DIREITO INTERNACIONAL E AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS: A INTERDEPENDÊNCIA VERSUS TEORIA DA DEPENDÊNCIA NA REGULAMENTAÇÃO DE UMA NOVA ORDEM INTERNACIONAL

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Transcrição:

Publicado no DVD Magister Número 34, outubro/novembro de 2010 DIREITO INTERNACIONAL E AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS: A INTERDEPENDÊNCIA VERSUS TEORIA DA DEPENDÊNCIA NA REGULAMENTAÇÃO DE UMA NOVA ORDEM INTERNACIONAL Mohamed Adi Neto Mateus Soares de Oliveira Lucas Henrique I. Marchi SUMÁRIO: Introdução; 1. Sociedade Internacional; 2. Novos Protagonistas da Sociedade Internacional; 3. A soberania no contexto contemporâneo; 4. Relação da Interdependência com a Teoria da Dependência das Relações Internacionais; Considerações Finais; Referências Bibliográficas. RESUMO: Trata-se de um artigo que busca esclarecer a relação de duas teorias envolvidas no contexto internacional. De um lado, a interdependência existente junto aos sujeitos do Direito Internacional Público e, de outro, a questão da dependência envolvida entre os teóricos das relações internacionais. Com base nessa relação, busca-se neste trabalho, demonstrar como, em virtude da evolução das relações internacionais, vista sob todos seus ângulos, as normas jurídicas internacionais estão se desenvolvendo, conferindo, inclusive, novas personalidades e capacidades jurídicas internacionais. PALAVRAS-CHAVE: Sociedade Internacional, Direito Internacional Público, Relações Internacionais, Interdependência e Dependência. INTRODUÇÃO Tratando-se do estudo de Direito Internacional Público, é imprescindível que o faça seguindo os rumos da história, haja vista seu caráter evolutivo. Convém destacar que o contexto histórico sempre se desenvolveu num ritmo histórico próprio, em função da evolução da sociedade internacional que, por sua vez, sempre refletiu nas mutações ocorridas na seara do DIP.

Historicamente, muitos autores afirmam que o DIP pode ser dividido em dois períodos distintos. O primeiro, da sua formação, vai até a Revolução Francesa. Já o segundo, também conhecido como período de seu desenvolvimento, parte da Revolução Francesa em 1789 até os dias atuais. Tendo em vista que o Direito Internacional Público deve ser considerado, antes de qualquer coisa, como um direito intersocial ou intergrupal, suas origens, bases normativas, são encontradas na Antiguidade e na própria Idade Média. Tais bases eram encontradas nas primeiras alianças formadas entre grupos sociais da época, as quais, apesar de não envolverem Estados Soberanos, posto que estes não existiam na época, detinham um certo grau de organização social e política, motivo pelo qual, afirma-se que alí já se encontravam as bases para a formação de um Direito Internacional. Todavia, este artigo tratará do Direito Internacional na sua fase de desenvolvimento, num contexto em que os Estados Soberanos detinham a "soberania clássica" ou "absoluta", até se chegar aos dias atuais, englobando os novos sujeitos da sociedade internacional. Na busca de explicações no tocante a atual conjuntura das relações internacionais, bem como sua regulamentação pelo Direito Internacional, há de se proceder em algumas reflexões acerca dos aspectos básicos do modelo clássico das normas internacionais. Caso contrário, não haverá a possibilidade de se desenvolver uma linha de raciocínio, na busca da compreensão da relação entre a evolução do DI e sua normatização das relações num âmbito internacional. Far-se-á, para tanto, esta análise, abordando, ainda, os novos atores internacionais, as novas fontes e as formas de aplicação das regras. 1. SOCIEDADE INTERNACIONAL Ao se falar em sociedade internacional, na óptica do Direito Internacional, surgem algumas questões a serem analisadas e refletidas. Conforme leciona JO, esses pontos podem ser resumidos nas seguintes questões: "Quais são os componentes da sociedade internacional? A quem o DI se destina? Quais são os atores do sistema legal internacional? Tais indagações estão ligadas à questão sobre os sujeitos do DI" 1. No sentido tradicional, apenas os Estados possuíam reconhecimento de sujeito internacional público, ao passo, que, atualmente, outros sujeitos estão participando ativamente da sociedade internacional, citando-se como exemplo, os próprios indivíduos e as Organizações Internacionais. Consequentemente, torna-se pertinente trabalhar, ainda que de forma superficial, com dois conceitos que caminham de forma simultânea e paralela, a personalidade e a capacidade jurídica internacional. Quando se fala que uma organização é uma pessoa legal ou sujeito de direitos, busca-se afirmar que tal instituição tem personalidade legal reconhecida por uma sociedade determinada na qual possui certa capacidade para entrar em relações legais, ser sujeito de direitos e obrigações. Sabe-se, que, na sociedade humana, personalidade legal quer dizer a existência como participante na mesma, sendo sua aptidão legal para ser sujeito de direitos. Trata-se, destarte, do

