MICROLINGUÍSTICA 1 : UMA REFLEXÃO NECESSÁRIA. Miguel Eugênio ALMEIDA (UEMS)
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- Pedro Lucas Godoi Vilanova
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1 MICROLINGUÍSTICA 1 : UMA REFLEXÃO NECESSÁRIA Miguel Eugênio ALMEIDA (UEMS) O estudo microlinguístico da língua compreende basicamente a busca dos elementos dos mecanismos internos dessa língua, ou conforme Saussure (Apud MALMBERG, [1971], p.62): Por língua, Saussure designava o próprio sistema da língua, quer dizer, o conjunto de todas as regras que, dentro de um estado da língua, determina o emprego dos sons, das formas e dos meios de expressão sintáticos e lexicais. Assim, a fonética/ fonologia, a morfologia, a sintaxe e a lexicologia estudam, nas suas especificidades, as regras de uso dos elementos estruturais da língua (sons; formas; expressões sintáticas; expressões lexicais). A língua, no caso, é compreendida como instrumento de comunicação das idéias humanas, ou melhor, é o sistema de sinais convencionados código possibilitando o diálogo entre os falantes da língua (LUFT, 1981, p.2). À medida que descrevemos os mecanismos de funcionamento da língua, estamos construindo a gramática dessa língua. A partir deste dado, verificamos, de uma maneira ou de outra, a preocupação dos gramáticos, de modo especial, no contexto histórico, em fixar em suas gramáticas não somente elementos de prescrição, mas elementos de descrição/ explicação. A seguir, delineamos, com o autor de gramática, as diferenças peculiares entre gramáticas, no sentido geral: Gramática natural sistema de regras segundo as quais os falantes constroem as frases. É um saber intuitivo, o próprio saber linguístico ou competência idiomática de cada falante. A gramática artificial é, primeiramente, a descrição desse saber linguístico e, secundariamente, uma obra livro, manual em que se registra essa descrição. (Id., ibid., p.5). Verificamos acima que o falante da língua tem internalizado uma gramática possibilitando fazer uso de regras da língua, ou melhor, da gramática natural dessa língua; pois a capacidade da aquisição da língua pelo falante é inata. Destarte, o inatismo, conforme Mora (1978, p. 203), é (...) doutrina segundo a qual há certas 1 Expressão adotada por Weedwood (2002).
2 idéias, princípios, noções, máximas especulativas, ou práticas que são inatas, quer dizer, que possuem a alma, o espírito, etc., de todos os homens sem exceção. O sopro do ser do homem é inato, porque está presente em todos os indivíduos de sua espécie. Mais especificamente, a linguagem é o sopro do ser do homem, por excelência. Pois, de acordo com Mondin (1980, p. 132), (...) a propriedade de falar distingue nitidamente o homem dos animais e qualquer outro ser deste mundo e faz dele um ser totalmente singular. Portanto, o homem é o demiurgo, de Platão, que sintetiza a idéia de Bem, como princípio do Ser e onde os demais derivam. E é, através deste princípio, que o homem se revela. Conforme Platão (apud Mora, op.cit., p. 204), (...) tais princípios são antes disposições que podem extrair-se num momento determinado pela ação de uma bem dirigida causa exterior. Deste modo, a linguagem revela-se como princípio humano que o torna capaz de comunicar consigo, com o outro e com o universo. Esta evidência que norteia o princípio através da ação da linguagem humana é que revela o inatismo da mesma (linguagem), como nos assegura Leibniz (apud Mora, 1978, p. 204): O que há no espírito humano é a evidência das verdades eternas. Onde continua: Inato o que se reconhece como evidente. De outro modo, quando passamos a descrever e a registrar os diferentes usos da língua, estamos certamente diante da construção de gramáticas artificiais dessa língua, porque a sua descrição/ explicação implica notoriamente o uso de regras dessa língua. Mais adiante, verificamos como os estudiosos gerativistas entendem a gramática: No momento atual, pensa-se que os fenômenos semânticos, fonológicos e sintáticos estão estreitamente ligados num funcionamento global, e que é o conjunto das regras que descrevem esse funcionamento total que constitui a gramática da língua. A gramática é a descrição completa da competência dos falantes da língua em questão. Ela deve dar conta, para todas as frases da língua, da relação entre forma, função e sentido. (STEFFEN; DAL LAGO, 1987, p.23). Portanto, a forma, a função e o sentido compreendem os três eixos demarcadores da descrição/ explicação e registro da gramática da língua. A forma compreende a descrição das relações de oposição entre os elementos básicos da língua, ou exemplificando com os estudiosos da língua: [...] o objeto do fonólogo, a quem interessa antes de tudo saber que /i/ é uma unidade que se opõe a outras, por exemplo, no sistema
