EdUECE- Livro

Documentos relacionados
Análise do currículo de ciências da 8ª série/9º ano como ação do projeto Observatório da Educação

Pró-Reitoria de Graduação Plano de Ensino 1º Quadrimestre de 2017

A CONSTRUÇÃO DO CURRÍCULO COM UMA PROPOSTA DE INTERAÇÃO ENTRE O PROFESSOR-ALUNOS E SABERES POPULARES.

DIFERENCIANDO SERES VIVOS E NÃO VIVOS POR MEIO DA CONSTRUÇÃO DE UM TERRÁRIO

Apresentação. Geek Educacional

PLANO DE ENSINO. Curso: Pedagogia. Disciplina: Teoria e Planejamento Curricular II. Carga Horária Semestral: 40 Semestre do Curso: 6º

EDUCAÇÃO INFANTIL E A SEXUALIDADE: O OLHAR DO PROFESSOR

ARQUITETURA DAS PROPOSTAS CURRICULARES PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL DE CINCO MUNICÍPIOS CATARINENSES

Resumo Pretendo, nesta pesquisa, apresentar um estudo sobre a posição que a alfabetização ocupa

AS CONTRIBUIÇÕES DO PIBID NO DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA

PIBID FURG E SUAS CONTRIBUIÇÕES NA FORMAÇÃO DE PEDAGOGOS

XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

Texto produzido a partir de interações estabelecidas como bolsistas do PIBID/UNIJUÍ 2

PRODOCÊNCIA UEPB: PROFISSÃO DOCENTE, INOVAÇÃO E TECNOLOGIA PARA A EDUCAÇÃO BÁSICA

Palavras-chave: Ensino de Química; Contextualização; Laboratório de Química; Conceitos Científicos; Experimentação. 1. INTRODUÇÃO

A PROVINHA BRASIL SOB A ÓTICA DOS PROFESSORES ALFABETIZADORES

Unidade Universitária: CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE. Disciplina: Projetos Educacionais para o Ensino de Biologia

UNIJUI UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO I: ENSINO EM CIÊNCIAS I

O PIBID DE QUÍMICA E PESQUISA NO COTIDIANO ESCOLAR: DIÁLOGO ENTRE UNIVERSIDADE, O PROFESSOR E A ESCOLA

A CONCEPÇÃO DE ENSINO ELABORADA PELOS ESTUDANTES DAS LICENCIATURAS

FORMAÇÃO CONTINUADA DE DOCENTES DO ENSINO SUPERIOR: POSSIBILIDADES DE CONSTRUÇÃO GRUPAL DE SABERES DOCENTES EM INSTITUIÇÃO PARTICULAR DE ENSINO

Didática e Formação de Professores: provocações. Bernardete A. Gatti Fundação Carlos Chagas

ANEXO II. Edital Pibid n /2012 CAPES PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA - PIBID. DETALHAMENTO DO SUBPROJETO (Licenciatura)

ENSINO E APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS (EJA): PROPOSTA INTERDISCIPLINAR A PARTIR DA PEDAGOGIA DO MOVIMENTO RESUMO

REFLEXÕES SOBRE A FORMAÇÃO PELA PESQUISA SEGUNDO PROFESSORES DO ENSINO MEDIO POLITÉCNICO 1

Aula 5 OFÍCINA TEMÁTICA NO ENSINO DE QUÍMICA

Sala 8 Gestão Pedagógica E. E. PROFA. NIDELSE MARTINS DE ALMEIDA

O DIÁLOGO ENTRE O CURRÍCULO ESCOLAR E O PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO NA REDE DE ENSINO PÚBLICO.

