A INFLUÊNCIA DO ENRIQUECIMENTO AMBIENTAL NO COMPORTAMENTO DE LEÕES, Panthera leo (FELIDAE LINNAEUS, 1758) NO ZOOLÓGICO MUNICIPAL DE UBERLÂNDIA-MG
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- Giuliana Marroquim Rocha
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1 A INFLUÊNCIA DO ENRIQUECIMENTO AMBIENTAL NO COMPORTAMENTO DE LEÕES, Panthera leo (FELIDAE LINNAEUS, 1758) NO ZOOLÓGICO MUNICIPAL DE UBERLÂNDIA-MG Introdução Guilherme Augusto Montes¹ (UEG) ¹PBIC/UEG Jonas Byk (UEG) Felinos particularmente são muito afetados pela erosão da biodiversidade, pois ao longo do tempo suas populações precisarão de territórios cada vez maiores (O Brien & Johnson, 2007). Neste contexto, os felinos em sua maioria se encontram ameaçados em algum grau e várias espécies são vistas como criticamente em perigo (Moreira, 2001). Segundo (Weller & Bennet 2001) estudos que enfatizam felinos cativos podem ajudar na sua conservação, pois os zoológicos, servem como um importante recurso público de lazer, educação, pesquisa e conservação contra a extinção de espécies na natureza (Moreira, 2001). Porém, já se sabe que o estresse do cativeiro além de causar comportamentos anormais, pode inibir a reprodução, prejudicar a função imune e influenciar o desenvolvimento dos animais (Carlstead & Shepherdson, 2000). Os leões são originários da África, comuns em zoológicos do mundo inteiro, são grandes atrativos pela sua ferocidade e imponentes pelo rugido e força. Na natureza possuem hábitos sociais, formando grupos de um a dois machos e várias fêmeas (Lopes & Mantovani, 2005) e geralmente são intolerantes com outros adultos do mesmo sexo, exibindo um sistema social, espacial e temporalmente disperso (Moreira, 2001). A dieta é bastante abrangente, suas presas incluem aves, roedores até grandes mamíferos (Powell, 1997). São essencialmente diurnos e às vezes mantêm um ritmo até ao anoitecer. Um grande problema enfrentado com essas espécies em cativeiro é que freqüentemente permanecem inativos ou escondidos do público e quando ativos exibem na maior parte do tempo comportamentos locomotores estereotipados (Weller & Bennett, 2001). Comportamentos estereotipados são aqueles repetitivos e sem nenhuma função aparente (Wooster, 1997). Esses comportamentos tipicamente não são vistos na natureza e podem ser indicativos de pobre bem estar (Mason et al., 2007). Um exemplo é o pacing, comportamento indicativo de estresse em felinos cativos, caracterizado por locomoção rápida de um lado a outro repetidas vezes (Varel et al., 2004). Uma instituição comprometida com o cuidado animal e educação do público não deve ignorar os comportamentos estereotipados. Existem cinco formas de reduzir ou prevenir estes comportamentos: seleção genética, uso de compostos farmacológicos, reforço positivo de comportamentos alternativos, onde busca-se reforçar comportamentos não estereotipados com alguma recompensa, punição e a mais comum, 1
2 enriquecimento ambiental (Mason et al., 2007). É essa última forma que receberá enfoque nesse estudo. O enriquecimento ambiental surgiu no início do século XX, onde o primatologista Robert Yerkes acreditava que os animais cativos deveriam ter seu tempo ocupado com lazer e trabalho (Shepherdson, 2003). Consiste, portanto, na exposição de animais cativos a ambientes ricos em estimulação sensorial (Nunes et al., 2003). É uma prática que busca aumentar o espaço psicológico de animais em cativeiro (Young, 2003), através do aumento da complexidade física, social e temporal de seus ambientes (Carlstead & Shepherdson, 2000). Um dos principais objetivos do enriquecimento ambiental é encorajar a expressão de comportamentos típicos da espécie, por exemplo, aumento de atividade e redução de inatividade. Objetivo (s) Objetivo geral: Verificar os efeitos do enriquecimento olfativo e alimentar no comportamento dos animais. Objetivo específico: Testar a hipótese de que a aplicação dessas categorias de enriquecimento ambiental aumenta a diversidade comportamental, reduzindo comportamentos anormais e estimulando comportamentos mais naturais, como a exploração. Metodologia O estudo foi realizado no Zoológico do Parque Municipal do Sabiá, ( O, S), em Uberlândia, MG, Brasil. O parque possui uma área total de 185 ha, dos quais cerca de 35 ha são de remanescentes de vegetação nativa. No zoológico há dois indivíduos existentes de leões (Panthera leo), o macho apelidado de Léo com 23 anos e a fêmea apelidada de Nala com 4 anos de idade. Os animais possuem o mesmo tratador e são alimentados todos os dias no mesmo horário, por volta das 11:30 hs. Seu alimento consiste de músculo bovino, 6 Kg diários para cada animal. O estudo foi dividido em três