13/08/2013 SEGUNDA TURMA : MIN. GILMAR MENDES

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1 Ementa e Acórdão Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 11 13/08/2013 SEGUNDA TURMA RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS DISTRITO FEDERAL RELATOR RECTE.(S) ADV.(A/S) RECDO.(A/S) PROC.(A/S)(ES) : MIN. GILMAR MENDES :ANDRÉ PASQUALINI :RAFAEL LAURICELLA :MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL :PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA Recurso ordinário em habeas corpus. 2. Art. 311, caput, do CP. Adulteração de placa traseira do veículo com aposição de fita isolante preta. 3. As placas de um automóvel são sinais identificadores externos do veículo, obrigatórios conforme dispõe o Código de Trânsito Brasileiro. A jurisprudência do STF considera típica a adulteração de placa numerada dianteira ou traseira do veículo. 4. Reconhecimento da tipicidade da conduta atribuída ao recorrente. Recurso a que se nega provimento. A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do, em Segunda Turma, sob a presidência da Senhora Ministra Cármen Lúcia, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário, nos termos do voto do Relator. Brasília, 13 de agosto de Ministro GILMAR MENDES Relator Documento assinado digitalmente documento pode ser acessado no endereço eletrônico sob o número

2 Relatório Inteiro Teor do Acórdão - Página 2 de 11 13/08/2013 SEGUNDA TURMA RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS DISTRITO FEDERAL RELATOR RECTE.(S) ADV.(A/S) RECDO.(A/S) PROC.(A/S)(ES) : MIN. GILMAR MENDES :ANDRÉ PASQUALINI :RAFAEL LAURICELLA :MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL :PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA R E L A T Ó R I O O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (Relator): Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus, sem pedido de medida liminar, contra acórdão proferido pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que denegou a ordem nos autos do HC /SP, cuja ementa transcrevo (edoc 4, fl. 46): HABEAS CORPUS. ADULTERAÇÃO DE PLACA DE VEÍCULO AUTOMOTOR. UTILIZAÇÃO DE FITA ADESIVA. ARTIGO 311 DO CÓDIGO PENAL. TIPICIDADE. DESNECESSIDADE DE FINALIDADE ESPECÍFICA. DENEGAÇÃO DA ORDEM. 1. É típica a conduta de adulterar a placa de veículo automotor mediante a colocação de fita adesiva. 2. A caracterização do crime previsto no artigo 311 do Código Penal prescinde de finalidade específica do agente. 3. Ordem denegada. Segundo a denúncia, em 16 de dezembro de 1999, na Rua Francisco Cruz, no município e comarca de São Paulo, o recorrente adulterou os caracteres BOF-1873 da placa traseira de automóvel modelo Voyage, transformando-os em BOE-1878, mediante a aposição de fita adesiva de cor preta em uma das placas, cujo fato fora constatado em laudo pericial. Na espécie, o recorrente foi absolvido em primeira instância, entretanto, o TJ/SP deu provimento ao apelo ministerial para condená-lo documento pode ser acessado no endereço eletrônico sob o número

3 Relatório Inteiro Teor do Acórdão - Página 3 de 11 a cumprir pena de 3 anos de reclusão em regime inicial aberto e ao pagamento de 10 dias-multa, no valor unitário mínimo, por violação ao art. 311, caput, do Código Penal, tendo sido a pena privativa de liberdade substituída por prestação de serviços à comunidade e pecuniária de 4 salários mínimos. O acórdão condenatório transitou em julgado em e a defesa ajuizou revisão criminal, na qual sustentou atipicidade da conduta, sem lograr êxito. Então, apresentando a mesma tese, impetrou habeas corpus no STJ, cuja ordem foi denegada, ensejando a interposição deste recurso ordinário. Nas razões recursais alega-se que o acórdão recorrido não pode prevalecer, pois: ignorou a impropriedade absoluta do meio empregado, consistente na aposição de fita isolante em apenas uma das placas do veículo, percebida a olho nu pelo policial, logo ao avistar o carro estacionado (edoc 1, p. 7). Ressalta-se tratar de falsidade absolutamente grosseira, percebida a olho nu pelo policial-militar, mormente porque a adulteração se deu apenas na placa traseira, deixando intacta a dianteira. Sustenta-se, ainda, que a objetividade jurídica do art. 311 do Código Penal é a fé pública em relação à propriedade e ao licenciamento do veículo, razão pela qual a aposição de fita adesiva com intuito de burlar o rodízio de carros da cidade de São Paulo constitui mera irregularidade administrativa. A Procuradoria-Geral da República ofereceu parecer pelo desprovimento do recurso. É o relatório. 2 documento pode ser acessado no endereço eletrônico sob o número

