Os níveis de linguagem e o juridiquês
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- Mônica Cordeiro Malheiro
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1 Os níveis de linguagem e o juridiquês OBJETIVO: APRESENTAR OS NÍVEIS DE LINGUAGEM DA LÍNGUA PORTUGUESA; DEMONSTRAR QUE A FORMALIDADE E A LINGUAGEM FORENSE SÃO INSTRUMENTOS IMPORTANTES PARA O PROFISSIONAL DO DIREITO; PERMITIR A REFLEXÃO SOBRE O USO DO JURIDIQUÊS AUTOR(A): PROF. MARCIA DE MATTOS S MACEDO NÍVEIS DE LINGUAGEM O homem sempre buscou recursos que o fizesse interagir com o outro por meio da linguagem, a fim de preservar ou transformar a cultura. Nesse sentido, desenvolveu algumas formas de comunicação também conhecidas como linguagem não verbal, que se utiliza de recursos visuais como os gestos, a dança, as cores, a imagem entre outras, e verbal, compreendendo tanto a escrita quanto a oral. Para que esses dois tipos de linguagens se concretizem, a língua - conjunto de palavras e regras combinadas e utilizadas por membros de uma determinada comunidade - é fundamental para o ato comunicativo. A forma de comunicação em uma sociedade pode ocorrer a partir de níveis de linguagem: Formal (culto): é o nível comunicativo utilizado em determinadas situações que exigem a observação das regras gramaticais. Caracteriza-se pela escolha de vocabulário específico, de acordo com a normatividade da língua portuguesa. Observe o exemplo abaixo extraído do livro de Chaïm Perelman (Tratado da Argumentação, p. 39): "O alcance filosófico da argumentação apresentada a um único ouvinte e sua superioridade dirigida a um vasto auditório foi admitida por todos os que, na Antiguidade, proclamavam a primazia da dialética sobre a retórica. Esta se limitava à técnica do longo discurso contínuo." Os níveis de linguagem e o juridiquês 01 / /11
2 Informal (coloquial/popular): é a forma que o falante/escritor utiliza no seu cotidiano, nas situações de espontaneidade, ou seja, sem preocupação com as normas da língua portuguesa. Veja o trecho de uma sentença do juiz João Batista de Matos Danda, do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, que optou por uma linguagem coloquial, em vez da técnica (ou jargão) utilizada nesse tipo de peça jurídica. "para julgar de novo, vou ler as declarações de todos mais uma vez e olhar os documentos. Pode ser que me convença do contrário. Mas pode ser que não. Vamos ver". Técnico (profissional): é a utilizada por profissionais (advogados, economistas, engenheiros, bancários) em suas atividades específicas. Observe agora o trecho da mesma sentença na linguagem técnico-jurídica: "Inconformado com a sentença, que julgou improcedente a ação, recorre o reclamante buscando sua reforma quanto ao vínculo de emprego e indenização por acidente de trabalho. Com contrarrazões sobem os autos a este tribunal. É o relatório. Passo a decidir." Os níveis de linguagem e o juridiquês 02 / /11
3 Legenda: JUIZ JURIDIQUÊS A escrita formal exige do aluno do direito muita dedicação aos estudos da variante normativa da língua portuguesa. Para isso, além de realizar leituras das mais variadas possíveis, precisa apropriar-se da linguagem específica encontrada em peças jurídicas (petição, sentença, acórdão), leis, jurisprudências, códigos entre outras. Muitas vezes, o profissional do direito confunde o uso da formalidade e da linguagem técnica com o de expressões arcaicas, ultrapassadas que causam duplo sentido ou são ininteligíveis. Assim, é necessário compreender as diferenças existentes entre a linguagem informal (muito associada à fala), a formal com termos técnicos (muito apreciada no judiciário) com aquela, cujo vocabulário é rebuscado, cheio de arcaísmos, denominada de juridiquês. O juridiquês é um neologismo criado, na área do Direito, para representar o uso de expressões ocas que não traduzem a realidade das práticas jurídicas. Há quem afirme que a utilização desse tipo de linguagem possa representar mascaramentos de profissionais que desejam ou subjugar o outro para que este não o compreenda de verdade ou para escamotear o próprio domínio da prática jurídica. Os níveis de linguagem e o juridiquês 03 / /11
