O Programa Bolsa-Família: focalização e impacto sobre a pobreza no Rio Grande do Norte



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O Programa Bolsa-Família: focalização e impacto sobre a pobreza no Rio Grande do Norte Resumo Bruno Jorge Bezerra Martins * UFRN Jorge Luiz Mariano da Silva ** UFRN Os objetivos do estudo é verificar a importância do programa Bolsa-Família para redução da pobreza no Rio Grande do Norte, bem como examinar à focalização do programa, isto é, se a população-alvo, os considerados pobres pelo programa, estão de fato tendo acesso ao Bolsa- Família. Utilizaram-se os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNAD, de 2006 e o índice de pobreza de Foster, Greer e Thorbecke FGT para calcular a proporção de domicílios pobres do estado. A linha de pobreza utilizada foi baseada nas condições de acesso das famílias ao programa Bolsa-Família, ou seja, consideraram-se pobres as famílias cuja renda mensal por pessoa não ultrapassasse R$ 120,00. Verificou-se que o programa é de suma importância para os domicílios pobres, principalmente, para as famílias em extrema pobreza, com renda per capita inferior a R$ 60. A estimativa de proporções de domicílios pobres foi de 26,0%. Do total de 215.234 domicílios pobres 57% informaram que estavam recebendo o Bolsa-Família. Destaca-se, que os maiores percentuais de domicílios com acesso ao programa foram verificados naqueles com as menores rendas per capita. Na medida em que cresce as faixas de renda per capita diminuem a participação de domicílios assistidos pelo programa. Estes resultados mostram que o programa tem atingido sua função básica, que é a focalização, ou seja, o alcance as camadas mais pobres da população. Palavras-Chave: Pobreza; Transferência de renda; Programa Social. Abstract The objectives of the study are to verify the importance of cash transfer programmes BolsaFamila for reduction of the poverty in the Rio Grande do Norte, as well as examining to the coverage of the program using micro-data from the National Annual Household Sample Survey (PNAD), 2006. The index of poverty of Foster, Greer and Thorbecke - FGT was used to measure headcount. It was verified that the program is of utmost importance for the poor domiciles, mainly, for the families in extreme poverty. The estimate of headcount was of 26%. It is distinguished, that the percentile greaters of domiciles with access to the program had been verified in those with the lesser incomes per capita. When the per capita income grows diminishes the participation of domiciles attended for the program. These results show that the program has reached its basic function, that is, the coverage to reach the population poor. * Graduando do Curso de Ciência Econômicas da UFRN ** Professor dos cursos de Pós-Graduação em Economia e em Administração da UFRN

Keywords: Poverty, Cash Transfer; Social Programs. O Programa Bolsa-Família: focalização e impacto sobre a pobreza no Rio Grande do Norte Bruno Jorge Bezerra Martins Jorge Luiz Mariano da Silva 1 Introdução Segundo dados do Banco Mundial os índices de pobreza e da desigualdade de renda são mais acentuados nos paises subdesenvolvidos, principalmente aqueles localizados na África, Ásia Oriental e na América Latina. No Brasil esses indicadores não estão muito longe desses países, apesar da tendência decrescente da pobreza e da desigualdade de renda nos últimos anos promovidos pela recuperação do salário mínimo real e, principalmente, pela expansão dos programas de transferência de renda, unificados, atualmente, pelo programa Bolsa-Família. Em 2003, um estudo da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda apontava a necessidade de unificação dos programas de renda mínima existentes naquela época, uma vez que a expansão dos programas e do número de famílias beneficiadas não deixava a perfeita focalização nos pobres. Esse estudo, ainda apontava que os resultados do Programa Bolsa-Escola sobre as famílias pobres eram modestos em decorrência do baixo recebido pelas famílias cadastradas. Criado em janeiro de 2004, pelo governo Federal, o programa Bolsa-Família tinha a finalidade de unificar os programas de transferência de renda vigentes desde julho de 2001 1. Essa unificação tinha como objetivo obter um maior controle dos recursos, e identificarem-se as famílias que estavam cadastradas e recebendo do programas, além de reduzir a burocracia e fornecer mais transparência dos recursos aplicados. Considerando a principal política na área social do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva LULA -, o Bolsa-Família, tinha como meta dar maior agilidade ao Programa Fome Zero lançado em janeiro de 2003, no início do primeiro mandado do governo LULA. O Programa visa atender as famílias que estão abaixo da linha de pobreza e extrema pobreza, classificando as famílias em situação de extrema pobreza aquelas com renda per capita mensal de até R$ 60,00, e como famílias pobres aquelas com renda per capita mensal de até R$ 1 Essas transferências de renda eram formadas pelos seguintes programas: I - Programa Nacional de Renda Mínima, denominado "Bolsa Escola", criado em abril de 2001; II - Programa Nacional de Acesso à Alimentação - PNA, denominado "Cartão Alimentação, criado em junho de 2003; III - Programa Nacional de Renda Mínima, vinculado à saúde, que teve a denominação de Bolsa Alimentação, que foi instituído em setembro de 2001; IV - Programa Auxílio-Gás, criado em 2002.

