1 P.º n.º R.P. 205/2010 SJC-CT Loteamento. Alteração. Objecto mediato do registo. Intervenção dos titulares inscritos. PARECER 1., na qualidade de apresentante e em representação de..., vem interpor recurso hierárquico da decisão de recusa do registo de alteração de loteamento, pedido a coberto da ap., de.../ /, sobre o prédio n.º, que se fundou na falta de prova do consentimento dos titulares inscritos dos lotes abrangidos pela alteração e no facto de o registo não ter sido pedido sobre todos os lotes, e procurou apoio no expendido no processo n.º R.P. 13/2000 DSJ-CT. 1.1. O pedido de registo foi instruído com certidão emitida pela Câmara Municipal de... contendo os termos da alteração à operação de transformação fundiária a que se refere o alvará de loteamento n.º..., de de... de, de que resulta a eliminação do lote n.º, com um acréscimo da área correspondente ao lote n.º... do mesmo proprietário, o referido, e redução da área de construção deste lote; a referência ao suprimento da falta de inserção do desenho geométrico dos lotes n.º e n.º... na planta de síntese; e a alteração do polígono de implantação dos lotes nºs a, a e a 1.2. Em declarações complementares, subscritas pelo titular inscrito, é especificada a alteração efectuada aos mencionados lotes nºs e e feita a descrição do lote subsistente (lote n.º ), com indicação de todos os elementos necessários à actualização da descrição, juntando-se prova matricial actualizada deste lote. 2. Nas alegações de recurso, que aqui se dão por reproduzidas, argumenta-se que a alteração de loteamento é emitida a favor de todos os titulares dos lotes abrangidos; que é da competência da Câmara verificar e comprovar os pressupostos de tutela urbanísticoadministrativa atinentes a alterações que versem sobre as especificações do alvará; e que, salvo a modificação operada nos lotes e, nenhuma das restantes alterações está sujeita a registo. 3. No despacho proferido ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 142.º-A do Código do Registo Predial (CRP), a decisão de recusa é sustentada à custa do entendimento de que: o princípio do trato sucessivo (artigo 34.º/4 do CRP) demanda o consentimento do titular inscrito do lote no qual se pretende efectuar o registo, não bastando demonstrar que o
2 alvará foi emitido em seu nome; o registo tem de ser pedido sobre todos os lotes; e todas as alterações às especificações estão sujeitas a registo. *** Vistas as posições em confronto, não havendo questões prejudiciais que obstem à apreciação do presente recurso, cumpre emitir parecer. Fundamentação 1. De acordo com o disposto no artigo 27.º/7 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE), na redacção dada pela Lei n.º 60/2007, de 4 de Setembro, a alteração da licença dá lugar a aditamento ao alvará, que, no caso de operação de loteamento, deve ser comunicado oficiosamente à conservatória do registo predial competente para efeitos de averbamento, com os elementos em que se traduz aquela alteração. 1.1. Mas, diz o n.º 8 do mesmo artigo, as alterações à licença de loteamento, com ou sem variação do número de lotes, que se traduzam na variação das áreas de implantação ou de construção até 3 %, desde que não impliquem aumento do número de fogos, alteração de parâmetros urbanísticos ou utilizações constantes de plano municipal de ordenamento do território, são aprovadas por simples deliberação da câmara municipal, com dispensa de quaisquer outras formalidades, sem prejuízo das demais disposições legais e regulamentares aplicáveis. 1.2. Donde se conclui que a simples variação das áreas de implantação ou de construção até 3% é também uma alteração da licença de loteamento, embora com regime procedimental atenuado, e, como tal, obtém enquadramento no artigo 2.º/1/d) do CRP e submete-se a todas as regras e princípios inerentes ao processo de registo de que comungam as demais alterações de loteamento, dando também lugar à comunicação a que alude o n.º 7 do artigo 27.º já citado 1. 1.3. Deste modo, independentemente do iter procedimental seguido, as alterações à licença podem ser, todas elas, publicitadas com base em comunicação da entidade competente (oficiosidade externa) e mediante averbamento à inscrição da operação de transformação fundiária (artigo 101.º/1/n) do CRP), sem prejuízo de caber depois a cada interessado obter a tradução tabular das modificações fundiárias que devam operar ao 1 Neste sentido, processo C. P. 11/2006 DSJ-CT.
