TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo

Transcrição

1 Registro: ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de Santo André, em que é apelante/apelado DIOVANI RIBEIRO NEVES, é apelado/apelante ALLAN MARIANI. ACORDAM, em 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso do réu, desprovido o do autor. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores DONEGÁ MORANDINI (Presidente) e BERETTA DA SILVEIRA., 14 de novembro de 2017 CARLOS ALBERTO DE SALLES RELATOR Assinatura Eletrônica

2 3ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Apelação nº: Comarca: Santo André Apelante/Apelado: Diovani Ribeiro Neves Apelante/Apelado: Allan Mariani Juiz sentenciante: José Francisco Matos VOTO Nº: INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. OFENSA EM CONVERSA PARTICULAR VIA REDE SOCIAL. Insurgência contra sentença de parcial procedência. Sentença reformada. Assistência judiciária gratuita. Revogação da assistência judiciária gratuita concedida em sentença, ante a inexistência de miserabilidade ou impossibilidade de o autor arcar com o custo financeiro do processo. Mérito. Conversa particular entre réu e sua ex-esposa, filha do autor, em contexto do relacionamento íntimo que detinham, não gera dano moral. Ademais, embora o tom não seja elogioso, não há imputação de crime ou utilização de palavras de baixo calão ou qualquer outra circunstância que ofendesse a honra do autor. Recurso do réu provido, desprovido o do autor. Trata-se de ação de indenização por dano moral decorrente de suposta ofensa praticada em conversa privada via rede social entre o réu e sua então esposa, filha do autor, cujos pedidos foram julgados parcialmente procedentes para, tendo acolhido impugnação ao valor da causa, condenar o réu ao pagamento de R$ 7.500,00. Inconformadas, apelam ambas as partes. O autor sustenta, em suma, que o réu praticou ofensa aos mortos (sua esposa, mãe de sua filha), à sua própria honra e de sua atual companheira, razão pela qual o valor arbitrado seria irrisório para lhe compensar. Alega que o montante gerou inclusive postagem desrespeitosa na rede social Facebook, na qual o réu teria se vangloriado de ter obtido vitória parcial nestes autos. Pretende a majoração da indenização para R$ ,00. O réu também apelou, impugnando preliminarmente a assistência judiciária gratuita concedida ao autor, ao fundamento de que ele receberia aposentadoria no valor mensal de R$ 5.650,28, além de ser proprietário de seis imóveis, de área total m², Apelação nº Santo André - VOTO Nº 2/5

3 patrimônio e renda incompatíveis com o benefício. No mérito, aduz que o bate-papo de que a conversa foi extraído é privado, e o processo em que a conversa foi reproduzida tramitou em segredo de justiça, de modo que as afirmações ali contidas não atingiram terceiros. Afirma que, na ocasião, apenas mencionou para sua então esposa fatos que ela própria havia lhe confidenciado em momento anterior, nada tendo inventado. Alega que não houve divulgação da conversa, e que a própria reprodução da prova extraída de processo sob sigilo seria ilegal, razão pela qual pretende a condenação do autor nas penas por litigância de má-fé. Recurso do réu bem preparado, mas não o do autor, ante a concessão de assistência judiciária gratuita. Ambos contrarrazoados (ps. 369/411 e 489/501), encontram-se os autos em termos de julgamento. É o relatório. Inicialmente, rejeitam-se as preliminares arguidas pelas partes em suas respectivas contrarrazões. A preliminar de deserção arguida pelo autor restou superada diante do recolhimento do preparo de apelação pelo réu, determinado após o indeferimento da assistência judiciária gratuita anteriormente ao julgamento da apelação. Tampouco prospera a alegação de inépcia do recurso por ausência de impugnação específica dos fundamentos da sentença deduzida pelo réu em suas contrarrazões: a apelação é recurso de fundamentação livre, e, ainda que a apelação reproduza em parte a inicial, em seu todo, é suficiente para impugnar a sentença. Embora tenha sido interposto posteriormente, passase à análise do mérito do recurso do réu, que contém questões cuja apreciação é logicamente anterior às contidas na apelação do autor. O réu impugna em primeiro lugar o benefício da assistência judiciária gratuita concedido ao autor em sentença. Com razão. Os rendimentos do autor, embora não sejam elevados, não condizem com a miserabilidade por ele alegada, chegando a praticamente R$ 6.000,00 mensais (ps. 99/100), sem considerar a afirmada e não demonstrada renda proveniente de exploração de imóveis. Nesse cenário, o valor das custas não é incompatível com seus rendimentos nem desproporcional ao benefício econômico que o autor pretendia obter com o processo, razão pela qual se revoga a Apelação nº Santo André - VOTO Nº 3/5

