DETERMINAÇÃO DE AFLATOXINAS EM AMOSTRAS DE LEITE E AMENDOIM CONSUMIDAS NA CIDADE DE BELÉM-PARÁ 1. José Luiz Fernandes Vieira 2 & Nádia Maria Martins 3 Nos últimos anos a produção agrícola tem recebido grande incentivo das autoridades governamentais do estado do Pará, com nítidas melhorias das condições sócio-econômicas da população. Entretanto, a exportação de produtos agropecuários requer um rigoroso controle de qualidade na produção, armazenamento, transporte e distribuição dos mesmos, a fim de serem observados os padrões sanitários em vigor, objetivando a preservação da saúde humana e animal. Dentre os diversos fatores que comprometem a qualidade de um alimento merece destaque à contaminação de grãos por micotoxinas, especialmente as aflatoxinas, que são metabólitos tóxicos de fungos como Aspergillus flavus e Aspergillus parasiticus, que constituem um sério problema de saúde pública em diversas regiões do mundo. As aflatoxinas estão associadas à ocorrência de carcinoma hepatocelular, e são consideradas importantes carcinógenas em países tropicais, pois estudos epidemiológicos têm creditado a estas toxinas efeitos tóxicos nos seres humanos. As aflatoxinas também são teratogênicas e mutagênicas. Em 1963, pesquisadores separaram, por cromatografia em papel, aflatoxinas B e G, sendo assim denominadas devido à fluorescência azul e verde que apresentavam, respectivamente. Em seguida um grupo de investigadores da Inglaterra isolaram por Cromatografia em Camada Delgada 4 micotoxinas, respectivamente AFB1, AFB2, AFG1 e AFG2. Considerando que o estado do Pará apresenta condições favoráveis ao desenvolvimento de fungos produtores de aflatoxinas, como temperatura e umidade elevadas, os autores avaliaram a presença de aflatoxinas em amostras de leite in natura e em grãos de amendoim comercializados na cidade de Belém, Pará. Página 1 de 11
1- Projeto de Pesquisa do Departamento de Deontologia e Medicina Legal, com apoio financeiro do FUNTEC/SECTAM/GOVERNO DO PARÁ 2- Professor de Toxicologia do Curso de Farmácia da UFPA. 3- Bolsista do Pibic/Cnpq 4- E-mail para correspondência: jvieira@ufpa.br MATERIAL E MÉTODOS Coleta das amostras Foram analisadas 20 amostras (1L cada) das diversas marcas de leite produzidas no Estado do Pará. De cada litro de leite foi retirada uma amostra significativa de 50mL para a determinação das aflatoxinas. As 15 amostras de amendoins torrados destinados ao consumo humano foram obtidas em diversos pontos da cidade de Belém, comercializadas informalmente em estabelecimentos comerciais. Extração e purificação Aos 50 ml de leite ou 50 gramas de amendoim torrado finamente granulado adicionou-se 270mL de metanol e 30mL de cloreto de potássio a 4% em funil de separação. Após 5 minutos de agitação, filtrou-se sob papel de filtro quantitativo e recolheu-se 150 ml do filtrado, que posteriormente foi purificado com a adição de 150mL de Cloreto de cobre a 10%, a seguir adicionou-se 50 g de Celite, filtrou-se e 150 ml do filtrado foi transferido para um funil de separação de 500mL, adicionou-se 150mL de água destilada. As micotoxinas foram extraídas duas vezes com 10mL de clorofórmio e as alíquotas foram reunidas e evaporadas em banho maria. Separação, detecção e quantificação. O extrato obtido foi reconstituído com 0,2mL de Tetracloreto de carbono e aplicado, juntamente com soluções padrões de aflatoxinas B1, B2, G1 e G2, em placa de Cromatografia de Camada Delgada (C.C.D), a qual foi Página 2 de 11
desenvolvida na fase móvel Clorofórmio: acetona (90:10). Após desenvolvimento cromatográfico, a revelação foi realizada com o auxílio do Ultravioleta de comprimento de onda 366nm. Para quantificação das micotoxinas alíquotas de 10µL de cada micotoxina, em diversas concentrações, juntamente com os extratos em volume de 10µL foram aplicados em placa de Cromatografia de Camada Delgada (C.C.D), a qual foi desenvolvida na fase móvel Clorofórmio: acetona (90:10), no sentido horizontal. Após desenvolvimento cromatográfico observou-se ao ultravioleta em comprimento de onda de 366nm, comparandose, visualmente, a intensidade da fluorescência das amostras com as diversas soluções padrões. Padronização da metodologia analítica para determinação de Aflatoxinas Para padronização da metodologia analítica para determinação de aflatoxinas em amostras de leite foram adotados os seguintes procedimentos: Preparo