A GESTÃO PARTICIPATIVA NOS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA NO PIAUÍ. Palavras-chave: Economia Solidária, participação, decisão.



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Transcrição:

A GESTÃO PARTICIPATIVA NOS EMPREENDIMENTOS DE ECONOMIA SOLIDÁRIA NO PIAUÍ Aritana Sousa Dutra de Melo 1 Bruno Batista de Carvalho Luz 2 Maria Jessyca Barros Soares 3 Gil Alves Cabral 4 Jhennyson Robert Ribeiro dos Santos 5 RESUMO A economia solidária se apresenta como uma nova forma de organização pautada em princípios como a igualdade, democracia, coletividade. O presente artigo busca avaliar os empreendimentos de economia solidária no Piauí do ponto de vista da participação dos associados nas decisões relacionando às formas tradicionais de gestão das instituições capitalistas. Palavras-chave: Economia Solidária, participação, decisão. ABSTRACT The solidarity economy is presented as a new form of organization based on principles such as equality, democracy and community. This article aims to assess the developments of economic solidarity in Piauí in terms of participation of members in decisions relating to the management of traditional forms of capitalist institutions. Keywords: Solidarity Economy, participation, decision. 1 Estudante de Graduação. Universidade Federal do Piauí (UFPI). tanadutra@hotmail.com 2 Estudante de Graduação. Universidade Federal do Piauí (UFPI). brunocarvalholuz@yahoo.com.br 3 Estudante de Graduação. Universidade Federal do Piauí (UFPI). jessyka_saron@hotmail.com 4 Estudante de Graduação. Universidade Federal do Piauí (UFPI). gil.a.c@hotmail.com 5 Estudante de Graduação. Universidade Federal do Piauí (UFPI). jhennyson7@hotmail.com

1 INTRODUÇÃO O mundo do trabalho no capitalismo contemporâneo vem passando por mudanças estruturais significativas. Ocorre uma diminuição da classe operária com a desproletarização do trabalho industrial ao passo em que efetiva-se uma expressiva expansão do trabalho assalariado com a ampliação do setor de serviços. Verifica-se também uma complexificação da classe trabalhadora a partir da heterogeneização do trabalho com uma subproletarização intensificada, presente na expansão do trabalho parcial, temporário, precário, subcontratado, terceirizado, informal. Neste contexto, além disso, constata-se uma tendência a uma maior fragmentação da classe trabalhadora. (ANTUNES, 2010) Frente as transformações do mundo do trabalho, surgem formas inovadoras de organização como alternativa de sobrevivência e geração de renda. Dentre elas apresenta-se a agregação de trabalhadores com gestão inspirada em métodos mais democráticos e solidários, que se denominou de Socioeconomia Solidária, Nova Economia Social, Novo Cooperativismo, Economia Solidária. Segundo Paul Singer (2002), a construção desta forma de organização para o trabalho é uma das estratégias de luta contra o desemprego e a exclusão social, à base de uma lógica oposta a que rege o mercado capitalista. é uma De acordo com a Secretaria Nacional de Economia solidária (SENAES) Economia Solidária inovadora alternativa de geração de trabalho e renda e uma resposta a favor da inclusão social. Compreende uma diversidade de práticas econômicas e sociais organizadas sob a forma de cooperativas, associações, clubes de troca, empresas autogestionárias, redes de cooperação, entre outras, que realizam atividades de produção de bens, prestação de serviços, finanças solidárias, trocas, comércio justo e consumo solidário. (BRASIL, 2010) Sua presença tem se verificado em setores da produção, prestação de serviços, comercialização e crédito. A Economia Solidária (Ecosol) adota formas coletivas de propriedade dos meios de produção, do processo de trabalho e de gestão do empreendimento, modificando a experiência operária do trabalho tradicional, exercitando o empoderamento pela comunidade dos trabalhadores e o esforço mútuo, em torno de interesses comuns. (GAIGER, 2009) Nesta perspectiva, as experiências no campo de constituição de empreendimentos de economia solidária (EES) tornou-se recorrente em todas as regiões do pais. No Piauí, dados do Sistema Nacional de Informações em Economia Solidária (SIES), coordenado pela SENAES (Secretaria Nacional de Economia Solidária), em 2007, apontam a existencia de 1. 472 empreendimentos de Economia Solidária (ESS) sendo 766 sob a forma de associação, 651 grupos de produção (formais e informais) e 41 cooperativas.

