A RESPONSABILIDADE SOCIAL COMO ESTRATÉGIA DE GESTÃO EMPRESARIAL



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o histórico da utilização de sistemas de gestão baseados em normas certificáveis, que iniciou com o sistema de gestão da qualidade, passou pelos sistemas de gestão do meio ambiente e da segurança e saúde ocupacional, mais recentemente emergindo com a utilização do sistema de gestão da responsabilidade social. O trabalho então aprofunda o tema sistema de gestão da responsabilidade social, abordando algu Palavras-chaves: Gestão empresarial, sistemas de gestão, responsabilidade social 2

1. Introdução No mundo globalizado atual, caracterizado por diferenças políticas, econômicas e sociais, observam-se cada vez mais os impactos que esta nova realidade tem levado à sociedade mundial. De acordo com Pfeifer (2003), se o processo de globalização permitiu aos seres humanos obterem um grau elevado de desenvolvimento tecnológico e econômico, também provocou maior desigualdade social no planeta. Além dos problemas agravados pelo processo de globalização, é importante citar também a ineficiência de muitos Governos em oferecer condições e serviços que promovam o bem estar social da população, o que colabora para a necessidade de participação de outros agentes em ações sociais no sentido de colaborar para melhorar as condições existentes. O aumento da conscientização da sociedade, muitas vezes carente de condições sociais justas, tem gerado uma reavaliação dos valores existentes, fazendo com que parte da responsabilidade por gerar desenvolvimento social, seja transferida para as empresas, que estão percebendo de forma crescente, que seu papel social é muito maior do que participar do desenvolvimento econômico e tecnológico de uma nação, gerar empregos ou pagar os impostos (GOMES,2003). A cobrança em cima das empresas se deve à conscientização da sociedade. Segundo Fonte (2005), tendo em vista que as empresas utilizam recursos pessoais e naturais do planeta para desenvolver suas atividades, devem oferecer retorno ou compensação para a sociedade, contribuindo para melhoria das condições sociais. Para Idowu et al.(2004), uma entidade que falha em fazer uma contribuição positiva para a sociedade, será percebida como sendo socialmente irresponsável. Alguns autores tais como Kliksberg (apud Gomes, 2003) apontam ser crescente a idéia de que sem desenvolvimento social paralelo, não haverá desenvolvimento econômico satisfatório, havendo necessidade de integração das políticas econômicas e sociais. Recebendo crescentes cobranças da sociedade e diante da situação competitiva do mundo globalizado, as empresas têm buscado encontrar diferenciais que lhe permitam manter e agregar parceiros e valor ao seu negócio. Como a tecnologia tem se desenvolvido cada vez mais, muitas vezes equiparando empresas, produtos e serviços fornecidos, as mudanças no conceito recente de competitividade têm levado empresas a se preocupar com o respeito que suas marcas possuem e conquistam junto as diversas partes interessadas (chamados stakeholders), quer sejam eles clientes, fornecedores, parceiros, empregados, sindicatos, governo, Organizações Não-Governamentais (ONGs), comunidade, consumidores, etc. Associando as cobranças e pressões recebidas da sociedade com a necessidade de obter diferencial competitivo perante seus públicos, algumas empresas já visualizaram um perfeito encaixe para atendimento de ambas, buscando cada vez mais, realizar ações e esforços para serem consideradas junto à sociedade, como empresas socialmente responsáveis. Segundo Pfeifer (2003), a responsabilidade social empresarial está fortemente embasada no conceito de desenvolvimento sustentável, cujo tripé está referenciado simultaneamente à sustentabilidade sócio-econômica e ambiental, proporcionando desenvolvimento socialmente justo, economicamente eficaz e ambientalmente correto. De acordo com Buffara (2003), o conceito de desenvolvimento sustentável difundiu-se no final da década de 80 surgindo no Brasil com força na década de 90, juntamente com o conceito de responsabilidade social corporativa. 3

