INAPLICABILIDADE DO FATOR PREVIDENCIÁRIO NA APOSENTADORIA PROPORCIONAL

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1 INAPLICABILIDADE DO FATOR PREVIDENCIÁRIO NA APOSENTADORIA PROPORCIONAL O presente artigo discute a forma de cálculo da aposentadoria proporcional prevista no 1º, do art. 9º, da Emenda Constitucional nº 20/98, analisando a legalidade e a constitucionalidade da aplicação do fator previdenciário. Inicialmente, destaca-se que o debate proposto não depende da análise da constitucionalidade do fator previdenciário, já declarada pelo Supremo Tribunal Federal, de modo cautelar, no julgamento da ADI 2111 MC/DF. No presente caso, apenas serão avaliadas a constitucionalidade e a legalidade da aplicação fator no cálculo do benefício previsto 1º, do art. 9º, da Emenda Constitucional nº 20/ ORIGEM E TELEOLOGIA DO FATOR PREVIDENCIÁRIO A Constituição da República prevê três modalidades de aposentadorias voluntárias: (a) por idade; (b) por tempo de contribuição; e (c) especial. As duas primeiras encontram-se previstas no art. 201, 7º, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98. Originalmente, o art. 202 tratava do benefício etário e da aposentadoria por tempo de serviço. O texto detalhava a forma de cálculo das prestações, sendo certo que admitia, para a última (tempo de serviço), as modalidades integral e proporcional. A Reforma da Previdência de 1998 pretendia realizar uma grande modificação nessa sistemática, unificando os dois benefícios, para criar uma nova prestação condicionada ao preenchimento cumulativo de idade mínima e tempo de contribuição. Entretanto, em razão de pitorescas circunstâncias, o Constituinte Derivado de 1998 (EC 20/98) optou, ao final, pela simples substituição da aposentadoria por tempo de

2 serviço pela aposentadoria por tempo de contribuição, o que acarretou a extinção da modalidade proporcional do benefício, mas preservou as duas aposentadorias com requisitos autônomos e alternativos: aposentadoria integral por tempo de contribuição (CRFB, art, 201, 7º, I) ; e aposentadoria proporcional por idade (CRFB, art, 201, 7º, II). Em razão da manutenção das duas espécies autônomas de aposentadorias no Regime Geral, o legislador ordinário adotou, como estratégia, o desestímulo às aposentadorias precoces, já que a reforma constitucional não obteve êxito em proibi-las. Como reflexo da derrota governamental na reforma da previdência, o legislador, em 1999, criou o fator previdenciário, por meio da Lei 9.876, como instrumento para desestimular aposentadorias precoces, que podem ser obtidas independentemente de limite etário rejeitado na reforma previdenciária de O fator configura-se, portanto, como alternativa legislativa ao fracasso de proposta de alteração da previdência. Jamais existiria caso fosse vencedora a proposta original do Constituinte Derivado. Levando em consideração a idade, o tempo de contribuição e a expectativa de sobrevida, busca compensar a inexistência de proibição de aposentadorias sem idade mínima. Em sua má sucedida missão de desestimular aposentadorias, o fator previdenciário tem como alvo principal o benefício por tempo de contribuição, tendo em vista a possibilidade de um segurado passar a gozá-lo ainda em idade jovem, usufruindo-o por períodos extremamente dilatados. Assim, o que justifica a aplicação obrigatória do fator é a inexistência de um limite etário mínimo. Tanto é assim que, no caso da aposentadoria por idade, a sua aplicação é e sempre foi facultativa, ou seja, só ocorre quando beneficia o segurado (art. 7º, Lei 9.876/99). Insiste-se: apenas faz sentido utilizar o fator previdenciário no cálculo dos benefícios influenciados pela derrota do projeto original da reforma previdenciário de 1998.

3 2. INTERPRETAÇÃO DO ART. 29 DA LEI 8.213/91 CONFORME A CONSTITUIÇÃO Lei 8.213/91, art. 29. O salário-de-benefício consiste: I - para os benefícios de que tratam as alíneas b e c do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário; (original sem grifo) O art. 29 da Lei 8.213/91 afirma que o cálculo do salário de benefício das aposentadorias por tempo de serviço e por idade corresponderá à média dos 80% maiores salários de contribuição, multiplicada pelo fator previdenciário. Os demais benefícios devem ser calculados sem o indigitado fator. O desafio hermenêutico consiste em saber se a aposentadoria proporcional se insere no inciso I, do art. 29 como uma espécie de aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição ou se será calculada sem o referido fator. Demonstrar-se-á que a única interpretação possível conforme a Constituição é aquela que exclui o fator previdenciário do cálculo da aposentadoria proporcional. 2.1 Aposentadoria do 1º, do art. 9º, da EC 20/98 como espécie autônoma de benefício Como forma de resguardar expectativas de direito, o Constituinte Derivado fixou regra de transição no art. 9º da Emenda 20/98, cujo 1º garante a aposentadoria proporcional ao segurado que atenda aos seguintes requisitos: Idade Mínima: 53 anos para o homem, 48 anos para a mulher

