Monitorização do Processo de Purificação de Gomas Naturais: Goma do Cajueiro



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Transcrição:

Monitorização do Processo de Purificação de Gomas Naturais: Goma do Cajueiro Sônia M.O. Costa, Judith f. Rodrigues e Regina C.M. de Paula Resumo: Na tentativa de obtenção de uma goma de elevado grau de pureza e totalmente na forma de sal de sódio, foi desenvolvido um método de purificação envolvendo quatro estágios. O primeiro desses estágios, o isolamento, seguiu o procedimento desenvolvido por Rodrigues et ai. I. OS dois seguintes, denominados primeira e segunda purificações, envolveram repetidas dissoluções em H20, a primeira delas em presença de NaCl, com subseqüentes precipitações com etanol. No último deles, utilizou-se troca iônica e liofilização. Os vários estágios foram monitorados pelo teor de cinzas, umidade, proteína e de cátions presentes. O teor de ácidos urônicos, a viscosidade intrínseca e a distribuição de massa molar por GPC foram também determinados ao longo das purificações. A goma do cajueiro (Anacardium occidentale L.) foi utilizada como substância-teste. Palavras-chave: Goma, polissacarídeo, purificação, cajueiro, Anacardium occidentale Introdução Gomas naturais são polissacarídeos que sofrem hidratação em água fria ou quente, formando dispersões coloidais, soluções altamente viscosas ou até mesmo géis. Elas podem ser obtidas de exsudatos de árvore, de sementes, de algas ou por fermentação microbiológica. Suas impurezas mais freqüentes são os sais inorgânicos e outras substâncias de baixa massa molar, além de proteínas, ligninas e ácidos nucléicos 2,3. A retirada dessas impurezas é inicialmente feita por meio de um processo denominado isolamento. Rodrigues et ai. I compararam dois métodos de isolamento de gomas naturais, o de Anderson 4, que é efetuado pela trituração, dissolução em H20 fria, filtrações, diálise e liofilização e o outro de Rinaudo e Milas 5, que utiliza trituração, diss~lução em H20 com ajuste de ph e à temperatura ambiente, filtração e precipitação com etano1. O método Rinaudo e Milas foi considerado o melhor por apresentar maior rapidez do processo, maior rendimento, menor possibilidade de contaminação e maior homogeneidade do material isolado. Rinaudo e Milas 5 aconselham a utilização de mais dois estágios (primeira e segunda purificações) para tornar completa a purificação de gomas, transformando-as totalmente em sal de Na. Um processo global de purificação de gomas, incluindo o isolamento, os dois estágios de purificação e um ultímo de liofilização, será testado e monitorado por meio do teor de cinzas, umidade, proteína e de cátions Sônia M.a. Costa, Centro de Ciências Exatas, Tecnológicas e Agrárias, Universidade Estadual Vale do Acarau, Av. da Universidade, 850, CP. 0-3, CEP 62040-370, Sobral - CE; Judith F. Rodrigues e Regina C.M. de Paula, Oepartamento de Quimica Orgânica e Inorgânica, Universidade Federal do Ceará, CP 12.200, CEP 60455-760, Fortaleza - CE. Polímeros: Ciência e Tecnologia - Abr/Jun - 96 49

presentes. O teor de ácidos urônicos, a viscosidade intrínseca e a distribuição de massa molar também serão determinados ao longo das purificações. A goma do cajueiro (Anacardium occidentale L.) foi utilizada como substância-teste. A goma do cajueiro é um heteropolissacarídeo ácido ramificado contendo os seguintes constituintes principais: galactose, arabinose, ramnose, glicose, ácido glicurônico, além de pequenas quantidades de manose, xilose e ácido metilglicurônic0 6. A sua composição percentual depende da origem. As gomas indiana e papuana contêm aproximadamente 60% de galactose, 15 % de arabinose, 