4 Deve-se entender que o uso de uma linguagem mais acessível (ou simplificada, como alguns magistrados defendem) não significa o empobrecimento da proferida nos tribunais e nas defesas judiciais. Basicamente, a linguagem jurídica é pautada por termos técnicos imprescindíveis e pela formalidade linguística. A própria legislação preconiza a simplificação da linguagem forense, como pode ser lido na Lei Complementar 95/98: [...] Art. 11. As disposições normativas serão redigidas com clareza, precisão e ordem lógica, observadas, para esse propósito, as seguintes normas: I - para a obtenção de clareza: a) usar as palavras e as expressões em seu sentido comum, salvo quando a norma versar sobre assunto técnico, hipótese em que se empregará a nomenclatura própria da área em que se esteja legislando; b) usar frases curtas e concisas; c) construir as orações na ordem direta, evitando preciosismo, neologismo e adjetivações dispensáveis; d) buscar a uniformidade do tempo verbal em todo o texto das normas legais, dando preferência ao tempo presente ou ao futuro simples do presente; e) usar os recursos de pontuação de forma judiciosa, evitando os abusos de caráter estilístico; II - para a obtenção de precisão: a) articular a linguagem, técnica ou comum, de modo a ensejar perfeita compreensão do objetivo da lei e a permitir que seu texto evidencie com clareza o conteúdo e o alcance que o legislador pretende dar à norma; b) expressar a ideia, quando repetida no texto, por meio das mesmas palavras, evitando o emprego de sinonímia com propósito meramente estilístico; c) evitar o emprego de expressão ou palavra que confira duplo sentido ao texto; d) escolher termos que tenham o mesmo sentido e significado na maior parte do território nacional, evitando o uso de expressões locais ou regionais; e) usar apenas siglas consagradas pelo uso, observado o princípio de que a primeira referência no texto seja acompanhada de explicitação de seu significado; Os níveis de linguagem e o juridiquês 04 / /11
5 f) grafar por extenso quaisquer referências a números e percentuais, exceto data, número de lei e nos casos em que houver prejuízo para a compreensão do texto; (Redação dada pela Lei Complementar nº 107, de ) ( g) indicar, expressamente o dispositivo objeto de remissão, em vez de usar as expressões anterior, seguinte ou equivalentes; (Incluída pela Lei Complementar nº 107, de ) ( [...] O que é o juridiquês Não se deve confundir o juridiquês com a linguagem formal e a técnica usadas no Judiciário, pois aquela se reveste de palavras arcaicas, rebuscadas, de raciocínios labirintíticos e pedantes como: "O vestuto vernáculo manejado no âmbito dos excelsos pretórios, inaugurado a partir da peça ab ovo, contaminando as súplicas do petitório, não repercute na cognoscência dos frequentadores do átrio forense." É contra esse tipo de linguagem que a Associação de Magistrados Brasileiros (AMB) realizou, em 2005, uma Campanha Nacional pela Simplificação da Linguagem Jurídica. Veja mais alguns exemplos de um glossário no Tribunal de expressões e palavras em juridiquês: Os níveis de linguagem e o juridiquês 05 / /11
6 GLOSSÁRIO DE JURIDIQUÊS ABROQUELAR: fundamentar APELO EXTREMO: recurso extraordinário AREÓPAGO: Tribunal AUTARQUIA ANCILAR: INSS CÁRTULA CHÉQUICA: folha de cheque COM FINCAS NO ARTIGO: com base no artigo COM SUPEDÂNEO NO ARTIGO: com base no artigo CONSORTE SUPÉRSTITE: viúva/viúvo DIGESTO OBREIRO: Consolidação das Leis do Trabalho DIPLOMA PROVISÓRIO: Medida provisória ERGÁSTULO PÚBLICO: cadeia ESTIPÊNDIO FUNCIONAL: salário ESTRIBADO NO ARTIGO: conforme o artigo EGRÉGIO PRETÓRIO SUPREMO: Supremo Tribunal Federal EXCELSO SODALÍCIO: Supremo Tribunal Federal COM ESPEQUE NO ARTIGO: com base no artigo EXORDIAL: peça ou petição inicial FULCRO: fundamento INDIGITADO: réu PEÇA AB OVO: peça ou petição inicial PROEMINAL DELATÓRIA: denúncia PEÇA INCREPATÓRIA: denúncia PETIÇÃO DE INTROITO: peça ou petição inicial PROLOGAL: peça ou petição inicial PEÇA VESTIBULAR: peça ou petição inicial PRETÓRIO EXCELSO: Supremo Tribunal Federal REMÉDIO HEROICO: Mandado de Segurança VISTOR: perito Os níveis de linguagem e o juridiquês 06 / /11
