UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DA RELIGIÃO
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- Letícia Garrido de Sousa
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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DA RELIGIÃO A CONTRACULTURA E SEUS DESDOBRAMENTOS: NOVAS EXPERIMENTAÇÕES E RELIGIOSIDADE NEW AGE TESE DE DOUTORADO JOELMA DO PATROCINIO DUARTE 2010
2 UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DA RELIGIÃO A CONTRACULTURA E SEUS DESDOBRAMENTOS: NOVAS EXPERIMENTAÇÕES E RELIGIOSIDADE NEW AGE Tese apresentada ao programa de Pós-Graduação em Ciência da Religião do Instituto de Ciências Humanas da Universidade Federal de Juiz de Fora, como requisito parcial para a obtenção do título de Doutor em Ciência da Religião, por Joelma do Patrocinio Duarte. Orientadora: Professora Doutora Fátima Regina Gomes Tavares. Juiz de Fora, julho de 2010
3 Tese defendida e aprovada, em 16 de julho de 2010, pela banca constituída por: Professora Doutora Fátima Regina Gomes Tavares Professora Doutora Francisca Verônica Cavalcante Professora Doutora Leila Amaral Professor Doutor Marcelo Camurça Professora Doutora Sandra Corrêa Sá Carneiro
4 Dedico à todos que buscam por diversos caminhos tornar o mundo mais humano.
5 AGRADECIMENTOS Agradeço à Fátima Tavares por aceitar me orientar e continuar me acompanhando em minha trajetória acadêmica no Programa de Pós-graduação em Ciência da Religião. A ela devo os primeiros contatos que tive com a temática ao qual me dediquei nesses anos de formação. Suas contribuições extrapolaram o campo acadêmico. Os anos convivendo com sua personalidade marcante também trouxeram contribuições para a esfera pessoal. Agradeço pela solidariedade e compreensão manifestada nos momentos que realmente precisei, pelos puxões de orelha, pela paciência e leitura atenta do trabalho. Ao professor do Departamento de Ciência da Religião, Marcelo Camurça, por sua gentileza e atenção nas leituras dos trabalhos e na convivência com seus alunos. Foram muitos os textos indicados por você, que ajudaram na minha formação em Ciência da Religião, especialmente no campo da antropologia. Agradeço a atual coordenação pela compreensão manifestada nos momentos que necessitei. Agradeço ao Antônio que sempre me atendeu com competência e atenção À Ana Lúcia M. Cordeiro e Elam Pimentel colegas de curso que se tornaram amigas queridas, agradeço pela gentileza, pelo constante incentivo e apoio. Foram vocês que não me deixaram desistir de me tornar Doutora em Ciência da Religião quando insistiram afetuosamente para que eu prestasse o concurso. Ana Lucia e Elam, de formas diferentes, acompanharam meus momentos de desânimo, desilusão e empolgação. Em todos esses momentos tiveram uma palavra amiga, atitudes incentivadoras que me estimulavam a ultrapassar as pedras no caminho. Aos meus colegas de pós-graduação pela agradável convivência, em especial Rosana e Paulo. Da mesma forma, agradeço a todos os meus amigos, principalmente Bertaísis e Rosani, pela torcida, pelo apoio e pelas influências afetivas.
6 À Ana Sthefan e Robert Daibert por sua amizade, carinho, atenção e cuidado em relação aos meus estudos. Amigos que permanecem unidos desde a graduação de História e que atualmente estão ligados também academicamente através da Ciência da Religião. Agradeço a minha amiga Eliane Abreu por torcer e vibrar com minhas conquistas e por me receber em sua casa todas as vezes que necessitei realizar as pesquisas nos arquivos localizados no Rio de Janeiro. Agradeço à toda sua família por se empenharem em me guiarem em todos os locais que precisei ir atrás de informações úteis à realização desse trabalho. Agradeço principalmente à minha família pelo constante incentivo, apoio e paciência.