Objetiva-se neste artigo, analisar a gestão dos EES do Piauí, na perspectiva da participação dos associados. Cabe destacar, que não abordaremos a Ecosol como uma ruptura com o modo de produção capitalista, tampouco como um outro modo de produção. Considera-se esta economia inserida no sistema capitalista como parte dele inclusive utilizando a lógica de circulação de mercadorias e de capital e integrada a este, como dependente, sobrevivendo com limites, contradições e desafios. Entretanto, percebe-se as formas participativas nos empreendimentos como mais democrática, gerando uma maior autonomia dos trabalhadores. Esta postura, mostra-se radicalmente oposta as experiencias participativas típicas do capitalismo e defendidas por teoricos gerencialistas tradicionais. 2 PARTICIPAÇÃO NAS DECISÕES Nas formas de participação propostas pelos teóricos gerencialistas, a dinâmica das relações de trabalho no processo de produção mantém a autoridade das hierarquias supervisoras e o poder continua a pertencer ao capital. (FARIA, 2009). Apesar dos discursos gerenciais de gestão participativa através de organizações que aprendem (learning organization), onde o chefe se converte em líder, o empregado vira colaborador e o diretor se torna gestor, é possível perceber que se trata de um linguagem idealizada onde se disfarça o conflito capital-trabalho. Se analisado a fundo, percebe-se que esse discurso serve apenas para dissimular e não para superar as relações de poder dentro das empresas. (BERNARDO, 2009). O que vê-se na realidade dos empreendimentos ao moldes gerenciais tradicionais é que o controle se encontra na mãos de uma minoria fechada que se auto-promove e se auto-reproduz. Nas organizações nesses moldes, não são idéias que se trocam, mas somente negócios que se realizam onde esse grupo minóritário age de conformidade com os critérios capitalistas de racionalidade. (TRAGTEMBERG, 1980). Como resultado, tem-se uma gestão em que as decisões não são tomadas coletivamente, em que os produtores diretos não são consultados a respeito de questões estratégicas, pelo contrário A estes sobra a disciplina da execução de operações que são definidas por outros cérebros que não os seus. Sobram as operações com instrumentos de trabalho cuja finalidade, ergonomia, funcionalidade e operacionalidade também não são definidas pelos produtores diretos, mas pelos gestores e planejadores da produção. (FARIA, 2009, p. 58) Questões que causem repercussões no futuro da organização, ou que gerem grandes consequências tanto para esta como para as pessoas que nela trabalham, são de interesse vital a todos os atores organizacionais (stakeholders). Tendo em vista que a autoridade se constitue enquanto requisito fundamental para participar no processo de tomada de decisão, analisar os

atores que estão envolvidos nessa tomada de decisão, a posição que este ocupa a nível de influência e quais os omitidos do processo são de fundamental importância para a compreensão do comportamento dessa organização. (MILLER, HICKSON, WILSON, 2004). Segundo observou Fernando Motta (1981) participação é um conceito ambíguo capaz de refletir múltiplas realidades e assumir tantos significados quanto os contextos específicos nos quais se desenvolve. O estudo da participação requer para que se definam os seus diversos níveis considerar o grau de controle, pelos trabalhadores, dos elementos constitutivos da gestão do processo do trabalho. (FARIA, 2004). Segundo Tabb e Goldfarb (1975) há quatro grandes tipos de participação, quais sejam: (1) A participação dos trabalhadores nos lucros; (2) A participação dos trabalhadores ou de seus representantes em consultas; (3) A participação dos trabalhadores nas decisões gerenciais; (4) A participação dos trabalhadores na tomada de decisão sem uma área definida de autoridade. Paul Bernstein (1982) propõe uma escala contínua de participação dos trabalhadores na tomada de decisão. Sua proposta de participação envolve três dimensões: (1) O grau de participação dos trabalhadores; (2) Os temas nos quais os trabalhadores participam das decisões; e (3) O nível organizacional no qual os trabalhadores participam. Considerando as proposições teóricas sobre a participação numa perspectiva mais democrática, como exposto acima, tomar-se-á como referência para analisar a gestão nos EES no Piauí os seguintes criterios: (1) A participação dos trabalhadores nos lucros; (2) A participação dos trabalhadores ou de seus representantes em consultas sobre decisões e (3) Os temas nos quais os trabalhadores participam das decisões. No que diz respeito a participação no lucros, Roberto Braga (1998) descreve o lucro como a remuneração do investimento dos proprietários da empresa. Utilizando-se do conceito de Braga e fazendo uma analogia com as sobras, conforme a pesquisa do SIES 2007, de um total de 1.470 empreendimentos, 609 pagaram as despesas e obtiveram sobras. Destes Total, 341 dividiram as sobras entre os sócios. Os dados mostram que do total de empreendimentos que obtem sobras, 56% dividem entre si a remuneração do investimento dos sócios, caracterizando uma participação totalmente contrária a lógica capitalista das empresas tradicionais, em que os lucros ficam concentrados nas mãos de uma oligarquia de acionistas que possuem títulos e concentram a propriedade, não havendo, portanto, nenhuma socialização entre os trabalhadores. No que respeita a participação dos trabalhadores ou de seus representantes em consultas percebe-se também uma diferenciação entre as experiencias de produção solidária e capitalista típica. Nesta, com empresas nos moldes gerencialistas tradicionais, as decisões ficam restritas a uma minoria da direção que as toma sem consultar aos demais trabalhadores operacionais. Conforme observa Chiavenato (2004, p. 04) há uma maior concentração no processo decisório