Embora existam muitas empresas que atuam no campo social, a grande maioria realiza trabalhos de forma assistencialista e sem continuidade garantida, atenuando, mas não colaborando para resolver os problemas sociais. No entanto, algumas ferramentas foram criadas e tem sido utilizadas pelas empresas de forma a orientar a atuação e a gestão socialmente responsável. No mundo de negócios globalizado, que já considerou e mobilizou empresas a adotarem Sistemas de Gestão baseados em aspectos de qualidade (ISO9001), meio ambiente (ISO14001) e saúde e segurança no trabalho (OHSAS18001, BS8800), os aspectos de Responsabilidade Social tem ganhado força e padrões Internacionais tais como o AA1000 e a norma SA8000 (e até mesmo a Norma Brasileira de Responsabilidade Social NBR16001), estão se juntando às outras ferramentas e iniciativas, para aplicação da Responsabilidade Social no meio empresarial. Segundo Pfeifer (2003), depois da re-engenharia, dos programas de qualidade e das outras formas de gestão empresarial, a responsabilidade social é um movimento que vem ganhando amplitude no mundo do trabalho. As recentes mudanças do mercado globalizado então, tem levado empresas a estarem mais próximas da Responsabilidade Social, procurando cada vez mais entende-la e utilizá-la. De acordo com o Instituto Ethos de Responsabilidade Social, Responsabilidade Social é uma forma de gestão pautada num comportamento ético e transparente da empresa com os públicos com que ela se relaciona, utilizando estratégias que levem em conta o desenvolvimento sustentável da sociedade. No entanto, Responsabilidade Social e Desenvolvimento Sustentável são temas amplos e multidisciplinares que devem ser muito bem entendidos antes de sua aplicação. Considerando a amplitude do tema, a recente incorporação da Responsabilidade Social de forma estratégica na Gestão das empresas (tentando retirar das ações sociais o caráter exclusivamente assistencialista e amador) e as inúmeras dúvidas e receios do empresariado, é que se torna necessário estudar como têm se dado à adoção desta nova forma de gestão empresarial. O trabalho espera mostrar não somente algumas formas de aplicação do tema responsabilidade social nas empresas, mas principalmente intenciona conscientizar e mobilizar empresários de que pode-se obter melhoria de desempenho com responsabilidade social. Paralelamente à busca contínua de melhoria de desempenho com responsabilidade social, com certeza as empresas estarão colaborando para resolver ou amenizar alguns dos problemas sociais encontrados em diversos setores do país e do mundo. 2. Sistema de Gestão como Estratégia Empresarial Antes de iniciarmos um maior aprofundamento referente ao tema Responsabilidade Social, é interessante conhecer como se iniciou e através de quais conceitos e ferramentas as empresas começaram e continuam a adotar Sistemas de Gestão baseados em normas que permitem a verificação (auditoria) por Organismos Externos à Organização, conferindo certificados de conformidade reconhecidos nacional e mundialmente. Devido às grandes transformações advindas do recente mundo globalizado, as empresas privadas começaram a perceber o nível crescente de exigências por parte de seus consumidores, clientes, e da sociedade como um todo, quando da aquisição de produtos e serviços. Considerando o mercado altamente competitivo que caracteriza os diversos setores da economia, as empresas passaram a buscar ferramentas que oferecessem aos clientes os requisitos e diferenciais que os mesmos buscavam. Assim, aspectos relativos à qualidade, 4

meio ambiente, saúde e segurança no trabalho e mais recentemente responsabilidade social, tornaram-se gradativamente pauta em reuniões gerenciais e em ações estratégicas de empresas de todo o mundo. Com o reconhecimento das 4 normas e de seus sistemas de gestão, muitas empresas já se utilizam da integração de duas ou mais delas, visando uma gestão integrada que proporcione resultados satisfatórios para os aspectos envolvidos. 2.1 Histórico da utilização de Sistemas de Gestão baseados em Normas Certificáveis Com o aumento do grau de exigência dos consumidores e clientes para com os produtos e serviços adquiridos, as empresas buscaram assimilar procedimentos, programas e sistemas de gestão que permitissem não somente melhorar seus processos e seus produtos, como também passar esta imagem a todos os envolvidos em suas atividades (chamados stakeholders). Assim, as empresas buscaram inicialmente ferramentas e programas de controle (tais como o TQC Total Quality Control) e gerenciamento da qualidade (tais como o TQM Total Quality Management), que permitiram grandes saltos na qualidade de produtos e serviços oferecidos. Segundo Felipe (2001, p.15), a busca por uma gestão capaz de atender