Avaliação antropométrica dos adolescentes da cidade de Registro no Vale do Ribeira (SP)

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1 ARTIGO ORIGINAL 29 Lorenza Oliveira Testa Carvalho 1 Gislene dos Anjos Tamasia 2 Avaliação antropométrica dos adolescentes da cidade de Registro no Vale do Ribeira (SP) Adolescents' anthropometric assessment at the Registro city in the Vale do Ribeira (SP) RESUMO Objetivo: Estudo transversal com o objetivo de avaliar o estado nutricional de adolescentes de 10 a 13 anos de idade usuários das escolas situadas em Registro (Vale do Ribeira), SP. Métodos: As medidas antropométricas realizadas foram a massa corporal e a estatura. A avaliação do estado nutricional foi realizada por meio dos escores Z dos índices antropométricos de estatura/idade e índice de massa corporal de acordo com a idade. Resultados: O estudo totalizou 101 adolescentes, e podese observar que apenas 46 (45,5%) encontravam-se dentro do esperado (eutrofia), enquanto que o restante apresentava diagnósticos de sobrepeso, obesidade, desnutrição, risco nutricional e déficit de estatura. Conclusão: Diante desse cenário, torna-se essencial uma investigação social, econômica e cultural para melhor direcionar uma intervenção nutricional para esta faixa etária. PALAVRAS-CHAVE Adolescente, estatura, desnutrição, obesidade. ABSTRACT Objective: Cross-sectional study assessing the nutritional status of adolescents between 10 and 13 years old in schools at Registro, Vale do Ribeira. São Paulo State. Methods: Anthropometric measurements (body mass and height) were taken and nutritional status was evaluated through the height-for-age and Body Mass Index (BMI) for age Z-scores. Results: Out of 101 adolescents, only 46 (45.5%) were within the expected (eutrophic) range, while the rest presented diagnoses of overweight, obesity, malnutrition, nutritional risk and stunting. Conclusion: In view of this situation, social, economic and cultural analysis are required to ensure more accurately-targeted nutritional interventions for this age bracket. KEY WORDS Adolescent, body height, malnutrition, obesity. 1 Mestrado no Departamento de Pediatria e Ciências aplicadas à Pediatria, Disciplina de Nefrologia Pediátrica - Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Doutoranda (Pesquisadora), Departamento de Fisiologia, Disciplina de Fisiologia da Nutrição - Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). São Paulo, SP, Brasil. 2 Mestrado no Departamento de Nutrição, Disciplina de Nutrição em Saúde Pública - Universidade de São Paulo/Faculdade de Saúde Pública (USP). Nutricionista da Atenção Básica do Município de Registro, Vale do Ribeira, São Paulo. Professora desde 2012 da União das Instituições de Serviço, Ensino e Pesquisa (UNISEPE) no Vale do Ribeira. Saúde Pública. São Paulo, SP, Brasil. Lorenza Oliveira Testa Carvalho (lorenzatesta@hotmail.com) - Rua Ararapira, 320, apartamento 44, Planalto Paulista. São Paulo, SP, Brasil. CEP: Recebido em 07/06/2015 Aprovado em 06/07/2015

