O Modelo de Concessão Ferroviária no Brasil sob a Ótica dos Usuários



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Resumo O Modelo de Concessão Ferroviária no Brasil sob a Ótica dos Usuários Autoria: Paulo Tarso Vilela de Resende, Paulo Renato de Sousa, Paulo Rodrigues Cerqueira O transporte ferroviário é de extrema relevância para o desenvolvimento do Brasil, contudo, algumas regras estabelecidas não favorecem a melhoria da eficiência operacional. Nesse contexto, a percepção sobre o trabalho realizado pelas concessionárias é de grande importância para identificar os possíveis gargalos e problemas que estejam limitando o potencial de utilização do modal ferroviário, tendo em vista os parâmetros regulatórios dos sistemas de concessão. Com o propósito de contextualizar essa discussão para o cenário brasileiro, 40 usuários foram amostrados e analisados por uma pesquisa descritiva do tipo survey em itens como: entendimento da missão da agência reguladora e associações de classe; disponibilidade; trilhos; serviços complementares, e, por fim, expectativa geral. Os resultados apontam que, a partir do modelo de concessão ferroviária adotado no Brasil, a percepção sobre o trabalho realizado pelas concessionárias é razoável, com alguns entraves pontuais como flexibilidade e abrangência da malha, valor das tarifas cobradas pelo serviço prestado, transporte intermodal, localização e serviços. Isso demonstra que, apesar dos grandes investimentos privados nos últimos anos, grande parte da malha ferroviária brasileira opera longe da condição ideal. 1 Introdução Dez anos já se passaram desde os primeiros movimentos de privatização das ferrovias brasileiras. A adoção do termo privatização tem como objetivo facilitar o entendimento em relação que é realmente de concessão. Em 1996, a antiga Rede Ferroviária Brasileira (RFFSA) apresentava um prejuízo de um milhão de dólares por dia, transformando cada ano em pesadelo orçamentário para o Governo Federal. A infraestrutura (trilhos, pontes, viadutos, etc.) encontrava-se absolutamente deteriorada, e o material rodante (vagões e locomotivas) estava abandonado e obsoleto. Os pátios de manutenção careciam de investimentos robustos e a receita com o transporte era suficiente para pagar os funcionários. Enfim, a situação era de total descontrole gerencial, já que havia um sistema ferroviário que se aproximava rapidamente da inutilidade dispendiosa. O Governo Federal então tomou a decisão de conceder à iniciativa privada a exploração ferroviária, usando as antigas superintendências da RFFSA como elemento de composição dos lotes de concessão. Além disso, foram respeitados alguns critérios de corredores de exportação, eixos internos de fluxos de produtos, principalmente minério de ferro, e natureza das cargas. Não foi o melhor modelo de concessão, mas o que era possível na época. Naquele momento, as ferrovias brasileiras passaram a ser exploradas por empresas privadas, algumas com vocação de produção e exportação, outras com vocação de transporte, e uma minoria sem vocação. A malha ferroviária brasileira passou então a receber investimentos substantivos, tanto para recuperar o que estava deteriorado, quanto para aumentar o volume de cargas, trazendo de volta a luta por um maior equilíbrio na matriz de transportes do Brasil. Hoje, as ferrovias participam com cerca de 25% de tudo o que é transportado no País. Foram realizados importante investimentos que visaram o crescimento percentual do modal. Em alguns trechos passou-se a movimentar cargas com maior valor agregado e peso bruto mais baixo, concorrendo com outros modais de transporte, sobretudo o rodoviário. Além disso, são observados avanços consideráveis na formação de um grupo de ferroviários altamente qualificado com alto conhecimento de estratégia, gestão de negócios, comprometidos com a 1

logística integrada, com a visão sistêmica das cadeias de suprimentos, e voltados para fazer do negócio ferroviário brasileiro uma importante fonte de competitividade. Agora é chegada a hora de também rever o que está foi feito de errado, o que falta ser feito e quais os caminhos a serem seguidos. Em primeiro lugar, o País não pode mais suportar a falta de planejamento integrado entre as concessionárias. As prioridades de programação, formação de cargas, manejo de vagões, enfim, operações de movimentação não acontecem de forma a garantir o menor tempo possível de deslocamento da origem para o destino, o que é básico para uma logística eficiente. Essa falta de integração reduz o potencial de tomada de decisão a favor da ferrovia, principalmente para aqueles usuários que precisam disponibilizar suas cargas em tempos reais compatíveis com restrições de necessidades dos clientes, ou seja, quando o cumprimento do prazo de entrega é fator fundamental para a manutenção das relações negociais. Além disso, as linhas passam excessivamente por dentro de cidades - são as famosas passagens de nível, o que prejudica imensamente a eficiência do deslocamento. O caso da Região Metropolitana de São Paulo é típico de país subdesenvolvido, onde os conflitos entre o transporte de passageiros e cargas é uma constante, apesar das janelas operacionais combinadas. Há diversas invasões das faixas de domínio das ferrovias o que aumenta os riscos de acidentes e diminui a eficiência operacional. Do lado estratégico, existe um movimento claro de redução do número de players no mercado ferroviário brasileiro, acompanhado de investimentos cada vez maiores, sobretudo nos corredores agrícolas, escoando a produção do Centro-Oeste e Norte do País para os portos do Sudeste e do Sul. Além disso, novos portos se apresentam como soluções de destino, como os do Nordeste e também do Norte. Logo, novas fronteiras ferroviárias se abrirão e novos negócios farão parte da matriz de transportes do Brasil. Nesse contexto, acredita-se, tecnicamente, que o modo ferroviário pode atingir até 35% de participação na matriz. Diante desses desafios, e agora com um novo período de gestão pública se descortinando, é preciso que algumas ações sejam tomadas no contexto das ferrovias. Entre elas, aprimorar o modelo de concessão, garantir melhores condições de operação urbana de movimentação de cargas, limitar e fiscalizar com mais assertividade e rigor as invasões das faixas de domínio, instalar instrumentos de controle de níveis de serviço entre concessionárias e, sobretudo, garantir ambientes mais favoráveis de investimentos privados na expansão física da malha ferroviária. Basicamente, o estudo está divido em quatro seções principais: (i) Na Seção 2, com base na revisão bibliográfica, os principais conceitos relacionados com a concessão ferroviária são abordados; (ii) Na seção 3 referente à metodologia, os procedimentos de coleta de dados, tratamento de dados e caracterização da amostra são apresentados; (iii) Na seção 4, resultados e análises são expostos em três sub-seções principais Perguntas sobre a Agência Reguladora e Associações de Classe, Percepção sobre o trabalho realizado pelas concessionárias nas ferrovias e Postura das concessionárias, (iv) Finalmente, na quinta e última seção, são realizados considerações que concluem o trabalho, apresentando as principais questões do estudo. 2

