses, mas com necessidade de integração para que a realidade do Reino de Deus, de justiça e paz, seja efetivamente operacionalizado.