TRABALHOS TÉCNICOS Divisão Jurídica DOS PROJETOS DE LEI QUE VISAM ALTERAR O CÓDIGO CIVIL (LEI Nº /2002)

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Transcrição:

TRABALHOS TÉCNICOS Divisão Jurídica DOS PROJETOS DE LEI QUE VISAM ALTERAR O CÓDIGO CIVIL (LEI Nº 10.406/2002) Tatiana Machado Dunshee de Abranches Advogada O denominado novo Código Civil, sancionado em janeiro de 2002, completou sete anos com inúmeros projetos de lei em tramitação que visam alterá-lo. O presente estudo visa comentar as principais modificações propostas na Câmara dos Deputados e tem como base os interesses dos empresários do comércio de bens, serviços e turismo. DO PROJETO DE LEI Nº 4.090/2008 O PL 4090/08 visa acrescentar o art. 1.367-A ao Código Civil, com o fim de prever a resolução do contrato de propriedade fiduciária nas hipóteses de desaparecimento ou perecimento da coisa objeto da avença. A autora do projeto, Deputada Elcione Barbalho, o fundamenta na necessidade de equiparação do contrato de alienação fiduciária ao contrato de depósito para prever a isenção de responsabilidade daquele, quando se tratar de caso fortuito ou força maior. A Deputada fundamenta ainda no fato de que, para fim de prisão civil, os tribunais vêm equiparando-os. Ocorre que, a despeito das similitudes existentes entre os contratos de arrendamento mercantil e depósito, trata-se de contratos distintos. A doutrina e a jurisprudência, de fato, equiparam os contratos, em virtude da obrigação do arrendatário de conservar e proteger o bem, tal qual o dever do depositário. No entanto, o acréscimo do art. 1.367-A ao Código Civil só deixaria mais explícito algo já existente no ordenamento jurídico. Isso porque o art. 1.367 do CC remete ao art. 1.436, que prevê a extinção do contrato por perecimento da coisa. Assim sendo, já há previsão legal de extinção do contrato de leasing pelo inadimplemento de qualquer das partes, ou de ambas, com a existência de culpa ou de motivos alheios à vontade dos contratantes, como caso fortuito ou força maior. Além disso, os Tribunais, em se tratando de furto ou roubo, já possuem entendimentos no sentido de tratar tal situação como fato alheio à vontade, na espécie força maior. Março de 2009

56 Ademais, o fundamento para equiparação entre os dois contratos com base na prisão civil já não prospera mais, tendo em vista que o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou, recentemente, o entendimento de que a prisão civil por dívida no Brasil está restrita à hipótese de inadimplemento voluntário e inescusável de pensão alimentícia. Portanto, em razão do exposto acima, o PL 4090/08, caso aprovado, não inovará substancialmente o sistema legal vigente. DO PROJETO DE LEI Nº 3.524/2008 O PL nº 3.524/08 visa extinguir a prestação de fiança e aval por pessoa física, permitindo apenas que pessoa jurídica garanta ao credor obrigação assumida e não cumprida pelo devedor. O autor do projeto, Deputado Ratinho Junior, apresenta como fundamento o fato de que ao impossibilitar a pessoa natural de ser fiador ou avalista, encontramos uma forma eficaz de evitar prejuízos a terceiros de boa-fé em transações comerciais, pois, frequentemente, a dívida é paga por parentes ou amigos do inadimplente. O deputado afirma ainda que se num primeiro momento poderá haver redução nas transações econômicas e um custo adicional relativo, em pouco tempo o mercado se adaptará e encontrará o ponto de equilíbrio. A segurança nas transações será muito maior e a possibilidade de prejuízos para os credores será sensivelmente menor. A fiança e o aval constituem garantias pessoais que, no entanto, não se confundem. A fiança é uma garantia fidejussória ampla, que se aplica a qualquer espécie de obrigação, seja ela convencional, legal ou judicial. Assim, garante qualquer obrigação, por tratar-se de instituto de direito civil. O aval, no entanto, é instituto de direito cambiário e constitui uma declaração unilateral de vontade e não um contrato. Dessa forma, em se tratando de garantias, a impossibilidade de prestação de fiança e aval por pessoa física de fato acarretará redução no volume dos negócios jurídicos, o que em nada interessa aos empresários e às suas respectivas atividades econômicas. Há que se considerar, ainda, que, em princípio, compete ao credor decidir sobre a idoneidade do fiador que lhe é apresentado, apurando tanto o aspecto financeiro como o moral. Assim sendo, evidentemente, o falido, o insolvente e o incapaz não configuram como fiadores. Além disso, a prática no mercado já demonstra a dificuldade de se encontrar pessoas que se disponibilizem a prestar tais garantias, o que corrobora ainda mais a inconsistência do mencionado projeto de lei. Trabalhos Técnicos Março de 2009