reconhecimento do seu valor humano, como sujeito capaz de exercer direitos e contrair obrigações, garantidos no ordenamento legal da sociedade. Já a capacidade decorre da personalidade, haja vista que ela demonstra o poder de intervir por si mesmo, enquanto a personalidade dá a idéia de o direito ser protegido pela lei, mesmo sem capacidade. Dessa forma, diz-se que é a própria sociedade quem permite e confere a determinada "pessoa", pública ou privada, a personalidade legal, observando que a capacidade e a personalidade podem ter conceitos variados de uma sociedade legal para outra, por isso, fala-se que é a característica da sociedade quem determina ambos os conceitos aqui trabalhados. No plano internacional, enfrenta-se o problema da tentativa de formar um conceito legal aceitável por todos os Estados. Na seara do Direito Internacional Público, o reconhecimento da personalidade internacional significa o reconhecimento de sua existência legal na sociedade internacional, ressaltando que a entidade que tem personalidade legal internacional pode exercer direitos e contrair deveres, conforme a sua capacidade legal internacional reconhecida pelo DI. Até o séc. XIX os Estados eram as únicas pessoas reconhecidas pelo DIP, não havendo legislações internacionais conferindo capacidade jurídica internacional a outros sujeitos. Isto se justifica, na medida em que o contexto da época era marcado pelo caráter estatocêntrico posto que todo o poder era concentrado nos Estados Soberanos. Todavia, a sociedade internacional evoluiu no sentido da necessidade em reger diretamente as atividades dos novos participantes, resultando, assim, no surgimento de novos atores internacionais. O sujeito de tal sociedade é o titular de direito ou obrigação, podendo gozar plenamente ou limitadamente desses direitos, conforme a sua capacidade legal, ao mesmo tempo em que poderá ser totalmente incapaz por falta de regras internacionais aplicáveis ao mesmo. Os Estados, por exemplo, já gozaram de maior capacidade legal internacional, tendo exclusiva jurisdição territorial e pessoal, ao passo que, no caso das organizações internacionais, suas respectivas capacidades legais internacionais são medidas conforme seus tratados constitutivos, limitando-se ainda, aos países que a reconhecem. Mas o que é sociedade internacional? Tarefa árdua diz respeito à discussão conceituação da sociedade internacional, uma vez que se vislumbram, doutrinariamente, diversos posicionamentos, muitos deles com opiniões conflitantes a respeito das pessoas legais internacionais. De certa forma, este trabalho entende que a sociedade internacional é o conjunto de sociedades nacionais, somado a outros autores internacionais, tais como às empresas transnacionais, os organismos internacionais, às organizações não governamentais e os indivíduos. A este respeito, DOLINGER compreende que a sociedade internacional nada mais é do que o conglomerado das sociedades internas dos Estados Soberanos. Neste sentido: As hipóteses aventadas para ilustrar a dimensão internacional das normas jurídicas do direito interno demonstram que além das sociedades internas, regidas por sua própria legislação, existe uma outra

sociedade, maior, composta pelo encontro de elementos destas sociedades nacionais, que compõe a sociedade internacional 2. No campo das Relações Internacionais, OLIVEIRA, trabalha com o conceito de Raymond Aron, entendendo, como sociedade internacional: o conjunto que engloba o sistema interestatal, a economia mundial - o mercado mundial ou sistema econômico mundial - os fenômenos transnacionais e supranacionais, aplicando-se o adjetivo internacional a todos os aspectos ora distinguidos. Ao conjunto de todas essas relações entre Estados e entre pessoas privadas, que se permitem sonhar com a unidade da espécie humana, pode-se chamar de sociedade internacional, ou sociedade mundial 3. Existem diversos ângulos na tentativa de defini-la. De um lado é um conjunto interestatal, vale dizer, trata-se das relações emergentes entre as diferentes unidades atuando como atores no cenário mundial, quer como detentoras do poder público, quer como expressão das vontades e das aspirações dos indivíduos e grupos que a compõem. Por outro lado, as relações se estabelecem através de fronteiras existentes entre estas unidades, indivíduos, grupos, empresas transnacionais e demais atores internacionais, por meio da economia, cultura, política, enfim, de todas as relações atualmente globalizadas. Mas, se a sociedade internacional é composta por diversos sujeitos internacionais, mister se faz identificarmos e conceituarmos os mesmos, destacando, ainda, suas características essenciais. Entre as suas principais características, figura-se a pluralidade, como já dito antes, de atores internacionais que as compõem. É consenso entre os estudiosos, do tema em pauta, apontar os Estados, as organizações internacionais, as organizações não governamentais, grupos particulares, empresas transnacionais, igreja, sindicatos, partidos políticos e os indivíduos como seus protagonistas. 