ESTRATÉGIA DE CONSERVAÇÃO DE ESPÉCIES FLORESTAIS NATIVAS

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Transcrição:

ESTRATÉGIA DE CONSERVAÇÃO DE ESPÉCIES FLORESTAIS NATIVAS Jarbas Yukio Shimizu 1, Antonio José de Araujo 2 1 R. Lord Lovat 40, CEP: 81510-520, Curitiba/PR, shimizuj@terra.com.br; 2 Universidade Estadual do Centro-Oeste - UNICENTRO, PR 153 Km 07, CEP: 84500-000, Irati/PR, daraujo@onda.com.br RESUMO A devastação das florestas brasileiras vem tomando proporções alarmantes, em todos os biomas, colocando muitas espécies de microorganismos, animais e plantas sob risco de extinção devido à descaracterização do habitat. As unidades de conservação fazem parte das medidas governamentais e privadas (RPPN) para atenuar esse problema. Elas são fundamentais na conservação de ecossistemas naturais. Porém, são ineficazes na conservação da variabilidade ecotípica de espécies florestais. Considerando que a maior parte dos ecótipos florestais de importância adaptativa localiza-se fora das unidades de conservação, medidas complementares são indispensáveis, requerendo a participação de produtores rurais, sobretudo os de pequena escala, por estarem presentes em todo o território nacional. A estratégia proposta tem como ponto fundamental evitar o plantio de sementes ou mudas em locais distantes de suas origens, visando preservar as características adaptativas próprias de cada ecossistema. Para isso, recomendam-se procedimentos para a amostragem de matrizes e instalação de povoamentos florestais para conservação mediante uso pelos produtores rurais. Para atingir pleno sucesso, essa tarefa requer orientações técnicas embasada em métodos científicos e precisa ser implementada com a participação ativa de todos os segmentos da sociedade. São indispensáveis as atuações de órgãos do governo, instituições acadêmicas, instituições de pesquisa agropecuária e florestal, sociedades de classes e, principalmente, os agricultores, que serão os principais conservadores desses recursos florestais, assim que os benefícios de sua conservação se tornem evidentes. Introdução Em face da sua extensão territorial, da diversidade de biomas e dos ecossistemas naturais, o Brasil tem sido considerado o repositório da maior biodiversidade do mundo. Porém, a contínua devastação das florestas e de outros ecossistemas naturais vem colocando um grande número de espécies animais, vegetais e microbianas em perigo de extinção, mormente pela destruição do habitat. Estima-se que a atual taxa de extinção de espécies, mormente em decorrência da ação antrópica, tenha chegado a 100 vezes mais que a normal. Essa taxa é muito superior à do surgimento de novas espécies (especiação), de maneira que a tendência atual, de rápido empobrecimento da biodiversidade, está sendo considerada como a sexta onda de extinção de espécies por que a Terra vem passando

(GLOBAL..., 2007). Em vista disso, tanto o governo quanto as organizações não governamentais vêm se empenhando em ações visando a reverter essa marcha de destruição dos ecossistemas florestais ou, pelo menos, reduzir o desequilíbrio entre a taxa de devastação das florestas e a de recuperação da cobertura florestal mediante plantios. As principais medidas de recomposição da cobertura florestal nativa têm o formato de programas destinados à recuperação de áreas degradadas, à restauração de áreas de preservação permanente (APP) e ao estabelecimento de reservas legais. A despeito da aparente simplicidade das ações requeridas nesses programas, a disponibilidade de sementes e mudas tem se tornado um problema crucial em comum. Nem sempre se dispõe, localmente, de sementes ou mudas das espécies requeridas, em quantidade suficiente para a implementação desses programas. Uma das medidas adotadas, com freqüência, é de estabelecer povoamentos com sementes ou mudas coletadas de outros locais. No entanto, por maior que seja a diversidade de espécies presente, o ecossistema não terá sustentabilidade ao longo de gerações se cada espécie componente não estiver representada por um número efetivo suficiente. Portanto, todas as iniciativas no sentido de recompor a cobertura florestal as nossas futuras gerações deverão estar embasadas em populações viáveis de cada espécie componente. Outras iniciativas vêem-se atropeladas por imposições legais como no estado de São Paulo (Resolução SMA 47 de 27/11/2003). Segundo o Art. 2º desta resolução, a recuperação florestal de áreas degradadas nas formações de floresta ombrófila, floresta estacional semidecidual e savanas florestadas (cerradão), será efetivada mediante o plantio de mudas de, no mínimo, 80 (oitenta) espécies arbóreas das formações vegetais de ocorrência regional, exemplificadas na listagem do Anexo a esta resolução, não excluindo espécies levantadas regionalmente. O atendimento a esta resolução torna difícil, se não impossível, avançar nos programas de recuperação de ecossistemas florestais, visto que, na maioria dos casos, não ocorre esse número de espécies arbóreas, em condições naturais, no ambiente a ser reflorestado. Além disso, se não houver remanescentes florestais nas proximidades, onde ocorram exemplares das mesmas espécies incluídas nos plantios, os exemplares plantados serão os únicos geradores de semente para o estabelecimento das próximas gerações requeridas para a expansão da cobertura florestal. Tendo-se que plantar, no mínimo, 80 espécies no povoamento inicial, fica difícil de estabelecer um número suficiente de indivíduos de cada espécie para que formem populações geneticamente viáveis ao longo das gerações. A restrição no número de indivíduos de cada espécie levará à formação de gargalos de variabilidade genética e a conseqüência disso, para as futuras gerações, poderá ser desastrosa, por conta da alta endogamia.