a filosofia da qualidade total, fez com que surgisse no mundo dos negócios, sistemas de gestão que atendessem as mais diversas exigências das partes interessadas (stakeholders). O primeiro quesito a ser considerado foi a qualidade. Em 1987, a ISO (International Organization for Standardization) lançou a série de normas ISO 9000, que criou um padrão no processo de gerenciar produtos e serviços no que se refere aos aspectos de qualidade. A grande difusão e sucesso das normas ISO de qualidade e de seus sistemas de gestão, trouxeram muita acreditação para as empresas, que passaram a perceber no processo de certificação, uma grande oportunidade de obter resultados, atestar a qualidade de suas operações e obter reconhecimento do mercado. Após o estabelecimento das normas de qualidade e o sucesso e aceitação das mesmas, uma nova realidade surgiu em virtude de impactos ambientais causados pelas empresas e visualizados pela sociedade. Isto ocorreu muito em função da ação de entidades ambientais e de alguns acidentes ambientais ocorridos em todo o mundo. Com isso, ganhou importância o tema meio ambiente e a ISO lançou em 1996 mais uma série de normas, a ISO 14000, que trata de questões especificamente ambientais. Atualmente a norma certificável ISO 14001 se encontra na revisão 2004. Estabelecidas às normas de qualidade e meio ambiente, o próximo tema a ganhar força dentro dos sistemas de gestão das empresas foi o de saúde e segurança dos trabalhadores. Com isso, a norma OHSAS 18001, lançada em 1999 por organismos nacionais de normalização e por algumas empresas certificadoras, começou a ganhar formça tendo em vista que é uma norma sobre sistema de gestão da segurança e da saúde no trabalho. Como última descoberta das empresas para reconhecimento de seus clientes e enriquecimento de seus sistemas de gestão, surgiu o tema responsabilidade social, que vem levando empresas a se certificarem e mostrarem que são socialmente responsáveis. Dentre as ferramentas de responsabilidade social, a norma internacional SA-8000, lançada em 1997 e atualmente na versão 2001, vem sendo crescentemente utilizada no meio empresarial para introdução da responsabilidade social de forma sistêmica, através de seu sistema de certificação reconhecido internacionalmente. Neste contexto, é importante citar conclusões encontradas em Porter (1998), Donaire (1995), Tachizawa (2001) e Silva (2002), apud Alberton (2003), de que a rentabilidade, bem como a 5

vantagem competitiva das empresas, são fortemente influenciadas pela capacidade dessas de antecipar-se e reagir frente às mudanças sociais e políticas que ocorrem no ambiente dos negócios. A adoção de sistemas de gestão baseados em normas passíveis de certificação, é uma tentativa de antecipação e de reação das empresas, para as mudanças que o mundo dos negócios tem observado, embasada no aumento da conscientização da sociedade. 3. Sistema de Gestão da Responsabilidade Social De acordo com Estes (1997, apud Paczkowski, 2003), no decorrer dos últimos duzentos anos, a obsessão pelo lucro e os prejuízos causados à sociedade e ao meio ambiente levaram a uma redefinição dos objetivos, direitos e deveres do meio empresarial. Este processo, juntamente com outros fatores, tais como as dificuldades de muitos governos em atender as demandas sociais existentes, tem levado a uma redefinição de papéis em diversos setores da sociedade. Desta forma, a atuação do governo, muitas vezes tomando ações de interesse privado, e da iniciativa privada em propor ações de interesse público, é reflexo da crescente transformação e redefinição dos papéis do Estado, do mercado e da sociedade (GARCIA, 2004). Segundo Cooney (2004, p.308), na última década, as empresas tem crescentemente adotado várias iniciativas de responsabilidade social corporativa para dirigir os impactos sociais e ambientais de suas operações, como resultado de uma larga pressão de consumidores e investidores. A intervenção das empresas no processo social é um processo antigo, porém foram sempre baseadas em ações paliativas e emergenciais, tais como o assistencialismo. O assistencialismo (filantropia, caridade), conceitos ainda não muito bem distintos, são formas tradicionais e mais antigas de intervenção social, tais como doações e trabalho voluntário, sendo utilizadas até os dias atuais por muitas empresas, mas que não geram resultados definitivos ou mudanças significativas (GARCIA, 2004). As ações de