2 Referencial Teórico 2.1 Introdução A matriz de transportes brasileira é ainda altamente voltada para o modal rodoviário. Aproximadamente 62% do volume de movimentação de cargas é realizado através das rodovias nacionais, enquanto somente 24% da logística de transporte é feito pelo modal ferroviário (FIOCCA, 2005). De acordo com Caixeta e Martins (2001), os efeitos da infraestrutura nas condições de eficiência da economia são essenciais, uma vez que a disponibilidade de infraestrutura adequada aumenta a eficiência do sistema produtivo e reduz o custo unitário dos produtos, beneficiando todas as empresas. Em comparação com os EUA, observa-se que este país possui números mais equilibrados, com destaque para o setor ferroviário, responsável por 38% da matriz de transporte, conforme GRAF.1: Gráfico 1: Distribuição do transporte no Brasil comparando com outros países. Fonte: COPPEAD / CNT, 2008. Isto gera implicações de diversas naturezas para o Brasil, por exemplo, a sobrecarga do transporte de cargas nas rodovias nacionais. Além disso, a eficiência e a capacidade logística de intermodalidade também ficam comprometidas. Como cada vez mais se busca redução nos custos logísticos e maior confiabilidade no serviço prestado, o uso de mais de um modal no Brasil surge como uma grande oportunidade para as empresas se tornarem mais competitivas, visto que o modal rodoviário é mais competitivo em trechos acima de 500 km. (NAZÁRIO, 2007). Por último, a condição das estradas brasileiras aumenta o custo de transporte, além de ser alvo constante de roubo de carga, influenciando diretamente nos gastos relativos ao seguro de carga. Diante disso, o movimento de privatização da malha ferroviária nacional contribuiu bastante para o crescimento e diversificação das opções de transporte de cargas no país. Um maior aporte de investimentos foi aplicado para melhoria da condição operacional da via permanente das malhas, substituição de material rodante sucateado (vagões e locomotivas) e, principalmente, introdução de novas tecnologias de controle de tráfego. Diante disso, houve também o aquecimento da indústria diretamente ligada ao transporte férreo no Brasil, tal como a de vagões, a qual teve um crescimento significativo nos últimos anos. Do total de 29.917 km, 27.917 km foram concedidos à iniciativa privada subdivididos em 11 malhas ferroviárias: Malha Sul (ALL - América Latina Logística), Malha Nordeste (CFN 3

Companhia Ferroviária do Nordeste), Malhas da EFVM (Estrada de Ferro Vitória-Minas) e EFC (Estrada de Ferro Carajás) para a Companhia Vale do Rio Doce, Malha Centro-Leste (Ferrovia Centro Atlântica), Malha Oeste, Paulista e da Ferronorte (Brasil Ferrovias), Malha da Ferroeste (Ferrovia Paraná S/A), Malha Tereza Cristina (Ferrovia Tereza Cristina) e, por fim, Malha Sudeste (MRS Logística S/A). A FIG. 1 ilustra a distribuição dessas malhas pelo território nacional. FIGURA 1: Concessão de malhas ferroviárias. Fonte: Associação Nacional de Transporte Ferroviário ANTF, 2008. Segundo dados da ANTF (2008), houve um aumento significativo no volume transportado na ferrovia brasileira entre 1997 e 2007, e com ganho na participação de cargas gerais. Houve uma queda significativa também no índice de acidentes na ordem de 62%. Além disso, a entrada do capital privado nas ferrovias gerou uma substituição gradativa do perfil e do montante de investimento aplicado na malha ferroviária nacional. Enquanto em 1997 a União investiu R$162 milhões e a iniciativa privada R$341 milhões, já em 2007 o Governo brasileiro investiu R$ 140 milhões, enquanto as concessionárias aplicaram o montante de R$ 2.6 bilhões em investimentos. Apesar dos avanços, ainda há muitos problemas que comprometem o pleno desenvolvimento da malha ferroviária brasileira. Lang (2007) menciona que, entre os principais, destacam-se: - Invasões nas faixas de domínio das ferrovias existem centenas de invasões na faixa de domínio da malha concedida, sendo a maioria em grandes centros urbanos e herdadas da RFFSA; - Passagens em nível críticas (principalmente nos centros urbanos); - Gargalos logísticos incluem os conflitos entre o tráfego ferroviário e os de veículos e pedestres e os gargalos físicos com um traçado longo, sinuoso e com rampas fortes, diminuindo o desempenho dos trens; - Falta de padronização da bitolas; - Necessidade de expansão integrada da malha obstáculos na regulamentação do setor e barreiras para a importação de material rodante e equipamentos do exterior. A produtividade de transporte fica comprometida, como em casos que a velocidade dos trens tem de ser drasticamente reduzida em função de trechos urbanos mal sinalizados ou em função da baixa conscientização da população local quanto a um comportamento seguro 4

