Manipulando a Polarização

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Transcrição:

Aula 3 Manipulando a Polarização 3.1 Resumo Nessa aula continuamos o nosso estudo da descrição clássica da polarização da luz, observando como esta pode ser manipulada por dispositivos como ltros e divisores de feixes polarizadores, placas de onda (ou rotacionadores de polarização), e outros. Bibliograa: O material da sec 3. é similar à sec 8.3 do livro do Moysés, vol 4, mas lá o autor já adota o ponto de vista quântico. A maior parte da seção 3.3 pode ser encontrada no livro do Moysés, vol 4, sec. 5.4. Outra referência com bastante material relacionado é French e Taylor, cap. 6. 3. Polarizadores É possível medir e manipular a polarização da luz usando polarizadores. Esses dispositivos transmitem apenas uma dada componente de polarização P f, `ltrando' a componente ortogonal. Nos referiremos a um ltro como esse como um polarizador P f. (Note que essas polarizações não são necessariamente lineares). Polarizadores podem ser construídos de diversas maneiras, por exemplo: P f explorando materiais especiais (`dicróicos'), que absorvem preferencialmente a luz com uma polarização, sendo transparentes para a polarização ortogonal. Um exemplo é o `polaróide', mencionado anteriormente, no qual moléculas longas e nas, dispostas lado a lado, absorvem a componente de polarização linear paralela a elas. através de efeitos de reexão em superfícies: p. ex., lembre-se que quando um feixe de luz incide sobre 10

3.. POLARIZADORES 11 uma interface plana com certo um ângulo de incidência especíco (chamado ângulo de Brewster), apenas a componente de polarização ortogonal ao plano de incidência é reetida (v. Moysés, seç 5.7, 5.8) explorando materiais `birrefringentes' (ex: cristais de calcita), os quais apresentam índices de refração diferentes para determinados componentes ortogonais da polarização (por exemplo, a componente horizontal pode ser refratada mais fortemente que a vertical). Nesse caso, o feixe incidente pode ser dividido em dois, de polarizações mutuamente ortogonais P f e, praticamente sem qualquer absorção. Chamamos um dispositivo como esse de um `divisor de feixe polarizador' (ou DFP). Este tipo de polarizador é vantajoso quando não queremos desperdiçar nenhuma parte do feixe. P f Por exemplo: se um feixe polarizado linearmente a um ângulo ±θ (eqs. (.1) e (.13)) incide sobre um polarizador horizontal (o qual transmite apenas a componente x), a componente y da polarização é absorvida. Eliminando então essa componente na eq. (.13), vemos que o campo transmitido é (usando notação de Dirac): E f (z, t) = (E cos θ) cos(kz ωt) x. (3.1) Observe que esse campo tem polarização horizontal ( P f = x ) e amplitude E f = E cos θ E. A intensidade é portanto reduzida por um fator cos θ. Se usarmos um DFP ao invés de um polarizador simples, a componente y não é absorvida, mas apenas separada e desviada para outra direção ẑ, gerando um segundo campo com a forma 1 E f (z, t) = (E sen θ) cos(kz ωt + φ y ) y. (3.) Observe que a soma das intensidades dos dois feixes é a mesma do feixe inicial, pois (E cos θ) +(E sen θ) = E. No caso geral, a ação de um polarizador P f pode ser descrita matematicamente pela seguinte regra: usando a eq. (.35), escreva o vetor de polarização P i do campo incidente na base ortonormal formada por { } P f,. Então, suprima a parte proporcional a (a qual é absorvida, ou desviada, dependendo P f do caso). Em outras palavras: P f P i = P f P i P f + P f P i P f Pf P i P f (3.3) Repare que, do ponto de vista geométrico, esta operação corresponde à projeção do vetor polarização inicial P i sobre o vetor polarização transmitida P f. Se você tiver diculdades para enxergar isso, compare 1 Note que, como este segundo feixe se propaga de forma independente do primeiro, convém escrevê-lo em termos de novas coordenadas (x, y, z ), as quais em geral não coincidem com (x, y, z).

