TV a cabo: a dispersão da audiência



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Transcrição:

TV a cabo: a dispersão da audiência Valério Brittos * A família toda reunida em torno da televisão, discutindo as tramas de alguma das várias telenovelas, dando gargalhadas de programas humorísticos ou ainda acompanhando as brincadeiras dos conhecidos apresentadores dos domingos brasileiros. Estas cenas, típicas do universo familiar nacional, começam a sofrer modificações, diante das mudanças no modo de ver TV que estão se processando entre os assinantes de uma tecnologia ainda nova no País, o sistema de televisão a cabo. É sobre esse universo que este trabalho trata, tendo como principal objetivo mostrar que, ao contrário do que se tem como dado, na televisão convencional, onde a recepção costuma ser coletiva, possibilitando a reunião da família, com relação à TV a cabo o fenômeno não se repete. Na televisão a cabo, a recepção, na maior parte do tempo, tende a ser individual ou, no máximo, só do marido com a mulher, havendo dispersão da audiência, diante da multiplicidade de canais ofertados. Ao refletir tais questões empíricas, este estudo de recepção de TV a cabo tem como referencial teórico e eixo condutor a nova visão sobre comunicação que está sendo efetuada na América Latina, que prioriza as relações entre

2 comunicação e cultura. Por esta via, desloca-se o foco dos meios de comunicação para as mediações próprias da recepção televisiva, enfatizando-se a posição da cultura e do cotidiano e rompendo-se com as análises apocalípticas, que viam o receptor passivo. Neste ensaio, segue-se as reflexões de Jesús Martín-Barbero e Néstor García Canclini. Martín-Barbero, ao tratar das mediações que envolvem a recepção, afasta da mídia a responsabilidade de formadora única dos modos de ser e agir humanos. Canclini põe as produções de comunicação em igualdade com outras expressões culturais, destacando que a cultura não se encontra em sua forma pura, mas híbrida, resultado dos cruzamentos de tempos e modos de viver do Terceiro Mundo. Está claro, no estudo da recepção, que o sentido e, portanto, a comunicação, são negociados. Não sendo o produtor onipotente, nem o receptor um mero depositário de mensagens, a comunicação implica em transação entre as partes. Há uma valorização da experiência e da competência comunicativa dos receptores. 1 O enfraquecimento do produtor coincide com o fortalecimento do receptor, embora este não possa ser colocado em pé de igualdade com aquele. O receptor contará sempre com o processo de mediação ao assistir * Professor do Centro de Ciências da Comunicação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS) e mestrando em Comunicação Social (PUCRS).

3 televisão, não existindo um sem o outro. Por isso, a recepção não é um fenômeno tão simples e direto, de causa e efeito, como a maioria dos estudos sempre tentou mostrar. É o espaço dos conflitos que articulam a cultura, das mestiçagens que a tecem e das anacronias que a sustentam, e, por último, do modo em que trabalha a hegemonia e as resistências que mobiliza. 2 A partir desse referencial teórico construiu-se um formulário, 3 aplicado a 17 pessoas, o total de membros de seis famílias integrantes da amostra, escolhidas a partir do perfil do assinante da operadora de TV a cabo Net, que foi somado às observações colhidas pelo próprio pesquisador, durante suas idas às residências. Conforme o perfil do assinante da Net, o titular da assinatura deveria ser do sexo masculino, ter mais de 30 anos, possuir filhos, ter curso superior e ser casado. 4 A dissolução do modelo massivo Na maioria das seis famílias pesquisadas a recepção televisiva não ocorre com todos os familiares reunidos, na maior parte do tempo. Contribui para isso, decisamente, a pluralidade de canais oferecidos pelo sistema de TV a cabo, que 1 MARTÍN-BARBERO, Jesús. Comunicación y cultura. Unas relaciones complejas. TELOS, Madri, n. 19, p. 21-26, 1989. p.25. 2 MARTÍN-BARBERO, Jesus. De los medios a las mediaciones. Comunicación, cultura y hegemonia. México: Gustavo Gilli, l987. p. 240. 3 Este trabalho propõe-se a discutir preliminarmente alguns dados levantados na pesquisa desenvolvida por este pesquisador em sua dissertação de Mestrado, que inclui, além do formulário e da observação, uma entrevista como estratégia de captação do real. Neste estudo será trabalhado só uma pequena parte do formulário, a que aborda o modo de ver televisão. 4 Chegou-se às famílias por conhecimento do pesquisador e indicação das primeiras famílias pesquisadas, estabelecendo-se a aplicação de formulários a todos os familiares que morassem na casa e tivessem idade a partir de 15 anos.