9% deglicose e 7% de ramnosé. Já a goma brasileira contém em tomo de 70% de galactose, apenas 5% de arabinose, 11 % de glicose e 4% de ramnose 7. O teor de ácido glicurônico é aproximadamente o mesmo (~6%), independentemente da origem da goma 4,7. Experimental Processo de purificação A goma bruta foi coletada em julho de 1990 de exsudatos naturais de cajueiros do tipo comum, produtores de fruto de corlaranja. A plantação experimental é proveniente da EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e está localizada no município de Pacajus (Ceará). No estágio de isolamento, como sugerido porrodrigues et ai. I, a goma bruta foi separada da maior parte das suas impurezas e seus constituíntes ácidos neutralizados (Fluxograma 1). A primeira purificação teve como objetivo substituir os cátions presentes na goma (K+, Ca 2 +, Mg 2 +, Fe 3 +) por Na+, por meio da adição de excesso de cloreto de sódio,e retirar as impurezas ainda presentes. Nesse estágio, foram dissolvidos 4 g da goma isolada em 100 ml de H20, na presença de 5 g de NaCl, e o sistema foi submetido às seguintes etapas: filtração, precipitação, nova filtração e lavagem do precipitado (Fluxograma 2). O excesso de NaCl que precipitou com a goma na primeira purificação foi eliminado na segunda purificação (Fluxograma 3). Para realizar essa segunda purificação, cada alíquota de 3 g foi dissolvida em 100 ml de H20 e submetida às mesmas etapas citadas na primeira purificação. Para garantir a goma totalmente na forma de sal de Na, foi feita uma eluição em uma coluna de troca iônica tipo amberlite IR- 120H+. A troca dos íons H+ por Na+ da coluna foi previamente feita pela eluição GOMA BRUTA OlUÇãO 4% em H,o Meio neutralizado com NaOH l.-...--- -l Temperatura ambiente IT llãde vidro l.-...---~_-l~unil de vidro sinterizado GOMA ISOLADA '--...---...J toh I H,o EtOH L..----r------' [! Acetona GOMA ISOLADA ~endimento78% Fluxograma 1. Etapas do isolamento da goma do cajueiro. ~ OIUÇãO 4% em H,o Adição de 5g de NaCL/IOOmL Temperatura ambiente toh/h,o EtOH L..----r------' [! Acetona GOMA [J Rendimento 90% la PURIFICADA Fluxograma 2. Etapas da primeira purificação da goma do cajueiro. 50 Polímeros: Ciência e Tecnologia - Abr/Jun - 96

GOMA 1a PURIFICADA GOMA 2 a PURIFICADA [ Solução 4% em H,o Temperatura ambiente [ Amberlite lr-120 Na' GOMA LIOFILIZADA Fluxograma 4. Etapas do estágio de liofilização da goma do cajueiro. '--...,- --1 [! toh/hp EtOH Acetona GOMA r-;: 2a PURIFICADA L!-endimento 77% Fluxograma 3. Etapas da segunda purificação da goma do cajueiro. de uma solução de NaCIIM. A solução de goma na fonna de sal, oriunda da coluna, foi liofilizada emtrês alíquotas de 200 ml em um liofilizador modelo L4KR, Edwards de alto vácuo (Fluxograma 4). O material oriundo de cada liofilização foi misturado aos demais para homogeneização. Métodos de análise As amostras de goma obtidas nos quatro estágios de purificação foram analisadas no que se refere a seus teores de umidade, cinza e N (proteína). Foram detenninados ainda os teores de cátions e de grupamentos carboxílicos e a viscosidade intrínseca. O teor de umidade foi obtido por diferença de peso após aquecimento a 105 C e o teor de cinza por aquecimento em mufla a 700 C, ambos efetuados até peso constante. O teor de proteína foi calculado a partir do resultado da análise elementar de N, fazendo-se uso da relação %N x 6,25 8. Para possibilitar a análise dos cátions, foi feita inicialmente a digestão das várias amostras de goma em uma mistura de ácido nítrico e ácido perc1órico na proporção 2:1 (v/v). Para a detenninação de Na+ e K+ foi utilizado um fotômetro de chamab 262 da Micronal e para análise de