Análise da gestão da cadeia de suprimentos de produtos orgânicos: estudo de caso da Cooperativa de Consumidores ECOTORRES/RS

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Transcrição:

13945 - Análise da gestão da cadeia de suprimentos de produtos orgânicos: estudo de caso da Cooperativa de Consumidores ECOTORRES/RS Review of the management of the supply chain of organic products: Case study of Cooperative Consumers ECOTORRES/RS KLEIN, Adriano Diego 1 ; SCHULTZ, Glauco 2 ; HOPP, Thais 3 ; TOTTA, Juliane 4 1 UFRGS, kleinagro@gmail.com; 2 UFRGS, glauco.schultz@ufrgs.br; 3 UFRGS, thais_hopp@hotmail.com; 4 UFRGS, juliane.totta@hotmail.com Resumo A expansão da agricultura orgânica e o crescimento do consumo de produtos orgânicos apresentam vários desafios, principalmente sobre os produtos e informações da produção; da capacidade produtiva e logística; do gerenciamento da comercialização e fluxo informações ao longo de sua cadeia produtiva. Nesse contexto, um novo agente se apresenta no mercado: as cooperativas de consumidores de produtos orgânicos. Neste trabalho foi realizado um estudo de caso sobre a cooperativa de consumidores Ecotorres (RS) sob a ótica da gestão da cadeia de suprimentos e fluxo de informações sobre a cadeia. Foram realizadas entrevistas com os gestores da cooperativa para identificação da forma de organização e de comercialização dos produtos. A Ecotorres têm muitas relações, e seu aspecto inovador é a forma de organização com inovações dos produtos, acesso de produtores ao mercado e valorização dos mesmos. Entretanto, possui como desafio a manutenção dos suprimentos. Palavras-chave: Cooperativa de consumidores; Cadeia de suprimentos; Agricultura orgânica; Ecotorres/RS; Iniciativas de Consumo Responsável. Abstract The expansion of organic agriculture and the growth of consumption of organic products present several challenges, especially on products and production information, production capacity and logistics, marketing and management of information throughout supply chain. In this context, a new agent presents in the market: consumer cooperatives of organic products. In this paper we present a case study on consumer cooperative Ecotorres (RS) from the perspective of supply chain management and information about the chain. Interviews were conducted with managers to identify the cooperative form of organization and marketing of products. The Ecotorres have many relationships, and his innovative aspect is the organization with product innovations, producer s access to the market and recovery of waste. However, has the challenge of maintaining supplies. Keywords: Consumer cooperative; Supply chain; Organic Agriculture; Ecotorres/RS; Initiatives for responsible consumption. Introdução Os sistemas agrícolas e industriais possuem como desafio a implantação de processos de produção sustentáveis, sendo necessária a adoção de estratégias de preservação dos recursos naturais. A agricultura orgânica tem se mostrado como uma alternativa promissora nesse sentido, apresentando amplo crescimento em área, quantidade e número de produtores. Entretanto, crescimento do consumo de produtos orgânicos traz consigo alguns problemas quanto à capacidade produtiva e logística e ao gerenciamento da comercialização e do fluxo informação ao longo de sua cadeia produtiva. Nesse contexto, surgem várias iniciativas para consumo responsável que adotam o conceito de comércio justo e economia solidária, com o propósito de proporcionar Cadernos de Agroecologia ISSN 2236-7934 Vol 8, No. 2, Nov 2013 1

