PODER JUDICIÁRIO FEDERAL JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 1ª REGIÃO

Transcrição

1 PRESCRIÇÃO FUNDIÁRIA DECISÃO PROFERIDA PELO STF NO RE MODULAÇÃO DOS EFEITOS I Em 13 novembro de 2014 o Supremo Tribunal Federal proferiu acórdão no recurso extraordinário nº em que expunha seu novo entendimento de que a prescrição aplicável às parcelas de FGTS incide a prescrição estipulada no art. 7º, XXIX, da Constituição da República (de 5 anos), e não aquela prevista nos arts. 23, 5º, da Lei nº 8.036/90 e 55 do Decreto nº /90 (de 30 anos). O Pretório Excelso, no entanto, modulou os efeitos da decisão, de modo a obstar a súbita consumação da prescrição de parcelas que trabalhadores poderiam ainda reivindicar judicialmente. II No caso vertente, o término do contrato de trabalho havido entre autor e ré e o ajuizamento da presente demanda ocorreram ambos antes do julgamento do recurso extraordinário. Assim, é aplicável às parcelas de FGTS pedidas a prescrição trintenária, e não a quinquenal. III Recurso conhecido e provido. Vistos estes autos de Recurso Ordinário em que figura como recorrente DANIEL MORAES SILVA e, como recorrida, SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DO RIO DE JANEIRO. R E L A T Ó R I O Em 18/11/2015, o MM. Juízo da 32ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, por meio da r. sentença de fls. 123/127, integrada pela r. decisão de fls. 131, ambas da lavra da Exma. Juíza Marta Verônica Borges Vieira, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados por Daniel Moraes Silva em face de Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro, para reconhecer o

2 vínculo de emprego noticiado na petição inicial e condenar a parte ré a anotar o liame na CTPS da demandante, bem como ao pagamento das seguintes parcelas: aviso prévio, férias acrescidas do terço constitucional, décimos terceiros salários, diferenças salariais, depósitos fundiários e multa de 40% respectiva, adicional por tempo de serviço, vales-transporte, salário-família, abono anual, e adicional de produtividade. Inconformada, a parte autora interpôs recurso ordinário fls Assevera, no mérito, que a prescrição aplicável às parcelas fundiárias pretendidas é trintenária. Afirma, ainda, que faz jus a adicional de insalubridade em grau máximo. Por fim, salienta que, reconhecido o vínculo empregatício, é mister do julgador estipular um salário inicial. Contrarrazões às fls. 140, sem arguições preliminares. Deixei de dar vista ao douto Ministério Público do Trabalho, por não se tratar de hipótese que o Parquet entenda justificar sua intervenção, conforme relação constante no Anexo ao Ofício PRT/1ª Reg. nº 27/08 GAB, de , em consonância com o disposto no Provimento nº 01/2005, da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho. V O T O Admissibilidade Conheço do recurso ordinário interposto pela parte autora, por tempestivo (fls. 132 e 133) e subscrito por advogado regularmente constituído nos autos (fls. 06 e 136). Inexigível da recorrente o recolhimento das custas processuais, por ser da parte ré a sucumbência apta a gerar tal encargo. Questões meritórias Prescrição fundiária A parte autora, ora recorrente, sustenta ser aplicável às parcelas de FGTS pretendidas a prescrição trintenária, e não a quinquenal, porque esta ação fora ajuizada antes da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal quanto à matéria. Diz que, quando do advento dessa decisão, já possuía 8 anos sem nenhum depósito fundiário, e defende que para ações aforadas até novembro de 2014 deve ser mantida a prescrição trintenária. Invoca, em seu auxílio, ainda, um acórdão proferido pelo Tribunal Superior do Trabalho que respalda sua tese. Com o julgamento do recurso extraordinário com agravo nº