1 AULA 3. MANIPULANDO A POLARIZAÇÃO com o que ocorre com vetores reais usuais: quando projetamos um dado vetor v sobre a direção de um vetor unitário ŵ, o vetor resultante é ( v ŵ) ŵ = ( v cos α) ŵ, onde α é o ângulo entre v e ŵ. O campo elétrico do feixe transmitido será então: [ E f (z, t) = ERe P f P i P f e i(kz ωt)] (3.4) onde P f P i é o produto escalar obtido da eq. (.31). Observe que, no caso de vetores complexos, em geral este produto escalar é um número complexo, que podemos representar na forma P f P i = P f P i e iγ com γ alguma fase. A eq. (3.4) pode ser reescrita então como [ ] E f (z, t) = E P f P i Re e i(kz ωt+γ) P f (3.5) Vemos assim que o feixe transmitido terá sempre a polarização P f, e sua amplitude passa a ser E f = E P f P i (3.6) Usando a desigualdade de Cauchy-Schwarz (v. exerc. 3, Lista 1) é fácil checar que, mesmo com vetores complexos, o produto escalar de dois vetores unitários, como P f e P i, sempre satisfaz P f P i 1. Assim, a amplitude transmitida é sempre menor que a amplitude inicial (como deveria). Equivalentemente, se usarmos a eq. (.10), vemos que a intensidade do feixe transmitido é reduzida por um fator I f /I i = P f P i 1 (3.7) Exemplo: Um feixe preparado com polarização linear P i = P (θ, 0) passa por um polarizador que transmite somente outra polarização linear P f = P (θ, 0). Nesse caso, o feixe transmitido tem amplitude E f = E P f P i = E cos θ cos θ + sen θ sen θ = E cos(θ θ ) (3.8) Nesse caso, portanto, a intensidade do campo transmitida é reduzida por um fator cos (θ θ ). Esse resultado é conhecido como a Lei de Malus, e é a formulação matematicamente precisa do efeito mencionado no início da aula. Exemplo: Um feixe preparado com polarização circular à direta P passa por um polarizador que transmite somente a polarização linear P f = P (θ, 0). Nesse caso, o feixe transmitido tem amplitude E f = E P f P i = E cos θ + i sen θ = E (3.9) Nesse caso, a intensidade transmitida é metade da inicial. (Note que o resultado é independente do ângulo θ - você consegue pensar em um bom motivo para isso?).

3.3. PLACAS DE ONDA 13 3.3 Placas de onda Além dos polarizadores existem outros dispositivos, conhecidos como placas de onda, que também são usados para manipular a polarização de feixes luminosos. Ao contrário dos polarizadores, porém, as placas de onda não reduzem a intensidade de um feixe incidente. Ao atravessá-las, o feixe ganha uma nova polarização, a qual depende da inicial. 3.3.1 Birrefringência Para entender como construir um dispositivo deste tipo, precisamos considerar o fenômeno conhecido como birrefringência. Como você deve recordar, o índice de refração n de um material é denido pela razão entre as velocidades da luz no vácuo e no material: onde k 0 = π λ 0 n = c v = ω vk 0, (3.10) é o número de onda da luz de freqüência angular ω no vácuo. Em geral, n depende de ω (essa dependência é responsável, por exemplo, pelo efeito de um prisma separando diferentes cores). Ocorre que existem materiais especiais, chamados birrefringentes, que possuem dois índices de refração n +, n diferentes, mesmo para feixes de luz monocromáticos (com uma só freqüência). Cada um desses índices está ligado a uma de duas polarizações ortogonais. Assim, num meio birrefringente existem duas velocidades diferentes v ± = c/n ± de propagação da luz de uma dada cor, cada uma associada a uma dessas polarizações selecionadas. Figure 3.1: Birrefringência de um cristal de calcita - os dois índices de refração do material levam a imagem do texto a se dividir em duas. Por exemplo: uma solução de água com açúcar dissolvido apresenta birrefringência circular, pois tem índices de refração distintos para as polarizações circulares P e P (v. exemplo no m da seç 3.3.). Do