uma maior aproximação entre os produtores e os consumidores. A cooperativa de consumidores de produtos orgânicos é um dos exemplos, que traz consigo uma série de implicações para a organização do suprimento de produtos orgânicos. Esse tipo de organização possui diversas dinâmicas de atuação, podendo ser formada exclusivamente por consumidores membros, mas também pode ser constituída por produtores, ou ainda, tendo um local ou feira aberto ao público. Segundo Borguini (2003), o principal motivo para que não se consuma produtos orgânicos diz respeito aos fatores relacionados à gestão da cadeia de suprimentos e ao posicionamento estratégico dos negócios, tais como preço, pouca oferta ou difícil acesso, falta de hábito de consumir produtos orgânicos, falta de informação sobre o produto e aparência inferior. Segundo o PISTELLI (2011) as cooperativas de consumo formam redes complexas onde o fluxo de informação gera reflexão dos consumidores inseridos em uma teia de relações com fornecedores e instituições locais, buscando um consumo mais consciente. Este trabalho busca analisar as relações de fornecimento e comercialização dos produtos orgânicos pela cooperativa de consumidores Ecotorres, localizada em Torres/RS. Para cumprir com este objetivo, foi realizado um estudo de caso sobre a cooperativa de consumidores, sob a ótica da gestão da cadeia de suprimentos e do fluxo de informações ao longo da sua cadeia produtiva, bem como a análise do ambiente institucional em que está inserida. Método de pesquisa Trata-se de uma pesquisa qualitativa, realizada a partir de um estudo de caso quanto aos procedimentos, tendo como ênfase um caráter exploratório quanto aos fins. Foram realizadas duas entrevistas com gestores da Cooperativa (secretária da Cooperativa e a gerente da loja) utilizando-se roteiro semiestruturado. A entrevista foi realizada no município de Torres (RS), durante o mês de maio de 2013, na sede da cooperativa. As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas para análise das informações. Também foram analisados documentos da cooperativa, tais como o Estatuto, bem como realizado levantamento bibliográfico contemplando outros estudos sobre o tema. A Cooperativa Ecotorres/RS foi selecionada após levantamento realizado em todo o Brasil, destacando-se como organização de consumidores pioneira no Estado do RS, sendo esta a justificativa para a realização do presente estudo de caso. A análise das informações foi realizada a partir da abordagem teórica sobre Gestão da Cadeia de Suprimentos (GCS). Segundo Batalha e Silva (1999), são necessárias relações coordenadas e diretas das atividades de suprimentos, produção e distribuição da empresa, tanto internamente como entre as empresas que fazem parte de uma cadeia, de maneira a aperfeiçoar seus processos e organização. Wood (2008) ressalta que a GCS é uma abordagem sistêmica que possui ênfase na análise das relações estabelecidas entre os agentes que possibilitam o funcionamento de uma cadeia. 2 Cadernos de Agroecologia ISSN 2236-7934 Vol 8, No. 2, Nov 2013

Resultados e discussões A Ecotorres é uma cooperativa de consumidores situada no município de Torres (RS), constituída em 1999 com o apoio do Centro Ecológico e da Cooperativa de Consumidores Ecológicos de Três Cachoeiras/RS COOPET. A Cooperativa conta com uma loja em Torres, onde também está localizada a sua sede e possui 120 sócios (consumidores e produtores). A loja atendo os clientes de segunda a sábado durante todo horário comercial, oferecendo produtos orgânicos, integrais e naturais. As decisões são tomadas por assembleia dos sócios que ocorre pelo menos uma vez ao ano, e existe um conselho gestor que realiza reuniões a cada duas semanas para analisar o andamento das atividades. A busca pela sustentabilidade da cooperativa e diversidade de produtos parte pela criação de uma ampla teia de relacionamentos que não se limita somente a prospecção de produtores locais, buscando o que Batalha e Silva (1999) chamam de sincronia das atividades a nível estratégico, tático e operacional. A busca por parcerias com outras cooperativas e centros de produção garantem não só maior diversidade de produtos, como também possibilitam minimizar problemas com escala e a elaboração de projetos conjuntos para desenvolvimentos de novos produtos. A parceria com empresas locais proporciona a operacionalização do desenvolvimento de novos produtos, como no caso de balas, sorvetes, sucos, barra nutritiva de frutas nativas orgânicas e de produção local. Além de diversificar a produção também agrega valor ao que é produzido, sem necessidade da criação de agroindústrias, já