O acesso a educação e autonomia económica. Quando o acesso a educação não se transforma em oportunidades económicas.
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- Nina Gorjão Regueira
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1 O acesso a educação e autonomia económica Quando o acesso a educação não se transforma em oportunidades económicas. Nota Introdutória O Objetivo de Desenvolvimento do Milénio (ODM) 3 Promover a Igualdade de Género e o Empoderamento das Mulheres, demostra a importância global da educação no que concerne a educação, sobretudo no que diz respeito a necessidade de alcançar em diversas realidades a paridade no acesso a educação formal. Subjacente a este facto, na atualidade a assunção dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) corrobora a importância da educação formal na autonomia das mulheres. O objetivo do presente trabalho é por um lado entender as relações existentes entre o acesso a educação e a autonomia económica das mulheres, assim como aprofundar nas razões que levam a que em alguns casos um maior acesso a educação não se transforme em maiores oportunidades económicas para as mulheres. Para tal o artigo, para além da nota introdutória e das conclusões contem: (i) Contextualização Educação e autonomia económica das mulheres; (ii) Análise da Situação Educação Universal e Paridade em Cabo Verde; (iii) Discussão Educação e Autonomia Económica Educação e autonomia económica das mulheres O acesso a educação formal é crucial na promoção da igualdade de género, no acesso ao emprego de qualidade e oportunidades económicas. Ao mesmo tempo auxilia no desenvolvimento de capacidades cognitivas e não cognitivas com impacto na capacidade de produção dos indivíduos. A literatura internacional evidência a relação entre o aumento da inversão em educação formal e o desenvolvimento social e económico dos países. Garantir o acesso a educação a mulheres e meninas é visto como um fator inseparável da autonomia das mulheres no que diz respeito a: (i) geração de renda e de recursos próprios, (ii) controle do seu próprio corpo e (iii) participação na tomada de decisões qua afetam a sua vida coletiva, dado que garante o exercício dos seus direitos em um contexto de plena igualdade. A geração de renda e de recursos próprios, concede a mulher a autonomia económica, esta se refere a capacidade de as mulheres serem provedoras do seu próprio sustento, e controlar os recursos dos quais elas dispõem de forma a poder beneficiar-se da melhor maneira dos mesmos. Apesar do aumento ao acesso a educação que se tem registado nos últimos anos e os esforços que se tem feito neste sentido, os dados sugerem, que as mulheres continuam a ver minadas as suas possibilidades de acesso a empregos de qualidade e oportunidades económicas dando-se uma crescente feminização da pobreza. 1
2 Educação Universal e Paridade em Cabo Verde - Análise da situação Desde o seu nascimento como nação independente, Cabo Verde, está engajado na promoção do desenvolvimento humano e na realização dos direitos humanos. No referente a promoção da igualdade de género na área de educação, o país atingiu a universalidade e paridade no acesso a educação primária na década de 90, com taxas líquidas de escolarização tanto para raparigas como rapazes de 96% até Contudo a situação que se vive atualmente é diferente com um aumento acentuado de disparidades fundamentalmente no que diz respeito ao acesso ao ensino básico. Os dados do Instituto Nacional de Estatísticas (INE), 1 indicam que em 2014 a taxa de alfabetização da população com 15 anos ou mais era de 86,5% e a taxa de alfabetização juvenil era de 97,8% com um fosso a desfavor dos rapazes (98,3% Feminino, 97,4% Masculino). O rácio entre o número de crianças em idade oficial para frequentar a escola primária /secundária que estão matriculados no ensino primário /secundário para a população total de crianças (Taxa Líquida de Escolarização) é maior no ensino primário que no secundário, sendo que no ensino primário esta taxa é maior para os rapazes (ficam mais meninas fora do sistema de ensino) e no ensino secundário esta a maior para as raparigas. Gráfico 