4 Inteiro Teor do Acórdão - Página 4 de 11 13/08/2013 SEGUNDA TURMA RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS DISTRITO FEDERAL V O T O O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): Conforme relatado, o recorrente foi denunciado pela prática do delito previsto no art. 311, caput, do Código Penal (adulteração de sinal identificador de veículo automotor), tendo sido absolvido pelo Juízo da 12ª Vara Criminal da Comarca da Capital/SP com base no art. 386, inciso IV, do Código de Processo Penal. Com o julgamento da apelação ministerial, o recorrente restou condenado à pena de 3 anos de reclusão, em regime aberto, e ao pagamento de 10 dias-multa, substituída a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade e pecuniária. A defesa, então, ajuizou revisão criminal, que foi indeferida, sob os seguintes fundamentos: Na hipótese concreta dos autos, o peticionário foi absolvido pela r. sentença de fls. 73/76 dos autos em apenso, modificada pelo V. Acórdão de fls. 112/116 (Geraldo Xavier, Sérgio Ribas e Sinésio de Souza), também dos autos em apenso, tendo sido condenado como incurso nas sanções do artigo 311, caput, do Código Penal, ao cumprimento de 03 (três) anos de reclusão, regime aberto, e pagamento de 10 (dez) dias-multa, valor mínimo legal, tendo sido a pena privativa de liberdade substituída por prestação de serviços à comunidade e por prestação pecuniária de quatro salários mínimos. Ora, sempre tributado o devido respeito aos entendimentos divergentes eventualmente existentes e considerados os termos do artigo 621 do Código de Processo Penal, verifica-se, então, da r. decisão revidenda e dos fundamentos invocados pelo peticionário, que o presente pedido revisional não comporta deferimento, não se vislumbrando hipótese de contrariedade ao texto expresso da

5 Inteiro Teor do Acórdão - Página 5 de 11 lei penal ou à evidência dos autos, não se fundando a condenação em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos, nem se tendo agora apresentado novas provas de inocência do condenado ou de qualquer circunstância que determinasse ou autorizasse a diminuição especial da pena aplicada. A prova nos autos produzida não deixou nenhuma dúvida quanto à ocorrência do fato, quanto à sua autoria ao peticionário atribuída, ou quanto à sua materialidade delitiva, cuidando-se mesmo de crime de adulteração de sinal identificador de veículo automotor, ficando expresso que: (...) A matéria articulada, enfim, já foi devidamente apreciada pelo V. Acórdão que, considerando suficientes as provas para tanto produzidas, concluiu pela admissão da ocorrência dos fatos, da sua tipicidade e da sua autoria ao peticionário atribuída, o mesmo ocorrendo no que diz respeito aos critérios utilizados para a fixação da pena aplicada. Assim sendo, e nestes termos, indefere-se o pedido. Daí, a impetração de HC no STJ, que denegou a ordem. Neste RHC, a defesa busca, em síntese, o reconhecimento da atipicidade da conduta atribuída. Inicialmente, sobre o tipo penal do art. 311, colho os seguintes estudos doutrinários: O bem jurídico protegido é a fé pública, especialmente a proteção da propriedade e da segurança no registro de automóveis. O objeto material é o número do chassi ou outro sinal identificador, componente ou equipamento de veículo automotor. (...) São duas as condutas tipificadas alternativamente: adulterar (falsificar, mudar, alterar por meio de qualquer modificação) ou remarcar (tornar a marcar alterando, por marca nova em). Os elementos objetivos são: número de chassi (estrutura de aço sobre a qual a carroceria do veículo é montada) ou qualquer sinal identificador (marca ou traço que possibilita autenticar ou reconhecer alguma coisa, 2