próximo às linhas férreas. Deve-se ressaltar ainda que os custos de implementação de novas ferrovias são considerados elevados em comparação a outros modais, como o rodoviário. Por outro lado, os custos de manutenção são relativamente menores. Em suma, pode-se dizer que o processo de concessão ferroviário brasileiro indubitavelmente trouxe benefícios para o país, ao mesmo tempo em que lançou novos desafios para as empresas concessionárias em termos de necessidade de melhoria contínua da malha nacional. Como forma de se entender melhor as condições de operação dessas empresas e a maneira como se deu o processo de privatização, a próxima seção discute o modelo de concessão adotado no Brasil. 2.2 Modelo de Concessão Brasileiro De acordo com o DNIT (2008), a implantação da malha ferroviária brasileira teve o objetivo de interligar vários estados do país, principalmente regiões próximas aos portos de Parati, Angra dos Reis e Santos. Segundo Castro (2002), a desestatização do setor ferroviário encontra-se no terceiro ciclo de evolução institucional. O primeiro ciclo refere-se aos primeiros investimentos no século XIX, promovidos pelo capital inglês interessado nas altas taxas de retorno, tendo a Estrada de Ferro Santos-Jundiaí (a Inglesa ) como seu marco. O segundo ciclo teve como característica principal a nacionalização das malhas existentes através da contração de empréstimos no âmbito internacional. De acordo com Castro (2002), em 1929, o Estado já era dono de 67% das companhias ferroviárias brasileiras e responsável pela administração de 41% da rede (cerca de 10.000 km). A segunda fase teve como ícone a criação da RFFSA (Rede Ferroviária Federal S.A.) no ano de 1957 e foi motivada pelo desejo do Governo em unificar a administração da malha ferroviária nacional, então composta por 18 linhas que já totalizavam 30.000 km (LANG, 2007). Martins e Cruz (2004) ainda afirmam que essa nova fase teria como característica marcante o maior controle do Governo ao dispor de instrumentos para reorganizar as malhas de ferro, equacionar os problemas e efetuar um planejamento global. Os resultados foram positivos, porém o incentivo à indústria automobilística acabou por desviar o foco de investimentos do setor ferroviário (RAILBUSS, 2004). O terceiro ciclo se iniciou com a inabilidade pública, ao passar dos anos, em gerir eficazmente a rede ferroviária nacional sob a égide da RFFSA. No ano de 1984, a dívida é transferida ao Tesouro Nacional e é criada a Cia. Brasileira de Trens Urbanos, que trataria do transporte de passageiros dos grandes centros aos subúrbios com o objetivo de aliviar a já pesada estrutura administrativa da RFFSA (CASTRO, 2002). Entretanto, a gestão da RFFSA continuava deficitária em função também de crises econômicas que rareavam os investimentos necessários e optou-se por incluí-la no PND (Programa Nacional de Desestatização) em 1992, para que fossem feitos estudos pelo BNDES na busca de uma melhor solução para as bases técnicas e jurídicas da desestatização. De acordo com o DNIT (2008), o volume de investimentos do Governo Federal na malha ferroviária foi reduzido significativamente entre 1980 e 1992. Eram necessários investimentos para conter o desequilíbrio técnico-operacional devido à degradação da malha e do material rodante. A RFFSA não conseguia gerar recursos suficientes para pagar a dívida contraída nos anos anteriores. De acordo com o BNDES (2000), os principais motivos que levaram à concessão das malhas do país são: - aumento do investimento na recuperação, modernização e ampliação da infraestrutura; 5

