MINISTERIO DA SAÚDE INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA RESIDÊNCIA MÉDICA EM CANCEROLOGIA CIRÚRGICA COM ÊNFASE EM TECIDO ÓSSEO E CONECTIVO JADIVAN LEITE DE OLIVEIRA CARCINOMA BASOCELULAR METASTÁTICO PARA O PULMÃO: RELATO DE CASO E REVISÃO DE LITERATURA Rio de Janeiro 2015 1
JADIVAN LEITE DE OLIVEIRA CARCINOMA BASOCELULAR METASTÁTICO PARA O PULMÂO: RELATO DE CASO E REVISÃO DE LITERATURA Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva como requisito para a conclusão da Residência Médica em Cancerologia Cirúrgica com Ênfase em Tecido Ósseo e Conectivo. Orientador: Dr. Marcelo Sá de Araújo Rio de Janeiro 2015 2
Oliveira, Jadivan Leite Carcinoma basocelular metastático para pulmão: Relato de Caso e Revisão de Literatura. Rio de Janeiro, RJ : [s.n.], 2015. Orientador: Marcelo Sá de Araújo Trabalho de Conclusão de Curso Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva 1.Carcinoma Basocelular 2. Carcinoma Basocelular Metastático 3.Metátase Pulmonar 3
JADIVAN LEITE DE OLIVEIRA CARCINOMA BASOCELULAR METASTÁTICO PARA O PULMÃO: RELATO DE CASO E REVISÃO DE LITERATURA Avaliado e Aprovado por: Dr. Nelson José Jabour Fiod Data: / / Rio de Janeiro 2015 4
RESUMO O carcinoma basocelular (CBC) é a forma mais comum de câncer de pele e raramente causa metástase. A morbidade do CBC está relacionada à invasão e destruição tecidual local principalmente quando localizado na região da cabeça e do pescoço. A prevalência de carcinoma basocelular metastático (CBCM) varia entre 0,0028% e 0,55% de todos os casos de CBCs primários. Mais de 250 casos de CBCMs têm sido relatados na literatura. Quase 85% dos CBCMs surgem a partir de lesões primárias na região da cabeça e do pescoço sendo menos freqüente de lesões originadas no dorso e nas extremidades. O CBCM normalmente ocorre em homens de meia-idade que têm CBC de longa duração, sendo a disseminação, normalmente para linfonodos, pulmões, ossos e pele. Nós apresentamos um caso de um grande CBC recorrente do braço direito com os achados radiológicos e histopatológicos, indicando a presença de metástases para o pulmão direito e destruição óssea do úmero direito, sendo realizado amputação interescápulo torácica à direita (cirurgia de Berger) e toracotomia direita para metastasectomia pulmonar. Palavras-chave: carcinoma basocelular, carcinoma basocelular metastático, metástase pulmonar. I INTRODUÇÃO O CBC é o câncer de pele mais freqüente no Brasil, sendo responsável por aproximadamente 25% de todos os tumores malignos registrados no país. Apresenta alto percentual de cura quando detectado precocemente. São estimados cerca de 188.020 novos casos no Brasil em 2014, segundo dados do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA) 1. A incidência do câncer de pele tem experimentado um considerável aumento em nível mundial, fundamentalmente pela diminuição da camada de 5
ozônio, a maior exposição da população à radiação ultravioleta e o aumento da expectativa de vida 2. O CBC foi descrito primariamente por Jacob em 1827, que o denominou ulcus rodens, já a sua nomenclatura atual foi proposta por Krompecher em 1903 3. O CBC é o câncer mais freqüentemente encontrado em humanos. É um tumor maligno epidérmico, com crescimento lento e invasividade local, que afeta mais freqüentemente os caucasianos. Tende a infiltrar os tecidos por contigüidade, de forma tridimensional e irregular, com extensões subclínicas digitiformes 4. A mortalidade por CBC é baixa variando de 0,05 a 0,08/100.000 habitantes, e as regiões mais acometidas são a cabeça e o pescoço com 60% a 80% dos casos 4. As metástases são bastante raras e a morbidade está relacionada à invasão e destruição tecidual local, principalmente quando localizado na região da cabeça e pescoço 4. Metástases apesar de bastante raras podem acontecer em 0,0028 % a 0,55% dos CBCs. A maioria dos CBCMs, cerca de 70%, são originários de um CBC primário na região da cabeça e do pescoço. A incidência de metástase é de 2% para tumores maiores do que 3 cm de diâmetro, ela aumenta para 25 % para tumores maiores que 5 cm de diâmetro e de 50% para tumores maiores do que 10 cm de diâmetro 5,6. O CBCM na maioria das vezes manifesta-se com disseminação