De Repente em Ação - As vozes do improviso caririense na formação de Corais. Pôster
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- Sabrina Aveiro Espírito Santo
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1 De Repente em Ação - As vozes do improviso caririense na formação de Corais Pôster Rodolfo Rodrigues Universidade Federal do Cariri rodolfo.tecmusica@gmail.com Resumo: Neste trabalho, além de descrever o projeto que dá título a esse artigo, objetiva-se apresentar a proposta de trabalho - que encontra-se em andamento - a respeito das análises coletadas no projeto. Apresenta a relação da cantoria e dos grupos de canto coral presentes na região do Cariri cearense, bem como a inter-relação entre essas duas esferas artísticas. Neste trabalho consta também a elaboração de um arranjo, desenvolvido a partir das propostas apresentadas. Para a elaboração da mesma foi tomado como base as gravações realizadas nas entrevistas com alguns cantadores da região e a análise de uma literatura acerca do tema da cantoria repentista e de grupos de corais. Palavras chave: De Repente em Ação; Cariri Cearense; Formação de Coral. Introdução O projeto De Repente em Ação deu-se início no mês de abril de 2017 e foi aprovado como ação acadêmica vinculada à Pró-Reitoria de Cultura (PROCULT) da Universidade Federal do Cariri (UFCA). Seu plano de trabalho objetiva realizar o levantamento e mapeamento de profissionais repentistas em atividade na Macrorregião do Cariri cearense (MRC), espaço este que compreende os municípios de Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha, além de realizar atividades práticas junto à comunidade acadêmica e externa. A Macrorregião do Cariri Cearense configura-se num espaço propício para o campo da pesquisa e o levantamento de dados, no que tange a cultura popular. Dentro das academias tem se tornado um verdadeiro centro de pesquisas, tal reconhecimento assumido pela região ocorre porque neste espaço fluem um conjunto de manifestações artístico-musicais - muitas delas singulares ao espaço. Conforme aponta Grangeiro (2013) O Cariri é considerado um caldeirão de cultura, pela mescla e diversidade cultural que abriga, principalmente na música, sendo este um dos motivos que
2 tem feito da região um espaço de muitas investigações nas áreas de Educação Musical e Etnomusicologia (GRANGEIRO, 2013, p. 10). Dentre as inúmeras manifestações culturais presentes nesse espaço regional, destaco, em particular, a arte dos cantadores repentistas, artistas que encontram-se com certa representatividade no espaço caririense, e que realizam importante trabalho de difusão e manutenção da arte. Estes são músicos, poetas, declamadores, pensadores e sonhadores, perfil dos que, com o apoio de uma viola criam versos improvisados na hora. Paralelamente à essa produção cultural, é possível encontrar a presença de outros grupos com formações mais diversificadas, e que, em grande parte, estão presentes em outros ambientes de ensino/apresentação. Destaco por exemplo a presença dos grupos de corais, compondo espaços como escolas, igrejas, ONG s e Universidades - como a própria UFCA. Repente x Coral A Cantoria repentista é um gênero musical que têm como base a improvisação rimada - mas não somente este - caminha, também, envolto a um conjunto de regras responsáveis por regerem sua estrutura. Dentre as inúmeras regras atentarei, primordialmente, às questões da Oralidade. Compreender a letra e os requisitos gramaticais desse estilo será o passo inicial para a apropriação desta produção artística na pretensão de aplicá-la num outro formato. A letra possui importância fundamental na composição da cantoria, aliás, a letra possui papel central na construção de uma estrofe, pois, para o repentista, todo o texto versado deve estar condizente ao tema proposto. Desta forma, a abordagem conteudística e a argumentação na produção da estrofe exige do cantador um apanhado volumoso de conhecimentos sobre assuntos diversos. Como a variedade de temas é enorme, a quantidade de informações é cada vez maior e a capacidade crítica dos ouvintes tem se aperfeiçoado. É também crescente a necessidade de aperfeiçoamento técnico e ampliação dos conhecimentos por parte dos repentistas, para que continuem correspondendo à curiosidade dos ouvintes e às expectativas do mercado cultural (FERREIRA, 2010, p. 3).