2. NOVOS PROTAGONISTAS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL Por conta deste cenário, marcado por sucessivas mudanças e fragmentações operadas no cenário mundial, somado ao desenvolvimento no paradigma da interdependência, consolidado nos anos setenta, acentuou-se o surgimento de um número cada vez mais heterogêneo e ampliado de protagonistas, de natureza tão diversificada como os seus objetivos, destacando-se os políticos, econômicos, culturais e tecnológicos. O Estado, em se tratando de um dos sujeitos mais antigos ou, para muitos, o mais antigo, nos termos de JO, pode ser considerado, em todas as suas esferas, como sendo o "participante mais ativo nas relações legais internacionais. A maioria das normas legais da sociedade internacional está ligada às atividades internacionais do Estado, ou para exigir obrigações ou para dar direitos sendo também o sujeito mais sólido e efetivo" 4. No mesmo sentido, PELLET, citando o Parecer nº 1 emitido pela Comissão de arbitragem para a ex- Iugoslávia, compreende que "Estado é normalmente definido como uma coletividade que se

compõe de um território e de uma população submetida a um poder político organizado. Ele se caracteriza pela soberania" 5. Esse quadro vem se modificando radicalmente nos últimos anos, tendo em vista o aumento significativo da participação das organizações internacionais, dos indivíduos, ambos vislumbrados como sujeitos, atrelados ao papel de atores como as organizações não governamentais, empresas transnacionais. Como resultado desses novos sujeitos e atores, constatar-se-á uma evolução das normas jurídicas internacionais, refletindo, inclusive, na subdivisão do Direito Internacional em novos ramos, como, por exemplo, Direito Internacional Econômico, Direito Internacional dos Direitos Humanos, Direito da Integração, Direito do Comércio Internacional, dentre outros. No tocante às organizações internacionais, apesar dos conflitos, a ideia de cooperação entre comunidades constituiu uma pretensão muito antiga na história da humanidade. Vislumbrava-se, por meio de associações entre os povos e suas diversificadas relações, a possibilidade de criação de organismos a fim de garantir a paz universal, posicionamento constante e de preocupação dos grandes pensadores em todos os tempos. Outra modificação ocorrida através da evolução das relações internacionais dentro da sociedade internacional foi o reconhecimento dos indivíduos como sujeitos de determinados direitos em tal órbita. A par da discussão da amplitude da capacidade jurídica dos indivíduos, se plena ou semi-plena, o que, diga-se de passagem sai fora do foco deste artigo, não há como deixar de tecer algumas considerações sobre esta temática. A primeira refere-se ao plano de normas jurídicas, onde se percebe uma enorme proteção (no âmbito teórico-normativo) dos direitos da pessoa humana. Em segundo lugar, nota-se que os indivíduos possuem atualmente uma personalidade jurídica ativa e passiva, podendo, inclusive, serem chamados para responder juridicamente na seara internacional. Tal assertiva pode ser conferida por inúmeros textos internacionais, a exemplo da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, da Convenção Americana sobre os Direitos Humanos de 1969. O papel das Cortes internacionais, através do importante papel desenvolvido por suas jurisprudências também corroboram a capacidade jurídica internacional do ser humano. Quando o assunto tratado refere-se à conceituação das organizações internacionais, nos deparamos com uma dificuldade generalizada, ou seja, ausência de consenso entre os autores para se definir as organizações internacionais. Tal fato deve-se ao fenômeno das OIS encontrarem-se em constante e dinâmica evolução, configuradas por diferenças estruturais, dotadas de objetivos diversificados e competências específicas, o que, por vezes, constitui um obstáculo para que se almeje uma definição única de organizações internacionais. Contudo, observar-se-á a existência de algumas definições que abrangem todas as características deste instituto, tais como, internacionalidade, composição interestatal e base convencional. STRENGER, citando os comentários de MANIN, compreende que as OIS são "entidades constituídas pela vontade comum dos Estados, dotadas de órgãos próprios, investidos de certa permanência e