- captação de recursos privados a fim de alavancar o setor; - redução do número de acidentes e aumento da produção; - retorno das encomendas de novos equipamentos e sistemas, recuperação do material degradado. Segundo a ABIFER (Associação Brasileira da Indústria Ferroviária), foram fabricados apenas seis vagões no Brasil em 1996. Só entre janeiro e setembro de 2004, já haviam sido produzidos 3.116 vagões (ANTF, 2008); - capacidade da ferrovia para adquirir um novo papel na matriz modal brasileira. Finalmente, no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, as privatizações foram consideradas prioridade e deu-se início ao processo de desestatização da malha, conforme TAB. 1, incluindo a RFFSA. TABELA 1 A desestatização das malhas da RFFSA Malhas Regionais Data do Leilão Concessionárias Início da Operação Extensão Oeste 05.03.1996 Ferrovia Novoeste S.A 01.07.1996 1.621 Centro-Oeste 14.06.1996 Ferrovia Centro-Atlântica S.A. 01.09.1996 7.080 Sudeste 20.09.1996 MRS Logística S.A. 01.12.1996 1.674 Tereza Cristina 22.11.1996 Ferrovia Tereza Cristina S.A. 01.02.1997 164 Nordeste 18.07.1997 Cia. Ferroviária do Nordeste 01.01.1998 4.534 Sul 13.12.1998 Ferrovia Sul-Atlântico S.A. atualmente 01.03.1997 6.586 ALL-América Latina Logística S.A. Paulista 10.11.1998 Ferrovias Bandeirantes S.A 01.01.1999 4.236 Total 25.895 Fonte: RFFSA e BNDES (2005). Segundo Kruger (2003), a motivação da privatização estava no alcance da intermodalidade e melhoria na ligação entre portos e centros produtores, gerando resultados que diminuiriam em muito o chamado risco ou custo Brasil. De acordo com Barbieri, Silva e Agnelli (2003), entre os anos de 1996 e 1998 houve a desestatização da malha férrea nacional, influenciada pela incapacidade do Estado em manter os elevados investimentos necessários para manutenção em modernização da malha ferroviária. Os autores ainda mencionam como um dos motivos a necessidade de elevar a capacitação das ferrovias para assumir um novo papel no sistema de transportes brasileiros. Castro (2002) explicita as definições que moldaram o processo de concessão: - Reestruturação da RFFSA, segundo o modelo de organização por linha de negócio de transporte de cargas monolítico, englobando todas as funções (manutenção e expansão da infraestrutura; operação; controle de tráfego; sistemas; marketing e finanças) - Subdivisão da RFFSA em cinco malhas regionais (Sul, Sudeste, Oeste, Centro-Leste e Nordeste) e uma estrada de ferro isolada (Tereza Cristina), definidas sob os critérios de unicidade de funções em cada malha. Segundo Lang (2007), o principal motivo para essa agregação seria a intenção de se formarem unidades de negócio independentes e propiciar uma melhor configuração operacional. Entretanto, a CNT (2008) expõe que esse modelo dificulta a operação ferroviária intermodal e exige uma forte regulamentação do transporte por tráfego mútuo (entre duas concessionárias) e direito de passagem. - Transferência pela RFFSA da posse dos bens das malhas regionais, necessários à operação e ao seu apoio, a serem integrados ao conjunto a ser privatizado: arrendamento dos bens imóveis operacionais e de apoio; venda dos bens operacionais de pequeno valor unitário. - Licitação da concessão, sob a modalidade leilão, com pré-identificação dos interessados, abrindo-se o valor mínimo da concessão cumulada com o valor do arrendamento dos bens operacionais e a venda dos bens de pequeno valor vinculados a cada uma das malhas. 6

Teoricamente, os princípios que regeram o processo de concessão seriam o de fomentar a concorrência intermodal (entre modais diferentes), a concorrência modal (somente no ferroviário), complementaridade intermodal (integração dos modos de transporte) e a complementaridade intramodal (integração das operadoras e da operação ferroviária). Além disso, tinha-se como objetivo preservar e expandir o modal ferroviário e promover um sistema ferroviário seguro e eficiente no que tange aos aspectos operacionais. Com relação às tarifas, preservar a modicidade tarifária (nas situações em que há insuficiência de competição efetiva e em que as tarifas propiciam receitas superiores às necessárias para a manutenção do sistema e atração de investimentos), proibir a prática de preços predatórios e garantir a disponibilidade de informações de custos confiáveis (CASTRO, 2002). A próxima seção explicita a metodologia utilizada neste estudo para analisar o modelo de concessões ferroviárias no Brasil na opinião dos usuários. 3 Metodologia A pesquisa do tipo survey é o meio mais flexível para obter dados de entrevistados. Assim, a pesquisa descritiva do tipo survey foi concebida por possibilitar: 1. a descrição de facetas quantificáveis do universo em estudo; 2. o emprego de técnicas padronizadas para coletar dados primários originados com a finalidade de comprovar a premissa; 3. o exame de relações entre as variáveis; 4. a generalização de resultados da amostra para o conjunto típico; 5. a recomendação de cursos de ação. (MALHOTRA, 2001). Os resultados podem ser manipulados de muitas maneiras, permitindo comparar as diferenças entre os grupos e os efeitos de variáveis independentes ou a prever o comportamento futuro. De acordo com a ANTT (2007) há no Brasil, aproximadamente 2.680 usuários de ferrovias conforme TAB.2. Foram selecionados 164 usuários. Inicialmente obteve-se uma amostra de 48 respondentes. Um total de 40 preenchidos completamente. Assim, de acordo com Hair et al. (2005), devem-se eliminar os formulários e /ou variáveis problemáticas, ou seja, aqueles que apresentam muitos dados ausentes. Ao final deste procedimento, totalizam 40 respondentes válidos para análise de dados. A amostra foi considerada significativa em função da reprodução de dados similares nos questionários aplicados. TABELA 2 Transporte de cargas características da demanda Concessionárias Clientes Principais produtos transportados NOVOESTE 17 Minério, soja e farelo, combustível e carga geral. FCA 828 Produto siderúrgico, minério, cimento e material de construção, soja e farelo. MRS 229 Minério, soja e farelo, produto siderúrgico e carvão. FTC 29 Carvão e coque, cimento e cerâmica. ALL 443 Produto agrícola, soja e farelo, combustível, cimento e fertilizante. FERROESTE 60 Produto agrícola, soja e farelo, cimento e adubo. EFVM 674 Minério, produtos siderúrgico e agrícola, e carvão. EFC 227 Minério, produtos siderúrgicos, soja e farelo e combustível. CFN 71 Minério, produtos siderúrgicos e agrícola, carvão, combustível e cimento. FERROBAN 64 Minério, fertilizante, soja e farelo, açúcar, combustível e produto agrícola. FERRONORTE 38 Soja e farelo, fertilizante e combustível. Fonte: ANTT (2007) Na primeira parte do estudo, os respondentes informaram dados gerais sobre a empresa, buscando identificar, principalmente, estado de origem, faturamento, setor, principais plantas no Brasil, variação no volume transportado via modal ferroviário desde a concessão, principais produtos transportados e nível de satisfação. Tendo como base essa amostra, constatou-se que 60% das empresas têm faturamento acima de 500 milhões de reais, 7