3 abrigo do acto administrativo de controlo prévio (artigo 80.º/3 do CRP) e que do ponto de vista jurídico e ou material se tenha logrado concretizar. 1.4. Claro que se a alteração à licença de loteamento tiver por objecto apenas especificações que não contendam com a divisão fundiária, a actividade registal esgotarse-á num acto único de averbamento à inscrição, a lançar na ficha correspondente à área intervencionada e na ficha de cada um dos lotes constantes do alvará com base na comunicação da entidade licenciadora, ficando desde logo patenteado o efeito real que se pretenda envolvido, designadamente ao nível da conformação vinculativa do direito de propriedade. 1.5. Queremos, com isto, sublinhar que o âmbito do artigo 2.º/1/d) comporta a publicitação do acto administrativo que altera as condições de exercício do direito de concretizar a operação urbanística sejam quais forem as alterações à licença de loteamento; digam respeito, ou não, à geometria do fundo pertinente a cada lote; esteja em causa, ou não, o desenho fundiário publicitado, já que todas elas respeitarão a elementos determinantes e fundamentais do acto administrativo. 1.6. Mas queremos, outrossim, notar que, em face do disposto no artigo 80.º/3 do CRP, sai reforçado o entendimento de que no enunciado linguístico do artigo 2.º/1/d) do mesmo Código encontram correspondência todas as alterações à licença, com ou sem concretização simultânea e imediata da transformação fundiária que nela esteja implicada, pois, mesmo nos casos em não exista obstáculo jurídico para a execução da autorização ao nível físico-descritivo dos lotes, o processo de registo promovido pela autoridade licenciadora ou autorizante não poderá, normalmente, visar mais do que a publicitação do acto administrativo, posto faltarem outras diligências, designadamente, matriciais que suscitam a intervenção do interessado. 2. Por outro lado, também interessa dizer que o facto de a lei encarregar a entidade licenciadora da promoção do registo, nos termos previstos no artigo 27.º/7 do RJUE, não é de molde a diminuir a regra da legitimidade para o pedido de registo (artigo 36.º do CRP) nem a postergar o princípio da instância vertido no artigo 41.º do CRP; 2.1. Alias, só a certeza de que a promoção deste registo de alteração à licença não constitui um exclusivo da entidade licenciadora justificará que se aduza a obrigatoriedade de o beneficiário do facto o promover no prazo de 30 dias a contar da titulação (artigos 8.º-A/1/a), 8.ºB/1/f) e 8.º-C/1 do CRP), reconhecendo-se aqui duas obrigações, com distintos sujeitos, com a singularidade de uma das obrigações, precisamente a que compete à câmara municipal, não [ter] prazo de cumprimento, não [ter] sanção e não
4 [desresponsabilizar] o não cumprimento da outra obrigação, a cargo do sujeito activo do facto 2. 2.2. Donde não se negará a qualquer interessado a iniciativa na promoção do registo, o qual, tendo por objecto imediato o acto administrativo que habilita à realização da alteração pretendida, se traduzirá no mesmo averbamento a efectuar nos termos dos artigos 101.º/1/d), 103.º e 95.º/1/f) do CRP, e, se for o caso, no ajustamento descritivo dos lotes ou parcelas modificados e na descrição de novos lotes ou parcelas individualizados (artigos 80.º/3 e 90.º do CRP). 2.3. Porém, se o facto «alteração à licença» já constar do registo por iniciativa da entidade licenciadora ou autorizante (artigo 27.º/7 do RJUE), como no caso dos autos, não sobra ao interessado senão pedir o registo dos actos de «execução» dessa autorização que devam ser patenteados na ficha de cada um dos lotes envolvidos, designadamente os que se destinem a garantir o destino jurídico unitário de cada um dos lotes e os que visem assinalar, ao nível descritivo, o efeito real da transformação fundiária administrativamente aprovada. 3. Acontece aqui que o interessado, em vez de pedir o averbamento de actualização da descrição correspondente ao lote n.