encarregada de cumprir as funções de tipo internacional que lhe são atribuídas por ato constitutivo" 6. No mesmo sentido, Manoel Medina as defini "como todo grupo ou associação que se estende por cima das fronteiras de um Estado e que adota uma estrutura orgânica permanente" 7. A composição interestatal é o primeiro elemento formador da organização internacional. A base convencional pode ser definida como a segunda característica fundamental de tais institutos, explicando-se isto, pelo fato de que para se criar uma OI é necessário a existência de um ato jurídico formal. Esta base formal pode ser expressada por tratados multilaterais (quando se envolvem nações diversas) negociados através de conferências intergovernamentais, nascendo-se daí, o chamado direito derivado ou secundário que deverá reger estes organismos internacionais. A terceira característica fundamental das organizações internacionais é a autonomia jurídica, isto é, a personalidade jurídica que as distinguem dos Estados-membros e de outros organismos internacionais, não obstante, a capacidade de ser sujeito de direitos e obrigações perante o Direito Internacional. Fato curioso é a excessiva capacidade legal que as Organizações Internacionais vem adquirindo nos últimos anos, criando estruturas de poder paralelo aos seus membros, ou, às vezes, até superiores as estes, como no caso da União Europeia. Desta forma, as organizações internacionais (sociedade singulares), constituídas pela justaposição de Estados teoricamente soberanos, mas, na realidade apresentando dimensões de poder bastante desiguais, fato este, entre outros, que vem consolidando, atualmente, tais organizações, como sujeito internacional com um Tratado internacional próprio, a exemplo da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados de 1969. As organizações internacionais são classificadas por diversos critérios, tais como: finalidades, componentes e suas competências. No tocante as finalidades desenvolvidas pelas OIS, são gerais ou especiais, ao refletirem o que está contido em tratados ou em outros documentos de constituições. Finalidade geral significa que a mesma tem objetivos diversos, consideradas úteis, subdividindo-se em interesses de escalas universais, como a ONU, ou regionais, como a OEA. Por outro lado, grande parte das organizações internacionais, são criadas com fins definidos e atividades específicas, podendo apresentar mais de um objetivo, citando-se, a título exemplificativo, a Organização de Cooperação para fins Militares, a OTAN, a Organização para fins Econômicos, a exemplo das Comunidades Europeias - 1951/1957, hoje União Europeia - 1992-, organizações com finalidades comerciais como a Organização Mundial do Comércio - OMC-. Quanto aos componentes, econtrar-se-ão dois tipos de organizações internacionais, aquelas com vocações universais e regionais, sendo, a primeira, formada por um número ilimitado de membros, aberta à participação potencial de todos os países do sistema de Estados. Conforme Odete Maria, em relação às organizações com finalidades universais, em 1995 existiam 34 dessas organizações, sendo a ONU, a mais conhecida. No tocante as outras, as demais organizações de caráter universal mais conhecidas são os dezesseis organismos especializados das Nações Unidas, os quais apresentam independências ordenativas e de seus objetivos instrumentais

(Banco Munidal-BIRD, Organização Mundial do Comércio-OMC, Organização Internacional do Trabalho-OIT, dentre várias outras) 8. Já aquelas dotadas de vocação regional, são restritas a um número limitado de Estados, unindo-se por afinidades, por exemplo, geográficas, econômicas e políticas. Por último, as OIS são classificadas em razão de suas competências, ressaltando que este critério contempla duas divisões, distinguindo as organizações internacionais de cooperação e de integração. O ponto fundamental destes dois tipos de organizações reside na questão da soberania, uma vez que algumas delas não transferem parcelas de competências soberanas (são as organizações mais numerosas), ao passo que existem aquelas em que seus Estados-membros concedem parcelas de soberania a uma autoridade externa, para a unidade integrada, vale dizer, uma organização internacional. As OIS de Cooperação desenvolvem funções de cooperação entre os seus Estados-membros, buscando atingir objetivos comuns, marcado pelas técnicas de negociações e de adoção de decisões por unanimidade. No tocante as OIS de Integração, também