Tendo em vista que existe uma ampla variação quanto às características reprodutivas ecológicas e genéticas entre as espécies florestais arbóreas, a questão da transferência de sementes e mudas de uma região para outra tem que ser analisada com cuidado, pois, pode-se incorrer em um ou mais dos seguintes problemas: 1) Se a transferência das sementes ou mudas for entre locais ecologicamente distintos, é provável que os migrantes floresçam em época distinta dos indivíduos locais, resultando em gargalos de variabilidade genética. Mesmo que haja coincidência fenológica e cruzamento dos indivíduos migrantes com os locais, poderão resultar progênies de baixa viabilidade por conta da divergência genética entre ecótipos (exogamia). Outra possibilidade é que nem haja reprodução dos migrantes se as diferenças ambientes forem muito fortes; 2) Mesmo que não haja diferença ecológica entre os locais de origem das sementes ou mudas e o local de plantio, se essa distância física for muito grande, pode haver diferenciação entre esses ecótipos meramente por força da deriva genética e as conseqüências seriam semelhantes às do caso anterior. Além disso, existe a questão da representatividade da população amostrada. Se as sementes ou mudas forem originadas de matrizes aparentadas (normalmente, quanto menor for a distância física entre elas, maior será a probabilidade de que essas árvores sejam parentes muito próximas como irmãs, mãe e filhas etc.), maior será o grau de endogamia nas progênies resultantes. Normalmente, os efeitos indesejáveis dos cruzamentos entre indivíduos aparentados somam-se aos da autofecundação que ocorre em muitas espécies. Esses eventos conduzem ao aumento do risco de perda de alelos em decorrência da homozigose e da deriva genética (variação na freqüência de alelos na população, decorrente de processo aleatório no pareamento dos gametas) (HALL et al., 1996; SEB- BENN et al., 2001; CASCANTE et al., 2002; SRIKWAN; WOODRUFF, 2003; FUCHS et al., 2003; QUESADA et al., 2004; LOWE et al., 2005). O aumento na endogamia leva à redução na viabilidade da população formada com essas sementes e maior redução ainda na viabilidade das sementes produzidas pelos povoamentos formados com essas sementes (se chegarem a produzir). Na falta de informações detalhadas sobre a biologia reprodutiva e as características genéticas de cada espécie, fica difícil de prescrever critérios para coleta de sementes e restauração de povoamentos florestais nativos, visto que não há uma recomendação que possa ser aplicável igualmente para todas elas. Porém, como medida de precaução, sugere-se não incluir, no mesmo povoamento, plantas oriundas de sementes coletadas de matrizes que estejam localizadas a menos de 100 m umas das outras, para minimizar o efeito da endogamia. Essa distância pode ser insuficiente se a es-