7 RESUMO O universo ligado à Nova Era começa a emergir a partir do movimento de contestação dos anos de 1960, denominado contracultura. Este movimento, através da transgressão como valor, vai pregar a liberdade individual, o trabalho no plano da subjetividade e a partir disso vão empreender um intenso experimentalismo através da mistura, produzindo os híbridos sem qualquer constrangimento. A contracultura é um evento que se apresenta como um contexto que dinamiza a proliferação dos híbridos. Desse modo, através dos vários experimentalismos uma nova percepção ou consciência vai adquirindo, gradativamente, visibilidade e vai se delineando à medida em que ocorre uma incorporação dos valores transgredidos colocados em ação pela contracultura. A autonomia processada e suas consequentes inovações passam a traduzir dinâmicas, operações e práticas para a sociedade, sendo a Nova Era considerada a manifestação mais radical dessa autonomia. Este trabalho apresenta as questões que envolveram a contracultura no mundo e no Brasil em consonância com as reflexões de Latour sobre a referência circulante, focalizando a questão da autonomia do transporte bem como o seu trabalho na configuração do social. A autonomia adquirida por aquilo que é criado vai desencadear uma série de conexões que passam a produzir vínculos sociais que são elaborados a partir de misturas ou dos híbridos. Assim, a nossa sociedade está repleta de híbridos, não havendo, uma separação entre natureza e cultura como afirma os modernos. Ao que parece, esses domínios, mais do que nunca, estão conectados e a Nova Era torna-se um indicativo sofisticado dessa ocorrência. Palavras-chave: contracultura, hibridismos, configuração do social, Nova Era.
8 ABSTRACT The universe connected to the New Age starts emerging with the contestation movement of the sixties, which is called counter-culture. Such movement, through transgression viewed as a value, will preach the individual freedom and the work on an subjectivity basis, and from these points of view, it will implement an intense experimentalism through a mix, producing the hybrids without any kind of constraint. The counter-culture is a event that is conveyed as a context that makes the proliferation of hybrids something dynamic. This way, through various kinds of experimentalisms, a new perception or consciousness gradually, starts becoming visible and begins to be delineated with the incorporation of the transgressed values that are started with the counter-culture occurrence. The autonomy processed and its consequent innovations begin translating dynamics, operations and practices to the society, and the New Age has been considered to be the most radical manifestation of such autonomy. This paper conveys the questions that involved the counter-culture in the world, and in Brasil, in accordance with the reflections made by Latour on the circulating reference, focusing on the transport autonomy question, as well as its role in the configuration of the society. The autonomy gotten through what is created is going to start a series of connections, which turn out to produce social links that are elaborated from mixes or hybrids. As a result, our society is full of hybrids, and there is no separation between nature and culture, as the modern affirm. It seems that such domains, more than ever, are connected, and the New Age seems to be a sophisticated sign of such occurrence. Key-words: counter-culture, hybridism, social configuration, New Age
9 SUMÁRIO Introdução...11 Capítulo 1: Sobre os horizontes da Nova Era Experiência e construção de novos vínculos Cenário e interpretações Nova Era e contracultura...38 Capítulo 2: Dos Estados Unidos para o mundo: sexo, drogas e rock? A revolução que estava no ar Ser hippie é subverter o significado das coisas Outros ismos : encontros, desencontros, conciliações e salamaleques Rock e religião...87 Capítulo 3: O espírito libertário que iluminava mentes e corações Outros românticos A produção artística: construção e quebra de fe(i)tiches A esquerda sob a perspectiva do CPCs, Une e reavaliações O Opinião e as artes plásticas Capítulo 4: A confluência tropical: ver com olhos livres Os pioneiros: antropofagia da década de
