MICROESTRUTURA E PROPRIEDADES DE LIGAS β DE TITÂNIO FUNDIDAS E SUBMETIDAS À FORJAMENTO ROTATIVO

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1 MICROESTRUTURA E PROPRIEDADES DE LIGAS β DE TITÂNIO FUNDIDAS E SUBMETIDAS À FORJAMENTO ROTATIVO R. F. M. Santos; J. G. Dessi; J. M. Chaves; C. R. M. Afonso Departamento de engenharia de Materiais (DEMa) - Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), São Carlos SP. formentonrafael@gmail.com RESUMO As características físicas, químicas e mecânicas das ligas Beta Ti mostram que essas apresentam potencial para substituir, em um futuro próximo, as ligas utilizadas atualmente na fabricação de implantes. Neste trabalho foram estudadas as ligas β-ti a partir da liga Ti-40Nb e da liga comercial Ti-12Mo-6Zr-2Fe (TMZF), e foram comparadas as microestrutura e propriedades em função da rota de processamento: fusão em molde de cobre e forjamento rotativo (swaging). Em seguida foram submetidas à caracterização microestrutural através da preparação metalográfica, difração de raios-x (DRX), microscopia ótica (MO), microscopia eletrônica de varredura (MEV). Propriedades físicas e mecânicas foram avaliadas através de microdureza Vickers e medidas de módulo de elasticidade via excitação por impulso. Os resultados mostraram que o processamento por forjamento rotativo reduziu o módulo de elasticidade, e em 95 para 81 GPa para a liga TMZF, e de 75 para 67 GPa para a liga Ti-40Nb. Palavras-chave: ligas Beta de Ti, forjamento rotativo, módulo de elasticidade, caracterização microestrutural. INTRODUÇÃO Atualmente as diferentes ligas metálicas utilizadas como implantes ortopédicos, como por exemplo, a liga Ti-6Al-4V, as ligas de Co-Cr e os aços inox, apresentam problemas de compatibilidade biológica e mecânica ( 1 ). A presença de elementos tóxicos na composição química destas ligas tem sido associada ao desenvolvimento 3952

2 de diferentes enfermidades no corpo humano, como o Alzheimer no caso do Al, e complicações no sistema respiratório no caso do Ni ( 2-3 ). Além disso, a grande diferença entre os módulos de elasticidade do osso humano (10-40 GPa) e das ligas comerciais utilizadas para confecção de implantes (200 GPa para o AISI 316L e 110 GPa para a Ti-6Al-4V) é responsável pelo efeito stress-shielding, o qual está associado à reabsorção óssea na região de contato entre o osso e o implante, que pode gerar fragilização do osso e a fixação não adequada do implante, podendo inclusive causar a soltura do implante ( 3-7 ). Neste cenário, as ligas beta de titânio (β-ti) com baixo módulo de elasticidade e livres de elementos tóxicos em sua composição química têm sido desenvolvidas para aplicação como biomaterial, tendo em vista que as ligas β-ti apresentam boa resistência à corrosão e melhor compatibilidade biológica e mecânica, quando comparada com as ligas utilizadas atualmente ( 4-7 ). Uma vez que as ligas β-ti, além das fases de equilíbrio, podem apresentar três fases metaestáveis, martensíta hexagonal α, martensíta ortorrômbica α e a fase-ω hexagonal (térmica ou atérmica), as propriedades destas ligas podem ser alteradas de acordo com a proporção das fases presentes no produto final ( 7-9 ). Enquanto a fase ω, esta é a fase mais dura e com maior módulo de elasticidade, dentre as fases metaestáveis e até mesmo que a fase β, a fase α possui o menor módulo de elasticidade e dureza dentre as fases citadas ( 10 ). A composição de fases é determinada pela a presença e teores de elementos beta-estabilizadores, bem como pelas rotas de processamento, incluindo taxas de resfriamento, tratamentos térmicos e tratamentos termomecânicos ( 8, 9, ). É importante destacar que a fase α pode ser formada tanto via transformação induzida por deformação da fase β (stress-induced martensite SIM), como também metaestavelmente mediante resfriamento rápido a partir do campo β ( 16 ). O forjamento rotativo (swaging) é um processo utilizado para redução da seção transversal de sólidos, como por exemplo barras, lingotes, fios, etc. Neste caso, a deformação é imposta de maneira circular e progressiva, gerando uma redução concêntrica. Porém, este processo também pode ser utilizado para produzir diversas formas regulares, como por exemplo, secções circulares, hexagonais, quadradas e octogonais. A técnica consiste em deformar plasticamente o material mediante alta pressão, através de martelos, até a dimensão final desejada do produto ( 17 ). 3953