1: Taxa líquida de escolarização (TLE) no ensino básico (%) ,3 97,7 94,2 92,3 91,6 89,5 96,4 F M / / / /2014 Fonte dados: Mulheres e Homens em Cabo Verde Factos e Números 2015 A leitura evolutiva dos dados referente a taxa líquida de escolarização no ensino básico nos sugere: 1) Decréscimo 8,5% TLE de raparigas no ensino básico e um aumento de 4,1% TLE de rapazes, entre 2010 e 2014; 2) Em 2014 o fosse de género entre raparigas e rapazes era de 6,9% a desfavor das raparigas no ensino primários; 3) A desigualdade entre meninas e meninos tem aumentado nos últimos anos, o cálculo do ICF 2 para 2014 era de 0,93 apesar de ser considerado aceitável estava, muito aquém da meta estabelecida pelos ODM que era de 0,96. 1 Mulheres e Homens em Cabo Verde Factos e Números 2015: IN: Instituto Nacional de Estatísticas de Cabo Verde. 2 O índice da Condição Feminina, exprime uma relação de proporcionalidade em razão do sexo, ou seja o fosso entre a posição dos homens e das mulheres. Calcula-se dividindo o numero absoluto ou % do dado relativo às mulheres pelo dos homens, mas se o indicador é negativo, como por exemplo morte de mulheres a operação inverte-se. A escala classificativa do Índice vai de 0 a 1, sendo que 1 significa igualdade e os valores inferior a 1 apontam para uma situação de desigualdade em desfavor das mulheres. Quando o índice 2
3 Ao analisar os dados referentes ao período para o ensino secundário verifica-se uma situação oposta ao caso anterior. A taxa líquida de escolarização para o ensino secundário é maior entre as raparigas que entre os rapazes. Em 2014 o fosso de género entre raparigas e rapazes era de 9,2% a desfavor dos rapazes. Cabe ressaltar que o fosso de género a desfavor dos rapazes tem vindo a diminuir dado que em 2010 a TLE de rapazes para o ensino secundário era de 62,5% e em 2014 era de 65,6%, mostrando uma evolução positiva. Outro dos indicadores de educação que estão profundamente relacionados com a autonomia económica das mulheres dado que poderiam indicar um maior acesso a emprego de qualidade é o rácio feminino /masculino no ensino superior, os dados indicam que no letivo 2011/2012 haviam mulheres frequentando universidades públicas ou privadas em Cabo Verde, frente a homens. Gráfico 2: Evolução do rácio feminino / masculino por nível de ensino ,11 1, ,17 1,34 Ensino superior -ICF Ensino secundário ICF ,17 1,64 1 1,2 1,4 1,6 Fonte: dados administrativos do MED 1) O acesso ao nível de ensino superior era mais elevado em mulheres do que em homens, com um ICF de 1,41 em 2012, situação que desfavorece os homens; 2) O ICF teve uma evolução positiva de 2010 a 2012 o que indica que a situação de acesso aos homens melhorou; 3) Se nota também uma diminuição das disparidades no acesso ao ensino secundário, passando de um ICF de 1,17 em 2010 a 1,11 em Os dados de uma forma geral indicam que a situação da mulher no referente ao acesso a educação tem vindo a ter uma evolução positiva, demostrando o crescente empoderamento da mulher em Cabo Verde. Contudo os dados sugerem que é necessário ter uma maior atenção a nível de planificação e da agenda política no que diz respeito ao acesso de meninas a educação primária. Discussão Educação e Autonomia Económica Existe um pressuposto de que, uma melhoria no nível de educação das mulheres garante o acesso ao mercado de trabalho e ao emprego de qualidade. Contudo os dados existentes sugerem que as mulheres apesar dos avanços conseguidos em matéria de educação continuam a ter maiores é superior a 1 significa que o desequilíbrio é em desfavor aos homens. Para classificar o valor do ICF, pode-se avaliar o índice de acordo com a seguinte escala: aceitável (entre 1 e 0,91), Médio (entre 0, 90 e 0,81), Baixo (entre 0,80 e 0,61), Muito Baixo (entre 0,60 e 0,41) e Critico (entre 0,40 e 0). Fonte: Relatório IDISA Cabo Verde O cálculo do ICF adota as recomendações técnicas divulgadas no Índice Africano de Desenvolvimento e de Género (Adis Abeba, 2004). 3
