ANPUH Associação Nacional de História / Núcleo Regional de Pernambuco ECKHOUT NUMA ABORDAGEM INTERATIVA PARA A SALA DE AULA Juliana das Oliveiras
2 ECKHOUT NUMA ABORDAGEM INTERATIVA PARA A SALA DE AULA Juliana Gomes das Oliveiras Graduanda de Licenciatura em História pela UFRPE julianadasoliveiras@yahoo.com.br Élcia de Torres Bandeira Professora DLCH / UFRPE elciabandeira@terra.com.br A partir do projeto Charges e Pinturas como Recursos Didáticos para o Ensino da História desenvolveu-se o sub-projeto As Pinturas de Eckhout como Recursos Didáticos para Ensino da História para tentar criar uma proposta pedagógica de utilização de imagens, em especial as pinturas de Eckhout sobre o Brasil, num contexto do cotidiano educacional, ou seja, na sala de aula. O projeto visa pesquisar, identificar, reproduzir, catalogar, organizar, arquivar, realizar análises das imagens selecionadas fornecendo textos e propostas de avaliação sobre elas, direcionadas ao ensino auferindo proveito de outras ciências, além da História, para sensibilização e compreensão. Bem como formando um banco de dados e imagens a ser disponibilizado no Departamento de Letras e Ciências Humanas DLCH / UFRPE. Assim, atendendo a uma demanda crescente por material didático para o ensino de História. As reproduções dos quadros de Eckhout são materiais alternativos possibilitando a aprendizagem de forma lúdica. Seguindo uma perspectiva de abordagem construtivista, baseada em autores como o francês Edgar Morin (2001), o suíço Philippe Perrenoud (2000), o brasileiro Paulo Freire (1997), o russo Lev Vygotsky (1998) e o espanhol César Coll (1998) e um de seus inspiradores como o francês Jean Piaget (2000) pretende-se desenvolver materiais didáticos para, principalmente, o ensino de História e também de, por exemplo, Saúde Pública e Ambiental, de Ciências, de Geografia e toda aquele segmento do conhecimento que se perceber possível da utilização das pinturas de Eckhout como instrumento pedagógico. Na perspectiva da Teoria da História, a pesquisa segue a linha da Nova História, a partir de Peter Burke (1992). E também utiliza a História das Artes com autores como Robert Cumming (1996) e Stevlana Alpers (1999). Para a base histórica, faz-se uso de leituras fundamentais como o do José Antônio Gonsalves de Mello (1987), neto, Evaldo Cabral de Mello (1997) e Jorge Couto (1998).
3 Parte-se de análises de experiências já geradas na área de história como as descritas no livro organizado pela Professora Circe Bittencourt (1997) O saber histórico na sala de aula e no material produzido para o Retratos do Novo Mundo: O Legado de Eckhout Seminário de capacitação para professores da rede pública de Pernambuco promovido pela Prefeitura da Cidade do Recife para capacitação de seus professores. Leituras sobre a semiótica para embasar na pesquisa, em especial a análise imagética, a partir desta perspectiva. Para tanto foi visto o livro da Coleção Primeiros Passos, da editora Brasiliense O que é semiótica e artigo da Gemma Penn (2002), do livro Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático, organizado por Martin W. Bauer e George Gaskell, da editora Vozes. O trabalho é multidisciplinar à medida que várias ciências podem utilizar-se das imagens. Exemplo disto aparece no trabalho da professora Rozélia Bezerra, na UFRPE, membro do grupo da pesquisa, quanto à análise ambiental, na disciplina Saúde Pública e Ambiental ministrada na UFRPE, ou em discussão sobre o imaginário formado a partir dos tipos étnicos presentes no Recife do século XVII abordada pela coordenadora da pesquisa, professora Élcia Bandeira. E é uma abordagem interdisciplinar, pois trabalha a Arte para o ensino da História como para o da Geografia e Ciências ao mesmo tempo, levando o aluno a entender e intuir a atmosfera do Recife no século XVII a partir daquela perspectiva apresentada por Eckhout. Assim, percebe-se a importância de compreensão, em primeira instância, do contexto histórico e artístico no qual estava inserido o pintor holandês: os estilos e vertentes estéticas em voga, as relações políticas e sociais praticadas na Europa e em Pernambuco. O projeto pleiteia primeiramente levantar a bibliografia concernente, a biografia do pintor em