10 4.2. A antropofagia dos anos de 1960: tropicalismo A profanação do terreno sagrado da Musica Popular Brasileira É proibido proibir: tudo está solto no exercício da liberdade Tropicalismo: explosão do espírito de vanguarda Capítulo 5: A tropicalidade de uma contra-cultura Eu organizo o movimento : densidade poética, o arcaico e o moderno: Subversão &subversões: esquerdas, tropicalismo e exílio Encontros que conduzem ao Kaos Capítulo 6: Cultura alternativa e a busca pela ampliação da consciência Os marginais: a vanguarda existencial Underground ou desbunde : a cor nos anos de chumbo Geração Bendita: É isso aí, bicho O estilo underground e a ampliação da consciência Conclusão Referências bibliografias...269
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16 AGRADECIMENTOS Agradeço à Fátima Tavares por aceitar me orientar e continuar me acompanhando em minha trajetória acadêmica no Programa de Pós-graduação em Ciência da Religião. A ela devo os primeiros contatos que tive com a temática ao qual me dediquei nesses anos de formação. Suas contribuições extrapolaram o campo acadêmico. Os anos convivendo com sua personalidade marcante também trouxeram contribuições para a esfera pessoal. Agradeço pela solidariedade e compreensão manifestada nos momentos que realmente precisei, pelos puxões de orelha, pela paciência e leitura atenta do trabalho. Agradeço ao professor Raul Magalhãespor ter aceitado a me orientar a pedido da Fátima e ter me acompanhado até se desligar do Departamento. Ao professor do Departamento de Ciência da Religião, Marcelo Camurça, por sua gentileza e atenção nas leituras dos trabalhos e na convivência com seus alunos. Foram muitos os textos indicados por você, que ajudaram na minha formação em Ciência da Religião, especialmente no campo da antropologia. Agradeço a atual coordenação pela compreensão manifestada nos momentos que necessitei. Agradeço ao Antônio que sempre me atendeu com competência e atenção À Ana Lúcia M. Cordeiro e Elam Pimentel colegas de curso que se tornaram amigas queridas, agradeço pela gentileza, pelo constante incentivo e apoio. Foram vocês que não me deixaram desistir de me tornar Doutora em Ciência da Religião quando insistiram afetuosamente para que eu prestasse o concurso. Ana Lucia e Elam, de formas diferentes, acompanharam meus momentos de desânimo, desilusão e empolgação. Em todos esses momentos tiveram uma palavra amiga, atitudes incentivadoras que me estimulavam a ultrapassar as pedras no caminho. 5
17 Aos meus colegas de pós-graduação pela agradável convivência, em especial Rosana e Paulo. Da mesma forma, agradeço a todos os meus amigos, principalmente Bertaísis e Rosani, pela torcida, pelo apoio e pelas influências afetivas. À Ana Sthefan e Robert Daibert por sua amizade, carinho, atenção e cuidado em relação aos meus estudos. Amigos que permanecem unidos desde a graduação de História e que atualmente estão ligados também academicamente através da Ciência da Religião. Agradeço a minha amiga Eliane Abreu por torcer e vibrar com minhas conquistas e por me receber em sua casa todas as vezes que necessitei realizar as pesquisas nos arquivos localizados no Rio de Janeiro. Agradeço à toda sua família por se empenharem em me guiarem em todos os locais que precisei ir atrás de informações úteis à realização desse trabalho. Agradeço principalmente à minha família pelo constante incentivo, apoio e paciência. 6
18 RESUMO O universo ligado à Nova Era começa a emergir a partir do movimento de contestação dos anos de 1960, denominado contracultura. Este movimento, através da transgressão como valor, vai pregar a liberdade individual, o trabalho no plano da subjetividade e a partir disso vão empreender um intenso experimentalismo através da mistura, produzindo os híbridos sem qualquer constrangimento. A contracultura é um evento que se apresenta como um contexto que dinamiza a proliferação dos híbridos. Desse modo, através dos vários experimentalismos uma nova percepção ou consciência vai adquirindo, gradativamente, visibilidade e vai se delineando à medida em que ocorre uma incorporação dos valores transgredidos colocados em ação pela contracultura. A autonomia processada e suas consequentes inovações passam a traduzir dinâmicas, operações e práticas para a sociedade, sendo a Nova Era considerada a manifestação mais radical dessa autonomia. Este trabalho apresenta as questões que envolveram a contracultura no mundo e no Brasil em consonância com as reflexões de Latour sobre a referência circulante, focalizando a questão da autonomia do transporte bem como o seu trabalho na configuração do social. A autonomia adquirida por aquilo que é criado vai desencadear uma série de conexões que passam a produzir vínculos sociais que são elaborados a partir de misturas ou dos híbridos. Assim, a nossa sociedade está repleta de híbridos, não havendo, uma separação entre natureza e cultura como afirma os modernos. Ao que parece, esses domínios, mais do que nunca, estão conectados e a Nova Era torna-se um indicativo sofisticado dessa ocorrência. Palavras-chave: contracultura, hibridismos, configuração do social, Nova Era. 7
