MEDIÇÃO DAS PROPRIEDADES AO CORTE DA MADEIRA DE PINHO ATRAVÉS DO ENSAIO OFF-AXIS
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- Ana Lívia Antas Chaplin
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1 MEDIÇÃO DAS PROPRIEDADES AO CORTE DA MADEIRA DE PINHO ATRAVÉS DO ENSAIO OFF-AXIS Nuno Garrido ESTV, Departamento de Engenharia de Madeiras, Viseu, Portugal José Xavier e José Morais CETAV/UTAD, Departamento de Engenharias, Vila Real, Portugal José Lousada UTAD, Departamento de Florestal, Vila Real, Portugal RESUMO Neste artigo apresentam-se os resultados dum trabalho experimental sobre a utilização do ensaio de tracção off-axis para a determinação das propriedades mecânicas ao corte da madeira de Pinus Pinaster Ait., nos planos de simetria natural e RT. O referido ensaio revelou-se um método directo para a determinação do módulo de corte e da tensão de rotura ao corte no plano. Porém, é questionável que o ensaio de tracção off-axis seja adequado para a identificação das propriedades mecânicas ao corte relativas ao plano RT. 1. INTRODUÇÃO É em geral reconhecida a necessidade de desenvolver novos ensaios normalizados para a medição do comportamento ao corte da madeira, que permitam a determinação simultânea dos módulos de corte e das tensões de rotura ao corte. No âmbito dos compósitos artificiais, um dos ensaios mais estudado para a identificação do comportamento ao corte é o ensaio de tracção off-axis, proposto por Chamis e Sinclair (1977). O principal problema com esse ensaio tem a ver com o acoplamento entre a deformação linear e a deformação de corte, que é uma característica dos materiais anisotrópicos (Tsai, 1980). Dependendo do tipo de constrangimento imposto às extremidades dos provetes, o referido acoplamento torna complexa a relação entre o estado de tensão instalado na região de referência do provete e as grandezas medidas experimentalmente (Pindera, 1986). Uma das soluções propostas para ultrapassar os efeitos do constrangimento das extremidades dos provetes off-axis consiste na utilização de bolachas oblíquas coladas nas extremidades dos provetes (Sun, 1993). Diversos trabalhos experimentais (Kawai, 1997; Pierron, 1998) demonstraram que o uso de bolachas oblíquas melhora significativamente a homogeneidade dos campos das tensões e das deformações. Esta solução permite não só a correcta identificação do módulo de corte como também da resistência ao corte (Pierron, 1996).
2 α Foram publicados alguns trabalhos sobre a aplicação do ensaio off-axis à madeira, quer para a determinação do módulo de corte quer para a determinação da resistência ao corte (Schuldt, 1972; Ebrahimi, 1981; Yoshihara, 2000; Liu, 2002). Todavia, em contraste com o que acontece com os compósitos artificiais, está por fazer um estudo detalhado sobre as potencialidades desse ensaio para a madeira. Neste artigo apresentamos os resultados dum trabalho experimental sobre a aplicabilidade do ensaio off-axis para a identificação do comportamento ao corte da madeira de Pinus Pinaster Ait., nos planos de simetria natural e RT (L é a direcção longitudinal das fibras, R é a direcção radial dos anéis de crescimento e T é a direcção tangencial aos anéis de crescimento). São descritos os provetes utilizados, bem como a metodologia experimental e de tratamento de dados, com vista à determinação dos módulos de elasticidade ao corte (G e G RT ) e das tensões de rotura ao corte (S e S RT ). 2. O ENSAIO DE TRACÇÃO OFF-AXIS Na Figura 1 apresenta-se a forma do provete do ensaio de tracção off-axis, proposto por Sun (1993) para a identificação do comportamento ao corte dos compósitos unidirecionais de matriz polimérica. O ângulo α entre a direcção de simetria material 1 e a direcção longitudinal dos provetes deve ser escolhido com base no critério de Chamis (1977). Por sua vez, o ângulo β de inclinação das bolachas deve ser determinado conforme foi proposto por Sun (1993). As grandezas obtidas directamente no ensaio de tracção off-axis são a força global P (medida pela célula de carga da máquina de ensaios) e as deformações ε a, ε c e ε c (medidas pela roseta de extensómetros, Figura 1). Admitindo que o estado de tensão na secção central do provete é uniaxial, as componentes do estado de tensão no referencial de simetria material (1, 2) são então dadas por: média P 2 σ 1 = cos α, 2 σ sin α A 2 média P = e média P τ sin 2 A 12 = A α, (1) onde A é a área da secção transversal do provete. Por outro lado, a deformação de corte média no referencial de simetria material é dada pela equação seguinte: ( ε 2ε + ε ) sin α + ( ε ε ) cos α média γ 12 = a b c a c. (2) O módulo de corte aparente obtém-se dividindo a tensão de corte média pela deformação de corte média: 2 β a 1 60 W L1 L 60 c b Figura 1 - Provete off-axis com bolachas inclinadas.