Ca 2 +, Mg 2 + e Fe 3 +, um espectrofotômetro de absorção atômica Perkin-Elmer 3030 B. A porcentagem de grupamentos carboxílicos (ácidos urônicos ) na fonna neutralizada (sal de Na) e na forma ácida foi obtida por titulações condutométricas com HCl 0,01 Me NaOH 0,01 M, respectivamente, como utilizado por Rodrigues et ai. I. Empregou-se um condutivímetro LF 521 WTW com eletrodo de platina platinizado de constante 1,000 cm- I, à temperatura de 25 ± 0,1 cc. Todas as análises foram feitas, no mínimo, em duplicata. As medidas de viscosidade foram efetuadas em NaCll M, utilizando-se um viscosímetro tipo Ubbelohde com diâmetro capilar 0,3 mm. O tempo de escoamento do solvente foi de 293 s a 25,0 ± 0,1 cc. Foram detenninadas as viscosidades intrínsecas das gomas obtidas nos quatro estágios. Os tempos de escoamento foram medidos para as diversas concentrações de goma após cada diluição no viscosímetro, partindo-se da concentração em tomo de 0,5 gldl e fmalizarjdo com aproximadamente 0,1 g/dl. Todos os tempos de escoamento foram repetidos no mínimo três vezes. As massas molares médias foram estimadas através de um cromatógrafo líquído HPLC da Phannacia, acoplado a um detector UV-I (em 280 nm) e inter1igado com um medidor de densidade (PAAR-DMA 60/602). Para minimizar o efeito da carga iônica dos polieletrólitos, todos os experimentos foram realizados em NaCl 1M. Amostras de dextrana e goma arábica foram usadas como padrão. Resultados e Discussão Controle dos estágios de isolamento e purifica~ão da goma do cajueiro No estágio de isolamento, foram utilizadas as condições determinadas por Rodrigues et ai. 1, sem nenhuma modificação ou ajuste. Polímeros: Ciência e Tecnologia - Abr/Jun - 96 51

Para encontrar as condições ideais de cada estágio de purificação, foram realizados vários testes variando-se aconcentração da solução de goma (entre 2, 3 e 4 %), a proporção etano1/ solução aquosa de goma (entre 70/30 e 80/20) e a quantidade de NaCl (entre 5 e 10 g/100 ml de solução). Essas condições ideais são aquelas que venham a fornecer um material solúvel (baixa turbidez da solução), com pouca precipitação de NaCl (baixa condutância da solução) e por meio de um processo com um bom rendimento. As condições ideais para cada etapa foram descritas na parte experimental e constam dos Fluxogramas 2, 3 e 4. O processo como um todo pode ser visualizado no Esquema 1. Análise das amostras de goma de cajueiro A Tabela 1 apresenta alguns dados característicos das gomas bruta, isolada, 1a e 2 a purificadas e liofilizada. GOMA BRUTA,---1,----- ISOLAMENTO ~ GOMA ISOLADA O teor de umidade foi utilizado para correção de massa. Os teores de cinza registrados para as gomas bruta, isolada, 2 3 purificada e liofilizada são próximos e suas variações estão dentro da faixa do erro experimental. A goma 1a purificada, no entanto, apresenta um valor superior ao das demais. Pressupõe-se que tenhahavidoumacoprecipitação donacl,jáque nesta etapa de purificação 50 g deste sal foram adicionados por litro de solução de goma e a evaporação do NaCl só é registrada a partir de 700 C 9. A porcentagem de proteína foi determinada para a goma bruta, isolada e liofilizada. O maior valor foi registrado para a goma bruta. Isto pode ser explicado não só pela maior quantidade de proteína mas também pela presença de outros compostos nitrogenados tais como aminoácidos, que foram também computados quando a porcentagem de proteína foi calculada por %N x 6,25. Observa-se que mesmo a goma considerada pura - a liofilizada -, contém ainda GOMA I'PURIFICADA GOMA 2' PURIFICADA Esquema 1. Seqüenciamento dos estágios de purificação de gomas. GOMA LIOFILIZADA Tabela 