4 permite uma maior segmentação do consumo, ocasionando dispersão da assistência. Acrescenta-se que, das seis famílias, quatro possuem mais de um ponto de recepção de televisão a cabo na moradia 5 e todas possuem vários aparelhos de TV. No cotidiano, o encontro de todos em torno da televisão dá-se só durante o almoço, mas unicamente em três famílias. Nas demais, a reunião para assistir TV é ocasional, tirando-se a família 5. 6 Durante a maioria do tempo, entre a amostra, a regra é a recepção do casal acontecer em conjunto 7 e a dos filhos isolada, com duas exceções. Uma é a família um, cujas opções do marido e da mulher não costumam coincidir, fazendo com que nem o casal assista TV reunido. A segunda é a família 6, onde em muitos horários o casal assiste TV com os filhos, que são crianças. A indisponibilidade de horário também prejudica a reunião de todos, neste sentido sendo contabilizados fatos como estudos dos filhos à noite (três famílias) e a existência de filhos pequenos que dormem cedo (uma família). Tirando as exceções, em todas as demais famílias o casal respondeu que costuma assistir TV em conjunto, enquanto os filhos disseram que sua recepção televisiva é isolada. Assim, além da família não ter o hábito de ver televisão 5 Somente duas famílias possuem um único ponto de TV a cabo na residência. São as famílias n. 4 e 5, sendo que esta última não possui mais filhos morando junto, restando, na casa, somente o casal. 6 A família 5 é a única que não tem mais filhos morando na casa, onde, portanto, os únicos membros são marido e mulher, que vêem televisão juntos em outros horários. 7 Embora também assistam em separado.

5 reunida, também não há o costume de assistir as atrações de TV juntamente com amigos. Esses dados revelam uma situação que merece reflexão. Se a TV é uma das principais fontes de lazer diária e de final de semana da esmagadora maioria dos pesquisados, conforme outra revelação proporcionada pelo formulário, e a recepção da programação de televisão a cabo tende a ocorrer de forma individualizada ou com apenas o casal reunido, pode-se imaginar que as famílias permanecem menos tempo juntas e que o já consolidado hábito de receber amigos com a TV ligada está refluindo, com uma possível queda de visitas nas residências da amostra. A realidade exposta comprova que as novas tecnologias desse período de globalização da economia e mundialização da cultura, como a TV a cabo, estão provocando a dissolução do modelo massivo de comunicação, sustentado na produção e distribuição de bens simbólicos para consumo do conjunto da sociedade. Se os integrantes da amostra não assistem mais televisão em grupo, é porque cada um procura e obtém junto ao sistema de cabo produtos culturais distintos, contrariamente ao modelo massivo próprio da TV convencional. Desta forma, há uma dissolução do horizonte cultural comum à toda sociedade, de três formas: a fragmentação dos públicos, pela multiplicação dos canais; a segmentação dos consumos mediante uma subscrição particular ao

6 cabo (só possível a quem tem capacidade econômica); e a individualização feita possível pela fibra ótica (mediante a qual cada usuário conectado a banco de dados pode solicitar a informação que lhe importa). 8 Com o cabo, os públicos são fragmentados a partir da segmentação do consumo viabilizada pela variedade dos canais. Essa mudança no modo de ver televisão, de coletiva a individual, traz conseqüências, inclusive, na sociabilidade. A chegada da televisão às sociedades (no Brasil, em 1950) já provocou profundas mudanças, terminando com hábitos tradicionais, como reuniões familiares diárias em torno do relato do dia, conselhos, aparelho de rádio e livros; visitas entre familiares e amigos com ingênuas sessões de jogos; e conversas sentadas em cadeiras em frente às casas. Mas, mesmo reduzidos drasticamente, os encontros seguiram existindo, só que ao redor da televisão. Agora, com a segmentação propiciada pela multiplicação de canais viabilizada pelas novas tecnologias de comunicação (NTC), como a que combina satélites com redes de cabos, cresce a indivualização do consumo televisivo, reduzindo a possibilidade de convivência social. Esse novo modo de ver TV integra o contexto de dissolução do espaço público e de privatização da vida. Sua compreensão deve ser vinculada ao sentimento de insegurança 8 MARTÍN-BARBERO, Jesús. Nuevas tecnologias y esquizofrenia cultural. In: MARTÍN-BARBERO, Jesús. Procesos de comunicación y matrices de cultura. Itinerario para entrar y salir de la razón dualista. México :

