A REPRESENTAÇÃO DISCURSIVA EM FOCO: UMA ANÁLISE INICIAL DO DISCURSO DE RENÚNCIA DE ACM
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- Bárbara de Oliveira Natal
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1 A REPRESENTAÇÃO DISCURSIVA EM FOCO: UMA ANÁLISE INICIAL DO DISCURSO DE RENÚNCIA DE ACM RESUMO Maria Eliete de QUEIROZ (PPgEL/UFRN) O presente trabalho é parte da pesquisa de doutoramento que estamos desenvolvendo no PPgEL/UFRN e integra as discussões do Grupo de pesquisa Análise textual dos discursos. O nosso foco para esta comunicação incidirá sobre a categoria Representação discursiva do plano da análise de texto, com base nos postulados de Adam (2008). Apresentamos uma análise inicial de como o enunciador constrói a sua imagem, através das esquematizações produzidas pelo discurso político de renúncia do Senador Antônio Carlos Magalhães (ACM), em sua atividade institucional. Para Adam (Op. Cit. p. 113) a atividade discursiva de referência constrói, semanticamente, uma representação, um objeto de discurso comunicável. O discurso político em evidência neste trabalho convida o leitor-interlocutor a construir essa representação do objeto de discurso apresentado em seu enunciado. Assim sendo, a Representação é construída por alguém (leitor) que compartilha do discurso e interpreta ou re-interpreta como o locutor compreende ou imagina uma determinada realidade social, política e cultural, considerando não somente os aspectos lingüísticos da materialidade textual, mas também dando conta do contexto situacional e das condições de produção do texto. PALAVRAS-CHAVE: Representação discursiva. Análise textual. Discurso político. INTRODUÇÃO O presente artigo apresenta dados iniciais da pesquisa de doutorado em Estudos da Linguagem, na área de Lingüística Aplicada. As questões de análise que aparecem neste trabalho fazem parte do discurso político de renúncia do senador Antônio Carlos Magalhães (ACM). Para tanto, trabalhamos com as categorias que formam o plano do texto e o plano do discurso no campo da análise e da descrição das operações de construção do texto, propostas por Adam (2008), focalizando no nível semântico do texto, principalmente, a Representação discursiva (Rd). Seguindo as categorias do Esquema 4 em Adam (2008), vamos trabalhar com os três níveis da análise de discurso, para em seguida centrarmos no plano da análise textual. No nível da análise de discurso, trabalharemos com o Nível 1(N1), que é a Ação de linguagem do locutor do texto, o Nível 2 (N2) que é o processo de interação social da ação linguageira e o Nível 3(N3) que envolve a formação sociodiscursiva, por meio da qual se estabelece o interdiscurso, pelo viés do estudo dos gêneros discursivos. Para Adam (2008) a proposição-enunciado possui um valor descritivo (...) que constrói um objeto de discurso comunicável. Cada proposição ou o conjunto de preposições apresentam idéias, conceitos, definições de algo ou de alguém que revelam imagens ou Representações discursivas (Rds) do objeto posto. Em termos de organização, este artigo se encontra dividido da seguinte forma: a primeira parte faz uma apresentação do discurso do senador ACM, em seguida aparece um breve histórico da Lingüística textual. Nesse percurso, situamos a base teórica do texto e
2 do discurso na análise textual, discutindo a representação discursiva. A última parte analisa a imagem que o locutor faz de si no discurso, e por último, as conclusões e resultados da análise. APRESENTANDO O DISCURSO DE ACM O discurso de renúncia do Senador Antônio Carlos Magalhães foi proferido no Plenário do Senado Federal em 30 de maio de 2001 e está disponibilizado para qualquer consulta na Ata da 62ª Sessão deliberativa ordinária. É um texto que está ligado a mais um caso de corrupção da política nacional e de falta de decoro parlamentar a que os políticos brasileiros costumam se envolver. O texto pertence ao gênero discurso político, mais precisamente, ao subgênero discurso político de renúncia, é um texto em prosa, corporificado em um gênero que adota o padrão composicional predominante de seqüências argumentativas, seguidas de passagens expositivo-explicativas e narrativas. O discurso político enquadra-se em um plano de texto ocasional, segundo a classificação apresentada por Adam (2008), não