57 DO PROJETO DE LEI Nº 3.619/2008 O PL nº 3.619/08 visa excluir do art. 478 do CC o termo imprevisível, que atualmente assim dispõe: Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação. O princípio tradicional do pacta sunt servanda, preconiza que uma vez concluído o contrato este deve permanecer imutável, foi atenuado pela nova e atual concepção do contrato, em que há a possibilidade de revisão da obrigação que se mostre demasiadamente excessiva, o que ora se denomina de cláusula rebus sic standibus. A possibilidade de revisão dos contratos tem como requisitos: a comutatividade, já que nos contratos aleatórios, que dependem do risco, não há que se falar em onerosidade excessiva; tratar-se de contrato de trato sucessivo ou de execução diferida, pois para que esse contrato tenha a sua comutatividade alterada no futuro, ele obviamente deve se protrair no tempo; vantagem exagerada para uma das partes; onerosidade excessiva assumida por uma das partes; imprevisibilidade da modificação do contrato. Nesse contexto, cabe mencionar o dispositivo do art. 317 do CC, que permite ao juiz rever o contrato em razão de situações imprevisíveis. Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação. A jurisprudência tem demonstrado a dificuldade de aplicação desse dispositivo, justamente em razão do termo imprevisível, já que a alta do dólar, o aumento do salário ou a inflação, podem ou não ser compreendidos como motivos imprevisíveis. Dessa forma, muitas situações práticas têm afastado a aplicação dos arts. 317 e 478 do CC. Assim sendo, a imprevisibilidade constante em tais normas deve ser interpretada em consonância com o princípio da boa-fé objetiva e da função social do contrato, de modo a Março de 2009 Trabalhos Técnicos

58 apartar tanto causas de desproporção não previsíveis, como também causas previsíveis, mas de resultados imprevisíveis. Portanto, o PL 3.619/08 vai de encontro à concepção moderna dos contratos e exclui a necessidade de que o desequilíbrio do contrato seja previsível. Nesse diapasão, a revisão contratual será aplicável sempre que um evento extraordinário tornar insuportável o cumprimento da prestação. Cabe ressaltar, por fim, que o relator da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) apresentou parecer favorável à aprovação do aludido projeto. DOS PROJETOS DE LEI NºS 1.632 E 1.633 DE 2007 Os mencionados projetos têm como objetivo impor o princípio da maioria às disposições do Código Civil que tratam de Direito Societário. O autor dos projetos, Deputado Osmar Serraglio, os fundamenta sob o aspecto de que a unanimidade inviabiliza a acomodação das divergências sociais e implanta a chantagem da minoria. Basta um sócio, com percentagem ínfima do capital social, discordar dos demais, para boicotar todos os interesses da sociedade. O PL nº 1.632 visa alterar o art. 999 com o fim de permitir que sejam feitas modificações no contrato social com base na decisão da maioria absoluta de votos, e não mais na dependência do consentimento de todos os sócios. Pretende, ainda, alterar a redação do art. 1.003 do CC, extinguindo a necessidade de consentimento dos demais sócios, nos casos de cessão total ou parcial de quota, quando não haja a correspondente modificação do contrato social. O PL nº 1.633 visa alterar a redação do art. 1.057, para permitir ao sócio, no silêncio do contrato, ceder sua quota, total ou parcialmente, a outro sócio ou a estranho, desde que haja o consentimento dos demais sócios, em maioria de capital. A redação atual permite a cessão das quotas, mas caso isso ocorra para quem seja sócio, independerá da audiência dos demais, e caso seja para um estranho, depende da não oposição de titulares de mais de ¼ do capital social. Antes do advento do Código Civil de 2002 (Lei nº 10.406) a regra para o quorum de deliberações, em se tratando de sociedade limitada, era o da maioria absoluta. Atualmente, a regra geral é o da maioria simples, conjugando-se o art. 1.076 com o art. 1.071. A estipulação de quorum diverso deve ser especificada no contrato ou na lei, já que determinadas matérias podem ter quorum específico. Cabe atentar para o fato de que o contrato social pode estipular quorum diverso, mas apenas para aumentar e nunca para diminuir. Trabalhos Técnicos Março de 2009