para os linfonodos regionais (60%) ou disseminação hematogênica para o pulmão (42%), o osso (20%), ou a pele (10%), com sintomas tais como linfadenomegalia, ulceração, anemia, dores ósseas e musculares, fraqueza, dependendo do local de metástase 5. O pulmão, apesar de um local distante, é o sítio mais freqüentemente envolvido em CBCM, com cerca de 250 casos relatados na literatura. A maioria dos CBCMs envolvendo os pulmões são múltiplos pequenos nódulos que se originam devido a disseminação hematogênica 6. O CBCM foi relatado pela primeira vez em 1984. Devido à raridade do CBCM na apresentação inicial, este tumor pode ser confundido como sendo 6
originário de outros tumores mais propensos a metástases 6. CBCM é definido como um tumor que metastatiza para sítios não contíguos e à distância, exibindo características histológicas semelhantes aquelas do CBC primário. A relação homem-mulher de incidência do CBCM é de 2:1. A mediana da idade de aparecimento do tumor é de 45 anos e o intervalo médio entre o aparecimento do tumor e os sinais de surgimento de metástase é de cerca de 9 anos 7. Os fatores de risco para metástases são lesões negligenciadas ou refratárias aos tratamentos, lesões maiores que 3 cm, lesões recidivadas, invasão perineural ou vascular, infiltração profunda do tumor, tipo histológico metatípico ou esclerodermiforme, radioterapia prévia, lesões nas orelhas e no couro cabeludo, pele clara, sexo masculino, imunossuprimido e tumores com diferenciação neuroendócrina 4,7. Este caso em discussão foi escolhido devido à raridade das metástases do CBC para o pulmão. II RELATO DE CASO Paciente 60 anos, sexo masculino, matriculado no INCA na seção de Tecido Ósseo e Conectivo (TOC) em março de 2001, com lesão em braço direito ulcerada de 4,0 cm, bordos elevados com ausência de linfonodomegalias. Fez biópsia incisional com laudo histopatológico de carcinoma basocelular ulcerado. Submetido à ressecção ampla em maio de 2001, porém com limite profundo, plano ósseo, comprometido. Pensando na preservação do membro, optou-se então por realizar tratamento adjuvante com radioterapia 60 Gy em 30 frações em agosto de 2001. Ficou em seguimento ambulatorial regular até outubro de 2002, a partir dessa data perdeu seguimento só retornando ao ambulatório em novembro de 2006 devido a trauma no braço direito e fratura do mesmo. Manteve seguimento ambulatorial regular até setembro de 2008 quando mais uma vez o mesmo abandonou as 7
consultas regulares só retornando após quase 6 anos, em janeiro de 2014. Agora com lesão ulcerada, volumosa em braço direito (Figura 1) e imagem de radiografia com área de destruição óssea local e nódulos pulmonares sugestivos de doença metastática (Figura 2 e 3). Realizou biópsia incisional da lesão do braço direito sendo o laudo histopatológico de carcinoma basocelular. Nos exames de estadiamento a Tomografia Computadorizada (TC) de Tórax evidenciou nódulo com densidade de partes moles e contorno espiculado no segmento lateral do lobo médio medindo 2,2 x 2,0 cm (Figura 4). Foi então deliberado uma amputação interescápulo torácica à direita (cirurgia de Berger) e avaliação pela cirurgia torácica quanto à possibilidade de ressecção do nódulo pulmonar. Submetido à cirurgia de Berger à direita em abril de 2014 (Figura 5), com boa recuperação no pós-operatório. Avaliado pela cirurgia torácica que solicitou uma biópsia da lesão pulmonar à direita na radiologia intervencionista guiado por TC. Procedimento realizado sem intercorrência com laudo histopatológico de carcinoma basocelular metastático. Realizou toracotomia direita e metastasectomia pulmonar direita em agosto de 2014 confirmando carcinoma basocelular metastático (Figura 6). Encaminhado para a oncologia clínica para avaliação de tratamento adjuvante, o caso foi discutido em mesa redonda sendo deliberado manter o paciente em controle clínico devido à cirurgia de ressecção Ro e não possuir uma terapia bem definida para tratamento do carcinoma basocelular metastático. No momento o paciente encontra-se em controle ambulatorial na oncologia clínica, no TOC e cirurgia torácica sem evidência de recidiva local ou a distância. III DISCUSSÃO 8