7 ATIVIDADE FINAL Os níveis de linguagem e o juridiquês 07 / /11
8 Leia o trecho do texto "Guerra contra o juridiquês pode levar a mudanças em projetos de lei" e assinale a alternativa que corresponde à análise do senador Pedro Taques em relação ao uso juridiquês: [...] No Senado, a orientação pela simplificação da linguagem jurídica deve ganhar uma defesa mais enfática durante a tramitação do projeto de Código de Processo Penal. Pedro Taques (PDT-MT), integrante da Comissão de Constituição e Justiça, conhece bem o juridiquês, já que é professor de Direito e ex-procurador da República. Ele rejeita a ideia de que o uso de termos técnicos impede, necessariamente, a clareza do texto. Na opinião dele, não é preciso lançar mão do coloquialismo para argumentar de forma inteligível. Mas lança um desafio: A linguagem pernóstica muitas vezes usada na Justiça é na verdade um símbolo que busca afastar o cidadão de quem exerce o poder. A democratização da palavra de forma nenhuma afetará o respeito da população ao Poder Judiciário disse o senador. Mais do que servir como uma ferramenta de poder, os termos incompreensíveis num raciocínio tortuoso acabam agredindo a própria Constituição federal, na opinião do juiz André Nicolitt, que também atua como professor de Direito na Universidade Cândido Mendes e na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). [...] (Disponível em Senado Notícias: contra-o-2018juridiques2019-pode-levar-a-mudancas-em-projetos-de- lei. Acesso em 20 jun 2015) Os níveis de linguagem e o juridiquês 08 / /11
9 A. Para o professor e ex-procurador da República, Pedro Taques, o juridiquês é necessário e deve ser ensinado aos estudantes de direito para promover a aproximação da sociedade com o meio jurídico. Como o uso da linguagem tradicional do Direito, que começa a ser aprendida já na faculdade, os estudantes serão o alvo inicial da campanha. B. Para o professor e ex-procurador da República, Pedro Taques, o juridiquês é uma linguagem rebuscada, mas necessária para o exercício de poder, para demostrar erudição e autoridade. O uso de termos incompreensíveis ao cidadão comum é uma prática apenas de magistrados, pois dominam a linguagem jurídica. C. Para o professor e ex-procurador da República, Pedro Taques, o juridiquês é uma linguagem rebuscada e inacessível, o que viola os princípios constitucionais do acesso à Justiça e da publicidade. É um exercício de poder, uma violência simbólica para mostrar erudição e autoridade. D. Para o professor e ex-procurador da República, Pedro Taques, o juridiquês já é uma cultura jurídica consagrada, que demonstra de quem é a competência na resolução de ações judiciais. O uso de termos incompreensíveis ao cidadão comum é uma prática apenas de magistrados, pois dominam a linguagem jurídica. REFERÊNCIA HENRIQUES, Antonio e DAMIÃO, Regina. Curso de Português Jurídico. 10ª ed. São Paulo: Atlas, MORENO, Cláudio; MARTINS, Túlio. Português para convencer: comunicação e persuasão em direito. São Paulo: Ática, XAVIER, Ronaldo Caldeira. Português no Direito. 15 ed. Rio de Janeiro: Forense, a MACEDO, Iraelcio Ferreira, et. al. Lições de gramática aplicadas ao texto jurídico. Rio de Janeiro, Forense, MEDEIROS, João Bosco, TOMASI, Carolina. Português forense: a produção do sentido. São Paulo: Atlas, a SIMÕES, Sérgio. Escrever corretamente sem segredo. Série Palavra Final, v. 5. São Paulo: Uninove, Redação jurídica sem segredo I. Série Palavra Final, v.6. São Paulo: Uninove, Redação jurídica sem segredo II. Série Palavra Final, v.7. São Paulo: Uninove, Os níveis de linguagem e o juridiquês 09 / /11
10 Os níveis de linguagem e o juridiquês 10 / /11
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