responsabilidade social podem incluir práticas de filantropia empresarial ou assistencialismo, porém não devem se restringir a elas. Muito mais do que fazer assistencialismo, é necessária a realização de ações concretas que realmente possam provocar mudanças definitivas. De acordo com Kraemer (2004), nos últimos anos perceberam-se grandes progressos na área de gerenciamento e relatório ambiental, ocorrendo mais recentemente, o mesmo processo quanto à conscientização sobre responsabilidade social e o conceito de sustentabilidade. Buffara (2003), afirma que o consumidor, como um agente independente, está cada vez mais interessado por essas questões, o que leva a crer que elas venham a se tornar uma regra no mercado global. O processo de intervenção social empresarial recebeu opções e novo fôlego nos últimos anos, tornando-se um campo em crescente expansão. Segundo Garcia (2004), o campo da intervenção social nos dias atuais é constituído por um conjunto de práticas bastante diferenciadas, disputadas por agentes igualmente diversos. Neste contexto, recentemente foram criadas normas e padrões no sentido de disseminar e padronizar em todo o mundo, os conceitos relativos à responsabilidade social nas empresas. Dentre as ferramentas e iniciativas que podem ser citadas estão: norma internacional de responsabilidade social SA-8000, o padrão AA1000 (AccountAbility 1000), GRI (Global Reporting Initiative) para relatórios de sustentabilidade, Global Compact (programa desenvolvido pela Organização das Nações Unidas) e o Livro Verde na Europa. No Brasil, 6

destacam-se o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social (Instituto Ethos) como colaboradores no desenvolvimento de indicadores e práticas de responsabilidade social. Mais recentemente, foi lançada a norma brasileira de responsabilidade social ABNT NBR 16001:2004 - Responsabilidade social - Sistema da gestão Requisitos, que ainda não tem sido largamente utilizada no mercado. A ISO (International Organization for Standardization) já tentou criar uma norma única e mundial de certificação social, porém as tentativas ainda não se consolidaram. Os trabalhos atuais parecem estar mais próximos de chegar a um consenso, para que em breve tenhamos uma norma ISO social. O grupo de trabalho para elaboração da norma ISO 26000 de Responsabilidade Social é conduzido pelo Brasil (representado pela Associação Brasileira de Normas Técnicas-ABNT) e pela Suécia (representada pelo Swedish Standard Institute-SIS) e terá a responsabilidade de finalizar a norma em três anos, devendo estar disponível em 2008 (GUIA DE COMPATIBILIDADE DE FERRAMENTAS DO INSTITUTO ETHOS, 2005). Dentre as ferramentas existentes, a SA-8000 tem sido reconhecida internacionalmente por seu sistema de certificação, que atesta a operação de um sistema de gestão da responsabilidade social praticada pela empresa, baseado em requisitos tais como proibição ao trabalho infantil, proibição ao trabalho forçado, garantia de saúde e segurança para os trabalhadores, garantia de liberdade de associação e direito à negociação coletiva, proibição de discriminação, proibição de práticas disciplinares incorretas e abusivas, garantia de jornada de trabalho e remuneração justa. De acordo com Oliveira (2002), a missão da SA-8000 é: Melhorar as condições do trabalho no mundo, promovendo o respeito aos direitos dos trabalhadores; Proporcionar a padronização em todos os setores de negócios e em todos os países; Trabalhar em parceria com organizações trabalhistas e de direitos humanos do mundo todo; Proporcionar um incentivo que beneficie a comunidade empresarial e consumidores através de uma abordagem, na qual ambas as partes saiam ganhando; Prover uma base única para realização de auditorias. Independente da ferramenta ou iniciativa utilizada é importante considerar a utilização de forma sistêmica e sempre que possível, envolver as partes interessadas da empresa no processo, de forma a agregar valor para o máximo de partes possível. De acordo com Almeida (1999, apud Karkotli, 2002), vários são os benefícios relatados da utilização de investimentos em responsabilidade social, dentre eles: evita ou reduz a possibilidade de acusações de injustiça social e ambiental, protege a empresa contra a impossibilidade de contratar funcionários qualificados ou perda de apoio dos existentes, pode evitar gastos extras com passivos ambientais, pode evitar restrições às operações e protege contra dificuldades de obter empréstimos. Dentre os benefícios citados por Lisboa Neto (2003) para as empresas que se preocupam com o social, pode-se citar a valorização da imagem, a difusão da marca, a fidelidade dos clientes, aumento nas vendas e retorno para os acionistas, além da colaboração para amenizar desigualdades sociais existentes nos dias de hoje. Melo Neto e Froes (2001, apud Pfeifer, 2003) ainda relacionam benefícios tais como contribuição decisiva para sustentabilidade e desempenho empresarial, melhoria do clima organizacional, fortalecimento da marca, motivação dos colaboradores, melhoria de relações e maior fidelidade dos clientes. 7