3 Desta maneira, o objetivo deste estudo foi investigar a influência da rota de processamento comparando a microestrutura e propriedades (microdureza e módulo de elasticidade) das ligas β-ti: Ti-40Nb (Ti40Nb) e Ti-12Mo-6Zr-2Fe (TMZF), quando fundidas em molde de cobre e quando submetidas à forjamento rotativo. MATERIAIS E METÓDOS As ligas Ti40Nb e TMZF foram confeccionadas através da fusão dos elementos puros por feixe de elétrons (Electon Meam Melting EBM), sob atmosfera protetora de Ar(g) e resfriadas em molde de cobre (condição EBM). Os lingotes obtidos, apesar de disformes como mostrado na figura 1, foram submetidos a forjamento rotativo (swaging), mediante prévio aquecimento de 900 o C entre os passes, até ser alcançado o formato circular na seção transversal, com diâmetro igual a ~12 mm (condição Swaged). Este processo representou, portanto, à uma redução de área aproximadamente de ~58% para a liga Ti-40Nb e de ~79%para a TMZF. Figura 1. Lingotes obtidos via EBM das ligas: a) Ti40Nb e b) TMZF. Após preparação metalográfica, a microestrutura das amostras de ambas as condições, condição EBM e condição Swaged, foram analisadas através de microscopia ótica (MO) e eletrônica de varredura (MEV) juntamente com mapeamento e análise química via Espectroscopia por Dispersão de Energia de Raios-X (EDS), em um microscópio Philips XL-30 FEG acoplado a um sistema EDS, operando à 25Kv. As análises das imagens foram realizadas no software ImageJ. Além disso a caracterização das fases presentes em cada amostra foi realizada via difração de raios-x, no difratômetro Rigaku Geigerflex usando a radiação Cu-kα com passo de 3954

4 0.02 o e ângulo 2θ de 30 a 90. Para determinação da dureza, foi utilizada a média de 15 valores de microdureza Vickers (HV), os quais foram obtidos em um microdurômetro Shimadzu HMV-G20ST, onde cada identação foi obtida mediante a aplicação de 0,5 kgf por 15 s. Por fim, o módulo de elasticidade foi determinado pelo equipamento Sonelastic, o qual determina esta propriedade física mediante excitação por impulso. RESULTADOS E DISCUSSÃO Caracterização morfológica e estrutural As análises químicas via MEV-EDS, mostradas na tabela 1, mostram que a composição química para ambas as ligas estudas estão de acordo com a literatura, tendo em vista que a pequena variação observada entre os valores mensurados e os valores teóricos estão dentro do erro da técnica, visto que a técnica utilizada é uma técnica semi-quantitativa. Uma vez que não houve variação significativa nos valores encontrados para ambas as condições, optou-se por mostrar apenas os dados referentes a condição EBM. Tabela 1. Composição química semi-quantitativa (%peso) das ligas Ti40Nb e TMZF, ambas na condição EBM, obtida via EDS-MEV. Elemento químico TMZF Ti40Nb Titânio 81,9 58,4 Nióbio 41,6 Molibdênio 10,5 Zircônio 5,5 Ferro 2,2 Foi observado através de imagens obtidas via microscopia ótica, representados na figura 2 (MO TMZF-Swaged) e Figura 3 (MO Ti40Nb-Swaged) respectivamente, mostrando uma microestrutura de grãos equiaxiais típica da fase β Ti (ccc) para as duas ligas estudadas. O tamanho médio de grão (T.G.) para ambas as ligas, mostrados na tabela 2, mostra que houve redução significativa do TG após o swaging sugerindo que houve refinamento dos grãos em razão da recristalização dinâmica, tendo em vista a temperatura e deformações envolvidas no processo de forjamento rotativo utilizados neste trabalho. 3955

5 Tabela 2. Tamanho médio de grão para as ligas TMZF e Ti40Nb para as condições EBM e Swaged. Condição/Região T.G. TMZF T.G. Ti40Nb EBM-superfície 375 ± ± 13 EBM-interior 375 ± ± 16 Swaged-superfície 127 ± ± 19 Swaged-interior 202 ± 17 Figura 2. Microscopia ótica da liga TMZF-Swaged. Figura 3. Microscopia ótica da liga Ti40Nb-Swaged. Na figura 3, para a liga Ti40Nb-Swaged partindo-se da superfície para o interior da amostra, é observada a transição microestrutural, passando de grão equiaxiais, típicos da fase β, para morfologia em forma de agulhas, típicos da fase martensita α (ortorrômbica). Assim, não foi possível observar os grãos localizados no interior da amostra. Este fato pôde também ser observado nas imagens obtidas via MEV-BSE 3956

6 (figuras 4a-d) para a liga Ti40Nb, onde é possível verificar a fase α, com largura média de 0,15 µm (150 nm) das agulhas crescendo a partir dos contornos de grão. A figura 4d mostra em detalhe a presença da morfologia agulhada da fase α. Figura 4. Imagem de MEV comparando as microestruturas para as condições EBM (a e b), Swaged (c e d) e mapeamento por EDS (e e f) para a liga Ti-40Nb. Comparando as figuras 2 e 5, morfologia da liga TMZF nas condições EBM e Swaged, é possível notar que mesmo após o processo de swaging, os grãos refinados, apresentam-se de forma equiaxial, não sendo observada a presença de agulhas da fase martensíta α. Porém, são observadas, na figura 5b, maclas de 3957