1. Características da goma do cajueiro em vários estágios de purificação. Característica bruta isolada Cor do sólido âmbar branco Aspecto do sólido Aspecto da solução escura e turva Iimpida Rendimento (%) 78 Umidade (%) 13,0 15,0 Cinza (%) 0,92 1,10 %N 0,28 0,19 Proteína (%) 1,75 1,19 Ácidos urônicos (%) Forma salina 6,0 Forma ácida 0,0 [TI] em NaCl 1 M 8,6 (ml/g) pó Goma Ia purificada 2 3 purificada branco branco pó pó Iimpida Iimpida 90 77 10,2 9,0 2,36 0,98 6,0 6,0 0,0 0,0 8,1 8,0 liofilizada branco flocos Iimpida 4,3 0,92 0,17 1,06 6,0 0,0 7,3 52 Polímeros: Ciência e Tecnologia - Abr/Jun - 96

proteína residual, provavelmente na forma de um complexo arabinogalactano-proteína (AGP). Na goma de cajueiro isolada foi detectada a presença de 6% deste complexo?, que existe também na goma arábicalo,ii,12. Os ácidos urônicos presentes na goma do cajueiro foram identificados por Anderson 6 como ácidos glicurônicos. O teor destes ácidos permanece constante ao longo dos estágios de purificação e é semelhante ao determinado porrodrigues etai. Ipara a goma de cajueiro isolada (6,3%). Constata-se, também, que todos os grupamentos RCOOR presentes inicialmente no polissacarídeo foram neutralizados, tendo-se apenas a goma na forma de sal. Verifica-se na Fig. 1 que os cátions presentes na goma bruta são principalmente Na+, K+, Ca 2 + e Mg 2+. Constata-se, também, uma diminuição nos teores de K+, Ca 2 +e Mg 2 +ao longo das purificações, cátions estes que estariam sendo substituídos por Na+. A goma la purificada, no entanto, apresenta um porcentual de Na+ anormalmente elevado, mas condizente com a co-precipitação de NaCl, já indicada pelo alto teor de cinzas desta goma. Na goma 2 a purificada, o teor de Na+ decresce, confirmando assim a retirada do excesso de Na+ presente. Observa-se, como previsto, que o porcentual de Na+ com relação ao total de cátions presentes aumenta com os estágios de purificação. Nas gomas bruta e isolada, ele fica em tomo de 70%. Sobe para 94,7% na goma 2 a purificada. Na goma liofilizada, apenas 0,2% dos íons presentes (Ca 2 + e Mg 2 + ) não foram substituídos por Na+, o que indica eles estarem fortemente ligados à goma. Para determinação da viscosidade intrínseca das gomas purificadas em cada estágio foram feitos gráficos da viscosidade reduzida (llesp/c) VS. concentração do polímero, mostrados na Fig. 2. Observa-se um decréscimo nos valores da viscosidade intrínseca ao longo das purificações que pode estar associado à variação na massa molar média. Por outro lado, as constantes de Ruggins (k, obtidas da inclinação das retas) não variam uniformemente. O comportamento anômalo para a goma isolada pode estar relacionado com diferença de solubilidade. Os cromatogramas de GPC para a goma do cajueiro purificada nas quatro etapas estão mostrados na Fig. 3. Três picos principais (A, B, C) foram detectados pela densidade. Somente um pico, correspondente ao A, foi detectado por absorção na região do ultravioleta. Segundo Paula e Rodrigues?, na go- ma de cajueiro isolada o pico A corresponde ao complexo polissacarídeo-proteína, de massa molar em tomo de 10 6 e os picos B e C a polissacarídeos de massas molares, respectivamente 3,2 x 10 4 e 1,6 x 10 4. Assumindo a quantidade de material como proporcional às diferenças de densidade, os autores iden- 0.35...---------------. 0.30 0.25 0.20 0.15 0.10 0.05 Ca",.'.' "'" 0.1.'."".,.,.'.' ".',,.,~ \ Na'/lO', i.-._.-.-. '~ 0.00 +----r-------.:~==::::::l~~~ Bruta I' Purificada Liofilizada Isolada 2' Purificada Figura 1. Distribuição do teor de Na+, K+, Ca 2 +eml+ nas amostras de goma obtidas nos vários estágios de purificação. O teor de Na+ foi dividido por um fator de 10 para facilitar a comparação. 11.0 10.5 10.0 : J 9.5..J,5-2 :;;- 9.0 ~" 8.5 8.0 7.5.. 7.0 +----.------~--- r_---_i 0.0 0.2 Concentração CgldL) "'.......,. Figura 2. Viscosidade reduzida versus concentração de goma do cajueiro nos vários estágios de purificação. Solvente NaCI IM e temperatura 25 C. Goma: ce) isolada, CO) la purificada, Cô) 2 a purificada, C-) liofilizada. "' 0.3 0.4 Polímeros: Ciência e Tecnologia - Abr/Jun - 96 53

