P.º R. P. 24/2009 SJC-CT-

Transcrição

1 P.º R. P. 24/2009 SJC-CT- Inscrição de penhora efectuada como provisória por dúvidas. Anotação indevida da sua caducidade. Eliminação desta anotação e elaboração do registo de conversão. Relatório DELIBERAÇÃO 1 Em 15 de Abril de 2008, a coberto da ap. 17, foi requerido um registo de penhora na Conservatória do Registo Predial de, respeitante aos prédios descritos sob os n.ºs 2236 e 2237, da freguesia da, concelho de. Serviram de base à instrução do pedido, inter alia, uma fotocópia certificada da notificação para execução de penhora, o duplicado do requerimento executivo e duas certidões matriciais. O aludido registo veio a ser efectuado como provisório por dúvidas por se verificarem divergências entre as áreas constantes das descrições prediais e as inscritas na matriz. Ora, salienta a Senhora Conservadora no seu despacho de qualificação, o n.º 2 do artigo 28.º do CRP refere que em relação aos prédios rústicos não submetidos ao cadastro geométrico a exigência de harmonização com a matriz é limitada aos números dos artigos matriciais e à área dos prédios, sendo que esta é dispensada sempre que a diferença entre a área da inscrição matricial e a da descrição não ultrapasse 10% em relação à área maior (n.º 3 do referido preceito). Porém, no caso dos autos a divergência apurada entre as referidas áreas é superior à percentagem consentida pela lei. 2 Com o intuito de remover as dúvidas aduzidas o interessado vem apresentar o pedido de conversão do registo de penhora (ap.15/ ) declarando complementarmente que as diferenças de áreas apontadas resultaram de erro de medição o que é comprovado mediante a junção de planta elaborada por técnico habilitado apresentando ainda, para o efeito e em conformidade, cópia extraída dos processos de reclamação administrativa n.ºs 873/2007 e 875/2007 dirigidos à Repartição de Finanças competente e que originaram a rectificação das áreas nos termos agora patenteados na matriz. 3 A Senhora Conservadora em 20 de Novembro de 2008 proferiu despacho de recusa de conversão do registo da penhora por as dúvidas não se mostrarem removidas, pois deveria ter sido previamente pedida a rectificação das áreas dos prédios e só posteriormente a conversão do referido registo. Remete a fundamentação de direito para o disposto nos artigos 68.º e 69.º, n.º 1, alínea e), do CRP. 1

2 4 Posteriormente, deram entrada na Conservatória um requerimento que continha os seguintes pedidos de registo: a) conversão do registo provisório de penhora; b) averbamento à descrição n.º 2236 da área correspondente à parte rústica 4641m2; e c) averbamento à descrição n.º 2237 da área correspondente à parte rústica 2555m2. O requerente renovou as declarações que já tinha prestado aquando do pedido de registo a que coube a ap.15/ , remetendo, quanto à instrução, para os documentos já apresentados com o aludido pedido. A conservatória procedeu à anotação do primeiro dos pedidos no Diário sob a ap.1/ , e, em 12 de Dezembro, procedeu à sua recusa por a inscrição de penhora já se encontrar caduca artigos 68.º e 69.º, n.º 1, alínea c), do CRP. 5 Inconformado com a qualificação que recaiu sobre o seu pedido, o interessado interpõe recurso hierárquico 1 expendendo os argumentos que aqui se dão por integralmente reproduzidos e dos quais destacamos, em síntese, os seguintes: 5.1 Não foi proferida decisão sobre os pedidos de averbamento às descrições presumindo-se, contudo, que foram liminarmente indeferidos uma vez que tal menção consta das descrições em causa, embora sem indicação dos números da apresentação nem da data das mesmas Quanto à invocada caducidade, citando doutrina deste Conselho, salienta que o prazo de caducidade do registo provisório por dúvidas só começa a correr a partir da data da notificação do referido despacho de qualificação ao interessado, tendo ocorrido no dia 28 de Abril de 2008, pelo que tendo sido 1 Por razões óbvias, as questões da competência do SAID não são tidas em consideração nesta sede. 2 Parece-nos que a menção constante das descrições prediais n.º 2236 e 2237, «indeferimento liminar do pedido de rectificação de área», induziu em erro o recorrente visto que equaciona a possibilidade de ela ter sido inserida na sequência do seu pedido de conversão do registo de penhora e que, por isso, vem reivindicar a notificação do correspondente despacho. No entanto, a inserção de tal menção na descrição decorreu do indeferimento liminar do processo de rectificação de áreas requerido em 3 de Dezembro de 2008, e anotado no Diário sob a ap. 9, cujo despacho foi certamente notificado ao requerente na data anotada na ficha por força do disposto no n.º 3 do artigo 71.º do CRP. 2