19 ABSTRACT The universe connected to the New Age starts emerging with the contestation movement of the sixties, which is called counter-culture. Such movement, through transgression viewed as a value, will preach the individual freedom and the work on an subjectivity basis, and from these points of view, it will implement an intense experimentalism through a mix, producing the hybrids without any kind of constraint. The counter-culture is a event that is conveyed as a context that makes the proliferation of hybrids something dynamic. This way, through various kinds of experimentalisms, a new perception or consciousness gradually, starts becoming visible and begins to be delineated with the incorporation of the transgressed values that are started with the counter-culture occurrence. The autonomy processed and its consequent innovations begin translating dynamics, operations and practices to the society, and the New Age has been considered to be the most radical manifestation of such autonomy. This paper conveys the questions that involved the counter-culture in the world, and in Brasil, in accordance with the reflections made by Latour on the circulating reference, focusing on the transport autonomy question, as well as its role in the configuration of the society. The autonomy gotten through what is created is going to start a series of connections, which turn out to produce social links that are elaborated from mixes or hybrids. As a result, our society is full of hybrids, and there is no separation between nature and culture, as the modern affirm. It seems that such domains, more than ever, are connected, and the New Age seems to be a sophisticated sign of such occurrence. Key-words: counter-culture, hybridism, social configuration, New Age 8
20 SUMÁRIO Introdução...11 Capítulo 1: Sobre os horizontes da Nova Era Experiência e construção de novos vínculos Cenário e interpretações Nova Era e contracultura...38 Capítulo 2: Dos Estados Unidos para o mundo: sexo, drogas e rock? A revolução que estava no ar Ser hippie é subverter o significado das coisas Outros ismos : encontros, desencontros, conciliações e salamaleques Rock e religião...87 Capítulo 3: O espírito libertário que iluminava mentes e corações Outros românticos A produção artística: construção e quebra de fe(i)tiches A esquerda sob a perspectiva do CPCs, Une e reavaliações O Opinião e as artes plásticas Capítulo 4: A confluência tropical: ver com olhos livres Os pioneiros: antropofagia da década de
21 4.2. A antropofagia dos anos de 1960: tropicalismo A profanação do terreno sagrado da Musica Popular Brasileira É proibido proibir: tudo está solto no exercício da liberdade Tropicalismo: explosão do espírito de vanguarda Capítulo 5: A tropicalidade de uma contra-cultura Eu organizo o movimento : densidade poética, o arcaico e o moderno: Subversão &subversões: esquerdas, tropicalismo e exílio Encontros que conduzem ao Kaos Capítulo 6: Cultura alternativa e a busca pela ampliação da consciência Os marginais: a vanguarda existencial Underground ou desbunde : a cor nos anos de chumbo Geração Bendita: É isso aí, bicho O estilo underground e a ampliação da consciência Conclusão Referênicas bibliografias
22 INTRODUÇÃO Pretendo neste trabalho visitar as raízes contraculturais da Nova Era, buscando perceber os encadeamentos ou as conexões que passam a ser processadas a partir desse evento. A abordagem laturiana de conceituação do híbrido confere dignidade ontológica a uma infinitude de seres num mundo onde somente ontologia puras como, natureza/cultura e sujeito/ objeto me levou a interpretar a contracultura como um momento significativo de confecção de fe(i)tiches. 