Uma radiografia da relação empresa + família + propriedade



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Transcrição:

Uma radiografia da relação empresa + família + propriedade Sinopse São sempre intrincados os laços que unem família e negócios. Nesta entrevista exclusiva, entretanto, o guru da empresa familiar John Davis mostra como é possível traduzi-los em um modelo objetivo, do qual é um dos criadores O que o levou a desenvolver o modelo de três círculos? O modelo surgiu das pesquisas que realizei com Renato Tagiuri, meu colega na Harvard University. Concluímos que, para entender a dinâmica das empresas familiares, seria preciso considerá-las como três subsistemas, independentes, mas sobrepostos: negócio (a empresa), família e estrutura da propriedade. A interseção dos círculos que representam esses subsistemas dá origem a sete posições com perspectivas diferentes (veja quadro na próxima página). A posição 1, por exemplo, corresponde a membros da família que não têm participação na empresa nem trabalham nela. Na posição 7, por sua vez, estão as pessoas que, além de pertencer à família, são acionistas e trabalham na empresa. Quais são as principais aplicações desse modelo? Esse modelo serve para descobrir, entre outras coisas, a fonte dos conflitos interpessoais, as prioridades e as limitações das empresas familiares. Apontar os diferentes subsistemas permite dividir as interações complexas e, além disso, facilita a compreensão dos problemas e suas causas. As lutas familiares pela política de dividendos ou o planejamento da sucessão, por exemplo, podem ser vistos de uma nova perspectiva, se levarmos em consideração o lugar que cada mem- Criado na década de 1970, o modelo de três círculos negócio, família e estrutura da propriedade permite identificar a fonte dos conflitos interpessoais, distinguir as prioridades e limitações das empresas familiares e compreender o comportamento de seus integrantes. Como esse modelo gera apenas uma visão instantânea da empresa, Davis, um de seus inventores, acrescentou a ele a variável tempo, criando o modelo de desenvolvimento (abordado também no artigo da página 104). Assim, tornouse possível estudar a evolução do negócio nas etapas de lançamento, expansão e maturidade, bem como os ciclos familiares e as mudanças de propriedade. A seguir, o especialista analisa os principais desafios de cada uma dessas etapas. Também destaca a importância de criar um conselho familiar atuante que, ao representar os interesses do conjunto, ajuda a aparar as arestas, melhora o processo de tomada de decisões e a gestão. A entrevista é de Viviana Alonso. bro ocupa no modelo de três círculos. É possível que uma pessoa que faz parte da família, que é acionista, mas não trabalha na empresa, pretenda que os dividendos sejam maiores. Ela imagina que sua aspiração é legítima por pertencer à família e ser proprietária da empresa. Em contrapartida, um familiar que ocupa um cargo de direção na empresa, mas não é acionista, tende a querer reinvestir os dividendos para expandir o negócio, porque assim terá melhores oportunidades de progresso profissional. Mais tarde, o sr. decidiu acrescentar a variável tempo ao esquema dos três círculos, que trouxe como resultado o chamado modelo de desenvolvimento, representando o negócio, a família e a propriedade em três eixos. Qual foi a razão? Os círculos que representam o negócio, a família e a estrutura da propriedade fornecem uma imagem instantâ-

Representação visual O modelo de três círculos 1 Família 4 nea da empresa em determinado momento. No entanto, alguns dos dilemas mais importantes que as empresas familiares enfrentam estão relacionados à passagem do tempo. Os pais envelhecem, há casamentos, nascem netos, e essas pessoas se juntam ao negócio e a empresa muda. Em outras palavras, ao longo de gerações vão ocorrendo mudanças lentas, mas constantes, na natureza da família, e o mesmo ocorre com a empresa. No princípio, é uma organização simples e pequena, porém depois se torna mais complexa. E, em alguns casos, declina ou desaparece. A estrutura da propriedade também se modifica. Geralmente, no início, as empresas têm um único fundador ou proprietário; mais tarde, a propriedade se transfere a seus filhos; e, três ou quatro gerações adiante, acaba nas mãos de primos. E é possível identificar quais são as principais mudanças? As empresas atravessam etapas previsíveis: desde a de lançamento do negócio até a de expansão e maturidade, que às vezes conduz ao declínio e à morte. Essas etapas correspondem aos ciclos familiares. No início, trata-se de um casal jovem. Quando ele chega à idade madura, entram os filhos no negócio ou, pelo menos, é essa a aspiração dos pais. Depois, é chegado o momento de a geração anterior sair de cena, com a prévia transferência de comando, e assim sucessivamente. Por sua vez, a estrutura da propriedade passa pelas fases de proprietário controlador, sociedade de irmãos e consórcio de primos. A grande vantagem de acrescentar a dimensão do tempo é que assim se pode estudar a evolução do negócio, da família e da estrutura da propriedade e, ao fazê-lo, é possível antecipar grande parte dos problemas que o negócio familiar enfrentará. E preparar-se para resolvê-los, é claro. Como se relaciona o desenvolvimento do negócio com a evolução da família e da propriedade? O eixo do negócio está relacionado com o tipo de líder da organização. As qualidades do líder de uma empresa que está na fase de lançamento não são necessariamente os atributos desejáveis do presidente de uma empresa em fase de expansão ou maturidade. É importante enfatizar que, algumas vezes, as empresas passam por várias etapas ao mesmo tempo. Uma empresa de longa trajetória e com múltiplas linhas de produto, que abre uma filial em outro país, por exemplo, está ao mesmo tempo na fase de expansão e na de lançamento. A dimensão do negócio permite dividir a organização em unidades e conciliar os pontos de vista dos membros da família encarregados de cada uma delas ou seja, a visão de um sobrinho que lidera a abertura da nova filial no exterior e a de uma filha que está subindo na hierarquia da organização. A estrutura da propriedade, por sua vez, está relacionada com o tipo de sucessão. O chefe da família e único acionista de uma empresa que está na etapa de proprietário controlador terá poder absoluto para nomear seu sucessor. Caso, porém, a propriedade esteja dividida em 2 Propriedade 7 6 5 3 Empresa partes iguais entre o presidente da empresa e sua irmã, e ela tiver uma função ativa no negócio, ele terá necessariamente de levar em conta seus interesses ao escolher o próximo líder. A dimensão familiar interage com a dimensão do negócio e com a da propriedade. Por exemplo: se o proprietário de uma empresa tem uma relação conflituosa e sérios problemas de comunicação com seu filho mais velho, dificilmente lhe transferirá a posse da empresa ou a responsabilidade de conduzi-la. Se nos concentrarmos no eixo evolutivo do negócio, quais são os principais desafios de cada etapa? Na etapa de lançamento, além da sobrevivência, o fundamental é conciliar o sonho do fundador com a análise racional. Isso porque, nessa fase inicial, as idéias de negócios se relacionam mais com os sonhos pessoais do que com as projeções objetivas.