APRENDER E ENSINAR: O ESTÁGIO DE DOCÊNCIA NA GRADUAÇÃO Leise Cristina Bianchini Claudiane Aparecida Erram Elaine Vieira Pinheiro

PROGRAMA DE COMPONENTE CURRICULAR

Didática Aplicada ao Ensino de Ciências e Biologia

EXPERIMENTAÇÃO CIENTÍFICA: ANALISANDO A MERENDA ESCOLAR COM PRÁTICAS DE BIOQUÍMICA NUTRICIONAL EM ESCOLAS DE ENSINO MÉDIO DE REDENÇÃO

SUGESTÕES DE AULAS DO PORTAL DO PROFESSOR PARA A DISCIPLINA DE EDUCAÇÃO FÍSICA, NA PRÁTICA DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

OS DESAFIOS DA PESQUISA NA FORMAÇÃO DOS ESTUDANTES DO CURSO DE PEDAGOGIA OFERECIDO PELA PLATAFORMA FREIRE, NO MUNICÍPIO DE BOM JESUS DA LAPA BA

O USO DA CALCULADORA NAS AULAS DE MATEMÁTICA DO ENSINO MÉDIO: O QUE TRAZ O LIVRO DIDÁTICO?

ENTENDIMENTOS DE PROFESSORES SOBRE A FUNÇÃO DA PESQUISA NA FORMAÇÃO DE ESTUDANTES DE ENSINO MÉDIO 1

XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec)

CAPÍTULO 1. Introdução

A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO SOBRE A AUTONOMIA DOCENTE NA EDUCAÇÃO SUPERIOR ( ).

A MEDIAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA SOB A ÓTICA CONSTRUTIVISTA: UMA ANÁLISE DO CURSO DE TURISMO DA CATÓLICA VIRTUAL

A DISCIPLINA DE DIDÁTICA NO CURSO DE PEDAGOGIA: SEU PAPEL NA FORMAÇÃO DOCENTE INICIAL

Prof. Dra. Eduarda Maria Schneider Universidade Tecnológica Federal do Paraná Curso Ciências Biológicas Licenciatura Campus Santa Helena

Universidade Estadual de Roraima Mestrado Profissional em Ensino de Ciência

Percepções de professores de ciências sobre as relações entre a pesquisa e a prática

O PIBID COMO POLÍTICA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM UM CURSO DE LICENCIATURA EM QUÍMICA

ENTRE ESCOLA, FORMAÇÃO DE PROFESSORES E SOCIEDADE, organizados na seguinte sequência: LIVRO 1 DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO NA RELAÇÃO COM A ESCOLA

MAPEAMENTO E ANÁLISE NAS QUESTÕES DO ENEM SOBRE QUÍMICA

AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM DAS FUNÇÕES INORGÂNICA EM UMA ESCOLA ESTADUAL DO MUNICÍPIO DE ESPERANÇA- PB

DEMANDAS E POTENCIALIDADES DO PROEJA NO ESTADO DO PARANÁ

O ENSINO DE BIOLOGIA E AS RELAÇÕES ENTRE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE: O QUE PENSAM OS ALUNOS DO ENSINO MÉDIO

PROGRAMA DE DISCIPLINA

Objetivo: propor recomendações para o trabalho efetivo dos NDE

As contribuições das práticas laboratoriais no processo de Ensino-Aprendizagem na área de Química

PESQUISA COMO PRINCÍPIO EDUCATIVO NA EDUCAÇÃO BÁSICA ATRAVÉS DO PIBIC-EM 1

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE ENFERMAGEM DE RIBEIRÃO PRETO Curso de Bacharelado e Licenciatura em Enfermagem

PERCEPÇÕES SOBRE A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO TERRITÓRIO DE IDENTIDADE DO SISAL. Paulo José Pereira dos Santos 1 Katiuscia da Silva Santos 2

ENSINO MÉDIO: INOVAÇÃO E MATERIALIDADE PEDAGÓGICA EM SALA DE AULA 1. Palavras-Chave: Ensino Médio. Inovação Pedagógica. Pensamento docente.