conhecidas como organismos de unificação, constituem modelos mais recentes, que pretendem integrar os Estados-membros em vez de apenas coordenálos, fato que requer transferências de parcelas de soberanias, ou seja, opera-se a unificação de Estados através da transmissão de algumas competências estatais à unidade comum, em favor especificamente de suas instituições. Além da característica de transferência de soberania, marca este paradigma a tomada de decisão por maioria e, em certos casos, por unanimidade, apresentando estrutura do tipo funcional, federal, ou mista, com as funções do legislativo, executivo e judiciário, podendo adotar decisões supranacionais, de caráter obrigatório e diretamente aplicável nos Estados membros. Em relação aos atores, extremamente atuantes na sociedade internacional, porém, sem capacidade jurídica, destacar-se-ão, primeiramente, as Organizações Não Governamentais - ONGs-. É crescente a veiculação desses organismos junto aos meios de comunicação, apresentando suas atividades e denúncias, nas últimas duas décadas do século XX, atingindo, ao final desse período, a ordem aproximada de cinco mil ONGs. Encontram-se reunidas em torno de dois grandes grupos fundamentais, os denominados organismos de concertação e de intervenção. O primeiro pode ser exemplificado pelos sindicatos, partidos políticos e esportivos, detendo nas suas características essenciais, a permanência, a continuidade de buscar posições comuns entre os parceiros, a coordenação de metas e cooperação com suas políticas de ação. Por outro lado, os organismos de intervenção, ao contrário dos grupos de concertação, limitam-se a responder desafios concretos, em favor do meio ambiente e da assistência humanitária, citando-se como exemplo o famoso grupo Greenpeace, Movimento Médicos Sem Fronteiras, dentre outros. Conforme entende o Instituto de Direito Internacional, ao referir-se as ONGs, são todos os "grupos de pessoas ou de coletividades livremente criados pela iniciativa privada, que exercem, sem ânimo de lucro, atividade internacional de interesse geral, à margem de toda preocupação de ordem

exclusivamente nacional" 9. Nota-se, portanto, os três caracteres essenciais para sua existência: a iniciativa privada, o elemento não lucrativo da organização e seu alcance internacional. Os grupos sociais não-estatais, como atores da sociedade internacional, se dividem em dois grandes grupos: o primeiro são as associações que não visam fins lucrativos, a exemplo das organizações não-governamentais. Já o segundo, é formado pelas associações que se envolvem com fins lucrativos, geralmente em forma de sociedades mercantis ou de corporações comerciais, um fenômeno sui generes ao adotar a nacionalidade e a legislação de um outro Estado onde se filiam. Caracterizam-se pela plurinacionalidade, ou até multinacionalidade, em razão de seu capital social e também pela transnacionalidade de seu raio de ação, por isso, diz-se que esses atores internacionais desconhecem fronteiras e nacionalidades. STRENGER, compreendendo as empresas transnacionais, as conceitua como "todas as corporações que operam econômica e comercialmente, com interesses comuns, em diversos países segundo ordens jurídicas locais, influenciadas vinculativamente por comando de centro único dominante, de irradiação político-administrativa" 10. Após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, os grupos terroristas passaram a ser reconhecidos como sujeitos passivos de Direito Internacional, nos termos do Cap. VII, do Conselho de Segurança, bem como através dos arts. 41/42 da Carta das Nações Unidas. São objetos de decisões tomadas pelo Conselho de Segurança, fato que, como dito anteriormente, demonstra a diversidade da sociedade internacional, tornando-os como sujeitos passivos, sujeitos às sanções provenientes das Cortes Internacionais. Outro ponto relevante, no tocante a evolução normativa internacional, refere-se a descentralização das normas. De acordo com o entendimento da escola voluntarista, o DI nada mais é do que a consequência da expressão das vontades estatais. No entanto, há que se ressaltar o fato de atualmente não haver hierarquia entre as normas jurídicas, em detrimento da fonte de que se originam, vale dizer, tratados, costumes, decisões ou mesmo atos internacionais, sempre serão emanado para os Estados. Por outro lado, como exceções à regra da falta de hierarquia, várias normas jurídicas são impostas aos Estados, independente de suas vontades, situando as chamadas normas imperativas, vale dizer, 'jus cogens", que, conforme o entendimento do art. 53 da Convenção de Viena de 1969, não se permite nenhuma derrogação a tais normas que, muito embora sejam obrigatórias, são pouco utilizadas. Passando para o problema da aplicação do Direito Internacional, apesar da existência das normas autoritárias ou imperativas, faz-se necessário esclarecer que a maior parte das leis internacionais não possui uma força executória e, ademais, as normas jus cogens são pouco numerosas. Destaca-se ainda o aumento do recurso, por parte dos Estados, aos meios jurisdicionais de solução de controvérsias internacionais (não só no tocante aos julgamentos da CIJ, mas também, do Órgão de Solução de Controvérsias da Organização Mundial do Comércio, dos novos Tribunais Internacionais, dentre outros), fato que reforça a tendência, lenta, porém, concreta, de uma