59 Fabio Ulhoa Coelho, no livro Curso de direito comercial, volume 2, Editora Saraiva, pg. 395, afirma: Até a entrada em vigor do Código Civil de 2002, se não houver cláusula restritiva, constante do próprio contrato social, é suficiente, para o arquivamento da alteração, a assinatura do sócio, ou sócios, que representam a maior parte do capital social. Esclarece o regulamento que a maioria societária pode, nesse caso, inclusive destituir gerente, excluir sócio minoritário e até mesmo promover a dissolução e extinção da sociedade limitada (Decreto nº 1.800/96, art. 54). Por outro lado, havendo restrição expressa no contrato social, deve o instrumento alterador atendê-la estritamente (Lei nº 8.934/94, art. 35, VI). Com a entrada em vigor do Código Civil de 2002, a matéria ganha injustificável complexidade. De início, é necessário distinguir quatro hipóteses de alteração contratual: a) designação de administrador não sócio; b) destituição de administrador sócio; c) expulsão extrajudicial de minoritário; d) as demais alterações. A lei estabeleceu condições diferentes para cada uma dessas modificações do contrato social. Assim, quando tem por objeto a designação de administrador não sócio (cabível apenas se houver permissão expressa no contrato social), a alteração contratual depende da vontade unânime dos sócios, enquanto o capital social não estiver totalmente integralizado, e da aprovação de sócio ou sócios titulares de 2/3 do capital social, após a total integralização deste (art. 1.061). Se o objeto é a destituição de administrador sócio, exige-se a aprovação de titular de ou titulares de quotas representativas de 2/3 do capital social, salvo se o contrato preceituar outro quorum, maior ou menor (art. 1.063, 1º). Em se tratando de expulsão extrajudicial de sócio minoritário, a alteração contratual poderá ser assinada por sócio ou sócios titulares de mais da metade do capital social (em qualquer das duas hipóteses em que é cabível essa forma de expulsão: mora na integralização ou prática de atos que põem em risco a continuidade da empresa, se houver, neste último caso, cláusula contratual permitindo-a) (arts. 1.004, parágrafo único, e 1.085). Por fim, as demais alterações contratuais dependem da aprovação de sócio ou sócios titulares de 3/4 do capital social (arts. 1.071, V, e 1.076, I). Grifo nosso. Considerando que a doutrina majoritária entende que o ato constitutivo de uma sociedade é uma espécie singular de contrato, a aplicação do princípio da maioria, tal como pretendido nos Projetos de Lei nºs 132 e 1.633, se coaduna com os princípios contemporâneos e norteadores dos contratos, como o da função social, probidade e boa-fé. DO PROJETO DE LEI Nº 3.871/2008 O PL nº 3.871 visa alterar o art. 1.030 do Código Civil para permitir que a exclusão de sócio possa também ser determinada pela convenção de arbitragem. O autor do projeto, Deputado Federal Juvenil, o fundamenta no fato de que com a vigência no nosso sistema Março de 2009 Trabalhos Técnicos

60 legislativo da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, os litígios que versam sobre direitos disponíveis podem ser julgados e decididos extrajudicialmente pelo procedimento denominado de JUÍZO ARBITRAL. A exclusão ou expulsão do sócio pode se dá de forma judicial ou extrajudicial, tal como dispõem os arts. 1.004, parágrafo único, 1.030 e 1.085, e pode ser feita sempre que houver mora na integralização do capital social ou por deliberação da maioria societária, desde que o contrato social contenha cláusula que a permita (exclusão extrajudicial). A expulsão deve ser pleiteada em ação de dissolução (exclusão judicial), sendo remisso, inadimplente ou desleal o sócio majoritário, ou não havendo cláusula contratual permissiva. No entanto, qualquer que seja a forma da expulsão, esta somente será cabível na hipótese de rescisão do contrato de sociedade em relação a sócio que não cumpriu com suas obrigações, pois essa desvinculação do sócio não é manifestação da vontade discricionária da maioria. Assim sendo, já havendo previsão da forma extrajudicial de expulsão do sócio, a alteração prevista no PL nº 3.871 se torna inócua, já que consiste em meio mais simples do que a via arbitral. Por fim, cabe mencionar, mais uma vez, que o presente trabalho visou apenas analisar os projetos de lei que estão tramitando com o fim de alterar o Código Civil e que tenham relação com o exercício das atividades econômicas acobertadas pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Os temas relacionados a atividades abarcadas por outra entidade sindical ou de interesse geral não estão aqui tratados em razão de serem inúmeros e pela extensão que dariam ao estudo. Trabalhos Técnicos Março de 2009