14 AULA 3. MANIPULANDO A POLARIZAÇÃO mesmo modo, um cristal de carbonato de cálcio (CaCO 3, também chamado de calcita) apresenta birrefringência linear, pois tem índices de refração distintos para um certo par de polarizações lineares ortogonais (g. 3.1). As duas polarizações `selecionadas' não são alteradas ao passarem pelo meio birrefringente. Mas e se um feixe com uma outra polarização P qualquer incide sobre o meio, o que ocorre? Repare que as polarizações `selecionadas' formam uma base ortonormal, de modo que P pode ser decomposta em uma combinação delas (v. eq. (.35)). Cada uma dessas componentes se propaga com velocidades diferentes, o que faz surgir uma defasagem entre elas. Veremos a seguir que isso resulta em uma mudança no vetor de polarização. 3.3. Birrefringência circular: rotacionando polarizações O tipo mais simples de placa de onda é um rotacionador de polarização. Como o nome já diz, trata-se de um dispositivo capaz de rodar o ângulo de polarização de um feixe linearmente polarizado. Vamos mostrar agora que podemos conseguir este efeito utilizando um material com birrefringência circular. Para ver como isso ocorre, considere os campos elétricos relacionados a feixes circularmente polarizados se propagando dentro desse material. Cada um deles tem uma velocidade distinta v ± = c/n ±, portanto, pelas eqs. (.8), (3.10), podemos representá-los respectivamente por [ ] [ ] E (z, t) = E Re e i(k + z ωt) P ; E (z, t) = E Re e i(k z ωt) P (3.11) onde k ± = n ± k 0 são os números de onda de cada polarização. Suponha agora que temos um feixe com outra polarização, por exemplo H = 1 ( P + P ), incidindo sobre o meio birrefringente. Nesse caso, não podemos usar a eq. (.8) para calcular sua propagação - mas podemos escrever esta última como uma combinação das eqs. (3.11) acima. 3 Se tomamos a superfície do meio como o ponto z = 0, e a região birrefringente tiver comprimento L, então essa propagação pode ser descrita como: [ 1 E(z, t) 0 z L = E Re (e i(k + z ωt) P + e i(k z ωt) P ) ] (3.1) Podemos ver com mais clareza a defasagem entre as duas componentes reescrevendo esta equação em termos de uma média e diferença entre os dois índices de refração: n = n + + n ; = n + n (3.13) Supomos aqui incidência normal à superfície do meio birrefringente. Deste modo, não precisaremos nos preocupar com efeitos de refração como o demonstrado na g. 3.1. 3 Observação técnica: isso vale devido à linearidade das equações de Maxwell.

3.3. PLACAS DE ONDA 15 Assim: [ e i(nk 0z ωt) ( E(z, t) 0 z L = E Re e i k 0z P + e i k0z P )] (3.14) Comparando essa equação com a eq. (.8), vemos que ela representa um campo se propagando com velocidade v = ω/nk 0 = c/n, e com uma polarização que muda conforme o feixe vai se propagando : P (z) = 1 ( e i k 0z P + e i k0z P ) (3.15) Que polarização é essa? Mudando de volta para a base { H, V } usando a eq. (.15), temos P (z) = 1 [( e i k 0z + e i k0z) H i ( e i k0z e i k0z) V ] = cos( k 0 z) H + sen( k 0 z) V (3.16) Comparando com a eq. (.1), vemos que se trata de uma polarização linear, com ângulo de polarização θ = k 0 z. Em outras palavras, ao passar pelo meio circularmente birrefringente, a polarização inicialmente horizontal vai sendo rodada no sentido anti-horário (se > 0) ou horário (se < 0). O ângulo nal de rotação é proporcional à espessura do meio: θ tot = k 0 L. (3.17) Portanto, após emergir da região birrefringente, o feixe inicialmente horizontal passa a ter polarização P (L) H = cos θ tot H + sen θ tot V (3.18) Realizando um cálculo análogo para o caso em que o campo inicia verticalmente polarizado, obtemos: P (L) V = sen θ tot H + cos θ tot V = cos(π/ + θ tot ) H + sen(π/ + θ tot ) V (3.19) Onde usamos cos(θ) = sen(θ+π/). Note que também neste caso obtemos uma polarização linear rotacionada em relação à inicial, com ângulo total de rotação dado por θ tot. Juntando as eqs. (3.18) e (3.19), podemos deduzir o efeito do meio circularmente birrefringente sobre qualquer polarização incidente P = a H + b V : P a(cos θ tot H + sen θ tot V ) + b( sen θ tot H + cos θ tot ) = (a cos θ tot b sen θ tot ) H + (a sen θ tot + b cos θ tot V R(θ tot ) P. (3.0) onde criamos o nome R(θ tot ) para nos referirmos a essa transformação linear - esta última equação deve ser lida a transformação R(θ tot ) aplicada sobre o vetor P.