se constitui em um gênero discursivo que obedece a uma ordem fixa, canônica de estrutura composicional do texto. Pode ser caracterizado como um discurso de manipulação, de avaliação da vida pública, de prestação de contas, de convencimento público, através do processo de argumentação do e no discurso HISTORIANDO BREVEMENTE A LINGUÍSTICA TEXTUAL A Lingüística Textual (LT) surge nos meados dos anos 60 do Séc. XX, com a gramática do texto, nas décadas de 70 e 80 ela se volta para os estudos semânticos e pragmáticos. É considerada uma (sub)disciplina da lingüística, que tem crescido muito na Europa (KOCH e WIESER, p. 13), especialmente na Alemanha, que é escolhida por muitos estudiosos como o grande centro intelectual do desenvolvimento e do crescimento da pesquisa e da produção científica nesta área de conhecimento (BLÜHDORN e ANDRADE 2009, MARCUSCHI, 2009). Blühdorn e Andrade (2009) consideravam a LT uma disciplina heterogênea e interdisciplinar, inicia o percurso dos estudos do texto estabelecendo a relação da teoria para a prática, caracterizando a primeira linha de evolução histórica por que passou a LT: da lingüística textual teórica para a lingüística textual aplicada. Neste processo de aplicabilidade destacam-se os campos da produção de texto, da recepção e compreensão de textos, do ensino do texto e da análise de textos em uso, podendo ser abordados os níveis gramaticais, semânticos e pragmáticos. A gramática de texto foi o ponto de partida dos pioneiros da lingüística textual (BLÜHDORN & ANDRADE, 2009 p. 18). Eles acreditavam fielmente no estudo das estruturas transfrásticas no nível dos elementos dos elementos de coesão conectando as frases e compondo as orações e não no nível do texto. Dentre os defensores desses estudos iniciais da LT inclui-se Harweg (1968, 1979 apud BLÜHDORN & ANDRADE, 2009). Os autores citados acrescentam que Hartmann e Weirich (1971, 1973 Op. Cit.) priorizam o estudo do texto como objeto formalmente mais complexo e não mais a oração, por considerarem o texto a unidade básica da estrutura da língua, mas ainda permaneceram analisando-o e estudando texto na perspectiva estruturalista. Deixam claro também que em Halliday e Hasan (1976 apud BLÜHDORN & ANDRADE, 2009) ampliaram a perspectiva de análise do texto concebendo-o como uma unidade de sentido, muito mais complexa do que apenas observá-lo pelo viés formal/estruturalista. Com base nessa
3 questão, ampliam a discussão o conceito de coesão é de natureza semântica; ele se refere às relações de sentido existentes no interior do texto, que o definem como um texto (HALLIDAY E HASAN, 1976 apud BLÜHDORN & ANDRADE, 2009 p. 18). Os elementos de coesão clássicos, os de coesão lexical e as isotopias discursivas são recursos que marcam ponto de partida para as pesquisa na área da semântica do texto. Beaugrande e Dressler (1981 apud BLÜHDORN & ANDRADE, 2009) são os autores que representam os estudos iniciais da pragmática na LT, reconhecendo que é através dos critérios de textualidade como a intencionalidade, a aceitabilidade, a informatividade, a situacionalidade e a intertextualidade que o texto é definido e reconhecido como tal, levando-se em consideração a situação comunicativo-discursiva em que aparece e ganha sentido. Nos anos 90 o estudo do texto se encaminha para a adoção de uma perspectiva sócio-interacional no tratamento para com a linguagem e, em decorrência disso, para o estudo dos processos e estratégias sócio-cognitivos envolvidos no processamento do texto e do discurso. Inserindo-se nesse contexto de discussão, Adam define a lingüística textual como um subdomínio do campo mais vasto da análise das práticas discursivas (ADAM, 2008, p.43). Com base nessa definição, o autor apresenta o texto em sua materialidade formado por um plano global de enunciado, que é construído com base em uma ação de linguagem visada, de acordo com o diálogo que o seu produtor estabelece com o outro, em uma situação sócio-discursiva vivida pelo sujeito, de acordo com o espaço social de que faz parte. Nesse sentido, os enunciados tomam formas em um gênero de discurso, que se projeta em uma organização discursivo-argumentativa e se vincula diretamente a uma instituição social. O autor concorda que incluir a lingüística textual no foco da análise do discurso significa