4 dificuldades a aceder empregos de qualidade independentemente do seu nível de ensino. Em Cabo Verde apesar do o acesso a níveis de ensino superiores ser maior entre mulheres que entre homens, tendência que se desenha desde o ensino secundário, a proporção de mulheres desempregadas com formação pós-secundária é maior. Gráfico 3: Taxa de desemprego (%), desagregados por sexo e nível de instrução, IMC 2014 Feminino Masculino Ambos 7,7 9 8,3 10,3 15,8 13,5 21,8 21,3 19,8 15,6 16,316,4 14,4 15,1 9 Sem nível Primário Secundário Pós-Secundário Total Fonte: Fonte:Elaborado com base nos dados produzidos pelo INE, IMC 2014 A análise dos dados referentes taxa de desemprego segundo os níveis de instrução desagregados por sexo, mostram que desemprego entre mulheres no geral é menor (15,1% nas mulheres frente a 16,3% nos homens), em Cabo Verde, contudo uma leitura mais aprofundada nos dão as seguintes informações: 1) A proporção de mulheres no desemprego com níveis mais elevados de escolaridade, é maior do que a dos homens: níveis de pós-secundário o desemprego afeta a cerca de 14,4% das mulheres, enquanto só afeta a 9% dos homens, o que se reflete em ICF de 1,6 a desfavor das mulheres; 2) O fosso de género referentes a taxa de desemprego em pessoas com um nível de estudos pós-secundário é de 5,4% a desfavor das mulheres; 3) A taxa de desemprego é maior, quanto maior é o nível de instrução independentemente do sexo biológico: 8,3% em pessoas sem nível de instrução, e 15,6% em pessoas com póssecundário; 4) O grupo mais afetado pelo desemprego é o que tem nível de educação secundária para ambos os sexos; 5) A menor taxa de desemprego se da em mulheres sem nível de instrução e a maior em mulheres com nível secundário de instrução. Os dados ilustram que a melhoria no nível de educação das mulheres por si só, pode não resultar em um maior acesso ao mercado de trabalho e ao emprego de qualidade. Várias são as questões que podem ser exploradas e que explicariam as causas das dificuldades que as mulheres encontram na hora de aceder ao mercado de trabalho nacional, as análises de dados estatísticos auxiliam na compreensão da problemática. A análise dos dados referentes aos nichos de emprego, indicam uma clara masculinização de certas profissões e feminização de outras, com fossos importantes no que se refere a profissões que exigem qualificação técnica, nomeadamente: (i) no grupo de legisladores, executivos ( ) nota-se um fosso de 21,8% a desfavor das mulheres ou (ii) o facto de que apesar dos dados 4
5 existentes o número de docentes do sexo masculino (826) é quase o dobro que docentes do sexo feminino (490). Outro dos fatores que cimentam as desigualdades entre homens e mulheres no que concerne a autonomia económica é o principal meio de vida. Segundo os dados divulgados no relatório de Cabo Verde Beinjing + 20, cerca de 51% dos homens tem como principal meio de vida o trabalho frente a 35% das mulheres. Este dado tem muita uma profunda conexão com a inatividade das mulheres em Cabo Verde. Segundo dados do INE, a população feminina representa a maioria da população inativa do país, cerca de são inativas frente a Em 2014 a taxa de participação da mulher na força de trabalho era de 51,2% do total de mulheres em idade ativa e a dos homens de 65%, indicando um fosso de género é de 13,8% a desfavor das mulheres. Os motivos para não se ser considerado(a) população ativa no âmbito de um inquérito ao emprego, estão as responsabilidades familiares: de acordo com os dados do Censo 2010, 22,5% das mulheres referem ser esse o principal fator que limita a sua entrada no mercado de trabalho, o que acontece com cerca de 4% dos homens. As responsabilidades familiares estão profundamente ligadas ao trabalho não remunerado (TNR). 3 A taxa de participação das mulheres no TNR em 2012 era de 90,3% enquanto que a dos homens era de 72,6%. 