TECNOLOGIAS DIGITAIS E SUA INTEGRAÇÃO EM ESCOLAS PÚBLICAS 1 Eloi Feitosa; 2 Rosemara Perpetua Lopes 1 Universidade Estadual Paulista UNESP, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas IBILCE, Departamento de Física 2 Universidade Estadual Paulista UNESP, Faculdade de Ciências e Tecnologia FCT, Programa de Pós-Graduação em Educação, Doutorado Resumo: Neste trabalho, discutimos a integração de tecnologias digitais em escolas públicas, a partir da experiência de desenvolvimento de um projeto em 2013, vinculado à universidade pública, e de estudos da literatura educacional pertinentes ao tema. A discussão é norteada pela questão: na escola, que fatores podem atuar sobre iniciativas que visam à integração das tecnologias digitais ao processo educativo? Ao promovêla, temos por objetivo evidenciar possibilidades e limites dessa integração, com foco no contexto escolar. Desenvolvido por um grupo interdisciplinar, o projeto, que continua em 2014, previa a realização de atividades didáticas que articulavam, de um lado, Matemática e Educação Ambiental; de outro, Inglês e Matemática, na Sala Ambiente de Informática da escola, com crianças do segundo ao quarto ano. Durante o processo, três fatores se mostraram determinantes: falta de acesso à sala de Informática existia, mas não estava disponível; falta de organização prévia dos alunos que se encontravam dispersos ou ocupados em outra atividade ou tinham que escolher entre duas previstas para o mesmo horário; falta de um local previamente definido e reservado para as atividades pedagógicas com tecnologia. Tais fatores parecem apontar para a gestão e seu posicionamento em face de iniciativas de integração de tecnologias digitais à escola. O escasso contato com a diretora e a coordenadora da instituição poderia ser visto como indício desse posicionamento. Assim, estariam contribuindo para reforçar a ideia de uma escola impermeável a mudanças e privando alunos de uma comunidade socioeconomicamente carente de vivências com tecnologias como computador e softwares, que poderiam facilitar a aprendizagem de conteúdos como a Matemática. Palavras-chave: tecnologias digitais; Educação Básica; aprendizagem matemática. 1 Introdução Neste trabalho, discutimos a integração de tecnologias digitais em escolas públicas, partindo de uma experiência vivenciada em 2013, de desenvolvimento de um projeto vinculado à universidade pública do Estado de São Paulo, e de estudos da literatura educacional, pertinentes ao tema. Assim, buscamos contribuir para os estudos sobre possibilidades e limites de integração de tecnologias na escola pública contemporânea, evidenciando o contexto para o qual se pensa essa integração, sendo este nosso objetivo. 04489
A discussão adquire relevância na medida em que trata de um tema emergente, segundo Bastos (2010), situando-o na realidade do campo de atuação do professor. Seu desenvolvimento vem ao encontro da seguinte questão: na escola, que fatores podem atuar sobre iniciativas que visam à integração das tecnologias digitais ao processo educativo? A escola é aqui concebida na perspectiva de Saviani (2003), como instituição cuja função precípua é propiciar ao aluno a aquisição do conhecimento historicamente acumulado, permitindo que passe do saber do senso comum ao saber científico. No texto que se segue, encontram-se: referencial teórico, contendo pressupostos que fundamentam nossas conjecturas; metodologia, que comporta a configuração do projeto, em linhas gerais; resultados e discussão, com explanação do desenvolvimento do mesmo na escola; e considerações finais, em que retomamos a questão acima. 2 Referencial teórico Tratamos, brevemente, do que são tecnologias e qual o seu papel no processo educativo, considerando alguns elementos implicados em sua integração na escola. 