Como é possível gerenciar a escassez de recursos naturais incentivando o consumo?

Transcrição

1 São Paulo, Ano II, n. 06, set./dez. de 2015 Como é possível gerenciar a escassez de recursos naturais incentivando o consumo?

2 A relação entre educação e gestão de recursos naturais: a posição da Igreja Católica sobre o tema Autor: Pe. José Ulisses Leva A doutrina espírita diante da sustentabilidade Autor: Alexandre Knesebeck São Paulo, Ano II, n. 06, set./dez. de

3 A relação entre educação e gestão de recursos naturais: a posição da Igreja Católica sobre o tema José Ulisses Leva 1 Introdução Se o consumo dos bens universais, como, por exemplo, a água, está presente na família, com seus hábitos e vícios, e na sociedade, com o marketing e supermercados com suas gôndolas cheias, qual é a sociedade que queremos e quais são nossas motivações em torná-la melhor? É fundamental, também, que a educação esteja visceralmente intrínseca nas famílias e nas escolas e universidades e, ainda, nas políticas públicas. Qual é o papel da família na formação dos seus pares? Qual é o papel das instituições escolares na educação dos seus alunos? Quais são o papel e o aparelhamento do Estado no gerenciamento dos recursos naturais? Como exigir do governo participação responsável e educativa para com a gestão dos recursos naturais? Como pensar a interação família escola Estado para responder aos problemas hodiernos? 1 Mestre em Teologia Dogmática pela Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção e doutor em História Eclesiástica pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma (Itália). Professor de História Eclesiástica na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. juleva@pucsp.br São Paulo, Ano II, n. 06, set./dez. de

4 Parceria família escola A família agrega valores e tem o papel de conscientizar os seus pares. A escola informa conhecimentos e educa os alunos agregando os valores trazidos e vivenciados pelas famílias. Qual é o papel da família e qual é o papel da escola na sociedade? Respondendo a essas indagações em dois artigos publicados recentemente, apresentei a família (LEVA, 2014c, p. 53; LEVA, 2014b, p. 146) como um canteiro para a promoção da vida e fomentação de valores, e a universidade (LEVA, 2014d, p. 215) como ambiente favorável para o diálogo e a sustentação dos valores perenes. Fundamentalmente devemos promover a parceria entre a família, primeiro núcleo agregador, e a escola, ambiente educacional, para maturar valores e conhecimento intelectual. Quando um e outro se mobilizam conjuntamente, a sociedade tende a refletir melhor as ansiedades e propor com critérios objetivos e sadios as valiosas resoluções. Resposta no Sion No ano de 2004, a Campanha da Fraternidade da Igreja Católica teve como tema Fraternidade e Água ( Houve mobilização e conscientização sobre o desperdício, a poluição dos mananciais e até um futuro sem água. Trabalhando no Colégio Sion, com a equipe do Projeto Fé e Vida, no Ensino Religioso, envolvemos toda a escola para falar sobre a água, sua necessidade vital e sua possível escassez. Falávamos com os alunos sobre o respeito que devemos ter para com o meio ambiente. Como deveríamos conciliar desenvolvimento e sustentabilidade e como usar adequadamente os recursos hídricos. Após uma década, vivemos e convivemos com o abastecimento de água comprometido. Os esforços não foram suficientes em 2004 para alertar sobre o perigo e a falta do precioso e vital líquido que move a humanidade? Buscamos uma parceria entre a Igreja Católica e o Colégio Sion para promover momentos reflexivos em torno do tema da água. Sentimos o quanto a parceria fez bem e o quanto ela é necessária para a continuidade da reflexão sobre a água e seu consumo. Portanto, se houver uma cadeia sincronizada na proteção do meio ambiente, no controle ao desmatamento desenfreado, no processo educativo e na parceira entre família e escola, sem dúvida alguma teremos uma corrente do bem em que toda a sociedade será beneficiada. Arquidiocese e o Vicariato Episcopal para a educação e a universidade O papa Francisco concedeu à Arquidiocese de São Paulo o Vicariato Episcopal (vicariatoeducacaouniversidade@gmail.com) para uma presença maior nas escolas e universidades. Com o propósito de aproximar mais a ação da Igreja em relação às escolas, colégios, faculdades e universidades, na Arquidiocese de São Paulo, criamos recentemente o Vicariato Episcopal para a educação e a universidade. Conforme o apelo insistente do papa Francisco, a Igreja precisa e quer ir ao encontro dos adolescentes e jovens nos lugares onde eles mais se encontram: nos ambientes escolares e acadêmicos (SCHERER, 2014). Quando a Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção retornou à Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo em 2009, buscamos os meios para alertar os puquianos sobre sustentabilidade, meio ambiente e consumo. Encontramos respostas quando firmamos parceria com os membros da PUC, professores e alunos, nas reflexões e no encaminhamento de soluções entre desenvolvimento e sustentabilidade. Ouvimos e lemos muito sobre essas palavras, mas não conseguimos ainda perceber seu alcance na sociedade. Quanto maior o consumismo e o desperdício, tanto pior a qualidade de vida para os seres humanos. Podemos também dizer, quanto maior a conscientização sobre os bens universais, tanto melhor nosso desenvolvimento sustentável. É interessante São Paulo, Ano II, n. 06, set./dez. de