O CBC é de crescimento lento, porém potencialmente agressivo localmente, sendo a neoplasia de pele mais freqüente. Embora sejam normalmente vistos na área exposta da região da cabeça e do pescoço, cerca de 10% de todos os CBCs estão localizados no tronco e menos de 1% dos casos têm sido relatados nas áreas não expostas da genitália. O CBC é considerado como um tumor de baixa malignidade, porém às vezes é extremamente agressivo especialmente quando lesões gigantes estão envolvidas. O CBCM é extremamente raro, mas quando ocorre, carrega altas taxas de morbidade e mortalidade 7,8. Muitos fatores de riscos que parecem predispor os doentes a desenvolver o CBCM foram identificados, incluindo lesão de longa duração, o local acometido, tumor primário da cabeça e do pescoço, especialmente na face ou nas orelhas é observado em 85% dos casos, o tamanho do tumor, o número de lesões, a profundidade de invasão, a persistência do CBC durante muitos anos, a recorrência apesar do tratamento ideal, o CBC refratário aos métodos convencionais de tratamento, o padrão histológico infiltrativo, a ressecção cirúrgica incompleta e radioterapia anterior, quer no início da idade adulta ou para câncer localizado 4,5,9. A maioria das lesões metastáticas surgem de lesões primárias maiores de 3 cm de diâmetro. Entre os vários subtipos histológicos de CBCs, o superficial, o infiltrativo e os subtipos micronodulares têm uma alta propensão para a recorrência e metástase, no entanto, isso é controverso e não há nenhuma evidência para apoiar que um subtipo especial predispõe ao CBCM. O CBC dissemina-se a distância geralmente através de vasos linfáticos, embora também ocorra disseminação hematogênica. Metástase ocorre normalmente nos gânglios linfáticos regionais, pulmão e osso embora os casos envolvendo a medula espinhal, a glândula parótida, a pele, a medula óssea, o baço, o fígado, as glândulas supra-renais, o cérebro, a dura-máter, o esôfago, o coração e o rim foram documentados 5,7. Os critérios para o diagnóstico de metástase de CBC são: tumor primário localizado na pele e não nas mucosas, metástases para linfonodos ou vísceras localmente distantes do primário e não relacionados com a extensão simples 9
do tumor e as características histológicas, tanto do tumor primário quanto das metástases típicos de CBC, sem sinais de diferenciação epidermóide 7. O caso apresentado preenche todos os critérios para um CBCM para o pulmão. A lesão primária no nosso caso foi significativamente grande localizada no membro superior à direita com invasão e destruição óssea local, sendo o diagnóstico histológico compatível com CBCM. Atualmente não há diretrizes estabelecidas para o tratamento do CBCM, porque todas as formas de tratamento até agora têm mostrado resultados desanimadores em termos de morbidade e mortalidade. A terapia para CBCM depende da localização e da extensão do tumor, sendo geralmente constituída por uma ampla excisão cirúrgica para metástase local sozinha ou combinado com quimioterapia e radioterapia para metástases à distância. O principal objetivo da cirurgia é a excisão completa do tumor com margens livres. A taxa de recorrência após a excisão cirúrgica varia entre 5% para ressecção completa e de 30% para ressecção com margens positivas 5, 10. Há muito tempo pensou-se que o tratamento dos tumores primários com radioterapia poderia contribuir para o seu potencial metastático, embora não haja nenhuma evidência para apoiar isso, a incidência de CBCM em pacientes tratados principalmente por radioterapia é estimada como sendo 1 em 25.000, que é muito menos do que a incidência de CBCM em todos os doentes com tumores primários 7. A quimioterapia com um agente único ou em combinação tem sido utilizada, mas não demonstrou resultados promissores, com exceção de alguns relatos isolados que mostraram resposta positiva significativa para a cisplatina, ciclofosfamida, vincristina, bleomicina, quer isoladamente ou em combinação 5,8,11. Ensaio clínico de fase I GDC-0449 tem mostrado resultados promissores. Foram tratados 33 pacientes com CBC localmente avançado ou CBCM. A taxa de resposta global foi de 50% e 60% para o CBCM e para o tumor localmente avançado, respectivamente 10. O Vismodegib (ensaio clínico GDC-0449), foi aprovado pelo FDA (Food and Drug Administration). É o 1