2.1 Tecnologias: o que são e que papel podem assumir na escola Polissêmica, a palavra tecnologia é aqui entendida na perspectiva de Kenski (2005) como ferramenta utilizada pelo homem para facilitar sua vida em sociedade. Na escola, pode se tornar uma aliada no processo de aprender e de ensinar, como afirmam Coll, Mauri e Onrubia (2010), dado o seu potencial. Em si mesma, a tecnologia não é boa, nem má, sendo o seu valor atribuído por quem a utiliza. Nas aulas, ela tanto pode assumir o papel de ferramenta mediadora, conforme propõem Coll, Mauri e Onrubia (2010), quanto de ferramenta para a aprendizagem, sob a ótica construcionista, ou ter um uso restrito segundo a abordagem instrucionista, como esclarece Valente (1993). Apesar de seu potencial e de atualmente o professor ter em sala de aula alunos da Idade Mídia, ditos nascidos na Era Digital (PALFREY, 2011), a tecnologia aguarda por ser integrada às práticas escolares, por fatores como os apontados a seguir. 2.2 Infraestrutura, gestão, cultura escolar e prática pedagógica 04490
De acordo com Coutinho (2003), mesmo em face de uma nova configuração social, como a apontada por Kuenzer (2001), a escola segue impermeável a mudanças, correndo o risco de formar sobrantes desconectados". No processo de integrar tecnologia à escola, alguns fatores interferem, conforme aponta a literatura. O primeiro é infraestrutura, sem a qual não há integração, mas sua presença, por si só, não implica inovação, conforme salienta Barreto (2002). O segundo fator é gestão. Segundo Trindade (2011), na escola, a direção e/ou a coordenação tanto pode(m) promover, quanto aniquilar iniciativas de uso das tecnologias. O terceiro fator é cultura escolar, que pode contribuir para manter empoeiradas as máquinas informáticas, como constatou Costa (2004). Esse contexto é favorável à manutenção de práticas que já não se sustentam, segundo Belloni (2001), porque, na escola deste início de século, ainda que os professores sejam os mesmos e mantenham velhas práticas, os alunos não são. 3 Metodologia Em 2013, desenvolvemos na escola E. M. Dr. Carlos Roberto Seixas, localizada na cidade de Engenheiro Schimidt, região de São José do Rio Preto, Estado de São Paulo, o projeto Ensino mediado por tecnologias digitais na Educação Básica. Iniciado no mês de maio, almejou fortalecer a educação oferecida pela escola pública, contribuindo para ampliar as chances de aprendizagem do aluno que a frequenta. Com o suporte de uma equipe interdisciplinar, propusemos desenvolver nesse local, na Sala Ambiente de Informática (SAI), equipada com uma lousa digital e nove computadores em bom estado de funcionamento, atividades com softwares. Para tanto, contamos com o apoio da Pró-Reitoria de Extensão Universitária e da Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Em 2014, o projeto continua em outras instituições. 4 Resultados e discussão As atividades desenvolvidas semanalmente na escola eram interdisciplinares e previam o uso de tecnologias digitais com alunos que cursavam do segundo ao quarto ano escolar. A primeira articulava Matemática e Educação Ambiental; a segunda, Inglês e Matemática. Desse modo, pretendíamos dar à Matemática, conteúdo curricular em que muitos alunos apresentavam dificuldades de aprendizagem (em média, 50% dos alunos de cada turma), um tratamento diferente do verificado em sala de aula. 04491
Em pouco tempo, percebemos que cada ida a essa instituição era um recomeço. A sala de Informática não podia ser usada, por motivos diversos: estava fechada em função de um curso que ocorreria no dia seguinte; o computador principal não se encontrava no local; ninguém sabia a senha para acessar o sistema etc. Esta restrição podia ter inviabilizado o projeto e só não o fez porque a equipe levou, semanalmente, ao local computador, datashow, caixas de som, cabos, tomadas etc., inclusive Internet móvel e softwares para uso offline. A esse respeito, Costa, que vivenciou a falta de acesso à Internet durante a realização de uma pesquisa em escola pública, considera: [...] é necessário romper com as políticas promíscuas que depositam os computadores nas escolas com interesses eleitorais e demagógicos e com objetivo maior de despejar dinheiro público para os fabricantes de máquinas informáticas e/ou dar circo à população. (2004, p. 173). Além da falta de acesso à SAI, a cada