Professor ou Professor Pesquisador

ELABORAÇÃO DE UMA PROPOSTA CURRICULAR PARA AS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA A PARTIR DO PROJETO PEDAGÓGICO DA ESCOLA FÉLIX ARAÚJO

A ESCOLA PÚBLICA E AS PRÁTICAS INTERDISCIPLINARES NO COMPONENTE CURRICULAR DO ENSINO RELIGIOSO PROMOVENDO A DIVERSIDADE COMO ATITUDE EMANCIPADORA

CARGA HORÁRIA SEMANAL: 04 CRÉDITO: 04

EXPERIÊNCIA COM AVALIAÇÃO NA ESCOLA BÁSICA: CONTRIBUIÇÕES DE PROFESSORES

Contribuições do Pibid na construção dos conhecimentos específicos na formação inicial de professores de Ciências

REFLETINDO UM POUCO MAIS SOBRE OS PCN E A FÍSICA

O Currículo Paulista e a revisão do PPP: compreender para intervir. Prof.ª Maria Regina dos Passos Pereira

Unidades de Aprendizagem: refletindo sobre experimentação em sala de aula no ensino de Química

Futuro Integral. Categoria do projeto: III Projetos finalizados (projetos encerrados) Nome da Instituição/Empresa: SESC Parana Unidade Apucarana

Palavras- Chave: Prova Brasil, Teoria Histórico-Cultural, Estatística.

A ESTRATÉGIA DE APRENDIZAGEM: PORTFÓLIO REFLEXIVO NO ENSINO DE CIÊNCIAS

MANTER E INOVAR. Sistema Positivo de Ensino Assessoria da Área de Informática Educativa

Problematização inicial: Quais os significados do ensinar à ensinagem? Formação para e sobre o quê?

A INFLUÊNCIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS CURRÍCULOS PRESCRITOS E NOS CURRÍCULOS PRATICADOS: UM ESTUDO COMPARADO ENTRE BRASIL E URUGUAI.

O USO DA HISTÓRIA DA MATEMÁTICA POR PROFESSORES NO ENSINO FUNDAMENTAL

SUGESTÕES DA REUNIÃO DO CONSELHO DE REPRESENTANTES

FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE

O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DE UMA PESQUISA

AS DISCUSSÕES SOBRE O ENSINO DE FÍSICA NO CONGRESSO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO EM ENGENHARIA (COBENGE) 1

SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO E OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA. A Geografia Levada a Sério

ETAPA 4 TERRITÓRIO EDUCATIVO PARA GESTORES EDUCACIONAIS E ESCOLARES

FORMAÇÃO DOCENTE: O PIBID E A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES 1

Palavras-chave: Geografia, Ensino; Fotografia Aérea com Pipa; Cidade; Urbano.

ETAPA 6 ESTUDO SOBRE PROCESSOS E DOCUMENTOS CURRICULARES PARA GESTORES EDUCACIONAIS E ESCOLARES

A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: CONTRIBUIÇÕES NA FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL DE SECRETARIADO EXECUTIVO

FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES E A EXPERIÊNCIA DO PIBID EM UMA IES COMUNITÁRIA: CAMINHOS PARA A CONSOLIDAÇÃO DE UMA CONCEPÇÃO DE TRABALHO DOCENTE

OS SENTIDOS DA INTERDISCIPLINARIDADE NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO BÁSICA

EDUCAÇÃO AMBIENTAL: UMA PRÁTICA TRANSFORMADORA NO ESPAÇO ESCOLAR

DESAFIOS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA REALIDADE ESCOLAR: CONTRIBUIÇÕES DO PIBID/QUÍMICA PARA SUA SUPERAÇÃO

Palavras-chave: Laboratório de Matemática; Pibid; Práticas Pedagógicas.

O PLANEJAMENTO DA PRÁTICA DOCENTE: PLANO DE ENSINO E ORGANIZAÇÃO DA AULA

MÓDULO V - Atividades práticas para um gestor de unidade de ensino e construção de um plano de gestão para escola.

PROPOSTA DE PROJETO DE ENSINO

Práticas Avaliativas e Aprendizagens significativas

A UTILIZAÇÃO DE SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS EM PROJETOS DE INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO CIENTÍFICA, DESENVOLVIDOS NA ARGENTINA

PLANO DE TRABALHO DO PROFESSOR 2012/1 1- DADOS DE IDENTIFICAÇÃO

A docência no ensino superior: a formação continuada do professor-formador e a reflexão crítica da sua ação docente

Eixo Temático: Eixo 01: Formação inicial de professores da educação básica. 1. Introdução

Práticas linguísticas, currículo escolar e ensino de língua: um estudo inicial.