questão, seleção das imagens objeto da pesquisa, passos estes já percorridos e a seguir expostos de forma analítica. Estando-se a partir de agora em busca pela contextualização do autor e sua obra como supracitado, de forma histórica e artística, ou seja, a relação e inserção do artista em seu meio sócio-econômico-cultural. Albert van Eckhout nasceu em Groningen, Holanda, em cerca de 1610 e lá morreu em cerca de 1666. Esteve em Recife e Olinda durante o período nassoviano (1637-1644), quando participou da comitiva do governador nomeado pela Companhia das Índias Ocidentais (West- Indische Compagnie ou WIC). Sobrinho do pintor Gheert Roeleffs, que, segundo alguns historiadores da arte, é seu mestre e introdutor no ofício. A produção de Eckhout anterior à vinda ao Brasil é desconhecida. Porém suas obras principais são as daqui. Sobre aqui ele fez as naturezas-mortas com frutas tropicais mostradas
4 como um todo e em corte transversal e seis quadros de tipos étnicos em tamanho natural. Feitos a partir de esboços, desenhos de situações e coisas vistas e percebidas no Pernambuco de outrora. A coleção objeto da pesquisa pertence ao Nationalmuseet, Copenhagen, Denmark (Museu Nacional da Dinamarca), presente do Conde João Maurício de Nassau-Siegen a seu primo Frederico III, rei da Dinamarca, em 1654. Eckhout e suas pinturas aqui discutidas oferecem possibilidade de análise, entre outros, dos seguintes elementos: hábitos e costumes, fauna, flora e o meio ambiente, arquitetura, relações sociais, economia e outros aspectos da vida rural seiscentista do Pernambuco Colonial. Os esboços, desenhos e pinturas de Eckout são notáveis dentre fontes iconográficas do Brasil holandês, sssim identificadas por especialistas e conferidas em Historia Naturalis Brasiliae, Theatrum Rerum Naturalium Brasiliae, Manuais e Miscellanea Cleyri. No século XVII, na Holanda protestante, onde se manteve retratando temas católicos, também se registrava o cotidiano e a esta prática, as Artes chamou se Pintura de Gênero, ou seja, representação do cotidiano. Quanto a este momento artístico, Alpers (1999, pp. 31-32) escreveu: Os quadros holandeses são ricos e variados em sua observação do mundo, admiráveis em sua exibição de virtuosismo, domésticos e domesticantes em suas preocupações. Os retratos, as naturezas-mortas, as paisagens e a apresentação da vida diária representam prazeres hauridos num mundo cheio de prazeres: os prazeres dos laços familiares, os prazeres nas posses, prazer nas pequenas cidades, nas igrejas, na terra. Nessas imagens, o século XVII assemelha-se a um longo domingo, como disse um autor holandês recente, depois dos tempos conturbados do século anterior. A arte holandesa oferece um deleite para os olhos, e como tal parece talvez exigir menos de nós que a arte da Itália. Eckhout viveu em um período onde pintores como: Jan Bruegel (c. 1525-1569), Michelangelo Merisi Caravaggio (1571-1610), Harmensz van Rijn Rembrandt (1606-1669), Piter Paul Rubens (1577-1640), Diego de Silva y Velázquez (1590-1660) e Jan Vermmer (1632-1675) também estavam produzindo e, naturalmente, houve as influências destes e tantos outros na obra de Eckhout. Quanto ao momento artístico vivenciado por tais pintores Foyga Ostrower (1983, 1983, p. 323) cita:
5 Em sua estrutura espacial, as imagens criadas pelos artistas holandeses aqui mencionados 1 pertencem inconfundivelmente ao Barroco corrente de caráter expressionista. Alinhamentos em diagonal de volumes, dissolução dos volumes por movimentos intensos ou pela luz, espaços assimétricos acelerados na profundidade, matéria essencialmente pictórica. O governo de Nassau-Siegen recebe destaque nas questões das relações sociais, analisadas por José Antônio Gonsalves de Mello (1987), neto, em Tempo dos Flamengos, no qual ele relata e analisa a partir de documentos pesquisados na Holanda o comportamento dos holandeses perante os negros e a escravidão, os índios e a catequese, os portugueses, os judeus e as religiões respectivas. Esta pesquisa contribui para que se possa compreender melhor a relação daqueles tipos étnicos construídos por Eckhout com a realidade da época, bem como, fazer a contextualização sugerida já citada, sendo embasamento para levar à sala