CONHECENDO O INIMIGO Direito Penal PROF. NIDAL AHMAD
CRIME IMPOSSÍVEL Art. 17 CRIME IMPOSSÍVEL Ineficácia Absoluta do Meio Impropriedade Absoluta do Objeto FATO ATÍPICO 7.1) CONCEITO É a tentativa não punível, porque o agente se vale de meios absolutamente ineficazes ou volta-se contra objetos absolutamente impróprios, tornando impossível a consumação do crime. É uma causa de exclusão da tipicidade. NÃO CONSTITUI CRIME 7.2) DELITO IMPOSSÍVEL POR INEFICÁCIA ABSOLUTA DO MEIO Ocorre quando o meio empregado pelo agente, pela sua própria natureza, é absolutamente incapaz de produzir o resultado. Meio é tudo aquilo que pode ser utilizado pelo agente para executar o delito e alcançar o resultado pretendido. Ex: faca, revólver, pedaço de madeira, veneno, etc. O crime impossível por ineficácia absoluta do meio guarda relação com o meio de execução ou instrumento utilizado pelo agente, que, por sua natureza, será incapaz de produzir qualquer resultado, ou seja, jamais alcançará a consumação do delito. É o caso do agente que, pretendendo matar a vítima, usa como meio executório arma completamente defeituosa, que jamais efetuaria qualquer disparo. Da mesma forma, trata-se de crime impossível, pela impropriedade absoluta do meio, o fato de o agente usar de grosseira falsificação de bilhete de loteria para recebimento de prêmio no futuro, quando percebido de imediato pela suposta vítima.
Ainda, constitui crime impossível, por ineficácia absoluta do meio, a conduta da gestante que busca interromper a gravidez com a morte do feto, fazendo uso de substância que não tem efeito abortivo, como, por exemplo, chá de boldo. crime impossível. Obs: a ineficácia do meio, quando relativa, leva à tentativa e não ao Há ineficácia relativa do meio quando, não obstante eficaz à produção do resultado, este não ocorre por circunstâncias acidentais. É o caso do agente que pretende desfechar um tiro de revólver contra a vítima, que, embora apto a efetuar disparo, uma bala nega fogo, sendo detido. Nesse caso, o agente responderá por tentativa de homicídio. 7.3) DELITO IMPOSSÍVEL POR IMPROPRIEDADE ABSOLUTA DO OBJETO MATERIAL O crime impossível pela impropriedade absoluta do objeto guarda relação com o objeto material, compreendendo a pessoa ou coisa, sobre o qual recai a conduta do agente. O objeto será absolutamente impróprio quando inexistente ao tempo da conduta do agente ou, ainda, pelas circunstâncias em que se encontra, afigura-se impossível a produção do resultado visado pelo agente. Tomemos como exemplo a conduta do agente, que pretendendo matar a vítima, desfere vários disparos de arma de fogo contra o seu corpo, verificando-se, após, que, ao receber os disparos, já se encontrava morta, em decorrência de ter sofrido, momentos antes, fulminante ataque cardíaco. Evidente, nesse caso, a impropriedade absoluta do objeto, diante da impossibilidade de ceifar a vida de pessoa que já estava morta. Da mesma forma, caracteriza crime impossível pela impropriedade absoluta do objeto a conduta da mulher que ingere substância abortiva, demonstrando-se, após, que jamais estivera grávida. Trata-se de fato atípico, pois não há objeto material a ser atingido (feto com vida intrauterina), não sendo possível, pois, punir a mulher nem mesmo a título de tentativa de aborto. Considera-se, ainda, crime impossível por impropriedade absoluta do objeto a conduta do punguista que pretende subtrair a carteira da vítima, que, ao tempo da ação, não trazia consigo qualquer quantia ou bem com valor econômico. tentativa. segundos antes. Obs: a impropriedade não pode ser relativa, pois nesse caso haverá Ex: o agente dispara tiros de revólver no leito da vítima, que dele saíra
ERRO DE TIPO Art. 20 Invencível Exclusão DOLO CULPA FATO ATÍPICO Essencial EXCLUSÃO DO DOLO Vencível RESPONDE POR CULPA, SE TIVER PREVISÃO LEGAL ERRO DE TIPO Erro sobre Objeto Acidental Erro Sobre Pessoa art.20, 3, CP Aberratio Ictus art. 73 CP Aberratio Criminis art. 74, CP