º... quanto à área e demais elementos físicos e fiscais alterados por via da transformação fundiária operada, e a consequente inutilização da ficha relativa ao lote n.º (eliminado), requereu o registo de alteração de loteamento sobre o prédio loteado (descrição n.º ), e prestou as declarações tendentes à actividade oficiosa de actualização dos fundos que, em «execução» daquela alteração, foram reordenados. 3.1. Ora, estando o facto alteração de loteamento já registado a coberto da ap., de.../ /, e mediante comunicação da entidade licenciadora, só podemos considerar extemporâneos os fundamentos invocados para a recusa, porquanto no processo de registo atinente àquela apresentação (...) teriam cobrado razão de ser quaisquer exigências relativas à intervenção dos titulares inscritos de todos os lotes directamente abrangidos pela alteração e à promoção do registo, como acto unitário, sobre o prédio objecto de loteamento e sobre todos os lotes constantes do alvará. 3.2. Realmente, estando em causa um acto administrativo carecido de colaboração dos interessados, determina o artigo 34.º/4 do CRP que se demonstre a intervenção dos titulares inscritos dos lotes directamente abrangidos pela alteração, como requerentes ou como destinatários do acto de conformação do conteúdo do direito de propriedade, de 2 Cfr. processo R.P. 63/2010 SJC-CT.
5 condicionamento da utilização do solo para fins urbanísticos, ou de permissão do direito de lotear, urbanizar e edificar 3, sob pena de o registo ser lavrado como provisório por dúvidas. 3.2.1. Pois mesmo quando ao acto em causa corresponda um procedimento simplificado, como nos casos previstos no artigo 27.º/8 do RJUE, não deixará de haver um acto de iniciativa e uma regra de legitimidade, a demandar que aos titulares inscritos dos lotes directamente abrangidos pertença a qualidade de requerentes ou de intervenientes no procedimento e, por conseguinte, de destinatários do acto administrativo correspondente 4. 3.2.2. A despeito de se tratar de actos reais, isto é, de actos que operam a qualificação jurídica da coisa abstraindo das circunstâncias pessoais de quem os requer, não são, ainda assim, actos administrativos intransitivos, e não deixam de ser actos emitidos sob reserva de direitos de terceiros que, desta forma, só lograrão eficácia face ao proprietário inscrito se este for também o titular da licença, vale dizer, o seu destinatário, ou tiver adquirido de quem, a esse título, interveio no procedimento administrativo (artigo 77.º/3 do RJUE) 5. 3.3. E também a nós nos parece que a alteração da licença é um facto unitário de efeitos incindíveis, dado que redefine o desenho urbanístico da área loteada e necessariamente reflecte o plano de conjunto preestabelecido, afectando todos os lotes (e não apenas aqueles sobre os quais cada uma dessa alterações incide), que deve, por esse motivo, ser lançado na ficha do prédio objecto do loteamento e em todas as fichas dos lotes dele destacados 6. 3.4. Acontece, porém, no caso apreço, que apesar de o averbamento efectuado não ter sido lançado em todas fichas (do prédio loteado e de todos lotes abrangidos pelo alvará) 3 Sobre a natureza jurídica da licença de urbanismo, cfr. Pedro Gonçalves e Fernanda Paula Oliveira, Revista Cedoua, ano II- 1.99. 4 Para nós, pedir a «intervenção» do titular inscrito (artigo 34.º/4 do CRP) não vale pedir o seu «consentimento» para o acto, pelo que sempre seria excessiva a exigência feita no despacho de qualificação no sentido de ser comprovado o «consentimento» dos interessados. 5 Sublinha-se aqui a diferença de regime entre o preceituado no artigo 29.º/3 do Decreto-Lei n.º 448/91, de 29 de Novembro, que, relativamente aos adquirentes dos lotes, fazia depender do registo predial a oponibilidade das condições estabelecidas no alvará, e o disposto no artigo 77.º/3 do RJUE, estipulando que as especificações do alvará de operação de loteamento vinculam a câmara municipal, o proprietário do prédio e os adquirentes dos lotes. 6 Processo R.P. 13/2000 DSJ-CT, publicado no BRN 7/2000, II caderno.