3 pelo Supremo Tribunal Federal, em 13/11/2014, a prescrição aplicável às parcelas devidas ao FGTS passou a ser quinquenal, e não mais trintenária, como previam a Lei nº 8.036/90 e o Decreto nº /90 (referido por Regulamento do FGTS). Para isso, o STF declarou inconstitucionais o 5º do art. 23 da lei e o art. 55 do regulamento. A ementa do acórdão resultante é a seguinte: Recurso extraordinário. Direito do Trabalho. Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Cobrança de valores não pagos. Prazo prescricional. Prescrição quinquenal. Art. 7º, XXIX, da Constituição. Superação de entendimento anterior sobre prescrição trintenária. Inconstitucionalidade dos arts. 23, 5º, da Lei 8.036/1990 e 55 do Regulamento do FGTS aprovado pelo Decreto /1990. Segurança jurídica. Necessidade de modulação dos efeitos da decisão. Art. 27 da Lei 9.868/1999. Declaração de inconstitucionalidade com efeitos ex nunc. Recurso extraordinário a que se nega provimento. Na fundamentação do voto condutor, proferido pelo douto ministro Gilmar Mendes, foi proposta a modulação dos efeitos da decisão, na forma que segue: A modulação que se propõe consiste em atribuir à presente decisão efeitos ex nunc (prospectivos). Dessa forma, para aqueles cujo termo inicial da prescrição ocorra após a data do presente julgamento, aplica-se, desde logo, o prazo de cinco anos. Por outro lado, para os casos em que o prazo prescricional já esteja em curso, aplica-se o que ocorrer primeiro: 30 anos, contados do termo inicial, ou 5 anos, a partir desta decisão. Assim, se, na presente data, já tenham transcorrido 27 anos do prazo prescricional, bastarão mais 3 anos para que se opere a prescrição, com base na jurisprudência desta Corte até então vigente. Por outro lado, se na data desta decisão tiverem decorrido 23 anos do prazo prescricional, ao caso se aplicará o novo prazo de 5 anos, a contar da data do presente julgamento. Por sua vez, o acórdão ficou redigido destarte: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os

4 Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a presidência do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, decidir o tema 608 da Repercussão Geral, por maioria, negar provimento ao recurso, também por maioria declarar a inconstitucionalidade do art. 23, 5º, da Lei nº 8.036/1990, e do art. 55 do Decreto nº /1990, na parte em que ressalvam o 'privilégio do FGTS à prescrição trintenária', haja vista violarem o disposto no art. 7º, XXIX, da Carta de Quanto à modulação, o Tribunal, por maioria, atribuiu à decisão efeitos ex nunc, nos termos do voto do relator, ministro Gilmar Mendes. Brasília, 13 de novembro de Ocorre que a prescrição trintenária das parcelas de FGTS, mesmo antes do julgamento do ARE suprarreferido, só era aplicável aos casos em que se pedia, de forma autônoma, a condenação da ré aos recolhimentos fundiários não tempestivamente feitos, independentemente de pedidos relativos a outras verbas quaisquer. Ou seja, a prescrição de trinta anos só incidia sobre depósitos fundiários reclamados como um pedido autônomo, e não quando eles decorriam do reflexo da condenação ao pagamento de outras verbas. Neste último caso, deve-se aplicar não a Súmula nº 362, mas a nº 206 igualmente editada pelo Tribunal Superior do Trabalho, que assim reza, in verbis: FGTS. INCIDÊNCIA SOBRE PARCELAS PRESCRITAS (nova redação) Res. 121/2003, DJ 19, 20 e A prescrição da pretensão relativa às parcelas remuneratórias alcança o respectivo recolhimento da contribuição para o FGTS. In casu, o vínculo empregatício reconhecido ao vindicante abarca o período compreendido entre 12/08/2005 e 23/12/2013, e, como suprarreferido, a decisão do Pretório Excelso foi proferida em 13/11/2014. Como o julgamento foi realizado após o término do contrato de trabalho, levando-se em conta a modulação de seus efeitos preconizada pelos próprios doutos ministros, e tendo em vista, ainda, que esta ação foi ajuizada em 09/02/2012, não há falar em parcelas prescritas de FGTS refiro-me unicamente ao principal; aos acessórios, consubstanciados nos reflexos de outras parcelas no FGTS, permanece aplicável a prescrição quinquenal, nos