8.1) CONCEITO Nos termos do artigo 20, caput, do Código Penal, caracteriza-se pelo erro sobre o elemento constitutivo do tipo penal. Antes de mais nada, mostra-se importante compreender o que significa a expressão elemento constitutivo do tipo penal. A figura típica (ou tipo legal) é composta de elementos específicos ou elementares. Cada expressão que compõe uma figura típica é um elemento que constitui o modelo legal de conduta proibida. Ex: O crime de homicídio (CP, art. 121) é composto pelos elementos matar alguém. Matar é um elemento constitutivo do tipo que define o crime de homicídio. alguém é também um elemento constitutivo do tipo que define o crime de homicídio. O erro de tipo é o erro que recai sobre um dos elementos constitutivos do tipo penal. Há uma falsa percepção da realidade que cerca o agente. O agente desenvolve uma conduta sem saber que está praticando um fato típico. Não sabe, em função do erro, que está praticando uma conduta típica. Ex: Durante uma caçada, o agente percebe que há movimentação atrás de arbustos. Supondo ser um animal, atira em direção ao alvo, e, quando vai se certificar do produto da caça, verifica que, na realidade, atingiu uma pessoa, que estava escondido atrás dos arbustos. A realidade do caçador era a de que estava atirando contra um animal. Todavia, tratase de uma falsa percepção da realidade, já que acabou atingindo uma pessoa humana. O agente errou sobre o elemento constitutivo alguém. Desenvolveu uma conduta sem saber, por conta do erro, que estava praticando um fato típico. Imaginemos a conduta de um estudante universitário que apanha um notebook que deixou carregando na tomada, supondo ser seu, quando, na realidade, era do colega, que antes teria colocado o seu notebook para carregar na mesma tomada. A realidade do estudante universitário era a de que estava se apossando do seu notebook. Todavia, trata-se de uma falsa percepção da realidade, pois se apossou do notebook alheio. O agente não sabia que estava praticando uma conduta típica, pois errou sobre o elemento constitutivo alheio do tipo penal que define o crime de furto (CP, art. 155). Em outras palavras, no erro de tipo, o agente desenvolve conduta sem consciência e vontade em relação ao resultado e nexo causal. Há desconformidade entre a realidade e a representação do sujeito que, se a conhecesse, não realizaria a conduta. Ex: No crime de homicídio temos os seguintes elementos: matar + alguém. O erro sobre qualquer desses elementos pode levar ao erro de tipo.
O erro de tipo pode recair sobre uma circunstância qualificadora. Ex: No crime de lesão corporal seguida de aborto, o sujeito não responde por este crime se desconhecia o estado de gravidez da vítima. É que neste caso ele supõe inexistente uma circunstância do crime (o estado de gravidez da vítima), subsistindo o tipo fundamental doloso (lesão corporal leve). O erro de tipo sempre exclui o dolo, seja invencível ou vencível, podendo, no entanto, dependendo do caso concreto, levar à punição por crime culposo, se previsto em lei. 8.2) ERRO DE TIPO ESSENCIAL É o erro que incide sobre as elementares e circunstâncias do tipo. Daí no nome erro essencial: incide sobre situação de tal importância para o tipo que, se o erro não existisse, o agente não teria cometido o crime, ou, pelo menos, não naquelas circunstâncias. Portanto, há erro de tipo essencial quando a falsa percepção da realidade impede o sujeito de compreender a natureza criminosa do fato. O erro de tipo essencial se subdivide em: INVENCÍVEL OU VENCÍVEL. A) INVENCÍVEL (OU ESCUSÁVEL) Ocorre quando não pode ser evitado pela normal diligência. Qualquer pessoa, empregando a diligência ordinária exigida pelo ordenamento jurídico, nas condições em que se viu o sujeito, incidiria em erro. Ex. o agente se embrenha em mata virgem e fechada, distante de qualquer centro urbano, com a intenção de caçar capivara. Pelas tantas, vislumbra um vulto se movimentando pela intensa vegetação. Supondo ser um animal, efetua um disparo. Atinge o alvo e constata, para sua surpresa, que abateu não um animal, mas um ser humano que, por coincidência, também caçava por ali. sujeito não age dolosa ou culposamente. O erro de tipo essencial invencível exclui o dolo e a culpa, pois o