6 Inteiro Teor do Acórdão - Página 6 de 11 como por exemplo, placa, plaqueta de veículo automotor, de seu componente (parte elementar) ou equipamento. (Bitencourt, Cezar Roberto. Código Penal Comentado, São Paulo, Saraiva, 2012, p ; grifo nosso). Sinal identificador é qualquer marca colocada no veículo para individualizá-lo, como a numeração correspondente àquela que consta no chassi estampada nos vidros do automóvel. Pode ser, inclusive, a placa do veículo. (...) Objetos material e jurídico: o objeto material é o número do chassi ou outro sinal identificador, componente ou equipamento de veículo. O objeto jurídico é a fé pública, voltando-se o interesse do Estado à proteção da propriedade e da segurança no registro de automóveis. ( ) Trata-se de crime formal (delito que não exige resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para alguém; de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente) (Nucci, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2013, p ; grifo nosso). Objeto jurídico: tutela-se a fé pública, que recai sobre o número do chassi ou qualquer sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou equipamento. Secundariamente, tutela-se a identificação do veículo. ( ) Ação nuclear: Duas são as ações incriminadas: adulterar (modificar) ou remarcar (implica inserção de nova sequência de códigos no espaço em que havia a numeração correta) o número de chassi. Segundo o Dicionário Aurélio, chassi é a estrutura de aço sobre a qual se monta toda a carroceria de veículo motorizado. Sobre tal estrutura de aço se insere um código para identificação do veículo. É também objeto material do crime qualquer sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou equipamento (placa de automóvel, numeração do motor, câmbio etc). (Capez, Fernando. Código Penal Comentado, Editora Saraiva, 2013, p. 616). 3

7 Inteiro Teor do Acórdão - Página 7 de 11 Bem jurídico: a fé pública, especialmente a confiança nos sinais ou marcas destinados à indicação de procedência lícita ou de autenticidade de veículo automotor. Consumação e tentativa: consuma-se o delito com a efetiva adulteração ou remarcação do número do chassi ou de qualquer sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou equipamento. Admite-se a tentativa. (...) O art. 114 e da Lei 9.503/1997 (Código de Trânsito Brasileiro - CTB) estatui a obrigatória identificação do veículo por caracteres gravados no chassi ou monobloco, a cargo do fabricante ou montador, devendo o conjunto de caracteres ser reproduzido em outras partes do veículo, consoante disponha o Contran Conselho Nacional de Trânsito. (...) As reproduções do número do chassi integram, portanto, o conceito de sinal identificador do veículo. Demais disso, há outros sinais identificadores de veículo, indicados na legislação. O CTB, no art. 115 e, determina que o veículo seja identificado externamente por meio de placas dianteira e traseira, esta última lacrada na estrutura do veículo, contendo caracteres individualizados para cada veículo e que o acompanham desde seu registro até a respectiva baixa. A Resolução 45/1998 do Contran estabelece que os caracteres das placas devem ser conjuntos alfanuméricos, formados de uma combinação de três letras sucedidas da combinação de quatro algarismos, gravados em alto relevo. (Prado, Luiz Regis. Comentários ao Código Penal, Editora Revista dos Tribunais, 2013, p ; grifo nosso). Dos trechos acima transcritos, observo que as placas de um automóvel são consideradas sinais identificadores externos do veículo, também obrigatórios conforme dispõe o Código de Trânsito Brasileiro, constituindo, desse modo, o objeto material do tipo ora analisado. Ainda, conforme os estudos doutrinários mencionados, a adulteração de sinal identificador de veículo automotor será típica independentemente da forma pela qual é realizada. Nesse mesmo sentido, manifestou-se o Ministro Jorge Mussi no voto 4