4 A falta de partilha das responsabilidades relacionadas ao TNR entre homens e mulheres, e entre o Estado e as famílias, limita grandemente as oportunidades de desenvolvimento das mulheres. A importante segregação de género em relação às atividades profissionais e que muitos dos nichos de emprego feminino não são necessariamente rentáveis, a alta taxa de inatividade das mulheres e o facto de que só 35% das mulheres tinha como principal meio de vida o trabalho remunerado, podem estar na base das persistentes desigualdades de oportunidades económicas para as mulheres e consequentemente na feminização da pobreza no país. Conclusões Cabo Verde é um exemplo claro de que somente a inversão e um maior acesso a educação não se materializam em um maior acesso ao mercado de trabalho e a emprego de qualidade. Os dados sobre desemprego indicam que, a maiores níveis de instrução maior é a taxa de desemprego, atingindo maioritariamente as mulheres. O facto de que o acesso a educação não garanta o acesso ao mercado de trabalho como evidenciado pelos dados 14,4 % dos desempregados com ensino pós-secundário e 21,8% com ensino secundário - mostram que as políticas publicas tem falhado no sentido de assegurar e garantir melhores oportunidades 3 TNR: compreende o conjunto de trabalhos integrados no trabalho doméstico familiar, cuidados infantis, cuidados a dependentes ou doentes que se realize para o próprio agregado familiar, e ainda trabalho voluntário na comunidade e de apoio prestado a outros agregados familiares, que se realiza de forma gratuita; IN: INE - Mulheres e Homens em Cabo Verde Factos e Números Inquérito Multiobjectivo 2012 Relatório do Módulo Uso do Tempo e Trabalho Não Remunerado em Cabo Verde 5
6 económicas para as mulheres. A alta segregação por sexo dos nichos de trabalho, com o agravante de que os nichos ocupados por mulheres não são sempre os mais rentáveis agudizam a situação de vulnerabilidade das mulheres, assim como as empurra para a pobreza (segundo dados do INE no ano 2007 em Cabo Verde 56,3% das pessoas vivendo abaixo do limiar da pobreza eram mulheres). A divisão sexual do trabalho é outra das esferas onde se identificam profundas desigualdades entre mulheres e homens, esta condiciona o pleno desenvolvimento da mulher na esfera económica dado que de acordo com os dados do Censo 2010, 22,5% das mulheres referem ser esse o principal fator que limita a sua entrada no mercado de trabalho, o que acontece com cerca de 4% dos homens. Segundo o Relatório para Cabo Verde Beijing + 20 Os dados do inquérito sobre o Uso do Tempo (2012) confirmam que as relações de género existentes transferem o grande peso do trabalho não remunerado para as mulheres: estas participam mais do que os homens no trabalho não remunerado (56% versus 44%). Várias são as razões que levam a que as mulheres sejam privadas de um total acesso ao mercado de trabalho como visto no decorrer do artigo, pelo que para garantir a plena igualdade entre mulheres e homens, os exercícios de planificação assim como os fazedores de políticas públicas devem estar conscientes de que as desigualdades de género têm sim, sido forjadas com base no sexo biológico, e que a transmissão das mesmas não é tarefa do acaso, mas sim que são transmitidas culturalmente, através de párticas sociais, familiares, mas também através de diversas práticas institucionais. 6
7 Bibliografia - Concluding observations on the combined seventh and eighthobservações finais sobre o relatório periódico combinado (sétimo e oitavo) Cabo Verde, Comité para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, 2013; - Empowering African Women: An Agenda for Action - GENDER EQUALITY INDEX 2015, African Development Bank 2015; - INE Feminino e Masculino e Questões de Género: Uma leitura com base no recenseamento geral da população e habitação Inquérito Multiobjectivo Contínuo 2014 Estatísticas das famílias e Condições de Vida. - Inquérito Multiobjectivo Contínuo 2014 Estatísticas de Emprego e Mercado de Trabalho; - Inquérito Multiobjectivo 2012 Relatório do Módulo Uso do Tempo e Trabalho Não Remunerado em Cabo Verde. - Relatório para Cabo Verde Beijing +20, Mujeres e desarrollo: Entender la pobreza desde una perspetiva de género, CEPAL-UNIFEM República de Italia Santiago de Chile, enero de 2004; - Plano Nacional para a igualdade e equidade de género: Relatório de avaliação e actualização; Instituto Cabo-verdiano para igualdade e equidade de género; Praia, Junho 2008; Mulheres e Homens em Cabo Verde Factos e Número; Instituto Nacional de Estatísticas de Cabo Verde, 2015; 7
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