Saiba mais Embora muitas dessas idéias não sejam viáveis, o fundador as leva em consideração e elas parecem atraentes, mesmo que ainda não tenham sido analisadas racionalmente. O fundador precisa, portanto, desenvolver a capacidade de fazer uma análise objetiva e, ao mesmo tempo, manter viva a paixão por seu sonho. Por outro lado, como na primeira etapa a empresa concentra toda a energia e o capital no projeto de ingressar no mercado e obter lucros, quase sempre com apenas um produto ou serviço, o desafio da sobrevivência surge quando esse produto ou serviço não dá os resultados esperados no curto prazo e a principal fonte de financiamento geralmente os recursos pessoais do fundador se esgota. As empresas que conseguem superar a incerteza dos anos iniciais ingressam na segunda etapa, que se caracteriza pela expansão de algumas áreas, pelo aumento do número de funcionários e por estruturas e processos organizacionais mais formais. É quando se impõe uma mudança nas funções do proprietário-gerente. No entanto, isso é difícil para ele, que está acostumado a controlar pessoalmente as operações diárias, mesmo sabendo que a expansão exige que contrate profissionais nem sempre pertencentes à família para postos gerenciais e que delegue autoridade a eles. Devido à ambivalência que mostra, outorgando poder aos novos gerentes e, mais tarde, reassumindo o controle, muitas vezes ele gera confusão ou conflitos. Quando ocorre dessa forma, o processo de profissionalização se mostra instável. E depois dessa etapa? Suponhamos que a etapa de crescimento tenha sido percorrida com êxito, mas que, em determinado momento, as margens de lucro caiam, a concorrência se multiplique e as vendas parem ou diminuam. Nesse caso, fica claro que a empresa chegou à maturidade, etapa que traz consigo o desafio da adaptação e da renovação, porque de outro modo corre o risco de declinar e desaparecer. Em suma, o que faz falta é outra abordagem estratégica e, na maioria dos casos, Davis estará no Brasil em 2004 John Davis é presidente e fundador da Owner Managed Business Institute (OMBI), firma de consultoria especializada em empresas familiares com sede na Califórnia, Estados Unidos. Com doutorado em administração de empresas pela Harvard Business School, Davis dirige o programa Families in Business: From Generation to Generation e também integrou o corpo docente da escola de administração da University of Southern California. Davis já colaborou com a criação dos cursos especializados nessa temática no IMD (Suíça) e na Universidad Adolfo Ibáñez (Chile), entre outras instituições. Além disso, prestou serviços de consultoria a empresas familiares de vários países, inclusive o Brasil, sobre tópicos vinculados à profissionalização da empresa familiar e ao planejamento estratégico da sucessão, entre outros. O especialista é co-autor do livro De Geração para Geração Ciclos de Vida das Empresas Familiares (ed. Negócio) e atualmente escreve outro livro sobre as melhores práticas de empresas familiares consideradas extremamente bem-sucedidas. Davis virá a São Paulo a convite da HSM do Brasil em maio de 2004 para ministrar um Special Management Program com o tema Managing the Family Business (Como Gerenciar o Negócio Familiar). é necessário investir no desenvolvimento de novos produtos, equipamentos e tecnologia. Os proprietários de uma empresa madura, entretanto, tendem a considerá-la uma fonte automática de receita e se mostram resistentes a reinvestir capital. De fato, algumas empresas cujos produtos serão viáveis no futuro cometem o erro de postergar a modernização indefinidamente. O desafio torna-se ainda maior se a etapa de maturidade na dimensão do negócio coincidir com a transferência da liderança na esfera familiar. Do ponto de vista psicológico, aceitar uma política de grandes investimentos não é tarefa fácil para a geração dos fundadores, sobretudo se isso implicar elevado nível de endividamento durante os últimos anos de sua participação ativa na direção da empresa. Uma das principais dificuldades que as empresas familiares enfrentam é o fato de os conflitos pessoais entre seus integrantes se transferirem facilmente para o âmbito do negócio. Como lidar com essa situação tão comum? É verdade que os conflitos acabam se tornando inevitáveis, devido à superposição família empresa, mas eles podem ser reduzidos. Por exemplo: dois irmãos que trabalham em uma empresa que assessoramos tinham personalidades e capacidades muito diferentes. Essa circunstância pode ser uma vantagem quando as diferenças se complementam, mas, na empresa em questão, a rivalidade repercutia na tomada de