verdadeira comunitarização, ou seja, da ideia de que a violação de um direito por um determinado Estado traz consequências por parte dos outros membros da sociedade internacional. Como consequência imediata do crescente comércio desenvolvido na Europa no período medieval, a lex mercatoria obteve um grande crescimento junto às cidades do norte da Itália. Assim, os mercadores se deslocavam até as grandes feiras, portos e, além de suas mercadorias levadas para serem comerciadas, carregavam consigo seus usos e costumes utilizados nas respectivas relações comerciais. Atualmente, trata-se da principal fonte do Comércio Internacional, marcada por um verdadeiro sistema normativo internacional, de forma paralela àqueles advindos dos Estados soberanos, caracterizada, originada, especialmente, pelas práticas comerciais. Após tais análises, necessário frisar que o Direito Internacional reflete a transformação de 'valores da sociedade internacional' em normas jurídicas, em um determinado momento da história, com o equilíbrio de forças nesse estágio, como demonstrado neste tópico. 3. A SOBERANIA NO CONTEXTO CONTEMPORÂNEO Em relação à soberania Estatal propriamente dita, tal conceito, sob a concepção histórica, sempre teve índole política, o que, no decorrer da evolução das relações internacionais, veio a consolidar-se em jurídica. Na esfera interna de um determinado Estado Soberano, verificar-se-á que a tal conceito pode ser encarado como um poder absoluto e ilimitado. Contudo, sob o prisma internacional, os Estados soberanos não se subordinam a entes superiores e, sim, a outros da mesma hierarquia, melhor dizendo, não há, tecnicamente, entes superiores. As relações internacionais entre os Estados Soberanos são garantidas pelo próprio ordenamento jurídico internacional. Todavia, como veremos ao final deste tópico, no estágio atual, tal afirmação não é absoluta, posto que há uma notória desigualdade, fruto de diversas mudanças ocorridas atualmente. Após a segunda guerra mundial, as normas internacionais, bem como todo o sistema internacional, sofreram uma significativa transformação social, política, científica, econômica, cultural, dentre várias outras modificações estruturais. Assim, áreas estruturais do Direito Internacional foram inteiramente reestruturadas visando uma regulamentação da própria sociedade contemporânea. Como resultado dessas transformações e, especialmente pela rapidez com que elas têm ocorrido, o DIP se encontra diante da necessidade de ter que acompanhar tais evoluções e sistematizá-las, tarefa nada fácil para os operadores do Direito. Do entendimento pós-moderno de Soberania, Quintão Soares entende que: a soberania é una, pois podem existir vários Estados soberanos, mas não se admite, no mesmo Estado, a convivência de duas ou mais soberanias; a soberania é indivisível, não se admitindo a existência de várias partes separadas do poder soberano, aplicando-se à universalidade dos fatos ocorridos no Estado; a soberania é inalienável, pois quem a detém (povo, nação ou Estado) desaparece quando fica sem

ela; a soberania é imprescritível, dado o fato de que todo poder soberano aspira existir permanentemente 11. Todavia, quando a se diz respeito à conceituação de soberania, há dificuldades, pois, novamente, em função das mutações ocorridas na sociedade cosmopolita (interação entre as nações, internacionalização dos mercados, fluxo internacional de capitais, atual divisão internacional do trabalho, dentre várias outras causas), houve o fortalecimento das disparidades entre os Estadoscentro dos Estados-periféricos, fato que resultou numa limitação de soberania dos Estados e, consequentemente, afetou sua conceituação tradicional. Assim, resta-nos, evidenciado, que tais transformações desequilibraram os poderes que sustentavam uma igualdade soberana (conforme aquela prevista no tratado de Westfalia), em virtude de todas as transformações já comentadas e, especialmente pela velocidade com que elas aconteceram, resultando, por fim, na limitação soberana que os Estados possuem atualmente. 