5 notar como, hoje, [...] em clara visão de que a boa imagem da empresa, que trabalha além da mera obtenção de lucros, é positiva para os negócios (MARTINS, 2014, p. 32). Devemos buscar os mecanismos para tornar eficiente nossa presença na família, nas escolas e nas universidades. Não devemos trabalhar isoladamente, mas buscar recursos e possibilidades para juntos respondermos eficazmente aos anseios da sociedade. Precisamos consumir nossas forças para conscientizar que o desmesurado consumo traz consequências para a humanidade. A Arquidiocese de São Paulo está recrutando parcerias para tornar visível seu papel na cidade de São Paulo, somando esforços junto a todos que buscam respostas. Todas as organizações são necessárias para encaminhar propostas salutares para o bem comum. Essas propostas devem ser conhecidas e maturadas em parceria, seja com as famílias, seja com as instituições escolares e demais grupos que compõem nossa sociedade. De fato, educar é tarefa essencial de todos. Assim diz um dos objetivos do Vicariato Episcopal: Promover o diálogo entre religião e cultura e entre fé e ciência, bem como a educação para a caridade, a justiça e a solidariedade social. O papel do Estado O Estado tem papel fundamental na proposição de normas e leis para assegurar recursos preservando os bens naturais e universais e capacitar as pessoas no uso racional, coletivo e seguro dos bens preciosos. As políticas públicas devem proporcionar interesse na sociedade. Não deve haver especulação partidária ou interesses palacianos quanto aos bens universais. Em grande parte, o problema hídrico que estamos enfrentando no Brasil se dá por desqualificação no gerenciamento da res pública, pelo desmatamento desenfreado e financiado da Amazônia, pelo acelerado e desorganizado crescimento populacional em algumas áreas, sem nenhum planejamento urbano, pelo desaparecimento voluntário dos mananciais e matas ciliares, pelo não comprometimento da sustentabilidade do planeta. O não compromisso em formar adequadamente o amor à natureza e à obra universal da Criação descaracteriza o papel do Estado em assegurar os bens e recursos naturais. Conclusão A Revista Espaço Ética tem sido uma oportunidade para amadurecidas reflexões sobre educação, exercício da democracia, gestão dos recursos naturais e consumo consciente dos bens. Quanto à interrogação sobre a ética no consumo, afirmei que a universidade é um espaço favorável e um campo aberto para falar com os alunos sobre ética e consumo (LEVA, 2014a, p. 168). Reiterei a afirmação no artigo Gerir pessoas ao mencionar a eficácia em promover o ser humano para o bem da sociedade em que ele vive e atua (LEVA, 2014b, p ). Para que o sistema educacional no gerir e administrar os recursos naturais seja para todos e tenha um papel de transformação na sociedade, é preciso que ela seja entendida de forma comprometida e participe de uma parceria como um concatenar para o bem universal. Todos devem sentir-se atraídos para educar e formar os membros da sociedade, quer seja a família, a universidade, as escolas e o Estado, para o bem da coletividade. Referências bibliográficas LEVA, José Ulisses. Podemos falar de ética nas práticas de consumo? Revista Espaço Ética, São Paulo, ano 1, n. 1, p , jan./ abr. 2014a. São Paulo, Ano II, n. 06, set./dez. de

6 . Família: gerar e gerir pessoas. Revista Espaço Ética, São Paulo, ano 1, n. 2, p , maio/ago. 2014b.. Família: lugar privilegiado para evangelizar. Revista de Catequese, São Paulo, ano 37, n. 143, p , jan./jun. 2014c.. A universidade e o mundo contemporâneo. O Magistério da Igreja e o mundo contemporâneo. Revista de Cultura Teológica, ano XXII, n. 83, p , jan./jun. 2014d. MARTINS, Ives Gandra da Silva. Liberdade e economia. Revista Jurídica Consulex, ano XVIII, n. 418, p , 15 jun SCHERER, Odilo Pedro. Cardeal Arcebispo de São Paulo. Carta endereçada à Arquidiocese em 30 de julho de 2014 por ocasião da apresentação do Vicariato. Imagens: São Paulo, Ano II, n. 06, set./dez. de