UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
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1 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES DEPARTAMENTO DE JORNALISMO E EDITORAÇÃO (Re) produção de estigmas sociais e relações com a alteridade nos discursos de Bolsonaro e Datena Projeto de Iniciação Científica Aluna: Camila Mazzotto de Carvalho Orientadora: Profa. Dra. Rosana de Lima Soares Maio de
2 1. Relação com projeto de pesquisa da orientadora O projeto de pesquisa atual, intitulado Crítica de Mídia e Cultura Audiovisual, conta com apoio do CNPq (bolsa produtividade em pesquisa) desde Entretanto, a temática dos estigmas sociais vem sendo por nós desenvolvida desde o ingresso na Universidade de São Paulo, em 2003, tendo percorrido diversas etapas. Ao longo desses anos, orientamos diversas pesquisas de iniciação científica sobre temas correlatos ao projeto. Uma delas, da aluna Júlia Tami, recebeu o primeiro lugar no Prêmio Destaque do Ano em Iniciação Científica do CNPq, na categoria de Ciências Humanas. É nesse sentido que encaminhamos a presente proposta, esperando desenvolvê-la em consonância com nosso projeto atual, voltado aos estudos de audiovisual, que encaminhamos como parte integrante do pedido de iniciação científica a fim de relacioná-lo a um conjunto de pesquisas em andamento. 2. Introdução Os discursos político e jornalístico, tomados como espaços de intertextualidade e heterogeneidade, participam da circulação de recursos simbólicos para a significação cotidiana e constituem, portanto, espaços privilegiados de representação do outro. Esta pesquisa, inserida no contexto do trabalho desenvolvido desde 2003 pela Profa. Dra. Rosana de Lima Soares inicialmente denominado Mídias Audiovisuais e Estigmas Sociais Sutileza e Grosseria da Exclusão e agora voltado, principalmente, para a análise crítica de produções audiovisuais se propõe a pensar a (re) produção de estigmas sociais e os discursos historicamente constituídos no país que emergem nos enunciados do deputado federal Jair Messias Bolsonaro e do jornalista José Luiz Datena, buscando apreender interlocuções entre as mediações política e jornalística e a formação de imaginários e narrativas sociais. O deputado federal e pré-candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro cumpre atualmente o seu sétimo mandato na Câmara dos Deputados do Brasil e, em 2017, foi apontado como o parlamentar mais influente nas redes sociais por um relatório da empresa de comunicação e pesquisa FSB 1. José Datena, um dos principais representantes do telejornalismo dramático 2 brasileiro foi, por sua vez, entre março de 2003 e março de 2018, o âncora do programa Brasil Urgente, produto midiático veiculado pela TV Bandeirantes que configura e reconfigura a vida cotidiana a partir de acontecimentos comuns de uma grande cidade brasileira (LANA, 2007), e um dos objetos de estudo deste projeto. Ambas as figuras públicas apresentam contra os seus nomes inúmeras denúncias referentes ao uso de um campo comum de relações e expressões de cunho discriminatório, que atingem diretamente múltiplos grupos sociais em seus discursos, estigmatizando negros, quilombolas, indígenas, refugiados, 2
3 mulheres e LGBTs, por exemplo. Em programa de entrevistas da Rádio Band veiculado no dia 30 de outubro de 2017, Bolsonaro e Datena atestaram, como num reconhecimento subjetivo de que compartilham espaços de signos e significação, semelhanças entre seus discursos, caracterizados pela noção de espontaneidade 3. A linguagem, segundo Maingueneau (1997), não é concebida como um simples suporte para a transmissão de informações, mas como o que permite construir e modificar as relações entre interlocutores, enunciados e seus referentes. As narrativas construídas a partir das mediações política e jornalística, portanto, unem a linguagem a múltiplas interpretações de mundo, relacionando sujeitos e ações. Em uma primeira análise dos discursos de Bolsonaro e Datena, o gesto de narrar o outro parece assumir a incorporação de representações sociais que aniquilam a alteridade, construindo-se a noção de um outro radical passível de ser banido ou aniquilado, cenário sobre o qual se debruça este projeto. Esse esforço de análise também tem a intenção de verificar, nas mediações política e jornalística, as bordas entre o que a Profa. Dra. Rosana de Lima Soares, em Mídias e Estigmas Sociais Sutileza e Grosseria da Exclusão chama de referencialidade e o que, em contrapartida, coloca-se como ficcionalidade no interior dos discursos, assumindo, portanto, a não disjunção entre fato e ficção. Considerando as implicações éticas das mediações política e jornalística e as discussões em torno da liberdade de expressão e da inviolabilidade parlamentar 4, direitos assegurados pela Constituição Federal de 1988, esta pesquisa, portanto, percebe os enunciados de Bolsonaro e Datena a partir da noção da mediação como processo que não se esgota na recepção de conteúdo, mas como trajeto que se desdobra no cotidiano e influencia a construção de noções de relação com a alteridade, promovendo a circulação de significados e representações sociais que se estendem para muito além do discurso. 3. Objetivos Esta pesquisa tem como objetivo geral estudar as noções de relação com a alteridade e os processos de construção de imaginários e identidades sociais compartilhados pelos discursos das figuras públicas Jair Messias Bolsonaro e José Luiz Datena, bem como as expectativas sociais sobre as quais tais noções se articulam. Segundo Pêcheux (1975), o sentido de uma palavra, expressão, proposição não existe em si mesmo (isto é, em sua relação transparente com a literalidade do significante), mas é determinado pelas posições ideológicas colocadas em jogo no processo sócio-histórico em que palavras, expressões, proposições são produzidas (isto é, reproduzidas). 3