8 Inteiro Teor do Acórdão - Página 8 de 11 condutor do STJ: a jurisprudência da Quinta Turma possui entendimento pacífico no sentido da tipicidade da conduta de alterar a placa de veículo automotor por meio da colocação de fita adesiva. ( ) A aposição de fita adesiva em letras ou números de placa identificadora do veículo automotor configura o delito previsto no art. 311 do Código Penal (REsp /SP, DJe ). Aqui, no STF, também considerando típica a adulteração de placa numerada dianteira ou traseira do veículo, cito os seguintes precedentes: HC /SP, rel. Min. Octavio Gallotti, DJ ; HC /RS, rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe e HC /RS, rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe Destaco, ainda, que o tipo penal não exige elemento subjetivo especial ou alguma intenção específica. Ante o exposto, entendo que não merece reparos o acórdão do STJ que denegou a ordem de habeas corpus lá impetrada. No caso, a adulteração de placa traseira do veículo com aposição de fita isolante preta atingiu o bem jurídico protegido pela norma penal, ou seja, a autenticidade dos sinais identificadores dos veículos automotores. Ainda, com relação à alegação de que a adulteração seria absolutamente grosseira (percebida a olho nu pelo policial-militar), a PGR manifestou-se nos seguintes termos: a discussão sobre o acerto ou desacerto das decisões proferidas pelas instâncias inferiores exige a realização de minucioso reexame do lastro fático-probatório dos autos de origem, o que, como se sabe, é incompatível com a restrita via processual do habeas corpus, que não admite dilação probatória. Por fim, destaco que, com a ação delituosa, o condenado visou 5

9 Inteiro Teor do Acórdão - Página 9 de 11 frustrar a fiscalização, enfim, os meios legítimos de controle do trânsito. Desse modo, voto pelo desprovimento do recurso. 6

10 Voto - MIN. CÁRMEN LÚCIA Inteiro Teor do Acórdão - Página 10 de 11 13/08/2013 SEGUNDA TURMA RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS DISTRITO FEDERAL SEGUNDA TURMA RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS VOTO A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA (PRESIDENTE) - O advogado é muito bom, mas o caso é ruim. Porque, na verdade, o Ministro Relator já mostrou e, agora, o Ministro Ricardo Lewandowski, reitera, o quanto o comportamento de adulteração de chassi de veículos torna-se comum em São Paulo, Belo Horizonte e até em cidades pequenas. Isso me faz lembrar um dito, parece-me que de Machado de Assis, que dizia que a virtude é uma, os pecados são muitos. Neste caso, com a adulteração que ocorreu, o Ministro Lewandowski disse muito bem: qualquer forma de adulteração frustra o objetivo que é guardado pelo Poder de Polícia. E, neste caso, inclui, exatamente, pela atuação, o núcleo do tipo do artigo 311. Por isso eu acompanho e, também, não tenho como mera infração administrativa, ou uma brincadeira, ou coisa que o valha, acompanhando o Relator. # # # documento pode ser acessado no endereço eletrônico sob o número

11 Extrato de Ata - 13/08/2013 Inteiro Teor do Acórdão - Página 11 de 11 SEGUNDA TURMA EXTRATO DE ATA RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS PROCED. : DISTRITO FEDERAL RELATOR : MIN. GILMAR MENDES RECTE.(S) : ANDRÉ PASQUALINI ADV.(A/S) : RAFAEL LAURICELLA RECDO.(A/S) : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso ordinário, nos termos do voto do Relator. Falou, pelo recorrente, o Dr. Claudio Demczuk de Alencar. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores Ministros Celso de Mello e Teori Zavascki. 2ª Turma, Presidência da Senhora Ministra Cármen Lúcia. Presentes à sessão os Senhores Ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Celso de Mello e Teori Zavascki. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco de Assis Vieira Sanseverino. Ravena Siqueira Secretária Substituta Documento assinado digitalmente conforme MP n /2001 de 24/08/2001, que institui a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico sob o número