fases: Fase I - Pré-enriquecimento; Fase II - Enriquecimento e Fase III - Pós-enriquecimento. Foram realizadas 40 horas de observação para cada fase, seguindo o método Animal Focal (Altmann, 1974), onde a cada intervalo de um minuto, um indivíduo foi observado e então anotado seu comportamento. Na fase I os animais foram observados sem nenhuma manipulação, somente para caracterização de seus repertórios comportamentais (Del-Claro, 2004), a fim de compará-los depois com os repertórios após o enriquecimento ser efetuado. A segunda fase consistiu no enriquecimento propriamente dito, os itens de enriquecimento alimentar e olfativo foram oferecidos separadamente e aleatoriamente, sem uma seqüência fixa. Sempre após a inserção do item os animais foram observados durante uma hora e meia, seguindo o mesmo método de observação utilizado na primeira fase. As técnicas utilizadas para o enriquecimento alimentar foram: 2
3 1- Quebra do condicionamento: nesta etapa foram alterados os horários de alimentação dos animais duas vezes por semana, durante duas semanas, com o intuito de começar a diminuir o condicionamento destes. 2- Alimento no interior de modelos de ave: Foram feitos três modelos de ave de papel machê, um branco (só com o papel), um pintado com tinta guache atóxica e outro com penas de galinha (fixadas com a umidade do papel), os quais foram preenchidos com a carne que seria oferecida naquele determinado dia. Este item foi oferecido duas vezes nesta fase, sendo um modelo para cada animal 3- Sorvete de carne: Pedaços de músculo bovino foram colocados em uma bandeja com um pouco de água e congelados. Este item foi oferecido duas vezes nesta fase, sendo um sorvete para cada animal. As técnicas utilizadas para o enriquecimento olfativo foram: 1- Orégano embrulhado em jornal: Folhas de orégano (Origanum vulgare) foram colocadas em embrulhos feitos de jornal, sem fechá-los totalmente para que o animal sentisse o cheiro mais facilmente. Este item foi oferecido duas vezes nesta fase, sendo mais de um embrulho por animal. 2- Canela embrulhada em jornal: Pedaços de canela (Cinnamomum zeylanicum) foram embrulhados em jornal, similarmente ao item 1. Este item também foi oferecido duas vez durante esta fase, sendo também mais de um embrulho por animal. Na terceira fase do estudo foram feitas mais 40 horas de observação sem manipulação. Os animais foram observados seguindo o mesmo método descrito na primeira fase. Resultados e Discussão No repertório comportamental do macho a categoria que mais se expressou durante o tempo observado na primeira fase foi Parado Inativo (82,33%), e o ato comportamental mais expressivo foi deitado com 95,27%, na terceira fase também houve predomínio de comportamentos dentro da categoria Parado Inativo, responsável por 74,88% do orçamento de tempo deste animal, sendo que em 97,30% do tempo o animal encontrava-se deitado, de forma significativa (p<0,0001), o animal reduziu a inatividade na terceira fase, mostrando que provavelmente o enriquecimento proporcionou uma ocupação ao animal. Houve um aumento, porém não significativo (p=0.0001), no tempo gasto na categoria Locomoção, pois antes o animal gastava 5,67% do seu tempo se movendo no recinto e após o enriquecimento 7,17%, mostrando que houve aumento na atividade do animal. A categoria Exploração teve aumento significativo (p<0,0001), passando o orçamento de tempo gasto pelo animal nessa categoria de 0,26% na primeira fase para 0,62% na terceira fase, demonstrando o efeito estimulante do enriquecimento sobre o comportamento do animal. Os itens de enriquecimento alimentar que causaram mais interações para o macho foram: modelo de ave com penas com 42,31% das interações, sendo que o ato mais expresso foi cheirar 3
4 modelo de ave com penas com 25,64%, seguido do modelo de ave pintado com 21,79% das interações, com o ato cheirar modelo de ave pintado sendo o mais expresso com 41,18%. Quanto aos enriquecimentos olfativos o macho interagiu com os embrulhos de orégano e de canela, porém não foram significativos. O repertório comportamental da fêmea mostrou que a categoria mais expressiva na primeira fase foi Locomoção com 64,50%, ocorrendo uma diminuição significativa (p<0,0001) já que na terceira fase o orçamento de tempo da fêmea gasto nessa categoria foi de 19,36%, essa diminuição tem um aspecto positivo, haja visto, que o ato comportamento mais expresso dentro dessa categoria foi o pacing, portanto o enriquecimento demonstra um efeito na queda da expressão desse comportamento estereotipado, o qual é indicativo de estresse em felinos cativos. A categoria Exploração foi expressa apenas na terceira fase, durante 1% do orçamento de tempo, isso