4 gratuidade anteriormente concedida. Quanto ao dano moral propriamente dito, prospera a apelação do réu, mas não a do autor, nos termos e pelos fundamentos que seguem. breve digressão. Para melhor compreensão, pede-se vênia para fazer O autor ajuizou ação de indenização por dano moral em face do réu, ex-marido de sua filha, tendo-se sentido ofendido por mensagem que o réu mandou à sua ex-esposa em bate-papo instantâneo privado via aplicativo para celulares com internet ( Whatsapp ) na qual se lê: Vc me conhece e ta deixando se levar de novo, seu pai q traiu sua mae e ta com uma mher dentro da casa q vc tem direito elas n tao la enchendo ele (sic p. 41). A transcrição dessa conversa foi extraída da ação de divórcio entre o réu e a filha do autor (Daiane), que tramitou em segredo de justiça. Feita essa breve digressão, fácil perceber que, respeitado o entendimento do magistrado sentenciante, os pedidos não procedem. Embora se compreenda que o autor guarde mágoa e raiva em relação ao réu por conta dos maus tratos por ele relatados à sua filha durante o casamento e mesmo após o término da relação, certo que não se extrai, do documento mencionado, conduta ofensiva à honra ou imputação de crime que ensejem indenização por dano moral. Conquanto em alguma medida ininteligível por conta do alto grau de coloquialidade, a única frase da mensagem, que em tese poderia ter ofendido o réu, aquela que afirma que ele teria traído sua falecida esposa, não contém qualquer linguagem de baixo calão ou imputação de crime. As expressões injuriosas trazidas na inicial ( Amante? Prostituta? Vagabunda? p. 4) não encontram eco na mensagem enviada pelo réu à sua ex-esposa, tendo sido conjecturadas pelo próprio autor. Isso, por si, já seria suficiente para reformar a sentença, posto não se vislumbrar na conversa qualquer conteúdo difamatório punível. Porém, há mais: como bem ressaltou o réu, tratou-se de conversa particular entre ele e sua ex-esposa, que foi, quando muito, reproduzida em processo que tramitou em segredo de justiça e, que, em princípio, não se pode presumir tenha atingido terceiros. Nesse cenário, caberia ao autor ter demonstrado que Apelação nº Santo André - VOTO Nº 4/5

5 as afirmações do réu lhe teriam sido prejudiciais perante sua comunidade, seu emprego, sua família, e de que maneira (não apenas perante sua filha, que era destinatária das mensagens). Isso, contudo, não foi feito, o que apenas reforça a improcedência dos pedidos. O provimento do recurso do réu prejudica o pleito de majoração dos honorários contidos na apelação do autor. Ante o exposto, dá-se provimento à apelação do réu, e nega-se provimento ao recurso do autor. Invertida a sucumbência, arcará o autor com as custas processuais e honorários advocatícios, ora arbitrados em 11% do valor da causa, já considerados os recursais (art. 85, 11, CPC). CARLOS ALBERTO DE SALLES Relator Apelação nº Santo André - VOTO Nº 5/5