4 Busca-se, portanto, entender como configura-se a dotação de sentido de múltiplas formas significantes em determinados contextos como, por exemplo, as noções de cidadão de bem e direitos humanos para humanos direitos ; e como, por meio desses discursos, a construção de referências para algumas formas significantes mostra-se arbitrária em relação às formas significantes enquanto referentes, como o campo associativo construído em torno do cristianismo, assumindo o hiato entre linguagem e referente. 4. Metodologia A primeira parte da pesquisa terá como enfoque principal a leitura da bibliografia aqui estabelecida e o estudo de relações entre conceitos de teorias na área de comunicação, política e análise do discurso. A seleção da amostragem se fará em torno da temática dos estigmas sociais, em suas interfaces com a psicanálise, a antropologia, a sociologia, a filosofia, a história, as ciências da linguagem, a comunicação. Em um segundo momento, será feita a coleta e a organização de dados dos discursos proferidos pelo deputado Jair Messias Bolsonaro em Plenário da Câmara e dos discursos proferidos pelo jornalista José Luiz Datena em Brasil Urgente, disponíveis nos sites da Câmara dos Deputados e da emissora de TV Bandeirantes, respectivamente. O intervalo de tempo a ser considerado compreende os discursos proferidos entre fevereiro de 2015 e março de 2018, que corresponde ao período do primeiro discurso do último mandato do deputado federal e ao último programa comandado por Datena, respectivamente, totalizando, portanto, trinta e oito meses de discursos proferidos. Além disso, somaremos ao corpo de análise as duas entrevistas do deputado ao jornalista, veiculadas em 30 de outubro de 2017 pela Rádio Band e em 15 de abril de 2018 pela emissora Bandeirantes, na inauguração do programa Agora é com Datena, da TV Bandeirantes; e, finalmente, as entrevistas concedidas a diferentes mídias e as participações de Bolsonaro em programas audiovisuais, a partir da seleção não-aleatória de discursos, considerando aqueles voltados à temática dos estigmas sociais. Por fim, a última etapa da pesquisa trará a comparação e análise crítica dos discursos da amostragem a fim de traçar pontos de confluência na construção de representações e (re) produção de estigmas sociais, bem como as semelhanças, as diferenças e as particularidades dos espaços de reivindicação e disputa por significados nas mediações política e jornalística, e as implicações éticas intrínsecas a elas. 4
5 5. Referências bibliográficas BARTHES, R. Elementos de Semiologia. São Paulo: Cultrix, BARTHES, R. Introdução à análise estrutural da narrativa. In: Análise estrutural da narrativa. Petrópolis: Vozes, BRANDÃO, M. H. N. Introdução à análise do discurso. 2a. ed. Campinas, SP: Editora da Unicamp, ELIAS, N.; SCOTSON, J. L. Os Estabelecidos e os Outsiders Sociologia das relações de poder a partir de uma pequena comunidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, FOUCAULT, M. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, FREUD, S. Psicologia de grupo e análise do ego. Rio de Janeiro: Imago, LANA, L. C. C. Telejornalismo dramático e vida cotidiana: estudo de caso do programa Brasil Urgente. Belo Horizonte: UFMG, MACHADO, A. A televisão levada a sério. São Paulo: Senac, MENDONÇA, K. A punição pela audiência: um estudo do Linha Direta. Rio de Janeiro: Quartet, ORWELL, G. O que é fascismo? E outros ensaios. São Paulo: Companhia das Letras, SILVA, G.; SOARES, R. L. Lugares da crítica na cultura midiática. Revista Comunicação, mídia e consumo. V.13, n. 37, SOARES, R. L.; GOMES, M. R. Por uma crítica do visível. São Paulo: ECA/USP, SERELLE, M. V.; SOARES, R. L. Mediações críticas: representações na cultura midiática. São Paulo: ECA/USP, VENANCIO, R. D. O. A pragmática do jornalismo popularesco. São Paulo: Scortecci, Notas 1 onar%20o-lidera-%20ranking-de-%20influencia-nas-%20redes-mas-%20no-conjunto-%20opredominio-%20e-do-%20pt/+&cd=1&hl=pt-%20br&ct=clnk&gl=br. 2 Termo sugerido no trabalho Telejornalismo dramático e vida cotidiana: estudo de caso do programa Brasil Urgente, no qual a autora defende a proposta de classificação de Brasil Urgente como telejornalismo dramático e não telejornalismo policial, resssaltando a busca pela proximidade com o dia-a-dia da cidade e a construção de contextos mais complexos que o programa estabelece com a vida social, sem restringi-lo aos casos de polícia (assuntos relativos aos crimes, às leis ou à segurança). 3 Datena: [Bolsonaro] é um sujeito que é polêmico, fala um monte de coisa que muita gente não concorda, que muita gente concorda... mas que tem coragem, tem peito para falar. Bolsonaro: Eu sou um pouco parecido contigo, [Datena]: na espontaneidade; e admiro o seu jornalismo: franco, aberto e objetivo. 4 Os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos Artigo 53 da Constituição Federal de
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