B) ERRO VENCÍVEL (OU INESCUSÁVEL) Ocorre quando pode ser evitado pela diligência ordinária, resultando de imprudência ou negligência. Qualquer pessoa, empregando a prudência normal exigida pela ordem jurídica, não cometeria o erro em que incidiu o sujeito. É o erro evitável, indesculpável ou inescusável (cuidado: vencível = inescusável): poderia ter sido evitado se o agente empregasse mediana prudência. Ex. Suponha-se que o agente vá caçar em mata próxima a zona urbana, onde costumam passar pessoas, e efetua um disparo de arma de fogo contra um vulto pensando ser um animal, atingindo, na verdade, uma pessoa que passava pelo local, matandoa. No caso, não obstante ter se verificado o erro de tipo, o erro, pelas circunstâncias, não era plenamente justificável, porquanto o agente agiu com imprudência, sem o devido cuidado objetivo, devendo responder por homicídio culposo. desde que previsto em lei o crime culposo. O erro de tipo essencial vencível exclui o dolo, mas não a culpa, ERRO PROVOCADO POR TERCEIRO E ERRO DE TIPO ACIDENTAL 9.1) ERRO PROVOCADO POR TERCEIRO Art. 20, 2º Existe o erro provocado quando o sujeito a ele é induzido por conduta de terceiro. A provocação pode ser dolosa ou culposa. A posição do terceiro provocador é a seguinte: Responde pelo crime a título de dolo ou culpa, de acordo com o elemento subjetivo do induzimento. A posição do provocado é a seguinte: a) Tratando-se de erro invencível, não responde pelo crime cometido, quer a título de dolo, quer de culpa. b) Tratando-se de provocação de erro vencível, não responde pelo crime a título de dolo, subsistindo a modalidade culposa, se prevista na lei penal incriminadora.
9.2) ERRO DE TIPO ACIDENTAL Incide sobre dados irrelevantes da conduta típica. Não impede o sujeito de compreender o caráter ilícito de seu comportamento. Mesmo que não existisse, ainda assim a conduta seria antijurídica. Erro sobre o objeto Resultado diverso do pretendido (Aberratio Criminis) Art. 74 CP ERRO DE TIPO ACIDENTAL Erro sobre a pessoa Art. 20, 3º CP Erro na execução (Aberratio Ictus) Art. 73 CP 9.3) ERRO SOBRE OBJETO Há erro sobre objeto quando o sujeito supõe que sua conduta recai sobre determinada coisa, sendo que, na realidade, ela incide sobre outra. É o caso do sujeito subtrair farinha pensando ser açúcar. O erro é irrelevante, pois a tutela penal abrange a posse e a propriedade de qualquer coisa, pelo que o agente responde por furto. É o caso, ainda, do sujeito desejar subtrair joia preciosa, mas se apossar de objeto com valor reduzido, pois banhado a ouro. O erro é irrelevante, sendo meramente acidental, não influenciando na tipicidade da conduta do agente, pois subtraiu conscientemente coisa alheia móvel, errando, no entanto, quanto ao objeto. Todavia, como bem advertiu Cléber Masson: A análise do caso concreto, entretanto, pode autorizar a incidência do princípio da insignificância, excluindo a tipicidade do fato, quando todos os seus requisitos objetivos e subjetivos estiverem presentes. É o que se dá, a título ilustrativo, na hipótese em que o agente, primário e sem antecedentes
criminais, subtrai de uma grande joalheria uma imitação de um relógio de alto valor, porém avaliada em somente R$ 10,00. 1 9.4) ERRO SOBRE PESSOA Art. 20, 3º Ocorre quando há erro de representação, em face do qual o sujeito atinge uma pessoa supondo tratar-se da que pretendia ofender. Ela pretende atingir certa pessoa, vindo a ofender outra inocente pensando tratar-se da primeira. Nos termos do art. 20, 3º, 2ª parte, reza o seguinte: Não se consideram, neste caso (erro sobre pessoa), as condições ou qualidades da vítima, senão as de pessoa contra quem o agente queria praticar o crime. Significa que no tocante ao crime cometido pelo sujeito não devem ser considerados os dados subjetivos da vítima efetiva, mas sim esses dados em relação à vítima virtual (que o agente pretendia ofender). Exs: a) O agente pretende cometer homicídio contra Pedro. Coloca-se de atalaia e, pressentindo a aproximação de um vulto e supondo tratar-se da vítima, atira e vem a matar o próprio pai. Sobre o fato não incide a agravante genérica prevista no art. 61, II, e, 1ª figura (ter cometido o crime contra ascendente). b) o agente pretende praticar um homicídio contra o próprio irmão. Põe-se de emboscada e, percebendo a aproximação de um vulto e o tomando pelo irmão, efetua disparos vindo a matar um terceiro. Sobre o fato incide a agravante do art. 61, II, e, 3ª figura (ter sido o crime cometido contra irmão). 1 MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado Parte Geral Vol. 1. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2017, p. 350.