inscrever as atividades de textualização no quadro de um gênero específico determinado, que é atualizado nas atividades humanas institucionalizadas. Dessa forma, a ação de linguagem é realizada por meio de um texto, em que os seus enunciados são organizados em uma seqüência composicional de base para formar o todo significativo. Assim, todo gênero é construído levando-se em conta níveis do texto que estão envoltos ao nível do discurso (ADAM, 2008). DISCUTINDO O TEXTO E O DISCURSO NA ANÁLISE TEXTUAL Cada sujeito social constrói o seu texto em função das suas intenções comunicativas. Esses textos são chamados de gêneros. Os gêneros são múltiplos e infinitos, tendo em vista a inter-relação com as atividades humanas, enquanto que os segmentos lingüísticos que integram a composição desses gêneros são finitos e passíveis de serem identificados mediante critérios lingüísticos específicos. A esses segmentos Bronckart (1999) atribui a denominação de tipos de discursos ou tipos discursivos. Segundo esse mesmo autor, a ação de produzir um texto é resultado da interação entre os conhecimentos que o produtor do texto possui sobre os gêneros a serem produzidos, situá-los em um contexto-histórico determinado, construir representações da situação social e material de comunicação em que o texto é produzido. Partilhando dessa compreensão, o texto deixa de ser entendido como um objeto abstrato e passa a ser visto como uma unidade concreta de produção textual, um produto verbal e social, que pertence e se atualiza em um determinado gênero, formado por várias seqüências discursivas, com elementos que trazem a marca e a representação de quem o produziu numa instância comunicativa real.
4 O conceito de gênero discursivo está vinculado aos estudos dialógicos de Bakhtin ([1955]1992) considerando o aspecto histórico e social como parte constitutiva da linguagem e os gêneros discursivos como os elementos de interlocução que ligam a história da sociedade à história da língua. Por isso, o autor os define como construtos sócio-históricos que se constroem enquanto formas relativamente estáveis, partilhadas socialmente, caracterizadas por estilo, forma composicional e conteúdo temático. A sua utilização é determinada a partir das atividades humanas, sejam essas religiosas, técnicas, ideológicas, profissionais, isso porque gêneros e atividades são mutuamente constitutivos. O texto para construir o seu todo argumentativo e significativo precisa que seja encadeado em subconjuntos das partes que formam a sua textualidade. A seqüenciação do plano do texto acontece em uma sucessão. Assim sendo, o texto é construído de partes, que por sua vez constrói uma unidade de sentido e se realiza em um contexto, designada por Adam (2008) como uma unidade semântica e pragmática denominada configuracional, porque nela estão inclusas as partes do enunciado que forma o todo do texto. Para Adam (2008), o plano do texto determina a configuração macrotextual do sentido. Para ele, esse plano pode ser convencional (fixo), pela história do gênero e pode ser ocasional, deslocado em relação à história dos gêneros. O plano de texto é estudado em sua materialidade e está relacionado à textura, à segmentação de proposições, de enunciados e de períodos, a estrutura composicional, formada pelas seqüências de base que encadeiam o sentido do texto, organizado argumentativamente. A materialidade do texto deve ser analisada no plano da análise discursiva, que envolve a ação de linguagem, a interação social e a formação discursiva, através da qual os gêneros são atualizados. A estrutura seqüencial de um texto é organizada por um plano de texto que leva em conta a sua seqüência organizacional. Tal organização se configura a partir de uma sucessão de enunciados. A operação configuracional pode ser definida como o fato de instituir na produção e de depreender na interpretação uma configuração a partir de uma sucessão (ADAM 2008, p. 280). O que o autor determina como sendo configuracional compreende as proposições-enunciados, os períodos, as partes de um plano de texto e as seqüências que o constituem como os elementos de um complexo concreto de relações.. Atribuir sentido ao texto, segundo este autor, significa ser capaz de compreender o enunciado encadeado uns com os outros e construir as