das soluções padrões As soluções padrões de Aflatoxinas B1, B2, G1 e G2, SIGMA, foram reconstituídas com metanol P.A. em volume final de 5mL. A seguir efetuaram-se diluições sucessivas das soluções padrões das aflatoxinas de 1/10 e 1/20, para obtenção das soluções de trabalho. Cálculo das concentrações das soluções padrões e de trabalho As soluções padrões e de trabalho de aflatoxinas B1, B2, G1 e G2, foram submetidas à espectrofotometria de ultravioleta com scan em comprimentos de onda de 190 a 320nm. De acordo com as absorbâncias obtidas e o solvente empregado na diluição das soluções, empregou-se a fórmula abaixo descrita para obtenção das concentrações das aflatoxinas. Página 3 de 11
µg micotoxina/ml = A x CF X PM X 1000 E Onde: A= Absorbância obtida CF= Fator de correção do aparelho PM= Peso molecular da micotoxina E= Absotividade molar da micotoxina TABELA 1: Valores usados para o cálculo das concentrações de aflatoxinas Solvente nm Absortividade Molar Peso molecular B1 Metanol 360 21.800 312 B2 Metanol 362 24.000 314 G1 Metanol 362 17.700 328 G2 Metanol 362 19.300 330 Padronização dos procedimentos analíticos para identificação e semiquantificação de aflatoxinas Após a determinação das concentrações das soluções padrões e de trabalho das diversas aflatoxinas efetuou-se a padronização dos procedimentos de identificação e semiquantificação das aflatoxinas, a seguir descritos: Alíquotas das soluções de trabalho das diversas aflatoxinas foram aplicadas em placas cromatográficas de 2mm de espessura e submetidas a desenvolvimento cromatográfico, empregando-se clorofórmio: metanol (90:10) como fase móvel. As placas cromatográficas foram desenvolvidas no sentido unidirecional, por 10 centímetros, secas a temperatura ambiente e Página 4 de 11
observadas a luz ultravioleta de 360nm, e os valores de Rf anotados. Os ensaios foram realizados por 10 vezes. Cálculo do limite de detecção Para determinação do limite de detecção foram empregadas alíquotas das soluções de trabalho das aflatoxinas em volume decrescente, aplicadas com auxílio de microsseringa Hamilton, em placas cromatográficas, que foram desenvolvidas no sentido unidirecional, por 10 centímetros, secas a temperatura ambientes e observadas à luz ultravioleta de 360nm. Os valores de Rf foram registrados. O limite de detecção foi considerado como a menor concentração identificável à luz ultravioleta, em 05 determinações. RESULTADOS Resultados da determinação das concentrações de aflatoxinas nas soluções padrões e de trabalho Os resultados da determinação das concentrações das soluções padrão e de trabalho de aflatoxinas B1, B2, G1 e G2, encontram-se descritas na Tabela 2. TABELA 2: Concentrações de Aflatoxinas nas soluções padrão e de trabalho. Micotoxina Solução Padrão Concentração mg/ml Solução de Trabalho Concentração mg/ml B1 27,46 3,96 B2 28,22 3,44 G1 9,23 1,98 G2 26,31 2,71 Página 5 de 11
Resultados da padronização dos procedimentos cromatográficos para determinação de aflatoxinas Os resultados da padronização dos procedimentos cromatográficos para determinação de aflatoxinas, encontram-se descritos na Tabela 3. TABELA 3:Padronização dos procedimentos cromatográficos para determinação de aflatoxinas. Micotoxina N Rf B1 10 0,55 B2 10 0,46 G1 10 0,40 G2 10 0,33 N= número de determinações realizadas. Resultados da determinação do Limite de detecção Os resultados da determinação dos limites de detecção das aflatoxinas analisadas, encontram-se descritos na Tabela 4. TABELA 4: Limites de detecção das diversas aflatoxinas analisadas Micotoxina N Limite de detecção mg/ml B1 5 0,79288 B2 5 0,688 G1 5 0,396 G2 5 0,54372 N= número de determinações realizadas Página 6 de 11
Resultados da determinação de aflatoxinas nas amostras de leite analisadas Os resultados da determinação das aflatoxinas B1, B2, G1 e G2 analisadas nas diversas amostras de amendoim encontram-se descritas na Tabela 5, e nas amostras de leite na Tabela 6. TABELA 5: Resultados da determinação de Aflatoxinas B1, B2, G1 e G2 nas diversas amostras de amendoim analisadas. Amostra de Amendoim B1 mg/kg B2 mg/kg G1 mg/kg G2 mg/kg 01 >20,0<30,0 >2,0<5,0 >5,0<10,0 >2,0<5,0 02 >10,0<20,0 >5,0<10,0 >5,0<10,0 <1,0 03 >5,0<10,0 >2,0<5,0 >5,0<10,0 >2,0<5,0 04 >10,0<20,0 <1,5 >10,0<20,0 >2,0<5,0 05 >5,0<10,0 >2,0<5,0 >5,0<10,0 <1,0 06 >5,0<10,0 <1,5 >5,0<10,0 <1,0 07 >10,0<20,0 >2,0<5,0 >5,0<10,0 >2,0<5,0 08 >10,0<20,0 <1,5 >10,0<20,0 <1,0 09 >5,0<10,0 >2,0<5,0 >5,0<10,0 >2,0<5,0 10 >10,0<20,0 <1,5 >5,0<10,0 <1,0 11 >20,0<30,0 >5,0<10,0 >10,0<20, >2,0<5,0 12 >5,0<10,0 >2,0<5,0 >5,0<10,0 <1,0 13 >20,0<30,0 >5,0<10,0 >10,0<20, >2,0<5,0 14 >20,0<30,0 >5,0<10,0 >5,0<10,0 >2,0<5,0 15 >10,0<20,0 >5,0<10,0 >2,0<5,0 <1,0 TABELA 6: Resultados da determinação de Aflatoxinas B1, B2, G1 e G2 nas diversas amostras de leite analisadas. Amostra de Leite B1 mg/l B2 mg/l G1 mg/l G2 mg/l 01 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 02 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 03 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 04 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 05 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 06 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 Página 7 de 11
07 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 08 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 09 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 10 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 11 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 12 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 13 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 14 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 15 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 16 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 17 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 18 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 19 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 20 <2,0 <1,5 <2,0 <1,0 DISCUSSÃO As aflatoxinas ocupam posição de destaque dentre as micotoxinas tanto pelos efeitos tóxicos ao homem e animais como pela facilidade de substratos para crescimento dos fungos produtores e pelas dificuldades de remoção dos alimentos contaminados. Portanto, a monitorização destes metabólitos tóxicos em grãos sensíveis constitui importante medida preventiva. O limite de detecção obtido para as diferentes aflatoxinas, conforme dados da Tabela 4, permite o emprego do método padronizado nas análises de rotina a fim de serem obedecidos os padrões sanitários vigentes no País. No Brasil, a presença de aflatoxinas em alimentos é regulamentada pela Resolução 34/76 do Ministério da Saúde, que estabelece 30µg/Kg para a soma das aflatoxinas B1 e G1, e pela Portaria 183 do Ministério da Agricultura, do Abastecimento e da Reforma Agrária, que estabelece o limite máximo de 20µg/Kg para a somatória das aflatoxinas B1, B2, G1 e G2, acompanhando a resolução dos Países do Mercosul. Página 8 de 11
O procedimento de extração empregado foi considerado de fácil execução, rápido e de custo operacional reduzido, recomendando seu emprego nas análises de rotina. Os resultados da determinação das diversas aflatoxinas nas amostras de leite produzidas no estado do Pará apresentaram valores abaixo do limite de detecção do procedimento analítico, portanto o consumo deste leite não representa risco a saúde humana sob o aspecto da contaminação por aflatoxinas. Tal fato pode ser creditado as características da pecuária do estado do Pará, onde não há o confinamento do animal e o uso de rações é reduzido, como conseqüência à contaminação das rações por fungos é minimizada. Considerando-se os resultados obtidos na determinação das amostras de amendoim, descritas na Tabela 5, segundo a Legislação do Ministério da Saúde, observamos que 26,66% das amostras analisadas encontravam-se impróprias para consumo humano. Ao analisarmos os resultados constantes na Tabela 5, considerando-se a Legislação do Ministério da Agricultura e do Mercosul, observamos que 60% das amostras analisadas encontram-se impróprias para consumo humano. Tal fator é agravado pelos hábitos alimentares da população paraense que utiliza o amendoim, geralmente, associado ao etanol. Espera-se desta interação um efeito sinérgico nos danos ao hepatócito. Deve ser ressaltado que no estado do Pará não existe programa de controle da contaminação de alimentos por Aflatoxinas nas esferas estadual e municipal. E os resultados observados neste estudo caracterizam a necessidade imediata da implantação de um programa de controle destes metabólitos tóxicos nos alimentos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Página 9 de 11
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