na medida em que se sobe para os níveis mais elevados da organização, diminui a necessidade de habilidades técnicas, enquanto aumenta a necessidade de habilidades conceituais. Pode-se observar nos empreendimentos de economia solidária uma outra dinâmica. Do total 1.472 empreendimentos, 1.234 afirmaram realizar, regularmente, assembléia de sócios ou reunião de coletivo, caracterizando um indicativo expressivo (82%) das organizações realizando consulta aos seus sócios. Esse método de consulta remete geralmente ao princípio um membro, um voto, ou, ao menos, a um processo decisório em que os direitos de voto na assembléia cujo poder de decisão é supremo não sejam distribuídos em função de eventuais participações no capital. A participação, o poder decisório dos membros apresenta-se independente de seu capital ou de sua função hierárquica (DEFOURNY, 2009). O dado revela ainda a partipação como um modo de mobilização dos sócios, ao esforço do desenvolvimento das organizações, ligado as decisões da instituição. Com relação aos temas nos quais os trabalhadores participam das decisões; podemos observar que dos 1.472 EES, 62% destes participam de decisões cotidianas do empreendimento, 58% tem acesso aos registros e informações do empreendimento, 53% prestam contas aos sócios em assembléia geral / reunião coletiva de sócios, 52% fazem eleição da diretoria em assembleia geral / reunião coletiva dos sócios, 43% decidem sobre destino das sobras e fundos em assembléia geral / reunião coletiva de sócios, 33% definem o plano de trabalho definido em assembléia geral / reunião coletiva de sócios e em apenas 2% não existe qualquer participação dos sócios nas decisões. Os dados apresentados denotam que os trabalhadores dos EES piauienses participam dos mais variados temas dentro da organização desenvolvendo uma construção coletiva da gestão não ocorrendo a separação entre os cérebros e as mãos, entre os que pensam e executam dentro da organização, cenário constante nas organizações capitalistas. 3 CONCLUSÃO Diante do exposto, é possível perceber nos EES do Piauí o funcionamento de mecanismos completamente contrários aos de participação presentes nas instituições capitalistas. Enquanto nesse tipo de empreendimento a tomada de decisões é feita por uma minoria inexistindo consultas expressivas a grande parte dos produtores, nos empreendimentos de Ecosol verifica-se a tomada de decisão baseada em consultas frequentes sobre os mais variados temas a todos os atores da organização, divisão de lucros entre os produtores diretos, gestão pautada em assembléias que versam desde decisões cotidianas a prestação de contas. Desta forma cabe-nos afirmar que nestes empreendimentos há uma maior inserção democrática dos trabalhadores gerando uma gestão mais participativa.

Cabe atentar que não afirmamos que este modo de produção seja um polo de enfrentamento ou ruptura com o modo de produção capitalista, no entanto a tomar como referência os métodos e técnicas gerenciais utilizado pelas organizações capitalistas, os valores mostrados ao longo desse trabalho mostram uma perspectiva de avanço com relação a participação dos trabalhadores na gestão dos empreendimentos. 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho?: ensaio sobre as metamorfoses e centralidade no mundo do trabalho. São Paulo: Cortez, 2010. ATLAS DA ECONOMIA SOLIDÁRIA NO BRASIL. Brasília: MTE, SENAES, 2005. Disponível em http://www.trabalho.gov.br/ecosolidaria/sies_atlas.asp. Acesso em 22 abril 2011. BERNARDO, Márcia Hespanhol. Trabalho duro, discurso flexível: uma análise das contradições do toyotismo a partir da vivência de trabalhadores. São Paulo: Expressão Popular, 2009. BERNSTEIN, Paul. Necessary elements for effective worker participation in decision-making. In: Lindenfeld, F. e Rothschild-With, J. (org.). Workplace democracy and social change. Boston: Porter Sargent, 1982. BRAGA, Roberto. Fundamentos e técnicas da administração financeira. São Paulo: Atlas, 1989. CHIAVENATO, Idalberto. Introdução a teoria geral da Administração: uma visão abrangente da moderna administração das organizações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003. DEFOURNY, Jacques. Empresa social. In: Hespanha, Pedro et al. Dicionário internacional da outra economia. São Paulo: Almedina Brasil, Ltda. 2009 FARIA, José Henrique de. Gestão participativa: relações de pode e de trabalho nas organizações. São Paulo: Atlas, 2009.. Economia política do poder: as práticas do controle nas organizações. Curitiba: Criar, 2004. V. III.

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