Terminada a última guerra mundial foi encontrada, num campo de concentração nazista, a seguinte mensagem dirigida ao professores:

Plano de Ensino Docente

Transcrição:

UM ESTUDO DE CURRÍCULO E PRÁTICAS EM CIÊNCIAS NO ÂMBITO DO OBSERVATÓRIO DA EDUCAÇÃO Christian Masseron Nunes Ana Rutz Devantier Gileine Garcia de Mattos Maira Ferreira Observatório da Educação/OBEDUC Universidade Federal de Pelotas/UFPEL RESUMO O presente trabalho, organizado no âmbito do projeto OBEDUC Observatório da Educação na Universidade Federal de Pelotas, se refere a uma análise de realidade educacional, a partir do levantamento de indicadores de escolas da rede pública estadual da cidade de Pelotas, e, na sequência, a partir da análise de currículo de Ciências de uma escola parceira do projeto OBEDUC. A análise de currículo de Ciências está vinculada à pesquisa realizada no subprojeto do Observatório, em um estudo intitulado Organizações curriculares e metodológicas para o ensino de Ciências na Educação Básica: análise e proposições, que visou analisar o currículo de Ciências dos anos finais do Ensino Fundamental em uma escola parceira. Organizamos os dados em tabelas e mapas conceituais e analisamos os índices fornecidos pelo IDEB (Índice de desenvolvimento da Educação) e os dados fornecidos pelo censo escolar, de taxa de rendimento escolar. Com relação à análise de currículo, pesquisamos em documentos da escola planos de estudos e diários de classe os conhecimentos e práticas legitimadas nesses documentos como constituidoras do currículo escolar em Ciências para, a partir disso, fazermos uma proposição de práticas curriculares. Ao analisar os resultados, nos deparamos com proposições curriculares pouco inovadoras, com currículos engessados, com sobreposição de conceitos e sem vinculação com temas mais gerais e explicativos dos fenômenos com os quais os estudantes se deparam no seu dia-a-dia, o que não estimula o interesse, a curiosidade e o espírito de investigação, de modo a incentivar o gosto pelo aprender de uma maneira dinâmica e reflexiva. Assim, podemos ver que há muitos fatores envolvidos na questão da qualidade da educação, sendo fundamental compreender por que se ensina o que se ensina. INTRODUÇÃO A escola tem sido fonte de debates e objeto de estudo da universidade visando à melhoria do ensino e da sociedade. Um dos projetos desenvolvidos na universidade, em parceria com a escola, é o Observatório da Educação (OBEDUC), um programa da Capes que possibilita o desenvolvimento de investigação, estudos e análises do contexto escolar, com o objetivo de diagnosticar a realidade educacional das escolas em relação às políticas públicas de avaliação e de intervenção. O projeto OBEDUC desenvolvido na UFPel, intitulado Interface Universidade e Educação Básica: Possibilidades Inovadoras e Qualidade do Ensino, está organizado em três subprojetos: a) Análise das políticas públicas e os impactos na qualidade 04618