ERRO DE TIPO ACIDENTAL O ERRO NÃO INFLUENCIA NA ESSÊNCIA DO CRIME, POIS MERAMENTE ACIDENTAL ERRO SOBRE O OBJETO ERRO SOBRE A PESSOA SUJEITO ERRA O OBJETO O QUAL PRETENDE ATINGIR. RESPONDE PELO CRIME. SUJEITO ERRA A IDENTIDADE DA PESSOA. ATINGE UMA PESSOA SUPONDO TRATAR- SE DE OUTRA A QUEM PRETENDIA OFENDER Ex: furto de bijuteria pensando ser de ouro Ex: sujeito quer matar o pai e acaba atingindo terceira pessoa; mãe, sob influência do estado puerperal, mata outra criança que não é o seu filho A CONSEQUÊNCIA É QUE O SUJEITO RESPONDE COMO SE TIVESSE ATINGIDO A PESSOA VISADA (VIRTUAL) CONSIDERAM-SE AS CARACTERÍSTICAS PESSOAIS DA PESSOA VISADA (VIRTUAL) ERRO NA EXECUÇÃO (aberratio ictus) E RESULTADO DIVERSO DO PRETENDIDO (aberratio criminis) 10.1) ERRO NA EXECUÇÃO (aberratio ictus) I) CONCEITO Aberratio ictus significa aberração no ataque ou desvio do golpe. Ocorre quando o sujeito, pretendendo atingir uma pessoa, vem a ofender outra.
Ocorre erro na execução quando o agente, pretendendo atingir uma pessoa, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, acaba atingindo pessoa diversa. A relação é de pessoa x pessoa e não crime x crime. O agente não erra quanto à identidade da pessoa, mas quanto aos meios no uso dos meios de execução do delito. Com efeito, visualiza como certa a vítima pretendida, mas, por erro na pontaria, por exemplo, acaba atingindo pessoa diversa. A aberratio ictus pode ocorrer quando, por acidente, o agente, ao invés de atingir a pessoa pretendida, atinge pessoa diversa. Suponhamos, nesse caso, que o agente pretende matar Wilson, deixando na sua mesa de trabalho uma xícara de café contendo veneno. Todavia, quem toma o café é Pedro, que acaba falecendo. Pode ocorrer também quando, por erro nos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa pretendida, atinge pessoa diversa. Exemplo: Agente pretendendo matar Wilson, visualiza a vítima, tendo-a como certa, faz a mira e efetua o disparo, mas, no entanto, erra o alvo pretendido, atingindo pessoa diversa, que se encontrava próxima ao local. II) ABERRATIO ICTUS COM UNIDADE SIMPLES Ocorre a aberratio ictus com resultado único quando em face de erro na execução somente a pessoa diversa da pretendida é atingida, resultando lesão corporal ou morte. A consequência jurídica da conduta do agente se encontra retratada no artigo 73, 1ª parte do Código Penal, que faz expressa remissão ao artigo 20, 3º, do Código Penal. Ou seja, na hipótese de erro na execução, deve-se observar o disposto no artigo 20, 3º, do Código Penal, segundo o qual, embora tenha atingido pessoa diversa, o agente deve receber tratamento penal considerando-se as condições ou qualidades da pessoa pretendida (vítima virtual), desprezando-se as condições pessoais da vítima efetivamente atingida. Ex: Agente efetua disparos em direção à vítima pretendida (vítima virtual), mas por erro na pontaria, acaba atingindo somente pessoa diversa, vindo a matá-la. Nesse caso, responderá pelo delito de homicídio doloso, como se tivesse matado a vítima pretendida. Nesse caso, nos termos do artigo 20, 3º, do Código Penal, deve-se considerar as condições ou qualidades da vítima pretendida. Assim, no caso, embora tenha atingido de forma letal pessoa diversa, o agente responde como se tivesse atingido a pessoa pretendida, ou seja, como se tivesse matado o próprio pai. Logo, responderá pelo crime de