Conclusões o isolada 5 10 Figura 3. Cromatogramas GPC de soluções de goma do cajueiro nos vários estágios de purificação. Solvente NaCl 1 M. tificaram a goma de cajueiro isolada como formada por 6% do complexo polissacarídeo-proteína, 42% do polissacarídeo B e 52% do polissacarídeo C. Comparando-se os quatro cromatogramas, observa-se que ao longo das purificações ocorre uma diminuição da fração A, correspondente ao complexo protéico, o que é compatível com a diminuição do teor de proteína (1,6% na goma isolada e 1,1 % na goma liofilizada). Verifica-se, também, uma maior proporção da fração B em relação a fração C. A manutenção do volume de eluição correspondente aos picos B e C mostram que os correspondentes polissacarídeos não foram degradados. A redução da quantidade de complexo proteína-polissacarídeo durante as etapas de purificação indica que a amostra como um todo foi fracionada. Adotando-se a mesma sistemática de cálculo de Paula e Rodrigues 7, pode-se identificar a goma liofilizada como constituída por 3% do complexo polissacarídeo-proteína, 48% do polissacarídeo de massa molar 3,2 x 10 4 e 49% do polissacarídeo de massa molar 1,6 x 10 4. A partir destes valores, a massa molar ponderai média da goma liofilizada pode ser estimada, obtendo-se o valor de 5,0 x 10 4. A goma isolada apresenta uma massa molar ponderai média estimada em 6,5 x 10 4. A diminuição na massa molar média ao longo das purificações confirma a justificativa anteriormente feita para explicar a diminuição da viscosidade intrínseca. 15 Volume de eluição (ml) 20 25 A utilização dos quatro estágios seqüenciados para a purificação da gomaproporcionou as seguintes características: a) substituição paulatina dos cátions Mg 2 +, Ca 2 + ek+porna+; b) diminuição do teor de proteína, apesar de permanecer uma porcentagem de proteína residual, provalvelmente devido ao complexo arabino-galactano-proteína; c) manutenção do teor de ácidos urônicos; d) redução da viscosidade intrínseca; e) não ocorrência de degradação dos polissacarídeos; f) fracionamento da amostra como um todo, devido a redução da quantidade do complexo arabinogalactano-proteína, o que é desejável no processo de purificação; g) pequena diminuição da massa molar média ao longo dos estágios de purificação. A goma submetida a esses processos apresentou alto teor de pureza, boa solubilidade e, como desejado, foi transformada predominantemente em sal de sódio. As outras características inerentes ao polissacarideo foram preservadas. Essa sistemática de purificação de gomas, apesar de demandar tempo, é essencial para a obtenção de um material de elevado grau de pureza, necessário para estudos mais refinados, como os de caracterização ou espectroscópicos, por exemplo. Agradecimentos À Embrapa, CE, pelo fornecimento da goma bruta; ao Prof. Fernando Galembeck, pela obtenção dos cromatogramas de GPC, e ao CNPq e CAPES pelas bolsas concedidas. Os autores agradecem ainda aos consultdres ad hoc pelas valiosas sugestões. Referências Bibliográficas 1. Rodrigues, l.f.; Paula, R.C.M.; Costa, S.M.O. Polímeros: Ciência e Tecnologia - n 1,31-36 (1993). 54 Polímeros: Ciência e Tecnologia - Abr/Jun - 96

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