3 a G 12 média τ = 12. média (3) γ 12 Uma vez que o campo das tensões na região de referência dos provetes é uniaxial e uniforme, o módulo de corte aparente coincide com o verdadeiro valor do módulo de corte do material (Xavier, 2003; Garrido, 2003). Porém, o estado de tensão na região de referência do provete (entre as amarras) não é de corte puro (Equações 1), pelo que a tensão de rotura ao corte só pode ser estimada indirectamente, através dum critério de rotura apropriado (Pierron, 1996). 3. TRABALHO EXPERIMENTAL 3.1. Material e provetes Neste trabalho utilizou-se madeira proveniente de uma única árvore da espécie Pinus Pinaster Ait. Os provetes para os ensaios de tracção off-axis no plano têm forma e as dimensões indicadas na Figura 2, com bolachas de Iroko (Chlorophora excelsea Beneth & Hook). Por sua vez, os provetes para os ensaios no plano RT têm as dimensões indicadas na Figura 3. Nestes provetes, dado o menor comprimento da zona de referência e a sua baixa razão de ortotropia, E R E T 1, 89 (Pereira, 2003), não foram empregues bolachas coladas, tendo-se recorrido a papel abrasivo para evitar as incisões dos mordentes das amarras na superfície dos provetes. Os detalhes sobre a manufactura dos provetes e o procedimento experimental podem ser encontrados em Garrido (2003). Antes dos ensaios mecânicos todos os provetes foram estabilizados para as condições ambientais em vigor no laboratório. Após os ensaios, foi determinado o teor de humidade e a densidade de cada provete (EN 408, 2002). Registaram-se teores de humidade entre 10% e 12%, e densidades entre 0,55 e 0,65. β = 36 α = 15 Figura 2 - Provetes off-axis para o plano.
4 20 15 O Figura 3 - Provetes off-axis para o plano RT Ensaios mecânicos Os ensaios mecânicos foram executados numa máquina universal INSTRON 1125, à velocidade do travessão de 2mm/min e usando amarras de cunhas deslizantes (Figura 4). Os ensaios foram instrumentados com uma célula de carga de 100 kn e com extensómetros eléctricos de resistência. Usaram-se rosetas extensométricas de três elementos CEA UR-350 (MicroMeasurement), coladas numa face dos provetes conforme está ilustrado nas Figuras 2 e 3. Os extensómetros foram colados com o adesivo M-Bond AE-10, seguindo o procedimento recomendado pelo fabricante. (a) (b) Figura 4 - Ensaio de tracção off-axis: (a) plano e (b) plano RT.