16 AULA 3. MANIPULANDO A POLARIZAÇÃO Essa equação pode ainda ser reescrita de forma sucinta se representarmos P como um vetor coluna a formado pelas suas componentes na base { H, V }. Nesse caso, a transformação na eq. (3.0) ca: b a cos θ tot b sen θ tot sen θ tot a (3.1) cos θ tot b Vemos assim que a transformação R(θ tot ) pode ser representada por uma matriz de rotação. Assim, o efeito do meio birrefringente é, de fato, rotacionar todas as polarizações lineares (vetores com entradas reais) de um ângulo θ tot. Exemplo: Você talvez se lembre das aulas de química que as moléculas de glicose (a substância que compõe o açúcar) têm dois chamados isômeros, ou seja, duas formas de se enrolar (a primeira correspondendo a uma espiral rodando para a esquerda, e a segunda para a direita). Por razões que não discutiremos aqui, ocorre que essas duas formas interagem de forma distinta com luz circularmente polarizada, o que leva a um efeito birrefringente. Uma dessas duas formas da glicose tem < 0 (roda a polarização no sentido horário, ou para a direita), e por isso é chamada de dextrose (vem da mesma raiz da palavra destro). A outra roda para a esquerda e é chamada levulose. Ocorre que, na natureza, plantas como a cana-deaçúcar produzem apenas dextrose (ninguém sabe ao certo por quê!). Assim, uma solução de açúcar natural dissolvido em água é birrefringente, com um valor de < 0 que é proporcional à concentração do açúcar. Essa propriedade é utilizada na indústria de açúcar para medir a concentração de xaropes, etc. 3.3.3 Birrefringência linear Outro tipo comum de placa de onda utiliza materiais com birrefringência linear. Neste caso as polarizações `selecionadas' pelo material, que se propagam com velocidades v ± distintas, são ambas lineares (e ortogonais). Costuma-se chamar essas duas direções de polarização de eixo rápido e eixo lento. Vamos assumir no que se segue que os eixos rápido e lento estão orientados a 45 e a 45, correspondendo às polarizações P ±45 = 1 ( H ± V ) (3.) (v. seç...1, exemplo 1). Nesse caso, fazendo um desenvolvimento análogo ao das eqs. (3.11) - (3.19), podese mostrar (v. Lista I, exerc. 6) que as polarizações horizontal e vertical sofrem a seguinte transformação linear após atravessar o meio: H cos θ tot H + i sen θ tot V V i sen θ tot H + cos θ tot V (3.3)

3.3. PLACAS DE ONDA 17 onde θ tot é denido como na eq. (3.17). Observe que, ao contrário do que acontecia nas eqs. (3.18) e (3.19), agora H e V são transformadas em polarizações que em geral são elípticas (v. lista I, ex. ). Uma exceção é o caso θ tot = π/4, em cujo caso H P ; V i P. (3.4) Em outras palavras, neste caso a placa de onda transforma as polarizações lineares H e V em polarizações circulares 4. Observe que, para que isso ocorra, é preciso, pela eq. (3.17), que (n + n )L = π/(k 0 ) = λ 0 /4, onde λ 0 é o comprimento deste feixe no vácuo. Por causa disto, uma placa de onda satisfazendo essa condição costuma ser chamada de uma placa de quarto de onda. Outra exceção ocorre quando θ tot = π/. Neste caso, H i V ; V i H, (3.5) ou seja, as polarizações horizontal e vertical são trocadas 4. Neste caso, é preciso que (n + n )L = λ 0 /, de modo que uma placa de onda deste tipo é conhecida como uma placa de meia onda. 4 O fator i representa apenas um acréscimo de π/ na fase ao campo elétrico, a qual não altera o vetor de polarização.