de aula as discussões pertinentes a reprodução das imagens daquele pintor. É interessante ressaltar como foi que o pintor holandês, recém iniciado nas artes conseguiu a proeza de fazer parte da comitiva científica de um príncipe em uma empreitada financiada pela Companhia das Índias Ocidentais (WIC) para o local considerado o maior produtor de açúcar da possessão pertencente ao país referência em grandes navegações Portugal. Para tanto, é necessário começar pela história geral, das relações dos países entre si, para se chegar à especificidade da história de cada país envolvido na colonização do Brasil. Depois disso, questionamentos sobre as imagens, como Alpers (1999) expõe, levam a perceber que o século XVII na Holanda é recheado de muitos simbolismos, mitos, emblemas. E isto deve ser levado em conta na hora de destrinchar a pintura como fonte de valores. A percepção das pinturas como documento requer também a pesquisa em outras fontes, necessitando-se fazer relações com documentos outros, como relatos de viajantes. Faz parte da análise imagética questionar também como foram registradas essas imagens, para quem, como os símbolos foram construídos. Pois, caso contrário, poder-se-á fazer apenas uma interpretação simbólica e não fiel aos fatos. Assim, poder-se-á dizer que, as pinturas de Albert van Eckhout são percepções subjetivas do real como tantas outras, ou seja, representa, interpreta, são especialmente simbólicas, o que reforça a possibilidade do material didático por outras ciências como o trabalho se propõe. 1 VERMEER (1632-1675), REMBRANDT (1606-1669), RUBENS (1577-1640), STEEN (1626-1679), CHARDIN (1699-1794).
6 Deseja-se também fazer uma discussão das pinturas quando elas são postas de forma a ilustrar livros didáticos. Fazendo relação entre a imagem reproduzida, o texto fertilizador e o contexto de ambos para se verificar se realmente são aplicadas de forma coesiva e coerente e assim poder-se-á utilizá-las para a aplicação das avaliações e práticas pedagógicas a serem sugeridas num livro produzido pela equipe ao final da pesquisa. A ação recíproca da História, Arte e Ciência constituintes da cultura, são relevantes para a valorização e compreensão da hibridação na identidade local e até nacional, esta observação permite redimensionar a cultura como fator fundamental para a formação da consciência e atitude comportamental de um povo, ou seja, para a formação do povo brasileiro. A pintura auxilia na reconstituição de um conjunto de elementos visuais do real e na compreensão da produção imaginária da obra artística. A utilização da pintura como fonte histórica pode facilitar a interação em sala de aula de diversos atores sociais, possibilitando a partir da escrita e dramatização avaliar, tendo como indicador de desempenho: a compreensão por parte d@s alun@s das relações sociais e do papel de cada personagem da história, percebendo-se, eles, também, atores sociais do hoje. Concebe-se que esta pesquisa possibilitará reconstruir um cenário do passado no presente levando o aluno a também se contextualizar na época dele, como também exercer a alteridade, na reconstituição do passado a partir de tais elementos, e neste caso as pinturas de Eckhout um holandês do século XVII, mostrando as instituições sociais, às quais constituem-se espelhos da sociedade. Reavaliar o material didático já existente e propor novos faz parte de nossas próximas etapas. Do mesmo modo, redimensionar o uso das imagens em sala, apresentar propostas concretas de intercâmbio das pinturas, ou seja, leituras possíveis da imagem quanto à realidade e o imaginário através de técnicas alternativas do trabalho pedagógico. Desta forma, produzir-se-á um ensino da História a partir do cotidiano, com movimento dando sentido a aprendizagem. As possibilidades de criação são ilimitadas, dependendo da ação criativa de cada sujeito histórico envolvido. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALPERS, Stevlana. A arte de descrever. São Paulo: Edusp, 1999. 427p; il. ARAÚJO, Claudia Roberta de. A Teoria de Jean Piaget. Recife, 2000. BITTENCOURT, Circe (org.). O saber histórico na sala de aula. São Paulo: Contexto, 1997. 175p; il.
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