representações semânticas do texto no seu todo. Isso porque, segundo Bakhtin, quando escolhemos as proposições para a construção e organização do texto essa seleção não é feita aleatoriamente, ela é escolhida em função do todo significativo do enunciado acabado, que está representado em nossa imaginação verbal e presentifica o nosso ponto de vista, a nossa opinião. A REPRESENTAÇÃO DISCURSIVA (Rd) E A CONSTRUÇÃO SEMÂNTICA DO TEXTO A Representação discursiva (Rd) trabalha com um conteúdo referencial revelador de imagens de quem enuncia o discurso, do seu interlocutor e do texto em ação. Na produção do discurso, o enunciador escolhe as palavras, as organizam em uma ordem linear, formando a estrutura de um plano textual. Essa estruturação macro vai depender do conteúdo a ser tematizado, do gênero de discurso e da situação comunicativa. O que é dito sobre o objeto, faz com que os leitores, ouvintes/interlocutores interpretem, construam ou (re)construam Rds ou imagens de uma determinada realidade de mundo. Nesse sentido, o texto projeta uma imagem de quem enuncia o discurso, de
5 quem (re)interpreta e do tema apresentado. O conceito de Rd e de imagem são discutidos neste trabalho como sendo similares. A Rd cria sentido e essa criação acontece em um processo de interação social, envolvendo quem enuncia o texto e quem o interpreta (um interlocutor), porque a Rd é uma questão de diálogo, de troca, de negociação entre os envolvidos no processo de interação verbal, que mobiliza os seus conhecimentos de mundo, de acordo com os préconstruídos culturais de cada um. O sentido de um enunciado é inseparável de uma atividade enunciativa que o texto convida a (re)construir. Na análise deste trabalho pretendemos trabalhar com o grupo das representações de quem fala ou enuncia o discurso (o locutor). Para Adam (Op. Cit.) toda proposição enunciada possui um valor descritivo. O valor descritivo de um enunciado só assume sentido na relação com o valor argumentativo desse enunciado. A construção de uma Rd dá a entender que a linguagem faz referência e todo texto é uma proposição do mundo que solicita do interpretante uma atividade semelhante. Quem constrói a representação do objeto é o interpretante a partir dos enunciados (cf. GRIZE, 2004 e ADAM, 1999, 2008). A Rd vai se dá em função de um objetivo, das representações psicossociais da situação de interação, do enunciador e do mundo do texto, dos pressupostos culturais. O DISCURSO DE ACM EM ANÁLISE: a imagem que o locutor faz de si mesmo Nesta análise inicial, mostraremos o primeiro grupo das Rds, através da imagem que ACM faz de si quando enuncia a sua renúncia do cargo de senador e presidente da casa federal. Observaremos, conjuntamente, a ação de linguagem é a primeira categoria no nível da análise textual dos discursos, denominada por Adam (2008) de (N1). A ação verbal do locutor acontece por meio de um discurso escrito/oralizado que ACM profere perante o Senado Federal, eis a abertura da fala: Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Srs. Parlamentares(...)Há mais de três meses as atenções do País estão voltadas para mim, como se eu fosse o principal problema do Brasil. Aliás, como se eu fosse algum problema para o Brasil. É a tática do diversionismo. Falam de Antonio Carlos, submetem-no ao mais torpe processo de linchamento político de que se tem notícia na história do País(...). O locutor interage (N2) com seus interlocutores: parlamentares, presidente, senadores e a população em geral, de maneira a tornar público a renúncia do mandato de senador, para se livrar da cassação. O discurso lido pelo locutor na tribuna do senado federal, se encontra materializado por escrito, na Ata da Sessão do Senado Federal do dia O texto está corporificado no gênero discurso político de renúncia, que se realiza em uma situação real de comunicação institucional (N3), por meio da sessão do plenário da câmara do senado federal. Levando em conta a formação sociodiscursiva, podemos considerá-lo como um texto histórico, do ponto de vista da política brasileira e da instituição Senado Federal, uma vez que trata do episódio da lista de votação secreta desta instituição. Este discurso é composto de blocos temáticos com várias proposições, formando um todo argumentativo. As etapas na ordem do plano de texto.