3 O poeta João Bandeira, residente na cidade de Juazeiro do Norte - CE, comentou, durante uma entrevista concedida ao projeto, que o cantador tem procurado conhecer novos conhecimentos, afirmando que hoje é possível encontrar muitos cantadores com nível superior (Entrevistado, 2017). 1 Vale ressaltar que no Cariri cearense, mais especificamente na cidade de Juazeiro do Norte, encontramos figuras importantes para a cultura da poesia improvisada do nosso país, como o poeta repentista Pedro Bandeira, reconhecido pelo pseudônimo príncipe dos poetas, considerado um dos maiores repentistas vivo em atividade. E Silvio Grangeiro, falecido no ano de 2015, até então embaixador da cultura do Cariri, outorga entregue pela UNESCO. O Cariri destaca-se também pela presença do curso de licenciatura em música na Universidade Federal do Cariri, campus Juazeiro do Norte. A presença desta fortalece o diálogo da cultura popular com o centro acadêmico - espaço ainda, aparentemente, eruditizado - construindo relações favoráveis para o impulso das pesquisas neste local, por conseguinte, tornando-se próxima à nossa realidade, seja como aluno, pesquisador, educador ou como indivíduo inserido na sociedade. O PPC (2014) do curso vem falar que Os saberes tradicionais das matrizes culturais que povoam a região do Cariri apresentam uma infinidade de possibilidades para as atividades de ensino, pesquisa, extensão e cultura [...]. A imensa riqueza e diversidade de ritmos e manifestações artístico-culturais que compõem a identidade Cariri é um dos elementos que tornam essa região um espaço singular. Espaço de criação e partilha de saberes, o Cariri apresenta um ambiente propício ao desenvolvimento artístico e à pesquisa em artes (MÚSICA, 2014, p. 7). Onde entra o Coral? A ideia de trabalhar com formação de corais a partir das pesquisas deste projeto veio quando, ao transcrever melodias de sextilhas - cantada pelos repentistas - para a partitura, a fim de compreender sua estrutura melódica, foi percebido a possibilidade de elaborar arranjos vocais diversos. 1
4 As melodias foram gravadas em entrevistas realizadas durante às atividades do projeto, e são frutos das cantorias improvisadas. Esse trabalho de coleta e transcrição representa uma ferramenta básica da Etnomusicologia, que, associada à pesquisa de campo, permite ter um material de análise que vem de encontro ao interesse do trabalho (OLIVEIRA, 2007). Esta ação, além de ter o papel de resgate, atrela a aplicação desse fazer musical em um novo formato. Segundo Sobol, (2012, p. 7) "A atividade do canto coral usada como meio de difusão e divulgação da música regional brasileira pode caracterizar-se como um veículo de preservação da nossa cultura regional encontrada nos diversos 'brasis' que existem dentro do Brasil". É possível que o canto coral, modernamente tão difundido em todos os extratos sociais, se associe em um grande potencial de emancipação da arte e cultura regionalista, através de interpretação e performance de canções regionais, por meio de arranjos ou transcrições que, mesmo envolvendo-se numa roupagem harmônico-estrutural nova e diferenciada, são capazes de preservar as características que compõem a identidade do original, levando esta atividade a uma relevância no que tange a divulgação, difusão e de preservação da cultura regional brasileira (SOBOL, 2012, p. 7). Numa sala de aula, por exemplo, as crianças podem aprender os elementos e os valores mais importantes de sua sociedade através da experiência musical (NETTL Apud. OLIVEIRA, 2007, p. 101). Além do mais o trabalho com a música popular brasileira torna-se necessário num país tão rico artisticamente como o nosso. Nabuco (2008, p. 4) enfatiza ainda que a cultura é elemento fundamental na construção de uma educação de qualidade e sintonizada com a identidade do seu povo. Sobre a criação de arranjos vocais, Sobol (2012) cita que A utilização de arranjos de músicas oriundas de outras comunidades ou regiões pode, certamente, enriquecer a experiência pessoal e coletiva do canto coral, pois amplia o contato com outras realidades e expõe as diferentes características sociais, culturais e musicais presentes no Brasil, tornando-se também um processo de difusão cultural (SOBOL, 2012, p. 3). Análise Técnica das melodias repentistas
5 Tendo uma análise das melodias transcritas para o sistema da notação musical, foi possível concluir que: Os versos são métricos; Há uma pulsação que permite a compreensão do movimento poético; Os graus conjuntos são decorrentes; A oralidade tem papel principal nesse processo de construção musical. Figura 1 - Melodia de sextilha transcrita para a partitura. Os versos estão separados por vírgulas para melhor visualização da métrica. Fonte: Próprio Autor Tanto para uma turma de iniciação musical, como para uma turma já musicalizada, a pulsação métrica presente na melodia torna-se um facilitador na apreensão da música. Principalmente com a sextilha, pois o pensamento em dísticos facilita na hora da montagem das estrofes (SAUTCHUK, 2010). Além do mais, a melodia repentista é produzida sobre um único acorde (normalmente em lá maior), o que facilita ainda mais a criação dos arranjos. Trabalhar arranjos de canto coral a partir da compreensão da arte repentista possibilita angariar um montante de particularidades que podem - e merecem - ser destacados aqui. A primeira delas é a possibilidade de apropriar-se de aspectos interdisciplinares. Segundo Grangeiro (2013)