5 4. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS EXPERIMENTAIS 4.1. Ensaios de tracção off-axis no plano Na Figura 5 ilustram-se os resultados directamente obtidos nos ensaios de tracção off-axis, para o plano de simetria natural. A partir desta informação experimental, e fazendo uso das equações (1) e (2), foram determinadas as curvas τ γ que estão representadas na Figura 6. Estas curvas mostram claramente que o comportamento ao corte da madeira de Pinus Pinaster Ait. no plano não é linear. A partir das curvas τ γ foi determinado o módulo de corte G, estando os resultados reunidos na Tabela 1. O módulo de corte foi considerado como sendo o valor na origem (γ = 0) da derivada dum polinómio de segundo grau obtido a partir das curvas τ γ, por regressão polinomial com um coeficiente de correlação superior a 0,999. O coeficiente de variação da amostra ensaiada (C. V. = 7%) é da ordem de grandeza característica das propriedades mecânicas da madeira. Conhecida a força máxima alcançada nos ensaios, determinou-se o valor, na rotura, das componentes do estado de tensão no referencial de simetria material (L, R), usando as equações (1): Hill: r σ L, r σ R e τ r. A resistência ao corte S foi então estimada através do critério de Tsai- σ X r 2 r ( σ ) ( τ ) r r r 2 σ σ L L R R + + = L X LYR YR S 1. (4) Neste caso, X L é a resistência longitudinal e Y R é a resistência radial. Os resultados assim obtidos encontram-se na Tabela 1. Refira-se que o valor médio de S coincide praticamente r com o valor médio de τ, pelo que o ensaio de tracção off-axis pode ser considerado um ensaio directo para a obtenção da resistência ao corte no plano (Xavier, 2003). Força (N) Ext. b Ext. c Ext. a Deformação (µε) Figura 5 - Resultados experimentais do ensaio de tracção off-axis, no plano.
6 Tensão de corte (MPa) Deformação de corte (µε) Figura 6 - Curvas tensão-deformação de corte no plano. Na Figura 7 pode ser apreciado o aspecto macroscópio da rotura dos provetes, o qual sugere que a rotura é dominada pela tensão de corte τ. A observação das superfícies de fractura por microscopia electrónica de varrimento (Figura 8) reforça essa conclusão. De facto, a rotura é essencialmente transcelular (pela parede e pelo lúmen das células), com uma morfologia (Figura 8a) característica da fractura por corte (Zink, 1994). A Figura 8 (b) esclarece o mecanismo de rotura da parede celular, por acção de tensões de corte. Figura 7 - Aspecto geral da rotura dos provetes. (a) (b)
7 Figura 8 - Morfologia da superfície de fractura dos provetes Ensaios off-axis no plano RT Na Figura 9 encontram-se as curvas que caracterizam o comportamento ao corte da amostra de madeira de Pinus Pinasetr Ait. no plano RT ( τ RT γ RT ), obtidas da mesma forma que as curvas τ γ (secção 4.1). Também para o plano RT, o comportamento ao corte não é linear até à rotura. Os módulos de corte G RT foram identificados em cada provete a partir das curvas tensãodefromação de corte, seguindo a metodologia usada na identificação do módulo de corte G. Também os valores da tensão de rotura ao corte S RT foram determinados como no caso do ensaio de tracção off-axis no plano. Os valores obtidos para estas grandezas encontram-se na Tabela 1, exibindo uma dispersão que seria de esperar num material com a variabilidade da madeira. Tensão de corte (MPa) Deformação de corte (µε) Figura 9 - Curvas tensão-deformação de corte no plano RT. A Figura 10 ilustra o aspecto macroscópio da rotura dos provetes RT. A rotura tem início num dos bordos do provete, desenvolvendo-se na direcção tangencial como é próprio de um ensaio de tracção off-axis. Isto mesmo se conclui da análise da superfície de fractura por microscopia electrónica de varrimento (Figura 11), onde são bem patentes os sinais de rotação de fibras devidos à fractura por corte na direcção tangencial. Todavia, uma percentagem significativa da superfície de fractura está globalmente orientada na direcção perpendicular ao esforço de tracção aplicado ao provete, pelo que é questionável se o ensaio off-axis é adequado para a identificação das propriedades mecânicas ao corte no plano RT (G RT e S RT ).