demonstra que os animais necessitam exibir seus repertórios comportamentais normais mesmo em cativeiro. Para a fêmea, os itens de enriquecimento alimentar que causaram maior interações foram: sorvete de carne com 34,21% das interações, onde o ato mais expresso foi cheirar sorvete de carne com 76,92% e modelo de ave pintado com 26,31% das interações, sendo que o único ato expresso foi cheirar modelo de ave pintado. Quanto ao enriquecimento olfativo os dois itens causaram interações, orégano embrulhado em jornal com 81,82% das interações e canela embrulhada em jornal não foi significativo. Houve um aumento significativo do número de comportamentos exibidos pelo casal durante a fase de enriquecimento. Além disso, as técnicas de enriquecimento ambiental utilizadas se mostraram eficientes na redução do pacing exibido pela fêmea (único indivíduo que exibia níveis consideráveis deste comportamento antes do enriquecimento), houve ainda aumento da exploração pelos dois animais após o enriquecimento. Estes resultados corroboram as expectativas e estudos já realizados, onde grandes felinos reduziram comportamentos anormais como o pacing e gastaram consideravelmente mais tempo explorando o recinto, após serem expostos a itens de enriquecimento alimentar (Wehnelt et al., 2002). A análise do repertório comportamental mostrou que o casal de leões passou grande parte do tempo inativo, porém os animais estudados possuem hábitos crepusculares ou noturnos o que explica essa inatividade, já que a maior parte das observações foram realizadas durante o dia. Este estudo corrobora com estudos realizados por (Campos et al. 2005) onde observouse longos períodos de inatividade em Panthera onca. Considerações finais Os resultados obtidos neste estudo sugerem que deva haver um programa de enriquecimento contínuo para os animais do Zoológico Municipal de Uberlândia-MG, para que os níveis de estresse sejam mantidos em padrões não prejudiciais ao animais cativos e que estes tenham uma melhor qualidade de vida mesmo longe do seu habitat natural. Sugere-se ainda que os frequentadores do Parque sejam orientados para que a visita seja o menos invasiva possível. 4
5 Referência ALTMANN, J Observational study of behavior: sampling methods. Behavior 49: CAMPOS, B.; QUEIROZ, V.S.; MORATO, R.G.; GENARO, G. Padrão de Atividade de Onças Pintadas (Panthera onca Linnaeus, 1758) Mantidas em Cativeiro Manejo e Comportamento. Revista de Etologia, v.7, n.2, p.75-77, CARLSTEAD, K. & SHEPHERDSON, D Alleviating stress in zoo animals with environmental enrichment, pp In: MOBERG, G.P. & MENCH, J.A. (eds.). The biology of animal stress: basic principles and implications for animal welfare. Davis, University of California. 377p. DEL-CLARO, K Comportamento animal: uma introdução à ecologia comportamental. Jundiaí, Livraria e Editora Conceito, VI, 132 p. LOPES, A.L.B. & MANTOVANI, J.E Determinação da área de vida e do uso de habitats pela jaguatirica (Felis pardalis) na região nordeste do Estado de São Paulo. In: XII Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, Goiânia, Brasil. p MASON, G.; CLUBB, R.; LATHAM, N. & VICKERY, S Why and how should we use environmental enrichment to tackle stereotypic behavior? Applied Animal Behavior Science 102 (3): MOREIRA, N Reprodução e estresse em fêmeas de felídeos do gênero Leopardus. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Paraná. 231p. NUNES, C.R.O.; BUSSAB, V.S.R. & GUERRA, R.F Enriquecimento ambiental, privação social e manipulação neonatal. Revista de Ciências Humanas 34: O BRIEN, S.J. & JOHNSON, W.E A evolução dos gatos. Scientific American 63 (8): POWELL, K.E Environmental enrichment programme for ocelots (Leopardus pardalis) at North Caroline Zoological Park, Asheboro. International Zoo Yearbook 35 (1): SHEPHERDSON, D.J Environmental enrichment: past, present and future. International Zoo Yearbook 38 (1): VAREL, M.A.C.; FURTADO, V.N.R. & FREITAS, E.G Influência da visitação pública de zoológicos no estresse da jaguatirica (Leopardus pardalis) em cativeiro. In: XXV CBZ, Brasília, Brasil. pp.223. WEHNELT, S.; HUDSON, C.; FELTNER, Y. & PEARSON, J Environmental enrichment for large felids at Chester Zoo. In: IV Annual Symposium on Zoo Research, Bristol, Reino Unido. p
6 WELLER, S.H. & BENNETT, C.L Twenty-four hour activity budgets and patterns of behavior in captive ocelots (Leopardus pardalis). Applied Animal Behavior Science 71 (1): WOOSTER, D.S Enrichment techniques for small felids at Woodland Park Zoo, Seattle. International Zoo Yearbook 35 (1): YOUNG, R. J Environmental Enrichment for Captive Animals. Oxford, Blackwell Science. 1 ed. 228 p. 6
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