3 fonológico do português. Para este, o /i/ existe não como um dado autônomo, mas como uma unidade de valor meramente relacional, formal. Trabalha com a forma. (GENOUVRIER; PEYTARD, 1985, p.173). No caso, verificamos com um exemplo tratando da forma da língua. O estudioso da língua descreve a relação de unidade de valor que se opõe às outras unidades, ou melhor, uma unidade de valor que se opõe a outra unidade de valor por uma relação fonética/ fonológica na cadeia falada, permitindo a construção de lexema e/ ou morfema. Basicamente, há três eixos estruturantes formando os vocábulos, conforme os pesquisadores da língua: Pode-se afirmar que são três campos distintos, porém reúnem-se num mesmo domínio. Por essa razão deve-se ter sempre presentes, para classificar os vocábulos de uma língua, três critérios: a) Critério fonológico: caracteriza os segmentos fônicos que constituem, de forma gramatical, os invariantes com suas variantes de superfície, suas estruturas formais e seus constituintes; b) Critério funcional, sintático ou sintagmático: observa, analisa a função e relação, o papel que o vocábulo desempenha nos enunciados, quer como determinado quer como determinante; c) Critério semântico: estuda o significado do ponto de vista de universo bio-social, denotativo e/ ou conotativo. (STEFFEN; DAL LAGO, op. cit., p.23). Os três critérios acima os mostram as formas caracterizando o aspecto do significante fonético/ fonológico e o aspecto do significado funcional e semântico dos vocábulos (signos) da língua. Destarte, as duas faces do signo linguístico manifestam-se concomitantemente pelo encadeamento dos fonemas na cadeia falada e pela relação bio-social de sua funcionalidade e de sua existência referencial e/ ou figurativa. Ainda, a respeito, esclarecem-nos os estudiosos da língua portuguesa: Com base nesses critérios, a gramática divide-se em capítulos de diferentes níveis com fonologia, morfologia, sintaxe e semântica. Esses níveis devem ser analisados concomitantemente. Não se pode dicotomizar uma relação a outra a outra [...] Na língua, o todo é solidário com as partes e as partes com o todo. (Id, ibid., p.23-24). Assim, diante do exposto, verificamos o domínio da língua passando inclusive pelo domínio da apreensão dos seus mecanismos internos, permitindo uma comunicação
4 mais consciente e eficiente entre os interlocutores de uma língua. Logo, a microlinguística alicerça o processo de compreensão dos fatos da língua em sua profundidade de natureza formal, quando relacionamos os elementos de superfície, no plano do significante, com os elementos profundos, no plano do significado, completando o entendimento dos elementos estruturantes do vocábulo signo -. A necessidade da compreensão dos fatos da língua passa pela microlinguística, para embasar os estudos da macrolinguística 2. De certo modo, precisamos tomar cuidado para não nos afastarmos em nossas análises sobre a língua, utilizando uma metalinguagem que se distancia da natureza íntima da língua, porque corremos o risco de sublimar uma explicação de campos de conhecimento com objetos de estudo especificamente diferentes, como por exemplo: Filosofia; Sociologia; Psicologia. O diálogo interdisciplinar é bem vindo, desde que não tome o lugar específico dos estudos da língua, propriamente ditos. Portanto, o fato linguístico relevante é o que aponta para a natureza íntima da língua, buscando a gramática da língua, propriamente dita. Referências Bibliográficas GENOUVRIER, E; PEYTARD, J. Linguística e Ensino do Português. Tradução de Rodolfo Ilari. Coimbra: Livraria Almedina: LUFT, C.P. Moderna Gramática Brasileira. 4. ed. Porto Alegre/ Rio de Janeiro: Globo, MALMBERG, B. As Novas Tendências da Linguística: uma orientação linguística moderna. Tradução de Francisco da Silva Borba. São Paulo: Companhia Editora Nacional/ EDUSP, [1971]. MONDIN, B. O Homem: quem é ele? Elementos de Antropologia Filosófica. Tradutor: R. Leal Ferreira e M.A.S. Ferrari. São Paulo: Edições Paulinas, Terminologia utilizada por Weedwood (Ibid., p.12-13) abarcando as seguintes áreas: psicolinguística, sociolinguística, linguística antropológica, dialetologia, linguística matemática e computacional, estilística etc.
5 MORA, J. F. Dicionário de Filosofia. Tradutor: António J. Massano e Manuel J. Palmerim. 4. ed. Lisboa: Publicações Dom Quixote, STEFFEN, E; DAL LAGO, O. A Gramática Gerativa Transformacional e o Ensino da Língua Portuguesa. Santa Maria: Edições UFSM, WEEDWOOD, B. Historia Concisa da Linguística. Tradução de Marcos Bagno. São Paulo: Parábola, 2002.
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