4. DEPENDÊNCIA X INTERDEPENDÊNCIA Analisando a dependência bem como a interdependência estatal contemporânea no tocante aos estudos das Relações Internacionais, verificar-se-á a necessidade esclarecermos, de forma genérica, duas escolas, a saber, a dependente e a interdependente. Na medida em que a sociedade internacional evoluiu e se modificou do modelo tradicionalista, sugiram novas questões a serem debatidas, tais como a existência de novos sujeitos de DIP, dos blocos econômicos e Guerra Fria, que motivaram o surgimento dessas escolas visando uma abordagem que não poderia ser explicada pelo sistema tradicional (estatocentrismo, segurança nacional, anarquia). A escola dependente, surgida nos anos cinqüenta, desenvolveu-se juntamente com o modelo interdependente, todavia, fazendo uma abordagem das relações internacionais sob o prisma econômico. Visa responder às questões oriundas do desenvolvimento econômico, com especial desenvolvimento na América Latina. Maria Odete de Oliveira, ao explicar tal escola, anota que: O paradigma dependentista reúne antecedentes junto à criação da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL) órgão filiado ao Conselho Econômico e Social da ONU, com sede em Santiago-Chile, tendo na pessoa de Raúl Prebish, seu primeiro secretário. Na época da ditadura instalada na América latina, tal órgão passou a aproximar economistas, sociólogos e outros estudiosos de várias procedências e os autores da chamada teoria da dependência propriamente dita. 12 Remonta suas origens às teorias estruturalistas latino-americanas, envolvendo economistas e sociólogos (dentre eles Fernando Henrique Cardoso), trazendo a partindo da realidade, da década de cinquenta, com escopo de explicar o subdesenvolvimento dos chamados países de terceiro mundo nas décadas posteriores, bem como, sua dependência econômica em relação às superpotências.

Por outro lado, o modelo interdependente ou transnacionalista, surgido nos anos sessenta, tem como intenção basilar, proceder na análise da importância sobre a dimensão econômica mundial, a tecnologia das comunicações em massa, o poder das empresas transnacionais. Afasta, por si só, o fundamento do paradigma realista de que as Relações Internacionais são conflitivas por sua natureza, demonstrando uma outra faceta, qual seja, a do cooperativismo, decorrendo-se daí seu novo marco. Essa escola considera as bases da escola realista (segurança nacional, forças militares, influências diplomáticas), insuficientes para buscar soluções da nova realidade internacional, em face da proliferação dos organismos internacionais, do surgimento da interdependência, dos atores nãoestatais e dos processos das corporações transnacionais. CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante do exposto, o presente artigo entende que a evolução da sociedade internacional e, consequentemente das próprias relações internacionais, interferiram de maneira substancial no ordenamento jurídico internacional, posto que há uma necessidade de adaptação aos novos ditames da sociedade cosmopolita. Com efeito, não há como analisar o DIP sem recorrermos às Relações Internacionais. Como visto, vários paradigmas foram surgindo objetivando explicar as mutações da sociedade contemporânea, cada qual na sua época específica, em seu modo de pensar e com seus valores bem definidos com as épocas de seu surgimento. Nessa seara, surgiram mais personagens, novos valores passaram a ser considerados, enfim, novas formas de elaboração do pensamento moldaram, através dos tempos, as normas jurídicas internacionais na busca da regulamentação dos acontecimentos. Houve uma evolução de proporção grandiosa da sociedade internacional, através do reconhecimento dos novos sujeitos pelo Direito Internacional, incluindo-se: os indivíduos e as Organizações Internacionais, não se esquecendo, da capacidade passiva que os Tribunais Internacionais vem conferindo aos grupos terroristas. Como reflexo imediato dessa tendência, ocorreu a modificação das tradicionais fontes jurídicas bem como na forma de aplicação e concretização das decisões. A crescente globalização do mundo, aliada ao enfraquecimento do conceito tradicional da soberania estatal, faz com que os atores transnacionais tomem, cada vez mais, o poder do Estado, no cenário internacional, através da economia e finanças. Tais fatos podem ser explicados pelo importante papel exercido pelas Organizações Internacionais que, a cada dia, vem conquistando fundamental relevância nas Relações Internacionais, apesar da sua precariedade institucional. Todavia, tais precariedades das Organizações Internacionais, estão sendo debatidas (com acentuada morosidade), em visíveis setores, a exemplo das reformas essenciais tratadas pela ONU.