7 urbana, ao isolamento das modernas soluções de moradia e à reorganização dos espaços e tempos de trabalhar e habitar. 9 Contudo, essa dissolução do modelo massivo de comunicação não é uma regra geral, que atinge a toda a sociedade. Por mais que cresça o índice de ligação por cabo das residências também nos países subdesenvolvidos, nessas localidades tecnologias como a televisão a cabo só atingem uma parcela reduzida da sociedade, diante dos contrastes sociais geradores de extremos dentro de um mesmo território, que fazem com que convivam abundância e miséria. O resultado é que o consumo de uma programação mais seletiva, com informações diferenciadas, segue restrito. O conhecimento dos dados e dos instrumentos que habilitam para atuar de forma autônoma ou criativa se reduz a quem pode subscrever redes exclusivas de televisão (antena parabólica, cabo, cadeias repetidoras de canais metropolitanos) e bancos de dados. 10 Para os demais, segue o modelo massivo de programação fornecida pelas principais e grandes redes de televisão nacionais. Assim, as NTC em nada revolucionam; ao contrário, aprofundam e sedimentam as diferenças sociais, com base nos que têm ou não a informação. Gustavo Gilli, 1987. p. 171-190. p. 190. 9 MARTÍN-BARBERO, Jesús. Comunicación y cultura. Unas relaciones complejas. Telos, Madri, n. 19, 1989, p. 21-26. p. 25-26. 10 CANCLINI, Néstor García. El consumo sirve para pensar. Dia-logos de la comunicacion, Lima, n. 30, p. 6-9, jun. 1991. p. 9.

8 Canclini também vislubra o problema. Segundo ele, o que se produz é uma segmentação desigual dos consumos, com os sistemas de informação importantes para a tomada de decisões restritos à elite social. 11 A segmentação é desigual porque os segmentos não são estabelecidos só por preferências de consumo. O grande funil determinador da segmentação é a questão econômica, pois a maioria não têm recursos para acessar às novas tecnologias de comunicação. Para esses, a segmentação inexiste, tendo que consumir os mesmos programas massivos. Conclusões A dificuldade de concluir sempre é grande, principalmente quando o objeto de estudo é novo, como o é a televisão a cabo no Brasil. Contudo, mesmo vendo-se esta pesquisa mais como uma geradora de questões a serem investigadas, algumas afirmações pode-se fazer. Assim, evidencia-se que efetivamente está transcorrendo um processo de mudança no modo de ver televisão entre aqueles que assinam TV a cabo, que está passando de coletivo, com a família reunida, a individual. 12 A individualização da recepção de televisão é porporcionada pela variedade de canais oferecidos pelo sistema de TV a cabo, responsável pela 11 CANCLINI, Néstor García. Culturas híbridas. Estrategias para entrar y salir de la modernidad. México : Grijalbo, 1990. p. 347. 12 Trata-se de um processo, sinalizando-se uma tendência que comporta momentos em que algumas famílias, mesmo assinando o sistema de TV a cabo, seguem assistindo também televisão em conjunto, como no horário do almoço. Comporta ainda a recepção em dupla da maioria dos casais, em alguns momentos.

9 segmentação do consumo e, desta forma, pela dissolução do modelo massivo de comunicação. Isso provoca ainda conseqüências na sociabilidade, com redução das possibilidades de convivência social, já que até então era comum assistir TV com os familiares e, apesar de com menos intensidade, até com amigos. Só que a dissolução do massivo não é uniforme, já que este modelo prevalece para a maioria da população do Terceiro Mundo. O que há então, é mais uma demonstração do hibridismo latino-americano, com a segmentação vigindo para uma elite que tem capacidade econômica para assinar uma tecnologia como a TV a cabo e o modelo massivo vigorando para a maioria. Esta situação de segmentação desigual tende a provocar o fim do horizonte cultural comum a toda a sociedade. Mas a mudança no modo de ver televisão não pode ser interpretada isoladamente. Seguindo o referencial teórico aqui eleito, que vê o receptor ativo e desloca o foco de análise para as mediações, a tendência à individualização na recepção televisiva, mesmo que propiciado pela multiplicidade de canais do cabo, não é efeito direto da imposição das indústrias culturais, inscrevendo-se num quadro geral de sobreposição do privado sobre o público. Bibliografia CANCLINI, Néstor García. Consumidores e cidadãos; conflitos multiculturais de globalização. Rio de Janeiro : Editora UFRJ, 1995.

10. Culturas híbridas. Estrategias para entrar y salir de la modernidad. México : Grijalbo, 1990.. El consumo sirve para pensar. Dia-logos de la comunicacion, Lima, n. 30, p. 6-9, jun. 1991. MARTÍN-BARBERO, Jesús. Comunicación y cultura. Unas relaciones complejas. Telos, Madri, n. 19, 1989, p. 21-26.. De los medios a las mediaciones. Comunicación, cultura y hegemonia. México: Gustavo Gilli, l987.. Nuevas tecnologias y esquizofrenia cultural. In: MARTÍN- BARBERO, Jesús. Procesos de comunicación y matrices de cultura.. Itinerario para entrar y salir de la razón dualista. México : Gustavo Gilli, 1987. p. 171-190. ORTIZ, Renato. A moderna tradição brasileira. Cultura brasileira e indústria cultural. 3. ed. São Paulo, Brasiliense, 1991.. Mundialização e cultura. São Paulo : Brasiliense, 1994.