1 Esse evento vai possibilitar que novas visões sejam empreendidas. Entre tantas outras que se desdobraram a partir da contracultura temse a nova consciência religiosa ou Nova Era, que se expressa como um campo de intensa experimentação, onde o híbrido ou trabalho desvelado de construção é que fornece sentido e cria vínculos nesse amplo universo que cruza espiritualidade, terapia e consumo. A espiritualidade do tipo Nova Era realiza e se expande quando o universo alternativo se fragmenta em múltiplas e versáteis associações. A versatilidade apresentada pela Nova era faz com que ela promova hibridizações constantes. Assim, as vivências ou experimentações do tipo Nova Era apontam para a perspectiva de que o religioso nesse universo de errância espiritual (AMARAL, 2000) não se configura como um domínio à parte, mas se realiza enquanto experiência híbrida. Assim, as análises vão buscar no contexto da contracultura a questão do hibridismo na conformação da subjetividade e seus vínculos, conexões e afinidades com a Nova Era, fenômeno que radicaliza a questão da experiência híbrida. Minha intenção é compreender o significado mais profundo das agitações que ocorreram na contracultura em seu estágio de maior ebulição, identificando no fenômeno contracultural a produção de uma autonomia que abre caminho para o surgimento de novos regimes de enunciação que vão produzir mudanças e criar vínculos. Associado a estas questões ou como prolongamento desses 1 Uma articulação entre fatos e fetiches, rompendo com a dicotomia moderna em torno da eficácia dos processos de ação, que distinguem o que é crença daquilo que é real. Ver Latour,
23 encadeamentos, indicarei que a intensa elaboração experimental da Nova Era reflete uma tendência mais ampla, indicada por Latour, que é a proliferação dos híbridos. A contracultura vai inspirar parte da juventude da época a vivenciar e a experimentar outros padrões de comportamento. Toda mudança, porém, antes da sua estabilização ou assimilação, provoca controvérsias. Assim sendo, apresentarei situações que ilustram essas controvérsias, que, assimiladas, perdem seu caráter de novidade e estranhamento. Nesse sentido, a contracultura, bem como a Nova Era, em função das experimentações empreendidas, nos ilustra com sofisticação a dinâmica de construção do social pelos processos híbridos. Com a intenção de realizar uma leitura dos processos que envolvem a contracultura e a Nova Era a partir da dignidade que a concepção de Latour concede aos híbridos, no primeiro capítulo, Sobre os Horizontes da Nova Era, irei apresentar as idéias centrais deste autor, aproveitando o momento para articular a questão do hibridismo no âmbito da história da Nova Era e da contracultura. Constará também no capítulo as análises de autores que investigam o tema, considerando os caminhos e reflexões que cada um aponta em relação à Nova Era. Com base nos autores analisados enfatizarei o vínculo histórico entre contracultura e Nova Era e as questões que podem ser levantadas a partir desse pressuposto. Na esteira da efervescência política e social dos anos de 1960 ocorre a entronização ideológica do que pode ser chamado de um individualismo libertário. A sexualidade é eleita como o motor desse individualismo libertário. Pensadores como Herbert Marcuse (1967; 1968) e Wilhelm Reich (1975), abrem com suas teses novas perspectivas no sentido de indicar que a sociedade burguesa reprime a sexualidade. Para Reich e Marcuse todos os flagelos da civilização ocidental estariam vinculados à repressão sexual. O que qualifica essa modalidade de individualismo, segundo Salem (1991), é a disposição de que o único regime a ser imposto ao indivíduo é o da liberação. O preceito da igualdade como regente das relações sociais afirma-se, assim, como condição sine qua non da liberação, pois assegura a destotalização do indivíduo com respeito a qualquer instância pretensamente englobante e/ ou normatizadora (SALEM, 1991, p. 67). Um dos movimentos de contestação que surgem a partir desse individualismo foi a contracultura, que inaugurou o imaginário hippie, a opção por uma vida despojada, e contribui para que a juventude norte-americana começasse a vivenciar a perspectiva real 12
24 da Era de Aquário. Há um desejo dos jovens de transformarem o mundo pacificamente propondo uma sociedade alternativa, o amor livre, o fim da neurose, rock`n roll e as drogas como forma de ampliação da consciência. Dos Estados Unidos para o mundo a contracultura vai produzindo novas conexões. Essas questões serão levantadas no capítulo dois, Dos Estados Unidos para o Mundo: sexo, droga e rock?, onde também serão apresentadas algumas situações que indicam a questão da proliferação dos híbridos e as conexões decorrentes disso. Tal ocorrência pode ser exemplificada na cultura pop que na época era vista como uma manifestação da cultura paz e amor ; na subversão realizada em todos os níveis pelos hippies e nas polêmicas que envolveram o rock nos seus contatos com a religião. No terceiro capítulo, O Espírito Libertário que Iluminava Mentes e Corações, será trabalhado o vínculo ou conexão entre arte e política, característica marcante nessa