6 Imagens de si no discurso No 1º parágrafo, o enunciador começa o seu discurso copiando literalmente um trecho do discurso do deputado Afonso Arinos proferido no dia , sem fazer nenhuma alusão ao texto original, para pedir ao presidente Getúlio Vargas que renuncie ao seu mandato. Ao fazer uso da cópia literal do texto do Deputado, o locutor estabelece ecos intertextuais com o Evangelho de São João, em um diálogo entre Jesus e Pôncio Pilatos, no Palácio dos governadores romanos, nos territórios ocupados. Utilizando-se das palavras do Deputado Arinos, o enunciador cria um jogo de representações a partir de expressões paradoxais: maior justiça...maior injustiça, erro supremo...suprema verdade... o que é a verdade?...o que é a mentira? Fazendo uso dessas expressões o locutor cria uma imagem de que o político ACM está sendo injustiçado pela acusação, assim como Jesus o foi, quando disse que só falava a verdade e que só a testemunhava, por isso foi sacrificado. Percebemos que a intenção do locutor é passar para o público-ouvinte a imagem de sacrificado. Quando apresenta os pares de palavras: justiça...injustiça... erro...verdade...mentira, o presidente do senado se auto representa como aquele que também só fala a verdade, no caso de violação do painel, que testemunha a verdade e que jamais faltou com ela. No 2º paragrafo, o locutor reafirma esse dizer, perguntando e respondendo ao mesmo tempo: o que é a mentira? E lhes respondo: mentira é a farsa que se montou para tentar interromper uma das mais longas e conceituadas vidas públicas de serviços prestados ao seu Estado e ao seu País. A mentira é a farsa que alguns montaram, com a ajuda de poderosas forças, para calar-me no Parlamento Temos no trecho o uso da predicação que é muito recorrente no discurso. Ela foi utilizada para conceituar o que é a mentira, colocando em cena as imagens do enunciador. Com esse processo da predicação, ACM reafirma que apesar de ter sido acusado por não falar a verdade, constrói a seguinte imagem: de político sério, verdadeiro, inocente da acusação, de um senador conceituado, destemido, atuante, injustamente acusado por um alguém ou uns alguéns através de que se montou... que alguns montaram. Através dessa categoria, o sujeito participante dessa ação (QUE SE... QUE ALGUNS) não é assumido pelo enunciador, é assumida por uma outra voz ou outro ponto de vista. Com isso observarmos que o locutor antecipa as suas ações de parlamentar, para reforçar ainda mais a imagem de inocente porque considera que sempre foi muito atuante e denunciador de coisas injustas. Nesses relatos, o enunciador consegue construir a sua Representação discursiva por meio de uma avaliação negativa que faz do Presidente da república FHC (na época) e, respectivamente deste governo. No decorrer do seu discurso, ACM, começa a assumir a sua voz de agente de suas ações quando relata, explica, argumenta, historia e descreve a sua atuação parlamentar, vejamos as suas falas ao se dirigir ao presidente Fernando Henrique Cardoso:
7 que não contou, porém, com um Presidente do Congresso subserviente para atender-lhe naquilo que não merecia ser atendido e diminuir a força do Poder, como muitas vezes é desejo, infelizmente, daqueles que estão no Palácio do Planalto É porque eu também não precisava barganhar para ocultar crimes que jamais cometi. Com respeito, mas altivez, jamais deixei de fazer alertas ao Presidente. Não foi por falta de alerta que despencamos em direção ao abismo. Posso lhes assegurar antecipadamente, contudo, que não cometi qualquer crime contra o Erário, não fiz advocacia administrativa, não procurei enriquecer quem quer que fosse, não furtei. Ao contrário, apontei ladrões que ainda estão impunes. Por meio desses exemplos, percebemos que há o reforço da imagem de um senador altivo, independente, sério, honesto como o presidente FHC, nao foi. Diante disso se assume