caracterizando a representatividade desta pesquisa como de grande porte na economia nacional. Existem, então, fortes evidências de que o modal ferroviário no Brasil é majoritariamente, utilizado por grandes empresas. A explicação para tal fato reside, principalmente, nas características da carga e deficiência operacional de algumas concessionárias em viabilizar, principalmente, o transporte de carga geral. Os estados de São Paulo, Minas Gerais, Bahia e Rio de Janeiro são os que mais possuem entrevistados da amostra, chegando a 64% do total. Pode-se perceber ainda que a grande maioria das empresas da amostra está localizada no estado de São Paulo (30%). Os setores pesquisados se enquadram, majoritariamente, com 64% da amostra em agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aqüicultura e Indústrias extrativas de carvão mineral, petróleo, gás natural, minerais metálicos. Outros mencionados: manufatura, transporte e armazenagem, fábrica de alumínio, papel, setor sucroalcooleiro e siderurgia. As concessionárias mais utilizadas pelas empresas entrevistadas foram a FCA, ALL e MRS. As concessionárias FCA e MRS têm grande abrangência no estado de Minas Gerais, que tem uma localização estratégica entre os estados do Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Goiás, Distrito Federal e Bahia. Isso permite o escoamento rápido de produtos, tanto do próprio estado como dos demais. A ALL abrange os estados do sul do Brasil e expandiu para Argentina, ligando sua malha a Buenos Aires e ao Pacífico. A variação no volume transportado via modal ferroviário desde a concessão tem aumentado conforme demonstrado no GRAF.2, com destaque para os usuários que responderam que o volume transportado varia entre 31 a 40% desde a concessão. O sistema ferroviário no Brasil ficou vários anos sem receber investimentos significativos; está passando por um momento de transição. O percentual de variação no volume transportado via modal ferroviário tem aumentado paulatinamente entre os usuários, com destaque para as empresas que tiveram variação de 31 a 40%. Isso ocorre, principalmente, devido ao processo de concessão ferroviária. O principal produto transportado pelas empresas entrevistadas foi grãos, em seguida matéria-prima e indústria extrativista foram mencionados. Todos caracterizados como produtos de baixo valor agregado e que necessitam de um sistema de transporte eficiente, pois o custo de transporte tem uma parcela significativa do valor desses produtos. 10% dos usuários declararam estar muito satisfeitos com o atendimento da demanda da empresa. 39% declararam estar satisfeitos, 20%, indiferentes. O percentual de clientes insatisfeitos foi de 28% e muito insatisfeitos, 3%. Gráfico 2: Variação no volume transportado via modal ferroviário desde a concessão. Na segunda parte do estudo, os respondentes foram orientados a classificar, em uma Escala Likert de 1 a 5, qual o grau de atendimento da missão da agência reguladora e das associações de classe do sistema ferroviário no Brasil, sendo o valor 1 da escala indicador de baixa 8

influência e o 5, de grande influência. Ao todo, foram cinco as instituições pesquisadas, quais sejam: ANTT- Agência Nacional de Transporte Terrestres, CNT Confederação Nacional de Transporte, ANTF Associação Nacional dos Transportes Ferroviários, ANUT Associação Nacional dos Usuários de Transporte de Cargas e ABTC Associação Brasileira de Logística e Transporte de Carga. O objetivo desta análise inicial foi de traçar um paralelo entre o atendimento da missão da ANTT e das principais associações de classe do Brasil. Na terceira parte, os respondentes foram orientados a classificar, em uma Escala Likert de 1 a 5, quais seriam os fatores mais influentes sobre o trabalho realizado pelas concessionárias ferroviárias. Ao todo, foram seis os itens de avaliação propostos, quais sejam: disponibilidade, trilhos, custos, serviços complementares e expectativa geral. O objetivo dessa análise foi traçar as expectativas das concessionárias no que tange o modelo utilizado no Brasil. Os resultados são apresentados com base na média e no desvio-padrão alcançados em cada variável de análise. A dispersão padrão é pequena se os dados estão concentrados em torno da média, e é grande se os dados estão mais distantes em relação à média, indicando um menor consenso de respostas. Trata-se de uma amostra por conveniência, o que impede generalização. Os nomes das empresas e entrevistados foram omitidos para resguardar a privacidade e os interesses comerciais dos envolvidos. Tendo-se apresentado a metodologia de coleta de dados e caracterização da amostra, o trabalho tem como objetivo principal pesquisar os aspectos de gestão do modelo privado de concessões ferroviárias no Brasil. Na seção seguinte, apresenta os resultados descritivos realizados a partir do banco de dados formado conforme procedimentos acima detalhados. 4 Análise dos resultados Os resultados estão divididos em três sub-seções (i) a Sub-seção 4.1. Perguntas sobre a Agência Reguladora e Associações de Classe; (ii) 4.2 Percepção sobre o trabalho realizado pelas concessionárias nas ferrovias e (iii) 4.3. a postura das concessionárias é discutida. 4.1 Perguntas sobre a Agência Reguladora e Associações de Classe Um sistema de transporte ferroviário, assim como qualquer outro modal, depende de diversos fatores para que sua estratégia seja definida. O transporte ferroviário no Brasil vem apresentando sinais que direcionam para graves problemas, principalmente em um país com uma cultura toda voltada para o transporte rodoviário. Na tentativa de se eliminar ou minimizar tais problemas, muitos investimentos têm sido realizados pelas concessionárias ferroviárias. Mas o Governo ainda tem se mostrado distante da realidade, o que é constatado pela falta de investimentos e ações para soluções dos problemas do setor. A missão deve esclarecer o compromisso e o dever da empresa para com a sociedade. Observa-se, de acordo com a TAB. 3, que o grau de atendimento da missão da ANUT, CNT e ABTC tiveram a menor média, destacando-se a importância e relevância das associações de classe no cenário brasileiro, que é um índice que merece destaque e que precisa ser mais bem trabalhado, divulgado e esclarecido entre os usuários das ferrovias. A ANTT e ANTF tiveram notas superiores, mas é necessário ressaltar perante os usuários das ferrovias as principais funções da agência e das associações de classe. 9