época e que tinha o firme propósito de promover a revolução socialista através da conscientização do povo. Esta visão, compartilhada por intelectuais, artistas e jovens engajados, foi denominada por Ridenti (2000) como Romantismo Revolucionário. Com isso a produção artística baseada no eixo nacional- popular era uma ideologia que marcava a estética no Brasil e rejeitava qualquer intervenção externa ou assimilação de idéias vanguardista. Para marcar os embates provocados pelas manifestações de vanguarda, será recuperado o envolvimento dos artistas ideologicamente envolvidos com o Romantismo Revolucionário (RIDENTI, 2000) através de suas atuações nos CPCs e no Grupo Opinião. O vinculo arte e esquerda com o eixo nacional- popular vai levar os segmentos sintonizados com essa perspectiva a rejeitarem as propostas da contracultura, ou qualquer proposta de vanguarda. No contexto do final dos anos 60 do século passado, o estilo underground tornou-se uma alternativa sedutora para muitos indivíduos e vai se expandir pelo mundo influenciando a produção cultural em vários níveis. No Brasil, esse movimento apresentou novas linguagens e rompeu com a perspectiva de arte engajada que alienava a subjetividade e colocava a questão estética numa camisa de força. Isso vai provocar a reação de segmentos da esquerda engajada que considerava a contracultura alienada e algo do imperialismo norte-americano. Os jovens que se identificavam com as propostas da contracultura eram duramente criticados e taxados de alienados. Esse desencontro de perspectiva vai produzir embates históricos que serão analisados no decorrer do quarto 13
25 capítulo. Alheios às críticas, muitos artistas seguem com suas experimentações. A manifestação que provocou mais controvérsias nesse período foi o Tropicalismo, que se colocou como vanguarda e pode ser lido como uma das faces da contracultura no Brasil; além de identificações desse movimento com a esquerda armada há também uma inspiração nos princípios associados à Nova Era. Essas são as questões de fundo que serão trabalhadas no quarto e quinto capítulos, A Confluência Tropical: ver com olhos livres e A Tropicalidade de uma Contra-Cultura, respectivamente. No sexto capítulo, A Cultura Alternativa e a Busca pela Ampliação da Consciência, serão analisados alguns exemplos de experiências contraculturais no Brasil e sua relação com o Regime Militar. Esses anos foram anos de muita repressão, ou melhor, eram anos de chumbo. Mesmo assim, a contracultura floresceu e significou um canal aberto às várias experimentações e formulações de novas linguagens. Dentro desse quadro de novas conexões surgem os poetas marginais, como Jorge Mautner, Waly Salomão, Torquato Neto, entre outros. Também será descrita a formação de um território livre, onde aparentemente tudo era permitido em termos comportamentais, num contexto de intensa repressão. Este local foi o Píer de Ipanema, na zona Sul do Rio de Janeiro e que se tornou um local de concentração de adeptos da contracultura numa praia que se torna a praia oficial do desbunde. Outro exemplo interessante da manifestação e registro da contracultura no Brasil encontra-se num filme realizado por uma comunidade hippie que deseja divulgar sua visão de mundo e uma coluna num jornal alternativo, o Pasquim, onde são divulgados princípios da contracultura em direção à busca da ampliação da consciência. Neste trabalho há um esforço no sentido de demonstrar os vínculos entre contracultura e Nova Era a partir da perspectiva de que estes movimentos estão ligados ao fenômeno de proliferação dos híbridos. Para a concretização do trabalho, realizamos uma pesquisa em jornais e revistas tendo como recorte cronológico o ano de 1967 a Esse período representou o estágio de maior ebulição da nossa contracultura. Os veículos impressos utilizados foram revistas e jornais. As revistas pesquisadas são: Manchete, Cruzeiro, Fatos & Fotos, Realidade, todas com edição da época. A revista Show Bizz foi utilizada como uma fonte especializada em cultura pop. O exemplar da Bizz consultado é uma edição especial de comemoração do rock, enfocando a história desse estilo musical e tudo que estava associado a ele. Aspectos 14