dia, quando a equipe chegava na escola, encontrava os alunos dispersos no pátio, entretidos em atividades esportivas ou preocupados em ter que escolher entre duas previstas para o mesmo horário. Nunca estavam reunidos e nem sempre eram os mesmos, de maneira que não era possível dar continuidade ao trabalho realizado na semana anterior. A esses dois fatores acrescenta-se um terceiro: falta de um local reservado para o desenvolvimento da atividade programada. Em decorrência, parte do tempo destinado à atividade era empregado na espera por um espaço físico para realizá-la. Isoladamente e em conjunto, esses três fatores apontam para a falta de apoio da gestão ao desenvolvimento do projeto na escola, apesar do interesse que a diretora e a coordenadora pedagógica manifestaram na ocasião em que foi formalizada a parceria entre essa instituição e a universidade. 5 Considerações finais Retomando o exposto, neste trabalho, buscamos contribuir para os estudos sobre as possibilidades e os limites de integração de tecnologias na escola pública contemporânea, a partir da experiência de realização de um projeto em 2013 e dos estudos da literatura educacional pertinentes ao tema. O projeto, que continua em 2014, previa o uso da SAI para o desenvolvimento de atividades didáticas interdisciplinares, que articulavam tanto Matemática e Educação Ambiental, quanto Matemática e Inglês, com duas turmas constituídas por alunos do 04492
segundo ao quarto ano escolar. Nesse processo, três fatores despontaram como determinantes: falta de acesso à SAI; falta de organização prévia dos alunos; falta de um local para a realização das atividades programadas. Resgatando a questão inicialmente apresentada, esses fatores sugerem atenção à gestão e seu posicionamento em face de iniciativas de integração de tecnologias digitais à escola. O escasso contato com a diretora e a coordenadora poderia ser visto como indício desse posicionamento. Neste caso, não somente estariam reforçando a ideia de uma escola impermeável a mudanças, mas privando os alunos de vivências com instrumentos que poderiam mudar sua relação com o conhecimento matemático. Referências BARRETO, R. G. Formação de professores, tecnologias e linguagens: mapeando velhos e novos (des)encontros. São Paulo: Ed. Loyola, 2002. BASTOS, M. I. O desenvolvimento de competências em TIC para a educação na formação de docentes na América Latina. Brasília: MEC, 2010. BELLONI, M. L. O que é mídia-educação. Campinas: Autores Associados, 2001. COLL, C.; MAURI, T.; ONRUBIA, J. A incorporação das tecnologias da informação e da comunicação na educação: do projeto técnico-pedagógico às práticas de uso. In: COLL, C.; MONEREO, C. Psicologia da educação virtual: aprender e ensinar com as tecnologias da informação e da comunicação. Porto Alegre: Artmed, 2010, p. 67-93. COSTA, G. L. M. O professor de Matemática e as Tecnologias de Informação e Comunicação: abrindo caminho para uma nova cultura profissional. 2004. Tese (Doutorado em Educação) Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, Campinas, SP, 2004. COUTINHO, L. M. Imagens sem fronteiras: a gênese da TV Escola no Brasil. In: SANTOS, G. L. (Org.). Tecnologias na educação e formação de professores. Brasília: Plano Editora, 2003, p. 69-98. KENSKI, V. M. As tecnologias invadem nosso cotidiano. In: ALMEIDA, M. E. B.; MORAN, J. M (Orgs.). Integração das tecnologias na educação. Brasília: Ministério da Educação/SEED, 2005, p. 92-94. KUENZER, A. Z. Educação, linguagens e tecnologias: as mudanças no mundo do trabalho e as relações entre conhecimento e método. In: CANDAU, V. M. (Org.). Cultura, linguagem e subjetividade no ensinar e aprender. 2. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2001, p. 134-160. PALFREY, J. Nascidos na era digital: entendendo a primeira geração de nativos digitais. Porto Alegre: Artmed, 2011. SAVIANI, D. Escola e democracia: teorias da educação, curvatura da vara, onze teses sobre a educação política. 36. ed. rev. Campinas, SP: Autores Associados, 2003. 04493
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