Missão TABELA 3 Atendimento da missão CNT - Confederação Nacional do Transporte (Missão: Promover o desenvolvimento e a defesa dos transportadores e do setor de transporte) ANUT - Associação Nacional dos Usuários de Transporte de Carga (Missão: Garantir a confiabilidade, segurança, qualidade, presteza, velocidade e adequado custo dos serviços de transporte em todos os modais, contribuindo para elevar competitividade logística das associadas) ABTC - Associação Brasileira de Logística e Transporte de Carga (Missão: defender os legítimos interesses do segmento de logística e transporte de cargas, em todos os seus modais, visando ao aperfeiçoamento e ao crescimento dessas atividades, tornando-as instrumentos de sustentação da economia do País) ANTT - Agência Nacional de Transportes Terrestres (Missão: Regular e fiscalizar a prestação dos serviços de transportes terrestres, com eficiência e imparcialidade, buscando a harmonização dos interesses dos agentes do setor) ANTF - Associação Nacional dos Transportes Ferroviários (Missão: promover o desenvolvimento e o aprimoramento do transporte ferroviário de carga no País, através de ações aglutinadoras das necessidades e anseios de seus associados) Média grau de atendimento da missão Desvio-padrão 2,6 1,08 2,5 1,01 2,7 0,96 3,325 1,11 3,25 1,03 Na opinião dos usuários, conforme demonstra o GRAF.3, um grande percentual de respondentes concorda que o Governo deveria ser responsável pela expansão das ferrovias. De acordo com a ANTT (2008), a expectativa é de que o investimento em infraestrutura ferroviária seja uma das prioridades para o Poder Público nos próximos anos. 53% 28% 5% 15% Governo Iniciativa Privada Concessionárias Ambos Gráfico 3: Responsável pela gestão das ferrovias. 4.2 Percepção sobre o trabalho realizado pelas concessionárias nas ferrovias Provavelmente, por estar intrinsecamente ligado com a garantia do prazo de entrega acordado, a disponibilidade de vagões na ferrovia de acordo com as necessidades específicas do produto (código 2) recebeu a maior média de resposta (3,175) em uma escala Likert de 1 a 5 (conforme GRAF. 4). 5 4,5 4 3,5 3 2,5 Média 3,01 3,175 2,8 3,01 3 3,12 2 1,5 1 0,5 Desvio padrão 1 1,02 1,15 1,18 1,15 1,18 0 Disponibilidade de máquinas na ferrovia Disponibilidade de vagões na ferrovia de acordo com as necessidades específicas do produto Serviços complementares ofertados de acordo com a demanda Há regularidade na oferta Flexibilidade de oferta Tempo de atendimento de tipo de vagões às demandas 1 2 3 4 5 6 Gráfico 4 - Disponibilidade 10

O tempo de transporte depende, em grande parte, das condições de tráfego e do material rodante. As concessionárias assumiram a malha concedida em péssimas condições de operação, mas, após o investimento já realizado, as condições de tráfego caminham para uma condição ainda longe do ideal. Alguns problemas de infraestrutura e superestrutura ainda têm forte impacto no desempenho operacional dos usuários. A malha brasileira está em condições diferentes por tipo de concessionária. Algumas empresas utilizam equipamentos extremamente modernos que fazem a medição e a avaliação dos trilhos. Um problema grave é a bitola, que permite flexibilidade da malha possibilitando atender diferentes pontos do país. Conforme demonstra o GRAF. 5, o código 8 Flexibilidade da Malha recebeu uma média baixa, ou seja, é um item que tem grande relevância para os usuários. 5 4,5 4 7 Condições da malha 3,5 3 2,5 2 1,5 8 Flexibilidade da malha (possibilitando atendimento em diferentes pontos de diferentes concessionárias e diferentes bitolas) 1 0,5 0 Média Desvio padrão Gráfico 5 - Trilhos O grande empecilho que existe no modal ferroviário está relacionado às tarifas. Conforme demonstrado na GRAF. 6, o código 13 apresentou a menor média entre os outros fatores analisados, destacando que uma parte significativa dos usuários entrevistados não está satisfeita com as tarifas cobradas pelos serviços prestados. Existem situações em que, pelo excesso de oferta do transporte rodoviário, mesmo em longa distância ele acaba sendo mais barato que o ferroviário. Não faz sentido contratar uma ferrovia se existe uma infinidade de caminhões que podem fazer o transporte não tão eficiente, mas mais barato. As ferrovias no Brasil representam uma solução para reduzir o custo e balancear a matriz de transporte de cargas, mas é necessária uma quantia grande de investimentos para tentar reduzir esses custos e promover o crescimento nacional. 11