que os produtos destacam-se não somente por serem orgânicos, mas principalmente pelos seguintes atributos de reconhecimento e valorização: características artesanais; vínculos locais e regionais; empreendimentos solidários; cadeias curtas; e valorização da cultura local. Os dados coletados demonstram uma série de relações que possibilitaram a criação da cooperativa, a partir de um fluxo de informações no sentido da cooperativa aos agentes (produtores, agroindústrias, feirantes e demais consumidores) e vice-versa. Alguns aspectos relacionados à logística de entrega dos produtos se tornaram pontos determinantes para manutenção do negócio. Para tal, a parceria com outros centros de consumo e sincronização do fornecimento com outros pontos de venda se tornaram fundamentais para continuidade do abastecimento da loja. Assim, a simples mimetização do comércio convencional não era possível, devido às especificidades dos produtos orgânicos comercializados (baixa escala e perecibilidade). A entrega de frutas, legumes e verduras é realizada semanalmente na cooperativa, sendo fundamental o estabelecimento de uma rota de entregas pelos fornecedores com o objetivo de compatibilizar a escala com as distâncias percorridas e com isso minimizar custos e os impactos nos preços. Portanto, as entregas são sincronizadas com outros produtores da região, sendo que Cooperativa prioriza produtores o mais próximo possível da cooperativa, visando diminuir o tempo de entrega e também os impactos ambientais oriundos do transporte. A entrega de muitos dos produtos de maior validade são feitos por agroindústrias parceiras e distribuidores. Para estes produtos existe a necessidade de fazer Cadernos de Agroecologia ISSN 2236-7934 Vol 8, No. 2, Nov 2013 3

compras maiores pela busca de menor preço e prazo de pagamento. Isso, porém exige o gerenciamento das mercadorias visando sua disposição e estocagem de forma a não sobrecarregar a loja. Alguns produtos como sorvete, polpas de fruta necessitam espaço em refrigerador, já outros não podem ser empilhados sob risco de danificar sua aparência. Existem cerca de 20 produtores rurais, os quais podem ser divididos entre principais e eventuais. Produtores rurais principais são cerca de doze que em sua maioria vivem da agricultura orgânica, sendo alguns certificados por Sistemas Participativos de Garantia (SPGs). Estão localizados em sua maioria na região do Litoral Norte do RS, próximo ao município de Torres, sendo que dois produtores são oriundos da Região da Serra do RS (Caxias e Farroupilha). Estes 12 produtores são responsáveis pela maioria dos produtos in natura, como as frutas, legumes e as verduras (FLVs) da cooperativa e apresentam grande frequência de fornecimento (segundas, quartas e sextas). Muitos destes produtores também participam de feiras orgânicas que ocorrem semanalmente em Torres/RS e Porto Alegre/RS. Já os produtores que fornecem produtos eventualmente totalizam 08 e são também consumidores da cooperativa, que possuem alguma produção de vegetais, ou adquirem matéria prima na loja (farinha, grãos, etc.) e produzem pães, bolos e outros produtos para a cooperativa. Com o valor obtido no fornecimento dos produtos na cooperativa resulta em créditos para adquirir produtos na loja. As agroindústrias especializadas (distribuidoras) são em torno de vinte, que fornecem produtos industrializados e manufaturados em escala, destacando-se: Shambala, Aesia, Ecobio, Ecocitrus, Econativa e Mata Ecológica. São empresas que comercializam produtos certificados e padronizados e estão localizadas no RS e SC. As agroindústrias consideradas como parceiras (em torno de cinco) estão localizadas nas regiões de Torres e Serra gaúcha, e são responsáveis pela fabricação de alguns produtos como sorvete, balas, polpas de frutas orgânicas e pelo fornecimento de produtos in natura para a cooperativa. Os produtores rurais principais são responsáveis por cerca de 35% do faturamento da cooperativa tendo como produtos sobretudo as Frutas Verduras e Legumes, já os eventuais contam com 10% do faturamento. Apesar de