120,00, que tenham em sua composição gestantes, nutrizes, crianças entre 0 e 12 anos ou adolescentes até 15 anos. Para terem direitos aos benefícios do programa - que podem chegar até R$ 112,00, dependendo do tipo de benefício as famílias tem que se comprometerem as condicionalidades do programa nas área de saúde e educação, isto é, manter as crianças e adolescente em idade escolar freqüentando a escola e cumprir os cuidados básicos em saúde das crianças desde o período do pré-natal. De acordo com alguns especialistas e profissionais da área de assistência social consideram que o programa Bolsa-Família pode ser a matriz de uma Política Nacional de Transferência de Renda, com a capacidade de se firmar como uma das principais estratégias do eixo assistencial do sistema brasileiro de proteção social. Considerando o avanço no programa tanto em termos número de famílias atendidas como nas condições de condicionalidades, que permitem um maior controle em termos da responsabilidade dos pais na educação e saúde dos filhos, esse estudo pretende analisar a importância do Bolsa-Família sobre para redução da pobreza no Rio Grande do Norte. Também será analisado se população-alvo, isto é, se os considerados pobres pelo programa estão de fato sendo atendidos pelo Bolsa-Família. Além dessa introdução o trabalho contém mais quatro seções. Na segunda, procura-se destacar alguns trabalhos que relatam a importância do Bolsa-Família como uma política de proteção social; a terceira seção trata da metodologia, destacando-se as informações utilizadas e o índice de pobreza utilizado; na quarta seção apresentam-se os resultados; e, na última seção apresentam-se as conclusões do estudo. 2 Bolsa-Família: o que dizem os pesquisadores? Analisando o impacto dos programas federais de transferência sobre a pobreza ROCHA (2005) mostrou que os programas de transferência de renda criados durante o governo FHC tinham um efeito marginal na redução da pobreza. Observou que os impactos são diferenciados por região em função da intensidade da pobreza enquanto insuficiência de renda e do valor das linhas de pobreza utilizadas. Na sua interpretação o Bolsa-Família, que substituiu os mecanismos de transferência de renda criados na gestão do governo FHC, melhorou a focalização das transferências, principalmente por atingir famílias pobres com crianças. MARQUES (2004), analisando a situação do programa Bolsa-Família, em julho de 2004, fazendo uma relação entre a quantidade de famílias beneficiárias e o valor dos recursos transferidos para os municípios, observou, na região Nordeste, que o percentual da população total dos municípios nordestinos beneficiária do Bolsa-Família mostrou-se bastante elevado, atingindo de 13% a 45% nos Estados dessa região. Observou ainda, quanto menor for a Receita dos municípios, maior era a importância relativa dos recursos transferidos pelo programa Bolsa-Família. A pesquisadora citou, como exemplo, o município de Vitória de