5 4,5 4 3,5 3 2,5 2 1,5 1 0,5 Média Desvio padrão 0 Operacionais por KM (combustível e manutenção) Patrulhamento policial: prevenção de assaltos Impacto no preço final do produto. Qual o impacto do custo do frete ferroviário no preço final do produto? Disponibilidade de negociação para investimentos em parceria com as concessionárias em Linhas Ferroviárias, Vagões e terminais dedicados As tarifas estão de acordo com o serviço prestado Gráfico 6 - Custos 9 10 11 12 13 O reconhecimento do sistema ferroviário passa pela qualidade prestada e oferecimento de novos serviços. Investigou-se nesta seção de perguntas, basicamente, a utilização de serviços complementares. De uma forma geral, a questão sobre transporte intermodal (GRAF. 7, código 14) merece destaque por apresentar a menor média entre os demais quesitos. A falta de opção do transporte intermodal compromete a competitividade de qualquer negócio na indústria brasileira, motivo pelo qual é de grande destaque nos serviços complementares oferecidos pelas concessionárias. A operação intermodal requer altos investimentos, operadores de elevada capacidade técnica, tecnologia de informação, sistema de comunicação e rastreamento. A malha ferroviária brasileira precisa crescer de forma integrada com outros modais, por meio de um sistema que integre todas as regiões do país. Mas para um programa de expansão é necessária a participação do Governo. O transporte rodoviário concorre com o ferroviário por dois motivos principais: (1) não houve, ao longo dos anos, um planejamento adequado para a ampliação da malha ferroviária o rodoviário, com maior agilidade e mobilidade, vem cumprindo o papel do transporte ferroviário; (2) faltam investimentos em terminais com o objetivo de integrar melhor os dois modos de transporte. As soluções são, portanto, corolários dessas afirmações: planejamento e investimentos para se aprimorar e ampliar a malha existente e melhoria da infraestrutura de terminais intermodais (rodoviário e ferroviário devem ser vistos como modos complementares de transportes). O grande deslocamento de produtos e mercadorias tem um preço alto e o custo é um fator preponderante. A integração vai acontecer quando o embarcador conseguir visualizar na interligação de modalidades uma situação vantajosa em termos de custo. Mas é necessário garantir eficiência de modalidade, confiabilidade, manutenção e integridade das cargas. As concessionárias têm trabalhado para recuperar o sistema ferroviário, principalmente no sentido da intermodalidade, da geração de mão-de-obra, da eliminação de gargalos e da expansão da malha. 12

14 15 16 17 18 19 Qualidade/adequação das instalações considerando a qualidade da infraestrutura e do apoio operacional ofertado Fluxo de informações e documentos Serviços de armazenagem e controle de estoques Serviços de manuseio de cargas Localização e abrangência da malha Transporte intermodal Gráfico 7 - Serviços Complementares 0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 4,5 5 Procurou-se investigar nesta seção de perguntas as principais percepções sobre a expectativa geral nas 40 empresas pesquisadas. Foram apresentadas 5 questões aos respondentes, de forma que estes, numa escala Likert de 1 a 5, expressassem as expectativas gerais. A nota cinco indica que a afirmação se aplica perfeitamente às práticas adotadas, e a nota um indica uma alta incoerência entre as mesmas. O GRAF. 8 apresenta as afirmações, acompanhadas das respectivas médias e dos desvios-padrão obtidos. Provavelmente, por estar intrinsecamente ligado com a expansão do transporte ferroviário, o item Investimentos das concessionárias em novos trechos (código 27) recebeu a menor média de resposta (2,6). Ou seja, é o item que tem maior relevância entre os usuários e que deveria ser explorado com maior urgência pelas concessionárias e pelo Governo. É sabido que as autoridades têm dado maior atenção à construção de novos trechos, como a Transnordestina, a Ferrovia Norte-Sul e o Ferroanel, em São Paulo, após o planejamento operacional entre concessionárias (código 31) e investimentos da concessionária em equipamentos para atender a sua carga. (código 28). Essas respostas corroboram a urgente necessidade de investimentos no setor. As concessionárias de transporte ferroviário têm feito grandes investimentos para melhorar a competitividade desse modo de transporte, mas ainda há muito o que fazer para que a situação se aproxime do desejável. 23 24 25 26 27 28 29 30 31 Planejamento operacional entre concessionárias Problemas com programação de trens afetando o tempo de entrega Rupturas devido a diferença de bitolas Investimentos das concessionárias em equipamentos para atender a sua carga Investimentos das concessionárias em novos trechos Fluidez no tráfego Sinalização e extensão dos trechos em obras Qualidade dos trechos Manutenção do trecho após a concessão 0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 4,5 5 Gráfico 8: Expectativa Geral 13