2 30 AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA DOS ADOLESCENTES Carvalho e Tamasia INTRODUÇÃO A adolescência é o período de transição entre a infância e a vida adulta, compreendendo a idade de 10 a 19 anos e 11 meses 1. Esse período é marcado pela aceleração de crescimento e, consequentemente, pelo aumento das necessidades de energia e, em geral, de todos os nutrientes. Com essas modificações corporais importantes, adolescentes tornam-se particularmente susceptíveis a excessos, carências e desequilíbrios nutricionais 2. O excesso de peso na fase da adolescência tornou-se relevante nas últimas décadas. A comparação entre dois grandes estudos nacionais permitiu a visualização desse aumento expressivo, quando se comparou, em 1989, os dados da Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição com uma prevalência de 7,6% de sobrepeso entre os adolescentes, sendo maior no sexo feminino, 10,5% 3 e a Pesquisa de Orçamentos Familiares - POF , que apontou 20,5% de sobrepeso e 4,9% de obesidade entre os adolescentes, sendo maior no sexo masculino 4. Como consequência desse aumento na prevalência do sobrepeso/obesidade entre adolescentes, já é possível encontrar alterações metabólicas características do excesso de peso. A associação entre obesidade e dislipidemia observada em adultos também tem sido documentada em crianças e adolescentes 5, 6. Somando-se a isso, a relação entre baixa estatura na infância e adolescência e risco de obesidade tem sido mencionada na literatura c i e n t í fi c a 7. A fase da adolescência, especificamente o final desse período, influencia diretamente o estado nutricional futuro. Sendo assim, os adolescentes tornam-se um grupo relevante em termos de saúde pública, o que torna estratégica a promoção de saúde e prevenção de doenças nessa fase 8. O levantamento nutricional desses indivíduos, por meio da avaliação antropométrica, não somente possibilita o acompanhamento e monitoramento do estado nutricional desses jovens, como também propicia o conhecimento dos fatores determinantes de agravos nutricionais e suas consequências na saúde desta população 9. OBJETIVO Diante do exposto, esse trabalho teve como objetivo avaliar o estado nutricional dos adolescentes de 10 a 13 anos de idade da rede pública de ensino, por meio da utilização das medidas antropométricas. MÉTODOS O estudo apresentou delineamento transversal com inclusão dos adolescentes na faixa etária entre 10 e 13 anos, usuários de escolas situadas em Registro (SP), no Vale do Ribeira em outubro de As medidas antropométricas utilizadas foram a massa corporal e a estatura e foram realizadas de acordo com as técnicas e equipamentos padronizados 10, 11. Para a avaliação do estado nutricional, utilizou-se o escore Z (esc Z) dos índices antropométricos de Estatura/Idade (E/I) e Índice de Massa Corpórea (IMC) 12, 13. Os adolescentes em que o menor valor dos escores (esc) Z encontrava-se de -2 a menor que -1 (-2 <esc Z < -1) foram classificados como em risco nutricional e de -1 a menor que +1 (-1 <esc Z < +1) como em estado de eutrofia. Aqueles que apresentavam o esc Z inferior a -2 foram classificados como em desnutrição energético-proteica. Ainda em relação à classificação de desnutrição mencionada, os adolescentes foram considerados com déficit de peso (esc Z de IMC inferior a -2) ou déficit de estatura (esc Z E/I inferior a -2). Foram classificados como sobrepeso aqueles adolescentes com esc Z IMC de +1 a menor que

3 Carvalho e Tamasia AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA DOS ADOLESCENTES (+1 <esc Z < +2) e obesidade aqueles com esc Z IMC igual a, ou maior que +2. Os adolescentes que apresentavam todos os esc Z dos índices antropométricos entre -1 e +1 foram classificados como adequados nutricionalmente e aqueles que apresentavam qualquer um, ou mais, destes índices fora deste intervalo foram classificados como inadequados nutricionalmente 12,13. Para o cálculo amostral do estudo, considerou-se um total de adolescentes de escolas do município de Registro e 95% de confiança, com uma prevalência de 5% e um erro de 5%. Assim foi determinada uma amostra de 101 adolescentes, corrigida pela população finita e estratificada entre as escolas. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Estadual Paulista (UNESP)/Faculdade de Medicina de Botucatu, protocolo CEP O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido também foi aprovado por esse Comitê. Todas as mães ou responsáveis permitiram a participação dos adolescentes no estudo e assinaram o termo mencionado. RESULTADOS O estudo totalizou 101 adolescentes, de acordo com a amostra determinada pelo cálculo amostral (3.329 adolescentes), sendo que 53 (52,5%) eram do gênero feminino (Figura 1). Pode-se observar que mais da metade dos adolescentes (54,5%) encontravam-se inadequados nutricionalmente quando avaliados pelos índices antropométricos de IMC e E/I (Figura 2). Ainda entre esses adolescentes, podem-se observar as classificações nutricionais abaixo (Figura 3). Figura 1. Distribuição dos adolescentes de acordo com gênero. 52,5% (N=53) 47,5% (N=48) Meninas Meninos

4 32 AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA DOS ADOLESCENTES Carvalho e Tamasia Figura 2. Distribuição dos adolescentes de acordo com a adequação nutricional. 54,5% (N=55) 45,5% (N=46) Inadequado Nutricionalmente Adequado Nutricionalmente Figura 3. Classificação dos adolescentes de acordo com o estado nutricional.