4 Tempo de Contribuição: 30 anos para o homem ou 25 anos para a mulher, acrescidos de período adicional (pedágio) de 40% do tempo que, em 16/12/1998, faltaria para atingir o tempo de contribuição acima referido. Nota-se que a regra de transição foi elaborada pensando em mudança muito mais radical que aquela de fato ocorrida, pois exige dois requisitos para a aposentadoria: idade e tempo de contribuição. Tal fato é reforçado pela análise do caput do dispositivo, claramente elaborado com foco na proposta original do Constituinte Derivado, ao ponto de trazer critérios mais graves que os do texto principal da Constituição. Não se trata, portanto, de uma aposentadoria por idade; tampouco de uma aposentadoria por tempo de contribuição ou de serviço. Ao contrário, o 1º, do art. 9º, da EC 20/98 cria uma outra espécie de aposentadoria voluntária: benefício por tempo de contribuição & idade. Desse modo, em que pese o INSS, administrativamente, classificar a prestação como aposentadoria por tempo de contribuição, uma análise jurídica mais acurada reflete o equívoco da Administração Pública, porquanto seu fato gerador também inclui o requisito etário. Assim, a primeira conclusão extraída é a seguinte: a aposentadoria proporcional não se enquadra nas alíneas b (aposentadoria por idade) ou c (aposentadoria por tempo de contribuição ou serviço), do art. 18 da Lei 8.213/91, devendo ser classificada como uma terceira espécie de aposentadoria voluntária. Logo, em uma interpretação literal, estaria excluída do inciso I, do art. 29, da Lei 8.213/91, o que, por si só, obstaria a aplicação do fator previdenciário. Como se passa a demonstrar, essa é a única interpretação capaz de compatibilizar o art. 29 da Lei 8.213/91 e a Constituição Federal.

5 2.2 Inconstitucionalidade da aplicação do fator previdenciário no cálculo da aposentadoria proporcional Como já explicado, a aposentadoria proporcional do 1º, do art. 9º, da EC 20/98 foi criada como regra de transição para uma reforma que não ocorreu, a qual exigiria idade (60 anos para o homem; 55 anos para a mulher) e tempo de contribuição (35 anos para o homem; 30 anos para a mulher) para a concessão. Projetando os efeitos da proposta reformadora original, o Constituinte Derivado buscou reduzir os impactos da mudança na vida dos segurados, sem descuidar da necessidade de alteração imediata das normas previdenciárias. Isso significa que o Constituinte Derivado considerou que a combinação entre uma idade mínima reduzida (53 anos para o homem; 48 anos para a mulher) e um tempo de contribuição majorado (pedágio de 40%) geraria um equilíbrio, entre a mudança originalmente proposta e a proteção a uma legítima expectativa de direito dos segurados. Mas, se a regra de transição foi construída para reduzir os impactos de uma reforma previdenciária mais profunda, tem-se que os requisitos previstos no 1º, do art. 9º, da EC 20/98 tiveram como parâmetro uma situação mais gravosa (... a reforma desejada...), que não chegou a se concretizar. Porém, as peculiaridades na tramitação da EC 20/98 e a falta de técnica legislativa produziram uma situação paradoxal: a aposentadoria proporcional da regra de transição não foi impactada pela derrota governamental na votação da regra principal. Em outras palavras, o texto principal da Constituição não prevê idade mínima para a aposentadoria por tempo de contribuição, o que justificou a criação do fator previdenciário, para combater benefícios precoces. Mas a regra de transição do art. 9º, 1º, da EC 20/98, exige idade mínima para a sua concessão, indicada pelo Constituinte Derivado, o que impede de classificá-la como precoce.

6 Consequentemente, a aplicação do fator previdenciário a esse benefício desvia sua finalidade, transformando-o em mero redutor da renda mensal inicial e acarretando um bis in idem, pois mesmo ultrapassadas as barreiras da idade mínima e do tempo de contribuição adicional (pedágio), haveria uma punição ao segurado em razão da idade com a qual se aposentou, apesar da expressa chancela do Constituinte Derivado. Incluir a aposentadoria proporcional no art. 29, I da Lei 8.213/91 consubstancia uma afronta ao próprio 1º, do art. 9º da EC 20/98, pois corresponde a um inconformismo com o limite etário fixado pela norma constitucional para a concessão do benefício. Não é possível classificar como precoce a aposentadoria que preencha os requisitos definidos pelo Constituinte Derivado, sob pena de o legislador se sobrepor à decisão da norma constitucional. 3. CONCLUSÃO Diante dessas considerações, conclui-se que a única interpretação do art. 29, I da Lei 8.213/91, capaz de manter sua conformidade com a previsão constitucional do 1º, do art. 29, da EC 20/98, é aquela que exclui a aposentadoria proporcional, prevista como regra de transição, da incidência do fator previdenciário.