2 do ensino na Educação Básica de Pelotas/RS, no qual foi feito levantamento de indicadores a partir de dados do IDEB e do Censo Escolar; b) Organizações curriculares e metodológicas para o ensino de Ciências na Educação Básica: análise e proposições, visa analisar o currículo de Ciências dos anos finais do Ensino Fundamental em uma escola parceira e, a partir disso, estudar alternativas curriculares em uma dimensão curricular contextualizada e menos fragmentada; c) Inovações pedagógicas, formação continuada e acompanhamento de professores novatos na Rede Pública Estadual de Pelotas/RS, em um trabalho de pesquisa que ainda está em fase inicial. O trabalho que apresentamos se refere aos resultados obtidos na realização do segundo subprojeto do Observatório, em um estudo sobre o currículo de Ciências nos anos finais do Ensino Fundamental, considerando também os indicadores educacionais que tivemos como resultado no subprojeto 1. Esses indicadores são apresentados como resultados da qualidade do ensino da educação brasileira, mas tal como Cóssio e Kuss (2012), entendemos que essas avaliações não consideram as condições das escolas, a formação dos professores ou os currículos, entre muitos outros fatores que têm efeitos na aprendizagem dos alunos e, consequentemente, na qualidade do ensino. Quando se trata de indicadores, uns dos primeiros reflexos de seus resultados são nas políticas de currículo. Uma das definições de currículo é de um caminho e um curso a ser percorrido (BARRETO, 2005), no entanto, o currículo escolar deve ir além dessa percepção, pois implica escolhas, objetivos e regras para a organização dos conhecimentos e das metodologias que serão utilizadas na escola. Com relação aos currículos de Ciências, apesar de muitas reformas curriculares os currículos de Ciências mantêm a lógica que valoriza uma Ciência fragmentada, que não colabora para a compreensão de mundo que a educação escolar deveria possibilitar. Para Sacristán (2000), deveríamos pensar um currículo a partir das discussões sobre: por quê ensinar o que selecionamos como conteúdo de ensino, qual o objetivo para, a partir disso, definir o quê ensinar. Para esse autor essa é uma forma de conhecer a melhor estratégia para o acesso ao conhecimento, reconhecendo os processos que incidem e modificam as decisões da prática pedagógica. PROPOSTA METODOLÓGICA Para a realização da pesquisa, utilizamos metodologia de caráter qualitativo, na qual o pesquisador não está preocupado em fazer inferências estatísticas, mas através do uso de sumários, classificações e tabelas, fazer interpretações e descrições 04619

3 dos dados coletados (MOREIRA, 2011, p. 7-32). No trabalho, procuramos descrever e interpretar os dados coletados, conduzir interpretações sistemáticas dos mesmos para uma compreensão dos dados e documentos analisados. (MORAES, 1999). Como etapa da análise documental, estudamos o Projeto Pedagógico (PP), os planos de estudos e os diários de classe de uma escola parceira. A partir disso, construímos tabelas e mapas conceituais, procurando mostrar os conhecimentos/ assuntos legitimados nesses documentos como conteúdos de Ciências. CURRÍCULO DE CIÊNCIAS: UMA PRÁTICA EM AÇÃO Com relação aos indicadores, tivemos os seguintes dados da escola pesquisada: Tabela 1: Dados do Censo Escolar, IDEB e de políticas públicas da Escola A tabela 1 indica que, apesar de haver um índice de evasão nulo, de uma taxa de reprovação de 22,2% e do auxilio do programa PDE Escola (Plano de Desenvolvimento da Educação), o resultado do IDEB é muito inferior à meta estabelecida, justificado, provavelmente, pelo conhecimento dos alunos medido nas avaliações em larga escala. Mas o que isso tem a ver com o currículo? Pensamos que um dos aspectos relacionados à qualidade do ensino é sobre aquilo que se ensina. Assim, analisamos os planejamentos e os diários de classe das turmas de 6º, 7º, 8º e 9º ano, e pudemos observar que muitos conceitos são segmentados e bastante distantes daquilo que os alunos conhecem em seu cotidiano, havendo uma dimensão predominantemente classificatória como mostramos a seguir, por exemplo, no 7º ano, quando ao tratar sobre os seres vivos, aparece o assunto vírus, mas no ano seguinte, ao tratar sobre reprodução e sexualidade o assunto não mais aparece, além disso, os conhecimentos sobre fecundação estão distantes do conhecimentos sobre o sistema glandular, mesmo que os conceitos/conhecimentos tratados aqui sejam fundamentais para a compreensão da fecundação Mas, onde encontramos a maior segmentação (e sobreposição de conceitos) foi no 9º ano, pois além do excesso de conteúdos (tomados, muitas vezes, como uma 04620