Tais reformas, no cômputo geral, refletem interesses de ordem econômica e segurança jurídica internacional, conforme se nota no site http://www.un.org/spanish/reforma/mru.html. A principal reforma, debatida pela Organização das Nações Unidas, refere-se, precipuamente, ao melhoramento do papel institucional da entidade. Por fim, resta ao Direito Internacional, no que tange às suas fontes e a suas estruturas descentralizadas - seus sujeitos, seus órgãos de solução de controvérsias -, regular todas estas modificações, causadas pela nova realidade do sistema internacional, vale dizer, a redução do poder soberano dos Estados, o desequilíbrio econômico e, conseqüentemente, político, entre tais atores internacionais. Este fato gera uma relação de dependência e interdependência de todos, levando a uma situação crítica e delicada os operadores do direito internacional. Distante do escopo de uma conclusão pessimista, com tais assertivas, importante reportar à realidade atual. Os operadores do Direito têm que ter em vista que o direito é uma espécie de reflexo da sociedade. Mas, por conta das desigualdades econômicas, a sociedade internacional vive um verdadeiro contexto literal de injustiça. Por isso, GALEANO, com muita sabedoria, comenta estes fatores. Eis seus comentários: Este mundo, que oferece o banquete a todos e fecha a porta no nariz de tantos, é ao mesmo tempo igualador e desigual: igualador nas ideias e nos costumes que impõe e desigual nas oportunidades que proporciona. A ditadura da sociedade de consumo exerce um totalitarismo simétrico ao de sua irmã gêmea, a ditadura da organização desigual do mundo 13. Seguramente, a partir do momento que as relações de dependência econômica e poderio militar, cultural, educacional, dentre outros, que poderiam ser elecandos aqui, passarem a contar com uma regulação normativa mais firme, não só no sentido de criação de normas, mas, também, através da criação de instituições democráticas que consigam aplicar com eficácia tais leis internacionais, certamente, tais disparidades caracterizadoras do atual contexto internacional diminuirão bastante. Mas, não se deve esquecer que o direito latu sensu, que possui como uma de suas ramificações estritas, o Direito Internacional, pode e deve se adaptar às mudanças sociais, porém, isso é mais a consequência destas mudanças, do que a sua causa propriamente dita. É justamente por esquecer-se dessas transformações, que os promotores da 'nova ordem econômica internacional' falham em seus empreendimentos, não conseguindo aplicar de forma pratica e eficaz, em muitas vezes, os valores inseridos nos textos internacionais modernos. Por isso, os partidários da antiglobalização que, muitas vezes, ficam por conta de holofotes, ao invés de concretizarem seus objetivos, devem meditar muito sobre essa questão.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CADEIRA BRANT, Leonardo Nemer. O Brasil e os novos desafios do Direito Internacional. Rio de Janeiro: Forense, 2004. DOLINGER, Jacob. Direito Internacional privado: parte geral. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. GALEANO, Eduardo. De pernas pro ar: a escola do mundo ao avesso. 8. ed. Porto Alegre: L&PM, 1999. JO, Hee Moon. Introdução ao Direito Internacional. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2004. MEDINA, Manuel. Las Organizaciones Internacionales. Madrid: Alianza, 1976. MELLO, Celso D. Albuquerque. Curso de direito internacional público. 14 ed. vol I. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. OLIVEIRA, Odete Maria de. Relações Internacionais: estudos de introdução. 1 ed. Curitiba: Juruá, 2003. SOARES, Mári17-91656150 Lúcio Quintão. Teoria do estado: introdução. 2 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. STRENGER, Irineu. Relações Internacionais. São Paulo: LTr, 1998.