5 Carvalho e Tamasia AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA DOS ADOLESCENTES 33 DISCUSSÃO A cidade de Registro (região do Vale do Ribeira), avaliada no presente estudo, está a 187 km da capital, São Paulo. A cidade apresenta como atividades econômicas: agricultura, pecuária, indústria de beneficiamento e comércio. Atualmente, possui habitantes, sendo 88,8% de área urbana e 11,2% de área rural, com uma área territorial de 716,33 km2, dos quais 10,96% correspondem à área urbana. A taxa de mortalidade na infância (menores de 5 anos) em Registro, no ano de 2011, foi de 11,16 por mil nascidos vivos 14. O Índice Paulista de Responsabilidade Social (IPRS), criado pela Fundação SEADE, em 2010, classifica o padrão de desenvolvimento dos municípios a partir de indicadores de renda, escolaridade e longevidade, sendo o melhor nível classificado como Grupo 1 e o pior como 5. A cidade de Registro encontra-se no Grupo 4, o que indica que é um município com baixo nível de riqueza e nível intermediário de longevidade e/ou escolaridade 15. Esse cenário social e econômico desfavorável reflete no estado nutricional entre os adolescentes, uma vez que mais da metade dos adolescentes avaliados (54,5%) encontravam-se inadequados nutricionalmente, quando avaliados pelos índices antropométricos de IMC e E/I, o que reflete um comprometimento direto do peso e/ou estatura nessa importante fase da vida, com destaque para os diagnósticos de sobrepeso e obesidade, cada vez mais comuns no Brasil e no exterior. Em um estudo que avaliou a prevalência de sobrepeso e obesidade em escolares residentes em um município de grande porte na região centro-oeste do estado de São Paulo, observou-se que, em relação ao peso corpóreo, 55,93% apresentaram resultado normal, 35,59% baixo peso e 8,47% eram portadores de sobrepeso, nas escolas particulares. Nas escolas públicas, 52,03% apresentaram resultado normal, baixo peso 41,22%, sobrepeso 4,73% e obesos 2,03% 16. Já entre 218 adolescentes do Recôncavo da Bahia, com idade entre 10 e 19 anos, um estudo verificou uma prevalência de 25,2% de excesso de peso, sendo que 55% dos adolescentes relataram consumir alimentos ricos em açúcares e gorduras, como doces, salgadinhos, refrigerantes, guloseimas e frituras cinco ou mais vezes por semana 17. Esse dado de excesso de peso (25,2%) encontrou-se similar ao presente estudo que encontrou 22,8% quando se considerou os adolescentes portadores de sobrepeso e obesidade. Em Mthatha, na África do Sul, em um estudo com adolescentes com idade entre 13 e 17 anos de idade, a prevalência geral de obesidade foi de 20,4%, enquanto a prevalência de hipertensão e pré-hipertensão foi de 21,2% e 12,3%, respectivamente. A prevalência de hipertensão e pré-hipertensão em sexo masculino foi de 22,0% e de 13,6% em comparação com 20,9% e 16,5% no sexo feminino, respectivamente. Ambas as condições foram associadas com maior IMC nos dois gêneros 18. Em Shanghai, na China, um estudo observou uma prevalência alta de sobrepeso e obesidade entre crianças e adolescentes, tanto em cidades desenvolvidas quanto em migrantes das áreas urbanas para rurais, e concluiu-se que o estilo de vida, os hábitos alimentares e fatores psicológicos apresentaram importante contribuição para aumentar ou diminuir o risco de obesidade 19. Ainda com relação ao excesso de peso, um estudo com adolescentes mexicanos, com idade entre 12 e 14 anos e diagnósticos de eutrofia, sobrepeso e obesidade pelo IMC, concluiu que aqueles com sobrepeso e obesidade apresentaram elevadas concentrações séricas de biomarcadores que têm sido associados ao desenvolvimento de doenças crônicas em adultos 20. Como limitações deste estudo tem-se a transversalidade dos dados, o que impossibilitou uma inferência casual. Portanto, sugere-se o desenvolvimento de novos estudos, através do acompanhamento por maior período, a fim de esclarecer as multicausalidades das alterações nu-