representarem um pouco menos da metade do faturamento eles são responsáveis tanto por um número significativo de sócios como pela atração de consumidores com frequência para cooperativa. As agroindústrias são responsáveis pelo restantes 55% do faturamento. A cooperativa tem registro em Estatuto como Ecotorres produtos ecológicos. Conta com presidência, conselho diretivos e sócios e conta com apoio do Centro Ecológico, que é uma ONG prestadora de serviços em sistemas de produção de base ecológica, além de ter como objetivo a difusão de informações sobre agroecologia. Também conta com a experiência da COOPET, outra cooperativa de compra existente no município de Três Cachoeiras/RS. O sistema orgânico no Brasil está expresso na Lei nº 10.831, de 23 de dezembro de 2003, onde a cooperativas e os produtores optaram pelo Sistema Participativo de Garantia (SPG) da qualidade dos produtos orgânicos. Já as agroindústrias optaram pela auditoria de terceira parte, como processo de avaliação da conformidade. 4 Cadernos de Agroecologia ISSN 2236-7934 Vol 8, No. 2, Nov 2013

Conclusões Entre as agroindústrias distribuidoras o principal desafio da Cooperativa é manter uma escala de compra que resulte em menores preços. Para agroindústrias parceiras, o estabelecimento de projetos conjuntos para desenvolvimento de atividades de campo, treinamento ou de produtos, reforça a opção pelo nicho dos produtos orgânicos, já que se beneficiam da publicidade de produtos orgânicos vinculados em alguns meios de comunicação, visto que a cooperativa possui orçamento restrito para realizar investimentos em marketing. Para os produtores rurais principais, há vários desafios como viabilizar a entrega diária de produtos, na maioria perecível, e também da conscientização sobre a importância da cooperativa de consumidores, salientando que o preço praticado por elas não pode ser muito superior a feira, podendo assim o produtor aumentar suas vendas e ter seu produto permanentemente a disposição do cliente. Além disso, a busca por produtores mais próximos ao local de comercialização é a estratégia para manter a característica de cadeias curtas e dinâmicas. Entretanto, somente a produção local limita a ampliação da diversificação dos produtos comercializados na loja. Entre os produtores rurais eventuais, a cooperativa busca dentro do possível, chamar novos sócios e mantê-los mobilizados, pois é também objetivo da cooperativa manter todos ativos e bem informados, tentando assim superar o desinteresse apresentado por alguns. Nesse ponto, a integração pode ser de várias formas, inclusive com eventos gastronômicos que tem obtido bons resultados. A cooperativa Ecotorres demonstrou ter se constituído como uma base de uma ampla teia de relações, sendo o aspecto inovador que sua forma de organização possibilitou o surgimento de inovações de produto, acesso de produtores ao mercado e valorização da produção. A importância das organizações de apoio foi fundamental para o sucesso da Cooperativa. Entretanto, o desafio da manutenção de uma cadeia de suprimentos eficiente de produtos orgânicos constitui-se em uma estratégia fundamental para a continuidade e expansão da Ecotorres. Referências BORGUINI, R. G.; SILVA, M. V.; TORRES, E. A. F. S. Consumer opinion on organic foods. In: Congresso Internacional de Economia e Gestão de redes agroalimentares. Ribeirão Preto, SP. Anais de Ribeirão Preto: USP, 2003. SILVA, C. A. B.; BATALHA, M. O. Competitividade em Sistemas Agroindustriais: Metodologia e Estudo de Caso. In: II Workshop Brasileiro Sobre Gestão de Sistemas Agroalimentares. Ribeirão Preto: FEARP/USP, 1999. BATALHA, M.O.; SILVA, A.L. Gestão de cadeias produtivas: novos aportes teóricos e empíricos. In: (Des)Equilíbrio Econômico & Agronegócio. Viçosa: Editora da UFV, 1999. p. 249-266. WOOD JR, T.; ZUFFO, P. Supply chain management. Revista de Administração de Empresas, v. 38, n. 3, 1998 PISTELLI, Renata de S.; MASCARENHAS, Thais Silva. Organização de grupos de consumo responsável. São Paulo: Instituto Kairós, 2011. Cadernos de Agroecologia ISSN 2236-7934 Vol 8, No. 2, Nov 2013 5