Santo Antão, PE, cujo valor do Bolsa-Família superava em mais de 283% os recursos federais, transferidos pelos SUS. MOURA (2007) observando dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, em 2004, percebeu que dos 18 milhões de domicílios com algum nível de insegurança alimentar, apenas 5,3 milhões eram beneficiários dos programas sociais de transferência de renda. Para LAVINAS, na medida em que o governo procurou agrupar e centralizar os programas integrados sob a marca Bolsa-Família, os projetos foram descoordenados e desfocados, o que induziria os beneficiários da ajuda governamental em dinheiro a tornaremse dependentes eternos da esmola oficial (FOLHAONLINE,2006e). Para SENNA et ali (2007) os programas focalizados como o Bolsa-Família apresentam difíceis tarefas a principal delas é a construção de critérios e mecanismos de seleção dos grupos sociais que serão ou não beneficiados, considerando o conjunto de fragilidades sociais a que esses segmentos estão expostos. Observam também que a principal controvérsia das condicionalidades do Bolsa-Família aparece, por um lado, no reconhecimento de que as mesmas têm potencial de pressionar a demanda sobre os serviços de saúde e educação, o que, de certa forma, pode representar uma oportunidade para ampliar o acesso de um maior contingente da população a esses serviços sociais. Já no que diz respeito às condicionalidades, pode-se afirmar que, se por um lado tais exigências têm potencial para facilitar o acesso de camadas da população que dificilmente conseguiriam chegar aos serviços, por outro, coloca a dúvida sobre a capacidade de os serviços de educação e saúde absorverem adequadamente o aumento de demanda resultante da implantação do programa. DINIZ (2007) observou que, os programas de renda mínima executados no Brasil têm como pensamento expresso a noção de que não é possível combater a exclusão econômica e social sem se levar em conta que é preciso dotar as pessoas de capacidades para obterem e cobrarem melhores condições de bem-estar. Esta capacitação viria através da educação. A resposta para a vinculação do acesso ao benefício à matrícula e freqüência das crianças na escola é a seguinte: os a parcela da sociedade menos favorecida têm dificuldade em manter os filhos estudando, não tanto pelo custo financeiro, mas pela importância que os rendimentos ganhos pelas crianças e pelos adolescentes têm na composição da renda familiar. Comparando as estimativas de famílias pobres com a população dos municípios e o número de famílias beneficiadas, SANTANA (2007) concluiu que essas relações constituíam indicadores de focalização e acerto na distribuição dos benefícios do programa. Quanto a focalização estudos recentes como o de SOARES et al (2006) mostram que o Bolsa-Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) são bem focalizados (74% da renda declarada do BPC e 80% da renda do Bolsa-Família destinam-se para famílias abaixo da linha de pobreza). ESTRELLA e RIBEIRO (2008), ao analisar o atendimento das condicionalidades do programa, perceberam que, embora o Bolsa-Família possa ser considerado formalmente um programa estrutural, sua capacidade efetiva de superar o ciclo intergeracional de pobreza das famílias beneficiadas ainda não está garantida. Eles destacam as condições de educação e saúde dos municípios que podem dificultara esse avanço social.

Em um estudo sobre a focalização dos programas de transferência de renda e seus efeitos sobre a pobreza e a desigualdade de renda, ROCHA (2008) percebeu que os novos programas sociais têm sidos bem-sucedidos em beneficiar os mais pobres. Destaca, ainda que há espaço para melhoria da focalização. Ressaltou que as transferências de renda tem impacto importante na redução da pobreza e sobre os níveis de desigualdade de renda. 3 - Metodologia As informações desse estudo foram extraídas dos microdados da PNAD 2006. Nesse ano, além da pesquisa básica, o IBGE coletou informações sobre acesso aos programas sociais. A primeira etapa da seleção de dados foi separar do arquivo de domicílios do Estado do Rio Grande do Norte, cujo total foi de 2170 domicílios. Em seguida foram selecionados apenas os domicílios permanentes com renda informada. Foram retirados também da análise os domicílios que tinham pessoas recebendo o Bolsa-Família, mas não declararam a renda. O número final de domicílios que foram analisados foi de 1770. A expansão dessa amostra, na população, corresponde a 831.343 domicílios. A definição da linha de pobreza que utilizada nesse estudo foi baseada nas condicionalidades para as famílias terem acesso ao programa Bolsa-Família. De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), o programa beneficia as famílias em situação de pobreza e extrema pobreza cuja renda mensal por pessoa seja no máximo de R$ 120,00. Portanto, adotou-se esse teto como a linha de pobreza desse estudo. Entre as diversas classes de índices de pobreza existentes na literatura, escolheu-se a proporção de pobres apesar de sua limitação em não levar em consideração a desigualdade entre os pobres. A proporção de pobres faz parte de uma classe geral de índices pobreza conhecido como FGT de FOSTER, GREER e THORBECKE. Esse índice pode ser representado pela seguinte fórmula: P = Nz* 1 q = ( z* y ) ε i 1 i (1) em que na fórmula z* é a linha de pobreza, y i é a renda domiciliar, N é o número de domicílios, q representa o número de domicílios pobres, e ε é uma medida de aversão à pobreza. O índice de proporções de pobres é derivado, admitindo-se que o valor de ε é igual a zero. Portanto, a proporção de pobres é representada por: P 0 = q / N (2) 4 Resultados e análise