homicídio doloso consumado, com a incidência da agravante de ter praticado crime contra ascendente, prevista no artigo 61, II, e, 1ª figura, do Código Penal. III) ABERRATIO ICTUS COM RESULTADO DUPLO A aberratio ictus com resultado duplo ocorre quando o agente, além de atingir a vítima pretendida, atinge também pessoa diversa. Nesse caso, com uma única ação, o agente produz mais de um resultado: atinge a pessoa pretendida, e também pessoa diversa. Por essa razão, o artigo 73, 2ª parte, do Código Penal faz expressa remissão ao artigo 70 do Código Penal, devendo ser aplicada a regra do concurso formal de crimes. Ex: Pretendendo matar Wilson, o agente efetua um disparo, que, além de atingir Wilson, atinge também Pedro, que se encontrava atrás da vítima pretendida. Por conta da potência da arma utilizada, o disparo efetuado causou a morte da pessoa pretendida e também da pessoa diversa. Em tese, teríamos homicídio doloso em relação à vítima pretendida e homicídio culposo em relação à pessoa diversa. Nesse caso, nos termos do que dispõe o artigo 73, 2ª parte, do Código Penal, deve-se aplicar a regra do artigo 70 do Código Penal, segundo o qual, se o agente com uma única ação praticar dois ou mais crimes, deve-se considerar a pena do crime mais grave, aumentando-a de 1/6 (um sexto) até a ½ (metade). 10.2) RESULTADO DIVERSO DO PRETENDIDO (aberratio criminis) Art. 74 A) CONCEITO A aberratio criminis também resulta de acidente ou erro na execução do crime, mas em contexto distinto da aberratio ictus. Na aberratio criminis, o agente pretende ofender um determinado bem jurídico, mas, por acidente ou erro na execução, acaba produzindo resultado diverso do pretendido. Na verdade, o agente pretendia praticar um crime, mas acaba praticando crime diverso do pretendido. Por essa razão, diz-se que na aberratio criminis há desvio do crime. Enquanto na aberratio ictus, a relação é entre pessoa x pessoa, ou seja, o agente, pretendendo atingir uma pessoa, acaba ofendendo pessoa diversa (ou ambas), na
aberratio criminis, o agente quer atingir um bem jurídico e ofende outro bem jurídico, produzindo resultado diverso do pretendido. Ex: O agente, pretendo praticar o crime de dano (CP, art. 163), atira uma pedra contra um carro. Todavia, por erro na pontaria, a pedra acabou atingindo uma pessoa que se encontrava próxima ao local. Note-se que o agente pretendia produzir um resultado (dano no veículo), mas acabou produzindo um resultado diverso do pretendido (lesão corporal). B) ESPÉCIES 1º) Com unidade simples ou resultado único: Só atinge o bem jurídico diverso do pretendido. Ou seja, o agente quer atingir uma coisa e atinge uma pessoa. Responde pelo resultado produzido a título de culpa (homicídio ou lesão corporal culposos). Portanto, a consequência é a seguinte: responde só pelo resultado produzido e, mesmo assim, se previsto como crime doloso. 2º) Com unidade complexa ou resultado duplo: Na aberratio criminis com resultado duplo, o agente, além de praticar o crime pretendido, também acaba produzindo um resultado diverso do pretendido. Ou seja, com uma ação ou omissão, acaba provocando dois resultados. Nesse caso, como expressamente prevê a parte final do artigo 74 do Código Penal, aplica-se a regra do concurso formal de crimes (CP, art. 70), considerando-se a pena do crime mais grave aumentada de 1/6 até metade, de acordo com o número de resultados diversos produzidos. Imaginemos que certo dia, o agente, com raiva do vizinho, resolva quebrar a janela da residência deste. Para tanto, espera chegar a hora adequada e, supondo não haver ninguém na residência, o agente arremessa com força, na direção da casa do vizinho, um enorme tijolo, que, além de quebrar a vidraça, atinge também sua nuca. O vizinho falece instantaneamente. Nesse caso, o agente deverá responder por homicídio culposo em concurso formal com o crime de dano (art. 121, 3º, e art. 163, na forma do art. 70, todos do Código Penal), considerando-se a pena aplicada para o crime de homicídio culposo, já que mais grave, aumentada de 1/6. Cumpre ressaltar, por pertinente, que, se o resultado previsto como crime culposo for menos grave ou se o crime não prever modalidade culposa, não aplica o disposto no artigo 74 do Código Penal. Assim, como dito em aula, se o agente efetua disparos de arma para matar a vítima, mas não o acerta e quebra a vidraça de uma casa ou acerta um carro, deve-se desprezar a hipótese do artigo 74 do Código Penal, responderá por tentativa de