incapaz de cometer o crime de que foi acusado. O uso da expressão negativa (não, jamais) que antecede todos os argumentos relatados, vem realçar essa imagem de político íntegro, com qualidades e valores positivos, incapaz de se envolver ou de ser (co)autor de um crime de violação do painel da votação do senado. A Rd que se tem é que a relação estabelecida entre senador e presidente foi pautada por uma autonomia entre os poderes, de que no senado e na presidência, o parlamentar fez proposições sérias, desenvolveu a necessária competência entre o legislativo e o executivo, sem que ACM, enquanto senador e presidente da casa, jamais pedisse e trocasse favores, sem roubar e enganar o outro, mesmo assim não foi recompensado pelo que fez. Para criar a imagem de quem não é culpado, de que nao está assegurada a verdade dos fatos, o locutor usa outra operação: a de tematização (retematização), para denominar os participantes do caso relatado. Vejamos o trecho: Nas ruas, em toda parte, onde desmascararei, como tenho feito, os ladrões do Erário, os inimigos da verdade, os criminosos de todos os crimes. Foram muitos desses os julgadores de minha conduta ética, quando na verdade alguns sequer podiam julgar a conduta de quem quer que fosse, pois são desprovidos de conduta própria para ser julgada. Através dessa operação, o locutor utiliza propriedades para os verdadeiros culpados que o envolveram no caso de corrupção. A Rd que o leitor faz é de um político engajado e competente com a coisa pública, dotado de discernimento sobre o papel positivo que exerceu na sociedade brasileira. Homem de sabedoria que soube contribuir com propostas para mudar a cara do país, conhecedor de várias causas, inclusive de que existem muitos políticos-ladrões que gozam da impunidade. Apresentando esses relatos, o enunciador assume que por ter um perfil de denunciador, foi acusado injustamente, nesse sentido, o enunciador sustenta a sua inocência.
8 CONCLUSÕES Os pressupostos teóricos que adiantamos, neste trabalho, destacam as discussões que fazemos das categorias da análise textual dos discursos focalizando que a ação de linguagem acontece tendo em vista os elementos lingüísticos que estão no nível da materialidade do texto e no nível das questões discursivas maiores. Esses dois planos constroem o processo semântico-pragmático do texto, utilizando as expressões gramaticais. Diante dessa reflexão, o texto é um objeto semântico, pragmático, argumentativo que referencia o mundo e que se constitui em uma instância real de comunicação. Analisando a Representação discursiva no discurso de renúncia de ACM, podemos perceber que o locutor constrói uma imagem de homem público honesto e isento da culpabilidade de violação do painel eletrônico do senado, utilizando-se de argumentos que reforçam o seu comprometimento coma justiça social. REFERÊNCIAS ADAM, J. M. Lês textes: types et prototypes. Paris: Nathan, A lingüística textual: introdução à análise textual dos discursos. Tradução de Maria das Graças Soares Rodrigues, Luis Passegi, João Gomes da S. Neto, Eulália Vera Lúcia Leurquin. Revisão técnica: Luis Passegi e João Gomes da S. Neto. São Paulo: Cortez, BAKTHIN, M. M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, BLÜHDORN, H. ANDRADE, M. L. da C. de O. Tendências recentes da lingüística textual na Alemanha e no Brasil. In: KOCH, I. G. V. WIESER. H. P. (Org.) Lingüística textual: perspectivas alemãs. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, BRONCKART, J.P. Atividade de linguagem, texto e discurso: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: EDUC, KOCH, I. G. V. WIESER. H. P. (Org.) Lingüística textual: perspectivas alemãs. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, MARCUSHI, L. A. Lingüística de texto: o que é e como se faz? Ed. Universitária da UFPE, 2009.
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