A Tabela 1 apresenta os resultados do número de domicílios pobres e não pobres, bem como a estimativa de proporções de domicílios pobres. O número de domicílios permanentes com renda informada foi de 831.343. Admitindo a linha de pobreza de R$ 120,00 encontraram-se 215.234 domicílios cujas pessoas residentes apresentam renda per capita que não ultrapassam o valor da linha de pobreza. O número de domicílios não pobres aqueles que apresentam renda per capita acima dessa linha foi de 616.109. A estimativa de proporções de domicílios pobres foi de 26,0%, ou seja, 26% dos domicílios permanentes no Estado do Rio Grande do Norte apresentaram renda per capita não superior a linha de pobreza. Tabela 1 - Número de domicílios pobres, não pobres e estimativa de proporções pobres. Domicílios Número de famílias pobres Não pobres 616.109 Pobres 215.234 Proporção de domicílios pobres: P 0 26,0% Total de domicílios 831.343 Fonte: Microdados do acesso aos Programas Sociais da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios, PNAD 2006. z* - Linha de pobreza: R$ 120,00, com base nas condições do acesso ao Programa Bolsa-Família do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Elaboração dos autores. A Tabela 2, mostra a distribuição de domicílios pobres por classe de renda per capita e renda per capita média, observa-se que o número de domicílios pobres, de acordo como o critério da linha de pobreza de R$ 120,00, foi de 215.234. Desse total, cerca de 1,3 dos domicílios apresentaram renda per capita igual a zero. O maior percentual de domicílios pobres estavam na classe de renda per capita entre R$ 80,00 a R$ 100,00, e a média da renda per capita dessa classe foi de R$ 90,00. A segunda faixa de renda com maior número de domicílios tinham a renda per capita entre R$ 100,00 a R$ 120,00, cuja média foi da renda per capita foi de R$ 112,64.

Tabela 2 Distribuição de domicílios pobres por classe da renda per capita e renda per capita média, 2006. Classe de renda per capita Número de domicílio % Renda per capita média dos domicílios 0 2.820 1,3 0,00 +0 20 8.928 4,1 15,98 20 40 19.269 9,0 30,32 40 60 40.883 19,0 52,63 60 80 37.594 17,5 71,15 80 100 59.216 27,5 90,86 100 120 46.524 21,6 112,64 Total 215.234 100,0 Fonte: Microdados do acesso aos Programas Sociais da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios, PNAD 2006. Elaboração dos autores. A Tabela 3 mostra a distribuição de domicílios pobres por classe de renda per capita com e sem acesso ao programa Bolsa-Família. Do total de 215.234 domicílios pobres 57% informaram que estavam recebendo o Bolsa-Família. Com exceção dos domicílios que apresentaram renda per capita zero, cujo total foi de 2.820 (conforme tabela 2), nas demais classes de renda per capita observaram-se domicílios com acesso ao programa Bolsa-Família. Vale salientar que os maiores percentuais de domicílios com acesso ao programa estão entres os domicílios com as menores rendas per capita. Na medida em que cresce as faixas de renda per capita diminuem a participação de domicílios assistidos pelo programa. Quando observa os domicílios sem acesso ao programa ocorre exatamente o inverso, isto é, na medida em que cresce as faixas de renda per capita aumentam o percentual de domicílios sem acesso ao programa. Este resultado mostra que o programa tem atingido sua função básica que é a focalização, ou seja, o alcance as camadas mais pobres. Tabela 3 Distribuição de domicílios pobres por classe da renda per capita com e sem acesso ao programa social Bolsa-Família Classe de renda per capita Domicílios pobres Com acesso ao programa Bolsa-Família (em %) Sem acesso ao programa Bolsa-Família (em %) 0 0,0 100 +0 20 68,4 31,6 20 40 63,4 36,6 40 60 66,7 33,3

60 80 63,8 36,2 80 100 54,6 45,4 100 120 45,9 54,1 Total 57,0 43,0 Fonte: Microdados do acesso aos Programas Sociais da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios, PNAD 2006. Elaboração dos autores. Os Gráficos 1 e 2 ilustram o número de domicílios com e sem acesso ao programa social Bolsa- Família no Estado do Rio Grande do Norte. Distribuição percentual % 70 60 50 40 30 20 10 Domicílios com Bolsa Família 0 0 +0 20 20 40 40 60 60 80 80 100 Classe de renda per capita 100 120 Total GRÁFICO 2 Distribuição percentual de domicílios pobres com pessoas recebendo do programa social Bolsa-Família, no Rio Grande do Norte, em 2006. Fonte: Microdados do acesso aos Programas Sociais da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios, PNAD 2006. Elaboração dos autores.