Os proprietários de uma empresa madura tendem a considerá-la fonte automática de receita e resistem a reinvestir capital decisões e algumas medidas eram postergadas indefinidamente. Como resolver um dilema desse tipo, se os dois irmãos forem proprietários com igual participação e ambos quiserem trabalhar na empresa? Quando o conflito não for profundo e eles estiverem dispostos a encontrar uma solução, eu recomendaria que contratassem um consultor profissional e que também, na medida do possível, deixassem as decisões fundamentais nas mãos da diretoria, de assessores ou do conselho familiar. Assim, a gestão da empresa não sofreria interrupções. Que função exerce o conselho familiar? O conselho familiar tem sua origem na tradição de empresas européias de várias gerações. Para manter a harmonia familiar e evitar que os problemas domésticos prejudicassem a empresa, muitas delas criaram um organismo no qual determinados membros da família representam os interesses do conjunto. Eles pedem informações sobre a evolução da empresa, expressam as necessidades do grupo familiar e buscam formas de resolver os problemas internos para que não sejam transferidos ao negócio. O conselho também se encarrega de criar políticas para preservar os interesses da família no longo prazo e as submete à apreciação da diretoria. Existe uma diretriz clara sobre quem deve integrar esse conselho? Não. A composição varia de acordo com as diferentes etapas em que se encontra a empresa. Nas empresas de primeira e segunda geração, por exemplo, os integrantes costumam ser, em geral, o proprietário-gerente, seu cônjuge e filhos mais velhos, com seus respectivos cônjuges. Algumas famílias optam pela inclusão de contraparentes como membros permanentes; outras preferem que intervenham apenas em determinados assuntos. A vantagem da participação dos contraparentes é que diminuem as probabilidades do aparecimento de triângulos familiares nocivos; a desvantagem é que nos grupos mais numerosos o tamanho do conselho aumenta consideravelmente e sua eficácia diminui. Em seu livro De Geração para Geração Ciclos de Vida das Empresas Familiares, em co-autoria com Kelin Gersick e Ivan Lansberg, entre outros, o sr. menciona algumas diretrizes que favorecem a criação de conselhos familiares bem-sucedidos. Poderia descrevê-las brevemente? Os conselhos que conseguem os melhores resultados estabelecem e executam um cronograma de reuniões regulares, cuja freqüência é de duas a quatro vezes ao ano. O mais recomendável é realizar as reuniões fora da empresa e de casa, para reduzir ao mínimo as interrupções. Às vezes convém analisar alguns temas em subgrupos, antes de discuti-los em conjunto. Por exemplo: os membros da primeira geração de um lado e os da segunda de outro. Além disso, os conselhos eficazes caracterizam-se por responsabilidades de direção claramente delineadas; em geral, um dos líderes da família preside o conselho. Também se distinguem por não vacilar em recorrer a assessores externos quando considerarem que é necessário, especialmente nas primeiras etapas de formação do conselho. Um último ponto é que organizam suas atividades em um plano familiar. No que consiste um plano familiar? A maioria deles possui quatro partes: a história da família, uma visão de futuro, a declaração da missão e um plano de ação. Escrever uma história da família, a partir dos registros e passagens da vida de seus integrantes, é um dos melhores projetos iniciais do conselho familiar porque destaca a identidade da família e lembra a todos o legado que carregam. Também é o melhor instrumento para integrar e educar os novos membros e os mais jovens. A visão de futuro é a parte formal do plano: projeta a imagem da empresa para os próximos cinco ou dez anos. Em geral, os parentes discutem o futuro que desejam para sua famí-

lia e para a empresa. Esse último tópico se relaciona à parte seguinte, a declaração da missão, que inclui os valores éticos da família e sua opinião sobre o papel da empresa na comunidade, entre outros pontos. Por fim, o plano de ação detalha medidas concretas vinculadas às atividades dos membros da família. Por exemplo: os programas de capacitação em liderança. Além disso, cria processos ou fixa pautas para resolver ou minimizar os eventuais conflitos e melhorar a comunicação entre os membros da família.