26 vinculados à contracultura são comentados, inclusive com entrevistas. Uma outra revista utilizada foi a Revista Civilização Brasileira. Uma publicação criada por Ênio Silveira e que reunia intelectuais de esquerda que comentavam produções no campo da cultura. São nomes associados a essa revista: Moacyr Felix, Dias Gomes, Cavalcanti Proença, Vieira Pinto, Nelson Weneck Sodré, Leandro Konder e Carlos Nelson Coutinho. As revistas Bondinho e Flor do Mal são consideradas publicações alternativas e foram encontradas na Associação Brasileira de Imprensa, na Biblioteca Nacional. Segundo a atendente da ABI, esta associação conseguiu resguardar alguma coisa que era considerado subversivo pelo Regime Militar. Talvez isso explique a ausência dessas publicações na Biblioteca Nacional. Os jornais pesquisados foram Jornal do Brasil, Última Hora, Folha de São Paulo e o Pasquim. As fontes foram consultadas na Biblioteca Nacional, na Associação Brasileira de Imprensa. Na Biblioteca Nacional a pesquisa foi realizada através de microfilmes; na Associação Brasileira de Impressa a pesquisa foi feita através do manuseio dos exemplares. Algumas citações dessas fontes podem não ter o número da página discriminado em função da qualidade do microfilme. O material de pesquisa vai indicar como aspectos da contracultura brasileira eram abordados por esses veículos; identificar críticas, incentivos e divulgação da produção da cultura alternativa; perceber se há notificação de práticas religiosas alternativas e também nos proporciona avaliar em termos gerais a repercussão da contracultura ou as manifestações a ela associadas no Brasil e sua relação com o regime militar, a questão da censura e a produção da imagem do Brasil. O Pasquim foi um veiculo representativo da imprensa alternativa, divulgando e criando várias tendências. O Pasquim iniciou suas publicações em 1969 com tiragem semanal e se tornou um sucesso de vendas no período da Ditadura. Nesse jornal, a análise se concentra particularmente na coluna Underground, escrita por Luiz Carlos Maciel. Este jornalista mantinha um contato com o que estava sendo produzido nos Estados Unidos, as pessoas que liam o jornal buscavam um contato com ele, muitas delas lhe enviavam material. Esse jornalista é considerado o introdutor no país de muitas novidades trazidas pela contracultura a nível global. É considerado o Guru da contracultura, o que faz com que ele seja citado no várias vezes no decorrer do trabalho A coluna fornece um amplo quadro da contracultura. 15
27 Grosso modo, as fontes passaram por uma análise criteriosa, focalizando o teor dos conteúdos. A análise não pretende demarcar o perfil editorial das publicações e a que grupo de interesses elas estavam associadas. É o teor dos conteúdos que me interessa. São nesses conteúdos que buscarei identificar a produção de motes ligados à busca da autonomia e/ ou do estabelecimento da liberdade individual que vão permitir novas posturas religiosas.também não houve uma preocupação em quantificar esta triagem; optei por uma abordagem qualitativa. Foram utilizados sites como fontes de informações, de conteúdo sobre o tema e como uma possibilidade de acesso a outros documentos. Também foram utilizados encartes que acompanham as mídias, como DVD, CD e LPs. Os encartes foram utilizados por conterem as músicas desses artistas e por apresentarem comentários que trazem a tona sutilezas que só um crítico de música pode perceber e entender. Esse tipo de fonte nem sempre é datado e nem apresenta números de página. Quando utilizo este tipo de fonte explico na nota de pé de página essa ocorrência. Um filme produzido por uma comunidade hippie, produzido em 1970, foi analisado. Ele é um longa-metragem e pretendia através de um roteiro (fictício) retratar a experiência da comunidade. O filme foi analisado na cinemateca do Museu de Arte Moderna. O filme é conhecido por dois nomes, Geração Bendita e/ ou É isso aí, bicho. É considerado o primeiro filme hippie. De forma que ele tornou-se um registro de uma época. Busquei utilizar livros de memórias para tentar resgatar as vivências naquela época, assim como muitas das referências bibliográficas utilizadas foram produzidas num contexto próximo aos acontecimentos. Os livros de memórias dos indivíduos que vivenciaram aquele momento acabam reafirmando aquilo que as fontes advindas do material jornalístico já apontavam. Para auxiliar essa parte mais empírica, foram acrescentadas obras básicas sobre os temas levantados e que vão fornecer o arcabouço para a construção teórica do trabalho. Com base nos estudos específicos de alguns sociólogos, antropólogos e historiadores, busca-se a interpretação social e cultural que possibilite uma análise dos primeiros momentos que vão inspirar o que hoje conhecemos como movimento Nova Era e sua relação com a proliferação dos híbridos. 16
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