5 termos da Súmula nº 206 do Tribunal Superior do Trabalho. Dou provimento. Adicional de insalubridade Reportando-se ao item 7 da causa de pedir da inicial, roga o demandante seja-lhe pago o plus salarial em epígrafe, que, apesar de previsto em norma coletiva para a função que lhe foi atribuída, nunca foi pago ao longo do contrato de trabalho. Tendo sido declarado o vínculo de emprego com a ré, afirma o autor que faz jus aos benefícios instituídos no acordo coletivo por ela subscrito, sendo de todo irrelevante que não tenha havido perícia neste processo, à medida que o direito almejado é expressamente assegurado no instrumento normativo. A pretora sentenciante, todavia, julgou improcedente o pleito, precisamente porque não foi realizada perícia. Mas carece de reforma o decisum monocrático. A sentença reconheceu a existência de vínculo de emprego entre autor e ré; por conseguinte, são devidos àquele os benefícios instituídos nas normas coletivas subscritas por esta, como o seriam para qualquer empregado seu. E, de fato, nos acordos coletivos juntados aos autos (v. fls. 12/31), nas cláusulas 4, 10 ou 11, repete-se este idêntico preceito: Fica mantido aos exercentes das funções: Encarregados de Campo, Coveiros, Serventes de Cemitérios, Capeleiros, Pedreiros, Condutores de Féretros o adicional da taxa de insalubridade no grau máximo de 40% (quarenta por cento) do salário mínimo. Tendo a sentença reconhecido o exercício da função de servente de cemitério até 2009 e de coveiro a partir de então (ambas contempladas no dispositivo supratranscrito), é logicamente devido ao reclamante o pagamento do adicional de insalubridade buscado, observados os termos da norma coletiva. São devidos reflexos da verba em férias acrescidas do terço constitucional, décimos terceiros salários e FGTS, por todo o período imprescrito. Dou provimento. Salário inicial Por fim, pugna o autor pela fixação do salário a ser anotado em sua

6 carteira de trabalho e previdência social, argumentando que, Em que pese a ausência de pedido quanto ao salário inicial a ser anotado na CTPS do recorrente, referido pleito é decorrência lógica de reconhecimento de vínculo empregatício. Arrazoa também que vários magistrados entendem sequer existir necessidade de pedido expresso para que deva haver a anotação na CTPS do trabalhador quando há reconhecimento judicial de vínculo empregatício, determinação que pode ser tomada ex officio. Assim, tendo sido reconhecido o vínculo e determinada sua anotação na CTPS, bem como da função exercida, não pode subsistir lacuna no campo destinado ao registro do valor salarial. E tem razão o demandante. Com efeito, um salário inicial deve ser registrado em sua CTPS. Analisando os acordos coletivos trazidos aos autos e os pisos neles instituídos para a função do reclamante, bem como o valor que ele disse receber desde 2010 (R$ 520,00), determino a anotação do salário inicial (isto é, do salário que era pago no momento em que se iniciou o contrato, em 12/08/2005) de R$ 350,00. Dou provimento. Pelo exposto, conheço do recurso ordinário interposto pela parte autora e, no mérito, dou provimento ao apelo para: 1) fixar a prescrição trintenária às parcelas de FGTS; 2) condenar a ré ao pagamento de adicional de insalubridade e reflexos; e 3) determinar a anotação, na CTPS do reclamante, do salário inicial de R$ 350,00. Tudo na forma da fundamentação supra, que este dispositivo integra para quaisquer fins de direito. Relatados e discutidos. A C O R D A M os Desembargadores da 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região, por unanimidade, conhecer do recurso ordinário interposto pela parte autora e, no mérito, dar provimento ao apelo para: 1) fixar a prescrição trintenária às parcelas de FGTS; 2) condenar a ré ao pagamento de adicional de insalubridade e reflexos; e 3) determinar a anotação, na CTPS do reclamante, do salário inicial de R$ 350,00. Tudo na forma da fundamentação, que este dispositivo integra para quaisquer fins de direito. Rio de Janeiro, 19 de julho de

7 jmfs Juiz EVANDRO PEREIRA VALADÃO LOPES Relator