3 requerida a conversão do registo no dia 28 de Outubro de 2008 a inscrição ainda se encontrava dentro do seu prazo de vigência. Acresce ainda, por outro lado, que o pedido de conversão da inscrição provisória entretanto formulado ( ) suspende o respectivo prazo de caducidade até à notificação do despacho de recusa (que teve lugar no dia ), o que contribui para dilatar o aludido prazo. 5.3 No que concerne ao eventual e presumido indeferimento liminar dos pedidos de averbamento entende que qualquer pedido tem de ser objecto de anotação no Diário, mesmo até os casos que determinam a rejeição da apresentação (artigo 66.º do CRP). Por isso, solicita que seja ordenado à Senhora Conservadora que proceda à anotação dos pedidos de averbamento à descrição no Diário reportados a 25 de Novembro de 2008 e que notifique o interessado do eventual despacho de indeferimento, se foi proferido ou a proferir caso ainda mantenha o mesmo entendimento. Pede ainda que sejam revogados os despachos proferidos e que seja ordenado à recorrida que proceda à qualificação, analisando o pedido e convertendo em definitiva a inscrição de penhora em causa. 6 Os argumentos expendidos pelo recorrente convenceram a recorrida da errónea contagem do prazo de vigência do registo de penhora, tendo, por isso, procedido à inutilização da anotação da caducidade do referido registo, repondo-o em vigor. Os demais argumentos alegados não foram bafejados com igual sorte por entender que os motivos das dúvidas não se encontram removidos uma vez que deveria ter sido previamente requerida a rectificação da área de cada um dos prédios e posteriormente a conversão do registo da penhora, como claramente consta do primeiro despacho de recusa da conversão (ap.15/ ). Por fim acrescenta, algo contraditoriamente, que os averbamentos à descrição são, por norma, lavrados oficiosamente no seguimento de qualquer inscrição e com o número de apresentação desta pelo que se o registo tivesse sido convertido os averbamentos teriam também sido efectuados às descrições em causa. 6.1 Concede ainda que o pedido de registo deu efectivamente entrada na Conservatória no dia 25 de Novembro e não no dia 27, como foi anotado no Diário, mas tal diferimento foi acordado com o interessado e teve subjacente o intuito de 3

4 ajudar e colaborar visto que o registo já tinha sido anteriormente recusado com a inerente perda do emolumento 3. 7 Como veremos a seguir, o processo é o próprio, as partes têm legitimidade e o recurso é tempestivo, inexistindo questões prévias ou prejudiciais que obstem à sua apreciação. II Questões prévias O presente recurso hierárquico foi interposto contra a decisão proferida pela Senhora Conservadora sobre o pedido apresentado sob o n.º 1/ , da qual constava, tão só, que o pedido de conversão era recusado por a respectiva inscrição de penhora já se encontrar caducada. Ora, de harmonia com o que se encontra prescrito no n.º 1 do artigo 140.º do Código do Registo Predial, a decisão de recusa da prática de acto de registo nos termos requeridos pode ser impugnada mediante a interposição de recurso hierárquico para o presidente do Instituto dos Registos e do Notariado, I.P. Acontece, porém, que a recorrida reparou a sua decisão na íntegra o que, no rigor dos princípios, nos levaria de imediato a sustentar que os autos não deveriam ter sido enviados para a entidade ad quem, uma vez que o recurso hierárquico, quanto ao mérito, ficou esvaziado de conteúdo atenta a referida reparação integral 3 As alegadas boas intenções da Senhora Conservadora não estão aqui em causa mas não merecem o nosso aplauso visto não serem compagináveis com o cumprimento da legalidade. Com efeito, por força do prescrito no n.º 4 do artigo 60.º do CRP, os documentos apresentados pelo correio são anotados no Diário imediatamente após a última apresentação por telecópia recebida entre as 0 horas e a hora de encerramento ao público do serviço de registo, observando-se o prescrito no artigo 63.º do mesmo Código, se necessário. Esta norma reveste natureza imperativa. Consequentemente, é inaceitável a prática que conduza à alteração das aludidas regras legais ainda que entre o requerente do registo e a conservatória se tivesse estabelecido algum acordo no sentido da retenção da apresentação para momento futuro, atento que tal matéria não se encontra na disponibilidade das partes. O pedido devia, em suma, ter sido anotado no Diário no dia 25 de Novembro de 2008, havendo agora que dar nota dessa ocorrência. Como é sabido, da apresentação do pedido no Diário decorrem importantíssimos efeitos que não podem ser desprotegidos cfr. o disposto nos artigos 6.º, 75.º e 77.º do CRP. 4