Distribuição percentual % 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 Domicílios sem acesso ao Bolsa Família 0 +0 20 20 40 40 60 60 80 80 100 100 120 Classe de renda per capita Total GRÁFICO 1 Distribuição percentual de domicílios pobres sem acesso ao programa social Bolsa-Família, no Rio Grande do Norte, em 2006. Fonte: Microdados do acesso aos Programas Sociais da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios, PNAD 2006. Elaboração dos autores. 5 - Conclusões A pobreza, tratada como insuficiência de renda, tem reflexos diretos nas condições mínimas de sobrevivência do ser humano. A carência de renda pode afetar o nível do estado nutricional do ser humano e, além disso, pode ter reflexos sobre as condições de vida de toda a sociedade, tais como a mitigação e delinqüência. Há, porém, um outro elemento fundamental associado aos altos níveis de pobreza, que é a desigualdade de oportunidades, principalmente de saúde e educação. O Programa Bolsa-Família tem dado uma importante contribuição para o resgate social das famílias que vivem em situações de extrema pobreza e indigência. É importante se destacar a exigência da responsabilidade dos pais na educação e saúde das crianças. Esse é, sem dúvida, o um caminho a ser seguido para ser quebrado o ciclo da pobreza em que milhões de brasileiros se encontram. Destacam-se, entre os resultados encontrados, a importância do Bolsa-Família para os domicílios mais pobres do estado do Rio Grande do Norte. Entretanto, percebe-se que há, ainda, muito a se fazer. É preciso atingir um maior número de domicílios pobres, pois, apenas 60% deles tinham pessoas recebendo benefícios desse programa. Os resultado ainda apontaram uma boa focalização do Bolsa-Família, isto é, que este programa tem atendido, principalmente, as camadas mais pobres da população. Esse resultado realça a importância desse programa para aqueles mais carentes nas dimensões da renda, educação e saúde, mas,

principalmente, carentes de oportunidades para sobreviver com dignidade e participar da sociedade com igual oportunidade, como todas as outras pessoas que estão longe da linha de pobreza. Bibliografia ESTRELLA, J. e RIBEIRO, L. M. Qualidade da gestão das condicionalidades do Programa Bolsa Família: uma discussão sobre o índice de gestão descentralizada. Revista de Administração Pública. vol. 42 no.3 Rio de Janeiro Maio/Junho, 2008. DINIZ, S. Critérios de justiça e programas de renda mínina. Revista Katálysis, vol.10 no.1 Florianópolis Jan./June, 2007 MINISTÉRIO DA FAZENDA. SECRETARIA DE POLÍTICA ECONÔMICA. Gasto Social do governo Central: 2001-2002, Brasília, Novembro de 2003. MARQUES, R. M. (Coord); MENDES, A; LEITE, M. G.; e HUTZ, Ana. A Importância do Bolsa Família nos Municípios Brasileiros. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Brasília, novembro, mimeo, 2004. MOURA, P. G.M. Bolsa família: projeto social ou marketing político? Revista Katálysis. Vol.10 no.1 Florianópolis Jan./June, 2007. ROCHA, S. Impacto sobre a pobreza dos novos programas federais de transferência de renda. Revista de Economia Contemporânea. Rio de Janeiro, 9 (1), p. 153-185, jan./abr., 2005.. Transferências de renda federais: focalização e impactos sobre pobreza e desigualdade. Revista de Economia Contemporânea. Vol. 12, no.1 Rio de Janeiro, 2008. SOARES, F. V., SOARES, S., MEDEIROS, M., OSÓRIO, R. Programas de transferências de renda no Brasil: impactos sobre a desigualdade. Texto para Discussão IPEA, 2006. SANTANA, J. A. A evolução dos programas de transferência de renda e o Programa Bolsa Família. Trabalho apresentado no Seminário População, Pobreza e Desigualdade, realizado em Belo Horizonte Brasil, de 5 a 7 de novembro de 2007. SENNA, M. C. M.; BURLAND, L.; MONNERAT, G. L.; SCHOTTZ, V.; e MAGALHÃES, R. Programa Bolsa família: nova institucionalidade no campo da política social brasileira? Rev. katálysis vol.10 no.1 Florianópolis Jan./June 2007.