4 síntese dos conteúdos que serão tratados no Ensino Médio), são tratados em disciplinas distintas, dentro da própria disciplina de Ciências, o que, em princípio, iria contra a ideia da interdisciplinaridade, que tem sido estudada e defendida para a educação escolar. Com relação aos currículos de Ciências, Lima e Grillo (2008) afirmam que os conteúdos selecionados precisam ser suficientemente significativos (p. 13), no sentido de possibilitar aos alunos melhor compreensão da sua realidade para que possam pensar em transformá-la. Com relação ao 7º ano, construímos um mapa a partir dos dados do plano de estudos e do diário de classe de uma turma, que nos dá a ideia de organização dos conceitos (figura 1): Figura 1: Mapa com os conteúdos previstos No mapa que construímos percebe-se uma distribuição sistemática de temas, com distribuição hierárquica de conhecimentos, em uma representação linear que não prevê a contextualização dos conceitos ou a inter-relação desses com outros conceitos com um enfoque interdisciplinar. Nesse sentido, Lima e Grillo (2008) afirmam: os projetos educativos da área de Ciências precisam ser revistos, tendo em vista que a seleção de conteúdos escolares ainda recai em informações, nomenclaturas e definições a serem transmitidas e em descrições de fenômenos a serem memorizados (p.113). Como estratégia para propor uma reflexão sobre as questões que discutimos no estudo, fizemos um exercício de pensar o currículo de Ciências em uma dimensão mais contextualizada (e interdisciplinar), procurando relacionar conteúdos de Ciências com temas mais gerais e com o desenvolvimento de procedimentos e atitudes (COOL, 1997), como, por exemplo, na proposição de estudar as plantas, suas partes e funções a partir do tema alimentação, ao invés de estudar a caracterização de vegetais a partir de sua morfologia. 04621

5 Vemos em reflexões como esta, uma aproximação com as orientações para o trabalho com os temas transversais (BRASIL, 1997) como modo de dar significado ao que é ensinado e tratando os conteúdos escolares associados a questões que envolvem aspectos da vida social. CONSIDERAÇÕES FINAIS No estudo que realizamos, nos deparamos com proposições curriculares pouco inovadoras, com currículos engessados, com sobreposição de conceitos e sem vinculação com temas mais gerais e explicativos dos fenômenos com os quais os estudantes se deparam no seu dia-a-dia, o que não estimula o interesse, a curiosidade e o espírito de investigação, de modo a incentivar o gosto pelo aprender de uma maneira dinâmica e reflexiva. Assim, podemos ver que há muitos fatores envolvidos na questão da qualidade da educação, sendo fundamental compreender por que se ensina o que se ensina, já que o que ensinar é ponto de partida para a organização do currículo, pois o currículo como construção social e cultural está impregnado pelos valores inerentes ao contexto que o referenciam. (LIMA e GRILLO, p.14) REFERENCIAL BIBLIOGRAFICO BARRETO, E.S.S. Tendências Recentes do Currículo na Escola Básica. São Paulo: Fundação Carlos Chagas, 2005. BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: introdução aos parâmetros curriculares nacionais / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília : MEC/SEF, 1997. 126p. COLL, César. et al. Os Conteúdos na Reforma: ensino e aprendizagem de conceitos, procedimentos e atitudes. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.) CÓSSIO, M. de F. Avaliação: Concepção e práticas no contexto das políticas educacionais. KUSS, A. V.; LÜDTKE, R. O ensino de Biologia no contexto do Programa Novos Talentos/CAPES. Pelotas: Cópias Santa Cruz Ltda, 2012. GIMENO SACRISTÁN J. O currículo: os conteúdos do ensino ou uma análise prática.; PÉREZ GÓMEZ, A. I. Compreender e transformar o ensino. 4. ed. Porto Alegre: ArtMed, 2000. Cap. 6, p. 119-148. LIMA, Valderez R., GRILLO, Marlene. Como organizar os conteúdos científicos de modo a constituir um currículo para o século 21? In: GALIAZZI et al (org.). Aprender em rede na Educação em Ciências. Ijuí, Ed. Unijuí, 2008. MOREIRA, MA. (2011). Pesquisa em ensino: Aspectos Metodológicos. São Paulo: Editora Livraria da Física Ltda. MORAES, Roque. Análise de conteúdo. Revista Educação, Porto Alegre, v. 22, n. 37, p. 7-32, 1999. AGRADECIMENTOS: CAPES PROJETO OBSERVATÓRIO DA EDUCAÇÃO 04622