6 e não conter as novas especificações, nem os elementos essenciais da transformação fundiária a executar ulteriormente, e tenhamos de recomendar, por isso, que oportunamente se proceda ao suprimento de tais omissões em face do documento admitido a registo pela sobredita ap., de / / e dos elementos à data existentes no serviço de registo, o facto «alteração à licença de loteamento» já está registado, pelo que há-de ser esta a razão fundamental e decisiva por que se recusa o registo (artigo 69.º/1/c) do CRP). 4. Posto isto, somos, pois, de parecer que o registo do facto deve ser recusado, por já se encontrar registado 7, e que o recurso não merece provimento. Em síntese, formulam-se as seguintes CONCLUSÕES I- Em face das disposições conjugadas dos artigos 2.º/1/d) do Código do Registo Predial e 27.º/7 e 8 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, as alterações à licença de loteamento que se traduzam na variação das áreas de implantação ou de construção até 3% devem ser comunicadas oficiosamente à conservatória do registo predial competente para efeitos de averbamento, contendo a comunicação os elementos em que se traduz a alteração. II Cabe, no entanto, ao interessado requerer o registo dos actos de índole privada destinados a garantir o destino jurídico unitário de cada um dos lotes ou o ajustamento descritivo dos lotes alterados, que não possa ser desde logo abrangido pelo averbamento à inscrição da transformação fundiária (artigo 101.º/1/n) do Código do Registo Predial). III- A alteração da operação de transformação fundiária resultante de loteamento só pode ser registada definitivamente se os titulares inscritos dos 7 A alteração do fundamento de recusa que, nesta sede, se propõe é justificada em face do escopo essencial do registo, que é o de segurança do comércio jurídico imobiliário (artigo 1.º do CRP), e do interesse público envolvido, pressupondo que se ofereça uma informação predial clara e inequívoca, sem repetição ou duplicação de registos do mesmo facto, vale dizer, sem factos com duas ou mais vidas registais paralelas e simultâneas, como tal, incapazes de definir a situação jurídica do prédio.
7 lotes alterados tiverem intervindo no procedimento administrativo ou no processo de registo, ou tiverem adquirido de quem requereu a alteração ou de quem interveio no procedimento administrativo respectivo (artigos 34.º/4 do Código do Registo Predial e artigo 77.º/3 do RJUE). IV- A alteração da licença é um facto unitário de efeitos incindíveis que redefine o desenho urbanístico da área loteada e necessariamente reflecte o plano de conjunto preestabelecido, devendo, por isso, ser lançado na ficha do prédio objecto do loteamento e em todas as fichas dos lotes dele destacados. V- Deve ser recusado, nos termos do artigo 69.º/1/c) do Código do Registo Predial, o registo que vise publicitar a alteração à licença de loteamento que já se encontre publicitada por via oficiosa e com base em comunicação da entidade licenciadora, ainda que do extracto do averbamento efectuado não conste, como devia, o conteúdo da alteração. Parecer aprovado em sessão do Conselho Técnico de 29 de Abril 2011. Maria Madalena Rodrigues Teixeira, relatora, Luís Manuel Nunes Martins, Isabel Ferreira Quelhas Geraldes, António Manuel Fernandes Lopes, João Guimarães Gomes Bastos, José Ascenso Nunes da Maia. Este parecer foi homologado pelo Exmo. Senhor Presidente em 10.05.2011.
8 FICHA P.º R.P. 205/2010 SJC-CT SÚMULA DAS QUESTÕES TRATADAS 1. Alteração de loteamento - variação das áreas de implantação ou de construção até 3%. Instância e Oficiosidade do registo Intervenção dos titulares inscritos Registo unitário objecto mediato do registo Obrigação de registar momento da cobrança da quantia devida pelo incumprimento