5 da decisão impugnada veja-se, em conformidade, o disposto no n.º 3 do artigo 142.º-A do CRP. No entanto, a recorrida quedou-se pela eliminação da anotação da caducidade não tendo em conta que da reparação da sua decisão 4 decorria inexoravelmente a obrigação de proceder à realização do registo de conversão da penhora e dos inerentes averbamentos de actualização das descrições prediais abrangidas por aquele, já que o seu poder decisório se encontrava esgotado. Assim, e porque o recorrente pede, inter alia, que se converta em definitivo o registo da inscrição de penhora, afigura-se-nos que o meio utilizado não pode deixar de se considerar idóneo. III Nestes termos, a posição deste Conselho vai expressa na seguinte Deliberação A reparação integral da decisão de qualificação que recusou um pedido de conversão do registo de penhora, por se ter considerado indevidamente que o mesmo já tinha caducado 5, demanda a efectivação do correspondente 4 Perante a impugnação da decisão de recusa da prática do acto de registo peticionado pelo recorrente, a Senhora Conservadora só pode proferir despacho de sustentação ou de reparação da decisão, em face do prescrito no n.º 1 do artigo 142.º-A do Código do Registo Predial. Da reparação integral da decisão proferida decorre inelutavelmente a realização do registo em causa, isto é, a conversão do registo de penhora e dos inerentes averbamentos de actualização das descrições no que respeita às áreas (cuja resistência ao seu ingresso nas tábuas tinha já abandonado ao que parece em face do despacho proferido em 12 de Dezembro de 2008). 5 A caducidade é de apreciação oficiosa (artigo 333.º do Código Civil) e dá-se com o decurso do prazo da duração do registo, devendo ser-lhe anotada logo que verificada, por força do prescrito no n.º 4 do artigo 11.º do CRP cfr. MOUTEIRA GUERREIRO, in Noções de Direito Registral, 1993, págs. 88 e segs. Ora, verificando-se que se procedeu à anotação da caducidade de registo que embora provisório se mantém ainda em vigor deve o conservador reparar o erro cometido eliminando de imediato a anotação que foi indevidamente efectuada. Para mais desenvolvimentos sobre o ponto, veja-se o parecer do Conselho Técnico proferido no proc.º R.P.28/99 DSJ-CT, in BRN n.º 8/99, II, págs.18 e segs., no qual se salientou designadamente que «a eliminação da anotação de caducidade de um registo que se mantém em vigor nos termos sobreditos, porque resultante exclusivamente de uma avaliação errada feita pelo conservador quanto ao decurso de um prazo que ainda não se 5

6 registo, uma vez que o poder decisório da recorrida ficou esgotado com a prolação daquela decisão 6 7. Em face do exposto, entendemos que o presente recurso hierárquico merece provimento Deliberação aprovada em sessão do Conselho Técnico de 21 de Outubro de Isabel Ferreira Quelhas Geraldes, relatora. Esta deliberação foi homologada pelo Exmo. Senhor Presidente em consumou, surge como um poder-dever (de exercício oficioso) de correcção de uma anotação indevida, limitando-se a reconhecer a existência de efeitos já produzidos nas tábuas que ainda não cessaram, independentemente e apesar do conteúdo daquela anotação». 6 No caso em apreço nos autos, o registo de penhora foi efectuado antes da entrada em vigor das alterações introduzidas no Código do Registo Predial pelo Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de Julho, tendo o pedido da sua conversão em definitivo decorrido já na vigência da LN. Ora, segundo os ensinamentos de BAPTISTA MACHADO, in Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 2008, págs. 202 e segs., poder-se-á dizer que hoje tende a predominar em toda a parte, salvo disposição expressa em contrário, o princípio da aplicação imediata da LN às situações em curso no momento do seu início de vigência (IV) ou entrada em vigor. Consequentemente, na formação da decisão acerca da elaboração do averbamento à descrição há-de ter-se em conta a lei vigente ao tempo da formulação do pedido de conversão do registo de penhora cfr. o disposto no artigo 28.º-C, n.º 2, alínea b), do CRP. 7 No que respeita à destrinça entre o mero pedido de averbamento de actualização da descrição predial ainda que respeitante à área e o processo de rectificação veja-se, designadamente, a deliberação do Conselho tomada no proc.º C.P.98/2008 SJC-CT, homologada em 30 de Junho, disponível na Intranet. 6