Os benefícios reais e potenciais, juntamente com atuação socialmente responsável das empresas, gerando valor para outras partes interessadas no negócio, sinalizam que a atuação social das empresas tem sido percebida como uma variável importante no processo de avaliação das mesmas, sendo vista de forma crescente como um indicador de competitividade. Importante ressaltar que a atuação mais planejada do empresariado, através de ações concretas que forneçam efetivamente condições de evolução para o bem estar social, devem ser acompanhadas pela sociedade, de forma a não permitir a redução da responsabilidade do Estado para a realização de políticas públicas e fornecimento de ações sociais. 4. Conclusão O trabalho mostrou a crescente importância que o tema responsabilidade social tem obtido na sociedade, levando a participação de outros agentes no processo, visando colaborar para melhoria das condições sociais. Fruto de cobranças da sociedade, insatisfeita com a ação governamental no fornecimento de condições sociais dignas, as empresas estão cada vez mais se preocupando com os impactos de suas operações e com sua ação social. A responsabilidade social praticada pelas empresas, que sempre foram baseadas em ações de cunho assistencialista, que geralmente não levam resultados efetivos e definitivos, começa a ganhar novos ares com iniciativas e ferramentas que tentam proporcionar um planejamento e gerenciamento das práticas realizadas. Desta forma, após surgirem sistemas de gestão da qualidade, de meio ambiente, de saúde e segurança no trabalho, tem emergido nos últimos anos o sistema de gestão da responsabilidade social. Existem diversas práticas e iniciativas de responsabilidade social, que alguns autores já relatam trazer benefícios para as empresas, dentre as quais tem se destacado a norma internacional SA-8000, reconhecida mundialmente através de seu processo de certificação. Portanto, a necessidade de praticar responsabilidade social de forma mais planejada e sistêmica está cada vez mais sendo reconhecida no meio empresarial, o que leva a acreditar que pode ser um diferencial competitivo num futuro próximo. A emergência e a valorização do tema mostram que, desde que seja considerada como ferramenta de gestão, a responsabilidade social pode possibilitar às empresas, obter melhoria de desempenho sendo socialmente responsáveis. Referências ALBERTON, A. Meio Ambiente e Desempenho Econômico-Financeiro: O impacto da ISO14001 nas empresas brasileiras. 2003. Tese. (Doutorado em Engenharia de Produção) Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, UFSC, Florianópolis. BUFFARA, L. C. B. Desenvolvimento sustentável e responsabilidade social: um estudo de caso no grupo O Boticário. 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, UFSC, Florianópolis. COONEY, S. A broader role for the commonwealth in eradicating foreign sweatshops? Melbourne University Law Review, Erradicating Foreign Sweatshops, vol.28, p.290-342, 2004. FELIPE, D. L. Os sistemas Integrados de Gestão (ISO9000, ISO14000, OHSAS18001) como indicadores de responsabilidade social (SA8000) em processos produtivos de indústrias de confecções no Espírito Santo Brasil. 2001. Dissertação (Mestrado Em Engenharia de Produção) Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, UFSC, Florianópolis. FONTE, A. P. S. D. Responsabilidade Social como tecnologia de gestão: uma abordagem crítica a partir do estudo de caso em uma empresa do setor de manipulação farmacêutica da região metropolitana de Vitória. 2005. Dissertação (Mestrado em Administração) Programa de Mestrado em Administração, UFES, Vitória. GARCIA, J. O Negócio do Social. Ciências Sociais passo-a-passo nº 40, Editora Jorge Zahar, Rio de Janeiro, 2004, 61 p. 8

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