homicídio. Primeiro, porque o crime de tentativa de homicídio é mais grave do que o delito de dano; segundo, porque não há previsão legal de dano culposo. FALTA DE POTENCIAL CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE 2.1) ERRO DE PROIBIÇÃO Art. 21 I) CONCEITO Nos termos do artigo 21 do Código Penal, o desconhecimento da lei é inescusável. Não se mostra possível, portanto, o agente acusado de uma infração penal alegar desconhecimento da lei para se eximir da aplicação da lei penal. A partir da publicação da lei no Diário Oficial, há presunção absoluta acerca do seu conhecimento. O desconhecimento da lei não se confunde com a falta de potencial consciência da ilicitude. A primeira guarda relação com o desconhecimento do seu texto legal, dos seus detalhes, ao passo que a segunda se caracteriza pela ausência de conhecimento que a conduta desenvolvida é ilícita. É nesse contexto que surge o instituto do erro de proibição. O erro de proibição é o erro que incide sobre a ilicitude do fato. Encontra-se disciplinado no artigo 21 do Código Penal. No erro de proibição, o agente desenvolve uma conduta movido por uma falsa percepção acerca do caráter ilícito do fato típico praticado. Ou seja, o agente tem consciência da conduta praticada, mas lhe falta potencial consciência da ilicitude do fato. II) FORMAS E EFEITOS DO ERRO DE PROIBIÇÃO A) ESCUSÁVEL OU INEVITÁVEL: O erro de proibição escusável, inevitável ou invencível ocorre quando o erro sobre a ilicitude do fato é impossível de ser evitado, valendo-se o ser humano da sua diligência ordinária. Em outras palavras, ainda que tivesse empregado as diligências necessárias à sua condição pessoal, o agente não reuniria condições para compreender o caráter ilícito do fato praticado. Ex. um telejornal de alcance nacional informa, de forma equivocada, a aprovação da lei que autorizada a eutanásia de doentes em estágio terminal. Não havendo nenhuma razão para duvidar da veracidade da notícia, o agente se dirige até o hospital e desliga os aparelhos que mantinham vivo um ente querido, que se encontrava sofrendo com a doença que o acometia e em estágio terminal, causando-lhe a morte. Praticou fato típico e ilícito, mas
lhe faltou potencial consciência da ilicitude, incidindo o erro de proibição inevitável, cuja consequência será a exclusão da culpabilidade. B) INESCUSÁVEL OU EVITÁVEL: O erro de proibição inescusável ou evitável ocorre quando o erro sobre a ilicitude do fato que não se justifica, pois, se tivesse havido um mínimo de empenho em se informar, o agente poderia ter tido conhecimento da realidade. O critério de aferição do erro de proibição inescusável, vencível ou evitável encontra-se no parágrafo único do artigo 21 do Código Penal, segundo o qual considerase evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência. Em se tratando de erro de proibição evitável, permanece hígida a culpabilidade do agente, sendo, no entanto, causa de diminuição da pena de um sexto a um terço. Isenção de pena Redução de pena de 1/6 a 1/3 C) DIFERENÇA ENTRE ERRO DE TIPO E ERRO DE PROIBIÇÃO No erro de tipo essencial, previsto no artigo 20 do CP, o agente erra sobre um dos elementos constitutivos do tipo (que nada mais são do que as expressões que integram o artigo que define o crime.