6 A Cantoria é um gênero rico em muitos aspectos. Através dela pode-se trabalhar a gramática, a concentração, a criatividade, a dicção, a técnica vocal, a improvisação, e ainda a interdisciplinaridade, visto que pode abranger assuntos como a natureza, os sentimentos, fatos ocorridos ou não (GRANGEIRO, 2013, p. 17). Considerando que a proposta deste trabalho é desenvolver arranjos vocais a partir da melodia repentista, vale ressaltar que da cantoria utilizarei apenas os quesitos melódicos. Para letrar o arranjo entra aqui o diálogo com um novo fazer cultural: o Cordel. Considerando que a estrutura métrica de ambas são as mesmas, dá-se para trabalhar muitas letras de cordéis sobre uma única melodia como essa (apresentada anteriormente), abordando temas de quaisquer área do conhecimento, contemplando o diálogo da música com outras áreas do conhecimento. Caberá ao professor escolher o que trabalhar, pois tendo o arranjo pronto ele terá em mãos um material que lhe permitirá realizar os encaixes que lhe forem necessários. A possibilidade de diálogo com outras disciplinas torna-se tão extensa que professores de outras áreas podem realizar atividades estritamente com a disciplina de música, a fim de organizar uma aula em conjunto, abordando aspectos de ambos. Trabalhando essas vertentes, singulares à cantoria, de forma artística, é apresentar uma nova abordagem sobre o assunto, estimulando o conhecimento e a interação com o tema proposto, tendo a possibilidade de, além de apropriação de um novo fazer musical, criar ainda um grupo artístico, representado um pouco da cultura nordestina. Figura 2 - Exemplo de arranjo vocal a partir da melodia apresentada anteriormente
7 Fonte: Próprio autor. Como é possível perceber a melodia principal encontra-se na voz soprano, mas a depender da forma do arranjo essa melodia pode estar em outra voz, ou ficar transitando entre os naipes. A voz do Baixo realiza um contraponto, remetendo à condução feita no bordão da viola caipira. Com a inserção de uma letra o arranjo ficaria da seguinte forma:
8 Figura 3 Estrofe de Cordel 2 inserida no arranjo vocal. 2 Estrofe do poeta Pedro Bandeira presente no livro O poeta Pedro Bandeira mostra Juazeiro ao mundo.
9 Fonte: Próprio autor. Por mais que o formato de apresentação esteja diferente do da base, uma vez que a proposta é utilizar um coro ao invés de um solista, como acontece na cantoria, é perceptível que a característica original da música é preservada. Para Sobol (2012, p. 3) O Resgate da identidade cultural é um elemento vital para a autopreservação de uma comunidade, e a memória cultural de uma região deve ser mantida como referência de identidade para os grupos do amanhã. Além da interdisciplinaridade, aspectos como a própria técnica vocal podem ser contemplados, uma vez que, na busca de uma aproximação sonora/timbrística da cantoria o grupo pode trabalhar e discutir sobre as diferentes formas de impostação, projeção sonora, instrumentação, enfim, aspectos que permitam uma compreensão prática sobre a própria prática Coral. Conclusão Com o projeto, que encontra-se em minha coordenação, titulado De Repente em Ação, posso coletar informações e gravar inúmeras melodias com os cantadores no qual entrevisto, transcrevendo-as na partitura e fazendo uma análise melódica, podendo propor trabalhos a partir dessas melodias em forma de arranjo coral. Percebi também que o acervo, com escritas - na notação musical - de melodias repentistas é escasso. Por isso a necessidade de um estudo mais a fundo sobre como se dá essa construção melódica, e como ela se desenvolve, compreendendo seu modo e sua estética. Como forma de aplicação deste estudo é que está sendo desenvolvido esse trabalho para formação e/ou execução de grupos de canto coral. Espero que este trabalho, que se encontra ainda em andamento, possa ser desenvolvido e, desde já, desperte no professor de música a curiosidade e a sensibilidade de utilizar, não só do repente, mas da cultura popular em seu trabalho docente, seja na formação de coral ou em qualquer outro formato.
10 Referências ALVES, A. C. R. De repente: a música de improviso através do cantador popular. In: MusiMid, 5º MusiMid, Anais, p. 1-13, 2010 De Repente em Ação. Conheça um pouco da história do Poeta Cantador João Bandeira. Disponível em: < Acesso em: 19 Agosto FERREIRA, Edmilson. A arte dos repentistas: sua história e suas técnicas. Jornal do Maranhão, Recife, mai GRANGEIRO, M. I. C. Cantoria repentista como ferramenta de educação musical: Escola experimental de repentistas de Abaiara. Juazeiro do Norte - CE. Universidade Federal do Cariri - UFCA NABUCO, Fundação Joaquim. Poetas do Repente. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, OLIVEIRA, L. P. de. Questões sobre música, cultura e educação. Revista Nupeart, v.5, n.5, p , set SAUTCHUK, J. M. M. A poética cantada: investigação das habilidades do repentista nordestino. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, n. 35. Brasília, janeiro-junho de 2010, p SOBOLL, R. S.. Música Regional Brasileira no Cânone do Canto Coral como Veículo de Difusão, Divulgação e Preservação da Cultura Brasileira. In: II Encontro FUNARTE Políticas para as Artes, 2012, Rio de Janeiro. II Encontro FUNARTE Políticas para as Artes, TAVARES, Braulio. Cantoria: Regras e Estilos. Pedramérico, Livreiro Sebista, 1979, p UNIVERSIDADE FEDERAL DO CARIRI. Projeto Pedagógico do Curso/PPC de Música Licenciatura. (org.) REIS, C, M.; CUNHA, C, M.; ANJOS, F, W.; AZEVÊDO, I, R, G.; ALMEIDA, J, R, M.; MOREIRA, M, M, A.; SILVA. M, A. Juazeiro do Norte, 2014
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