8 Figura 10 - Aspecto geral da rotura dos provetes RT. Figura 11 - Morfologia da superfície de fractura dos provetes RT. Tabela 1 - Propriedades ao corte nos planos e RT. Plano Plano RT Provete G (GPa) S (MPa) G RT (GPa) S RT (MPa) 1 1,23 15,9 0,17 2,48 2 1,14 14,6 0,15 2,64 3 1,03 14,0 0,16 2,70 4 1,11 11,5 0,16 2,66 5 1,13 18,0 0,17 2,15 6 1,05 15,2 0,17 2,14 7 1,10 15,9 0,16 2,57 8 1,09 21,8 0,16 2,35 9 1,10 18,2 0,14 2, ,03 16,8 0,15 2, ,06 14,9 0,17 2, ,02 16,1 0,14 2, ,32 16,0 0,16 2, ,17 20,7 0,14 2, ,11 14, ,15 20,
9 Média 1,11 16,5 0,16 2,39 C. V. (%) 7,00 16,7 7,12 8,81 5. CONCLUSÕES O ensaio de tracção off-axis é adequado para a identificação completa do comportamento ao corte da madeira de Pinus Pinaster Ait., no plano. Embora o estado de tensão não seja de corte puro, o ensaio off-axis pode ser encarado como um método directo para a determinação quer do módulo de corte, quer da resistência ao corte no plano. É porém questionável a possibilidade de recorrer ao ensaio de tracção off-axis para a determinação das propriedades mecânicas ao corte da madeira de Pinus Pinaster Ait., no plano de simetria natural RT. 6. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem à Fundação para a Ciência e a Tecnologia o apoio financeiro para a realização deste trabalho, através do Projecto POCTI/EME/36270/ REFERÊNCIAS Chamis, C. C.; Sinclair, J. H., "Ten-deg off-axis test for shear properties in fiber composites", Experimental Mechanics 17 (9), Ebrahimi, G.; Sliker, A., Measurement of shear modulus in wood by a tension test, Wood Science, 13(3), pp European Committee for Standardization, EN 408 Timber structures Structural timber and glued laminated timber Determination of some physical and mechanical properties, Office for Official Publications of the European Communities, Luxembourg, Garrido, N., Caracterização do comportamento ao corte da madeira através do ensaio off-axis. Tese de Mestrado, UTAD (em preparação). Kawai, M.; Morishita, M.; Satoh, H.; Tomura, S., Effects of end-tab shape on strain field of directional carbon/epoxy composite specimens subjected to off-axis tension, Composites Part A 28A,, pp Liu, J. L., Analysis of off-axis tension test of wood specimens, Wood and Fiber Science, 34 (2), pp Pindera, M. J.; Herakovich, C. T., Shear characterization of unidirectional composites with the off-axis tension test, Experimental Mechanics, pp Pierron, F.; Alboa, E.; Surrel, Y.; Vautrin, A., Whole-field assessment of the effects of boundary conditions on the strain field in off-axis tensile testing of unidirectional composites, Composites Science and Technology, 58(12), pp Pierron, F.; Vautrin, A., The off-axis tensile test: a critical approach, Composites Science and Technology, 56, pp Pereira, J. L., Comportamento Mecânico da Madeira em Tracção nas Direcções de Simetria Material. Tese de Mestrado, UTAD, Vila Real (em preparação). Schuldt, A., Unified testing procedure for determining the elastic parameters of wood. Ph.D. thesis, Colorado State University, Fort Collins, CO, 200 pp. Sun, C. T.; Berreth, S.P., A new end tab design for off-axis tension test of composite materials, Journal of Composite Materials, vol. 22, August.
10 Tsai, W. S.; Hahan, H. T, Introduction to composite materials. Technomic Publishing Company, Lancaster. Xavier, J.; Garrido, N.; Oliveira, M.; Morais, J.; Camanho, P.; Pierron, F., A comparison of shear characterization of Pinus Pinaster Ait. with the Iosipescu and offaxis shear test methods, Composites Part A (aceite para publicação). Yoshihara, H.; Ohta, M., Estimation of shear strength of wood by uniaxial-tension tests of off-axis specimens, J. Wood Sci., 46, pp Zink, A. G.; Pellicane, P. J.; Shuler, C. E., Ultrastructural analysis of softwood fracture surfaces, Wood Science and Technology, 28, pp
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