A queda nos códigos 27, 28 e 31 pode ser explicada pelo prazo de desestatização da malha férrea nacional. Há mais de uma década do processo de concessão, os investimentos foram elevados. Entre 1997 e 2005, o investimento foi de 9,5 bilhões de reais (EXAME, 2006). Mas a ferrovia brasileira ainda está longe do ideal. O investimento na aquisição e criação de serviços está voltado para a modernidade da operação logística, o que demanda tempo e um longo planejamento operacional entre as concessionárias para o atendimento das demandas crescentes do modal ferroviário brasileiro. 4.3 Postura das concessionárias Paulatinamente busca-se redução nos custos logísticos e maior confiabilidade no sistema de transporte brasileiro. O uso do modal ferroviário é uma das soluções para que as empresas se tornem mais competitivas em um país onde o modal rodoviário predomina na matriz de transporte. A necessidade de investimentos reflete nas questões do GRAF. 9, quando se questiona a opinião dos usuários sobre a postura da concessionária. Fica claro que o principal fator para recuperar a capacidade de transporte são grandes investimentos no setor ferroviário, para garantir o atendimento dos prazos acordados, e disponibilização dos ativos para atender as necessidades dos usuários. 5 4,5 4 3,5 3 2,5 2 1,5 1 Média Desvio padrão 0,5 0 As atuais concessionárias têm uma estratégia clara de priorização de carga As atuais concessionárias disponiblizam satisfatoriamente os ativos para atendimento das suas necessidades As atuais concessionárias têm uma estratégia clara sobre o atendimento dos prazos acordados 32 33 34 Gráfico 9 Postura das concessionárias Quanto ao nível de satisfação para a demanda da empresa das empresas entrevistadas, 10% dos usuários declararam estar muito satisfeitos com o atendimento da demanda da empresa; 40% declararam estar satisfeitos, 20% são indiferentes. O percentual de clientes insatisfeitos foi de 28%, e muito insatisfeitos, 3%. A próxima seção sumariza as conclusões finais da pesquisa. 5 Conclusões Há no Brasil uma cultura rodoviarista por questões de inflação e econômicas. Com a estabilização da moeda, as dificuldades econômicas associadas à necessidade de crescimento trouxeram consequências no ponto de vista da operação. A rede ferroviária é um sistema caro em sua implantação e que requer investimentos constantes, mas que reduzem consideravelmente o desperdício e reduzem os custos quando envolvem grandes quantidades 14

de carga. Mas, apesar dos investimentos privados nos últimos anos no Brasil, grande parte da malha ferroviária brasileira opera longe da condição ideal. Este trabalho apresenta as principais conclusões de uma pesquisa realizada com 40 usuários de ferrovias e com atuação no Brasil. A partir do modelo de concessão ferroviária adotado no Brasil, a percepção sobre o trabalho realizado pelas concessionárias é razoável. As ferrovias têm um efeito de longo prazo em todo o processo econômico de uma nação. Ao transportar grande volume de produtos industrializados e matérias-primas reduzem-se os custos de produção e aumenta a eficiência, todos saem ganhando. O modal ferroviário no Brasil é utilizado basicamente para o transporte de cargas de baixo valor agregado e grandes distâncias. Isto pode ser percebido pela quantidade de respondentes que se enquadram em agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura e Indústrias extrativas de carvão mineral, petróleo, gás natural, minerais metálicos. Quanto aos itens de avaliação propostos, quais sejam: disponibilidade, trilhos, custos, serviços complementares e expectativa geral, observa-se de modo geral que há alguns entraves pontuais, como flexibilidade da malha, valor das tarifas cobradas pelo serviço prestado, transporte intermodal e localização e abrangência da malha e dos serviços. Outro fator que merece destaque é a integração entre o transporte ferroviário e outros modais, em parte ao número reduzido de terminais de integração existentes. Conforme a CNT (2008), a parceria das concessionárias ferroviárias com os seus clientes existe, mas ainda há muito o que aperfeiçoar, principalmente no que quesito investimentos. Calcula-se que o setor ferroviário necessita de cerca de R$1,5 bilhão para corrigir as heranças deixadas às concessionárias nos processo de desestatização. Na opinião dos usuários das ferrovias, é necessário um planejamento estruturado de médio e longo prazo para solucionar os principais gargalos da malha brasileira, além de investimentos de recursos públicos em conjunto com a iniciativa privada para a solução dos principais entraves existentes, fomentando, assim, o aumento da produtividade, disponibilidade e capacidade das ferrovias. Diante da tendência mundial de que a carga geral vem ganhando destaque em termos de movimentação e taxas de crescimento considerável, torna-se necessária a ampliação do universo de produtos transportados via modal ferroviário, com produtos de baixo volume e maior valor agregado, como veículos, contêineres, indústria de celulose e papel. O principal problema mencionado pelos usuários de modo geral é o planejamento de longo prazo. Os usuários querem aumentar a capacidade de transporte de 12 a 14% do volume ao ano, mas para isso é necessário um planejamento adequado e com a antecedência adequada. Em um setor no qual os investimentos são extremamente elevados, é necessário muito planejamento para atender os usuários. Dada essa situação, é preciso que o poder público reveja as condições legais que regem as concessões do sistema ferroviário e estabeleça regras que contribuam para seu desenvolvimento. Referências ABIFER.Associação Brasileira da Indústria Ferroviária. Disponível em http://abifer.org.br. Acesso em dez. 2008. ANTF. Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários. Banco de dados. Disponível em: http://www.antf.org.br. Acesso em: dez. 2008 ANTT Agência Nacional de Transportes Terrestres. Banco de dados. Disponível em: http://www.antt.gov.br. Acesso em: dez. 2008. 15

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