Ex: Art. 121 matar alguém: essas duas expressões são elementos que constituem o tipo penal que define o delito de homicídio). Aqui o agente age mediante uma falsa percepção da realidade. Ou seja, nas circunstâncias do caso concreto, ele não sabe o que faz. Se soubesse, não incorreria no erro, porque tem ciência da ilicitude da conduta. Ex: rapaz mantém conjunção carnal com menina menor de 14 anos de idade, supondo ser ela maior de idade. Errou sobre um elemento que constitui o artigo 217-A do CP, qual seja, menor de 14 anos de idade. O ERRO DE PROIBIÇÃO, previsto no artigo 21 do CP, é o erro que incide sobre a ilicitude do fato. O sujeito sabe o que faz, mas, incorrendo em erro, supõe inexistir a regra de proibição, ou seja, supõe que pratica conduta lícita. Ex: Holandês, em visita ao Brasil, porta substância entorpecente para consumo pessoal (sabe o que faz...), supondo ser conduta lícita, já que no seu País de origem é permitido (...mas erra sobre a ilicitude do fato). Para deixar bem clara a diferença, atentem para as seguintes hipóteses: a) Agente que porta arma de fogo verdadeira, supondo ser de brinquedo (eis a falsa percepção da realidade). Há erro de tipo, mais especificamente em relação ao elemento arma de fogo, que constitui o tipo penal que define o delito de porte ilegal de arma de fogo, previsto no artigo 14 da Lei nº 10.826/2003. O agente não sabe o que faz (portar arma de fogo verdadeira, pois supõe ser de brinquedo). Se soubesse, não incorreria em erro, porque sabe ou deveria saber que se trata de conduta ilícita. Se o erro de tipo for invencível, exclui-se o dolo e a culpa e o fato será atípico; se o erro de tipo for vencível, exclui-se o dolo e o sujeito responde pelo delito na modalidade culposa, se tiver previsão legal, conforme prevê o artigo 20 do CP. Como, no caso, não existe delito de porte ilegal de arma de fogo na modalidade culposa, o fato será atípico. b) Cidadão americano, em visita ao Brasil, porta uma arma de fogo, supondo ser conduta lícita, já que nos Estados Unidos, especificamente na região em que reside, tal conduta é permitida. Trata-se de erro de proibição, uma vez que o agente sabe exatamente o que está fazendo (portar arma de fogo verdadeira), mas supõe que sua conduta é permitida
pelo direito, quando, na verdade, é ilícita. Se o erro de proibição for inevitável, haverá isenção de pena e, por consequência, exclusão da culpabilidade; se for evitável, o agente responde pelo delito previsto no artigo 14 da Lei nº 10.826/2003, com redução da pena de 1/6 a 1/3, nos termos do artigo 21 do Código Penal. ERRO DE TIPO ERRO DE PROIBIÇÃO PORTAR ARMA DE FOGO VERDADEIRA, SUPONDO SER DE BRINQUEDO CIDADÃO AMERICANO PORTAR ARMA DE FOGO NO BRASIL SUPONDO SER CONDUTA LÍCITA AGENTE NÃO SABE O QUE FAZ AGENTE SABE O QUE FAZ CAUSA EXCLUDENTE DE TIPICIDADE SE SOUBESSE, NÃO INCORRERIA EM ERRO, POIS SABE SER CONDUTA ILÍCITA SUPÕE QUE SUA CONDUTA É LÍCITA CAUSA EXCLUDENTE DE CULPABILIDA DE SE ERRO FOR INVENCÍVEL, EXCLUI O DOLO E A CULPA E O FATO SERÁ ATÍPICO SE O ERRO FOR VENCÍVEL, EXCLUI O DOLO E O AGENTE RESPONDE POR CULPA SE A CONDUTA TIVER PREVISÃO NA MODALIDADE CULPOSA SE ERRO FOR INEVITÁVEL, HÁ ISENÇÃO DE PENA SE ERRO FOR EVITÁVEL, HÁ REDUÇÃO DA PENA DE 1/6 A 1/3