7 deformação, em torno das quais, segundo a literatura, pode existir martensíta ( 18 ). Segundo este mesmo estudo, a martensita α se forma em planos adjacentes à macla e, embora seja de difícil identificação, tendo em vista a sua dimensão reduzida, é possível distinguir a fase α, da matriz β e da própria macla, via análises microscopia eletrônica de transmissão (MET) ( 18 ). Embora a técnica de MET não tenha sido utilizada neste trabalho, a DRX realizada na liga TMZF-Swaged (figura 7) detectou picos sutis da fase α. Figura 5. Imagem de MEV comparando as microestruturas para as condições EBM (a e b), Swaged (c e d) e mapeamento por EDS (e e f) para a liga TMZF. 3958

8 O mapeamento dos elementos químicos da liga realizados via MEV-EDS, para ambas as ligas (figura 4e-f e figura 5e-f) mostram que não houve segregação, logo a microestrutura está homogênea. Novamente, como não houve variação entre os dados coletados para a condição EBM e Swaged, optou-se por mostrar apenas os dados referentes a condição EBM. Os difratogramas de raios-x, figuras 6 e 7, mostram que o forjamento rotativo provocou a transformação β α, e, uma vez que não houve resfriamento rápido do material antes, durante ou após o processo de forja, que esta transformação de fase é consequência da deformação plástica sofrida pelo material (α -SIM). Este fato tornase mais evidente quando se observa que antes do forjamento rotativo, na liga Ti40Nb EBM, foi detectada apenas a fase β, pela presença dos planos de difração (110), (200), (211) e (220), enquanto que após o forjamento, Ti40Nb Swaged, foi detectada a fase β, pelos planos correspondentes já citados, e a fase α pela difração dos planos (020), (021), (022) e (222) (figura 6). Figura 6. Padrões de Difração de raios-x (DRX) nas condições EBM e Swaged da liga Ti-40Nb. 3959

9 Figura 7. Padrões de DRX nas condições EBM e Swaged da liga TMZF. No caso da TMZF na condição EBM foi detectada a fase β, correspondente aos planos de difração (110), (200), (211) e (220), além da fase ω pela presença da difração do plano (002) entorno de 65 o. Na condição Swaged, foram detectadas a fase β e a fase α foi identificada pelos planos (220) e (113) no difratograma apresentado da figura 7. Caracterização física e mecânica Quanto as propriedades mecânicas e físicas, foi observada uma redução, quando comparadas as condições EBM e Swaged, de ~17% na dureza Vickers para a liga Ti40Nb e de ~3% para a liga TMZF, e uma redução de ~10% no módulo de elasticidade para a liga Ti40Nb e de ~15% para liga TMZF. Os valores observados são mostrados integralmente na tabela 2. Uma vez que a fase α possui menor dureza e menor módulo de elasticidade quando comparada a fase β ( 10 ), os resultados exibidos na tabela 2 reforçam que a presença da fase α é a responsável tanto pela redução da dureza quanto do módulo de elasticidade de ambas as ligas. No caso da TMZF - EBM, foi observado valores de dureza e de módulo de elasticidade maiores do que aqueles descritos na literatura ( 4 ), porém uma vez que a fase ω foi detectada para esta liga nesta condição, e sabendo que a fase ω, quando 3960

10 comparada com a fase β, possui maior dureza e maior módulo de elasticidade( 10 ), temos que a discrepância entre os valores descritos na literatura e os valores encontrados neste trabalho é decorrente da presença da fase ω. Tabela 3. Valores de microdureza Vickers e de módulo de elasticidade para ambas as ligas nas condições EBM e Swaged. Liga (%peso) e Condição Módulo de elasticidade (GPa) Microdureza Vickers Ti40Nb EBM 75 ± ± 4 Ti40Nb Swaged 67 ± ± 6 TMZF EBM 95 ± ± 5 TMZF Swaged 81 ± ± 6 CONCLUSÕES O processo de forjamento rotativo induziu, por deformação plástica, a formação de martensíta α (SIM) e como consequência observou-se uma redução efetiva de ~17% na dureza Vickers para liga Ti40Nb e de 3% para a liga TMZF, quando comparadas as condições EBM e Swaged. Observou-se também uma redução no módulo de elasticidade de 95 para 81 GPa para a liga TMZF, e de 75 para 67 GPa para a liga Ti-40Nb (15 e 10%, respectivamente), quando comparadas as condições EBM e Swaged. AGRADECIMENTOS Agradecemos à Capes e CNPq pelo suporte financeiro, à FAPESP Projeto Regular nº: 2017/ , ao Departamento de Engenharia de Materiais (DEMa) e Programa de Pós-Graduação em Ciência e Engenharia de Materiais (PPG-CEM) da UFSCar. Os autores agradecem ao prof. Dr. André Antunes do ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica) pelo forjamento rotativo das ligas Beta de Ti. REFERÊNCIAS 3961

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