primeiro tratamento sistêmico de pacientes com doença localmente avançada ou CBC metastático que não é favorável à cirurgia e à radiação 11. O prognóstico para o CBCM é geralmente pobre devido a uma resposta inconsistente à quimioterapia ou cirurgia. Em muitos casos descritos na literatura no momento do diagnostico inicial já se apresenta com doença amplamente disseminada 12,13. O tempo médio de sobrevida após a metástase inicial é de 8 meses, embora o tempo de sobrevida de vários anos também tenha sido relatado 6,14. O CBCM tem uma sobrevida em 5 anos de apenas 10% 4,15. Dados históricos sugerem que os intervalos entre o diagnóstico do primário e o aparecimento de doença metastática têm variado entre 7 a 43 anos, mas os intervalos desde o diagnóstico da doença metastática até a morte tem sido curto 16,17,18. IV CONCLUSÃO O CBCM por sua raridade continua sendo uma entidade de difícil caracterização em termos de etiologia, fatores de riscos para metástases e opções terapêuticas. O tratamento ideal do CBCM ainda não foi elucidado devido à escassez de dados sobre o assunto. Embora CBCM seja uma entidade rara, sua ocorrência deve ser lembrada, especialmente quando se trata de um CBC gigante, de repetição ou tumor de longa data na região da cabeça e pescoço. 1
V - REFERÊNCIAS 1. Estimativa 2014: incidência de câncer no Brasil / Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva, Coordenação Geral de Ações Estratégicas, Coordenação de Prevenção e Vigilância. Rio de Janeiro : Inca, 2014. 2. Benedet L et al. Avaliação clínica e histopatológica dos pacientes portadores de carcinoma basocelular. Arquivos Catarinenses de Medicina 2007;36(1). 3. Chinem, V. P., Miot, H. A. Epidemiology of Basal cell carcinoma. An Bras Dermatol. 2011;86(2):292-305. 4. Harwood M et al. Metastatic basal cell carcinoma diagnosed by sentinel lymph node biopsy. J Am Acad Dermatol 2005;53:475-8. 5. Mehta K. S et al. Metastatic Basal Cell Carcinoma: A Biological Continuum of Basal Cell Carcinoma? Case Reports in Dermatological Medicine 2012. 6. Seo S. H et al. Pulmonary Metastasis of Basal Cell Carcinoma, Ann Dermatol 2011;23(2). 7. Nongrum H. B et al. Metastatic basal cell carcinoma to the lungs: Case report and review of literature. Indian Dermatol Online J. Nov 2014; 5(1): 26 29. 8. Berking C et al. Basal cell carcinoma treatments for the commonest skin cancer. Dtsch Arztebl Int 2014;111:389 95. 9. Snow SN et al. Metastatic basal cell carcinoma. Report of five cases. Cancer. 1994;73:328 35 1
10. Ducic Y, Marra D. E. Metastatic basal cell carcinoma. Am J Otolaryngol. 2011;32:455 8 11. Vu A, Laub D., Jr. Metastatic basal cell carcinoma. In: Madan V, editor. Basal Cell Carcinoma. Croatia: InTech; 2012; 79 92. 12. Khan M. K et al. Cervical in-transit metastasis from a truncal basal cell carcinoma. BMJ Case Rep. 2010;1 5. 13. Von Hoff D. D et al. Inhibition of the hedgehog pathway in advanced basal-cell carcinoma. N Engl J Med. 2009;361(12):1164-72. 14. Cirrone F, Harris C. S. Vismodegib and the hedgehog pathway: A new treatment for basal cell carcinoma. Clin Ther. 2012;34:2039 50. 15. Yadranko D, Marra D. E, Metastatic basal cell carcinoma. American Journal of Otolaryngology Head and Neck Medicine and Surgery 2011; 32 :455 458. 16. Lo J. S et al. Metastatic basal cell carcinoma: Report of twelve cases with a review of the literature. J Am Acad Dermatol. 1991;24:715 9. 17. Ting P. T, Kasper R, Arlette J. P. Metastatic basal cell carcinoma: a report of 2 cases and literature review. J Cutan Med Surg 2005;1:10-15. 18. Aldhaban S et al. Giant basal cell carcinoma with regional lymph node and distant lung metastasis. Eur J Dermatol. 2011;21:972 5. 1
Figura 1. Lesão ulcerada e volumosa em braço direito Figura 2. Imagem de radiografia com lesão lítica em úmero direito 1
Figura 3. Imagem de radiografia de tórax com nódulo pulmonar em lobo médio Figura 4. Tomografia computadorizada de tórax com imagem de nódulo de 2.2 x 2.0 cm em lobo médio 1
Figura 5. Amputação interescápulotorácica à direita - Cirurgia de Berger Figura 6. Incisão da cirurgia de Berger e toracotomia direita 1