6 34 AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA DOS ADOLESCENTES Carvalho e Tamasia tricionais encontradas, como análise da influência genética, comportamental e socioeconômica. CONCLUSÃO econômico e cultural para melhor direcionar uma intervenção nutricional nas escolas municipais e estaduais da cidade de Registro no Vale do Ribeira (SP). Diante do cenário da fase da adolescência de intensa transformação física, mental, emocional, sexual e social e das consequentes inadequações antropométricas na população de adolescentes estudada, conclui-se que existe uma necessidade de investigação do cenário social, NOTA As autoras a agradecem à direção das escolas e às mães, que gentilmente permitiram a realização deste estudo e demonstraram interesse acerca do estado nutricional dos adolescentes. REFERÊNCIAS 1. Eisenstein E. Adolescência: definições, conceitos e critérios. Adolesc Saude. 2005;2(2): Otten JJ, Hellwig JP, Meyers LD. Dietary Reference Intakes: the essential guide to nutrient requirements. Washington: The National Academies Press; Neutzling MB. Sobrepeso em adolescentes brasileiros Brasil, PNSN [tese]. São Paulo: Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo; Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de orçamentos familiares (POF) : antropometria e estado nutricional de crianças, adolescentes e adultos no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; Faria ER, Franceschini SCC, Pelúzio MCG, Priore SE. Estado nutricional e dislipidemias de acordo com o sexo em adolescentes atendidos em um programa específico de Viçosa, MG. Rev Bras Nut Clin. 2006;21: Steinberg J, Daniels SR. Obesity, insulin resistance, diabetes and cardiovascular risk in children. An American Heart Association Scientific Statement from the atherosclerosis, hypertension, and obesity in the young Committee (Council on cardiovascular disease in the young) and the Diabetes Committee (Council on nutrition, physical activity and metabolism). Circulation. 2003;107: Fonseca VM, Sichieri R, Veiga GV. Fatores associados à obesidade em adolescentes. Rev Saude Publica. 1998;32(6): Oliveira RMS, Franceschini SCC, Rosado GP, Priore SE. Estado nutricional no fi nal da adolescência como fator determinante da situação nutricional na vida adulta de indivíduos do sexo masculino em Viçosa, MG. Adolesc Saude. 2008;5(1): Lourenço AM, Taquette SR, Hasselmann MH. Avaliação nutricional: antropometria e conduta nutricional na adolescência. Adolesc Saude. 2011;8(1): Gordon CC, Chumlea AWC, Roche AF. Stature, recumbent length and weight. In: Lohman TG, editor. Anthropometric standardization reference manual. Champaign: Human Kinetics; p Jelliffe DB. Evaluacióndel estado de nutrición de lacomunidad. (Evaluation of nutritional status the communities) Genebra, IL: Organización Mundial de La Salud (World Health Organization); World Health Organization. WHO Child Growth Standards: Length/height-for-age, weight-for-age, weightfor-length, weight-for-height and body mass index-for-age. Methods and development. WHO (nonserial publication). Geneva, Switzerland: WHO; de Onis M, Onyango AW, Borghi E, Siyam A, Nishida C, Siekmann J. Development of a WHO growth reference for school-aged children and adolescents. Bull World Health Organ. 2007;85(9):660-7.

7 Carvalho e Tamasia AVALIAÇÃO ANTROPOMÉTRICA DOS ADOLESCENTES Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. Perfil Municipal de Registro [Internet] [citado 2013 set 11]. Disponível em: php 15. Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. O Índice paulista de responsabilidade social IPRS [Internet] [citado 2013 Set 11]. Disponível em: iprs/pdf/oiprs.pdf 16. Sales-Peres SH, Goya S, Sant'Anna RM, Silva HM, Sales-Peres AC, Silva RPR, et al. Prevalência de sobrepeso e obesidade e fatores associados em adolescentes na região centro-oeste do estado de São Paulo (SP, Brasil). Cien Saude Colet. 2010;15(Suppl 2): Facina VB, Braga JGL. Perfil antropométrico de adolescentes do Recôncavo da Bahia. Rev Cienc Ext. 2013;9(3): Nkeh-Chungag BN, Sekokotla AM, Sewani-Rusike C, Namugowa A, Iputo JE. Prevalence of hypertension and pre-hypertension in year old adolescents living in Mthatha - South Africa: a cross-sectional study. Cent Eur J Public Health. 2015;23(1): Lu JK, Yin XJ, Xiong JP, Liu JJ, Watanabe T, Tanaka T. Comparison of the status of overweight/obesity among the youth of local Shanghai, young rural-to-urban migrants and immigrant origin areas. Int J ClinExp Med. 2015;15:8(2): McFarlin BK, Johnson CA, Moreno JP, Foreyt JP. Mexican American children have differential elevation of metabolic biomarkers proportional to obesity status. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2013;57(6):