pécie disseminar seus polens e suas sementes com facilidade e tiver alta carga genética (freqüência de genes de efeito letal); por outro lado, se sua carga genética for baixa, essa distância pode ser menor, visto que, mesmo havendo algum grau de parentesco entre as matrizes, suas progênies não serão afetadas substancialmente. A partir dessas limitações, ocorrem os desdobramentos quanto número mínimo de matrizes requerido para coleta de sementes, de maneira que represente a variabilidade genética da população (idealmente tomado como 45). Para atingir esse número de matrizes, geralmente, torna-se necessário explorar grandes áreas, aumentando-se a probabilidade de trazer sementes de locais ambientalmente distintas ou de distâncias que propiciam a formação de populações diferenciadas por causa da deriva genética. Portanto, tão importante quanto manter uma distância mínima entre as matrizes amostradas, visando minimizar os problemas da endogamia, é necessário estabelecer, para cada espécie, a distância máxima em que se pode estender a área de coleta de sementes (domínio de amostragem) para plantio em um determinado local (SHIMIZU, 2007). Para que as estratégias de amostragem e de estabelecimento de coberturas florestais geneticamente viáveis possam ser implementadas com eficácia e eficiência, é necessário dispor de informações sobre as características genéticas e reprodutivas de cada espécie amostrada. Os tópicos que requerem informações detalhadas de cada espécie envolvem estudos sobre: a) vetores e distância efetiva de dispersão dos polens e das sementes; b) distância física entre matrizes a partir da qual começa a ocorrer redução na viabilidade das progênies resultantes dos seus cruzamentos; c) grau de endogamia que a espécie tolera, sem que apresente declínio na viabilidade de suas progênies; d) estrutura genética das populações; e) periodicidade e intensidade dos eventos reprodutivos; f) estratégia de reprodução e de estabelecimento de populações naturais; g) aspectos silviculturais do estabelecimento da espécie em plantios; h) dinâmica populacional ao longo dos estágios de ocupação da área i) fatores determinantes que limitam a extensão do domínio de amostragem; j) componentes socio-econômicos. Essas e muitas outras questões são fundamentais e requerem estudos minuciosos, muitas vezes, por longos períodos de observação. Multiplicando-se a quantidade de questões críticas que pre-

cisam ser esclarecidas pelo número de espécies arbóreas que compõem os ecossistemas a serem restaurados, será necessário o trabalho de um grande número de pesquisadores por um longo período de tempo. Portanto, isto configura uma excelente oportunidade para que os atuais estudantes de engenharia florestal possam contribuir, ativamente, nessa grande tarefa, cada um explorando uma parte desse complexo, na forma de pesquisas para teses de mestrado e doutorado. As unidades de conservação, incluindo parques, reservas, florestas nacionais e estaduais, assim como as reservas particulares (RPPN), são fundamentais na conservação de ecossistemas naturais. No entanto, para a conservação da variabilidade ecotípica de espécies florestais, a eficácia dessas unidades se restringe aos limites físicos da sua área de influência. Considerando que a maior parte dos ecótipos florestais de grande significado adaptativo localiza-se fora das unidades de conservação, serão necessárias medidas que tenham como protagonistas os produtores rurais, sobretudo os de pequena escala, por estarem presentes em praticamente todo o território nacional, fora das unidades de conservação. No entanto, o êxito desses atores só poderá ser assegurado se forem devidamente orientados com base nos resultados das pesquisas. A estratégia proposta tem como ponto fundamental evitar o plantio de sementes ou mudas em locais distantes de suas origens, visando preservar as características adaptativas próprias de cada ecossistema. Para isso, recomendam-se procedimentos para a amostragem de matrizes e instalação de povoamentos florestais para conservação mediante uso pelos produtores rurais. Pretende-se, com isso, estabelecer as bases para a formação de núcleos de corredores de biodiversidade conectando grandes fragmentos florestais nativos, partindo-se de plantios de povoamentos geneticamente diversos dentro da mesma área de coleta das sementes. As restrições a serem observadas quanto à amostragem das matrizes e ao plantio dos povoamentos são: 1) Traçar esquemas de coleta e plantio separadamente para cada espécie, ainda que, preferencialmente, o plantio seja feito com mistura delas; 2) De cada espécie, coletar sementes de um mínimo de 45 matrizes por local (domínio de amostragem); 3) De cada espécie, coletar sementes de árvores autóctones, somente dentro do domínio de amostragem; 4) Plantar misturas de espécies, iniciando-se com as espécies pioneiras e as secundárias iniciais na primeira etapa; plantar as secundárias tardias e as clímax em etapa posterior, após o fechamento das copas das espécies plantadas inicialmente.

Tópicos para pesquisa 1) Vetores e distância efetiva de dispersão dos polens e das sementes a) pólen: anemofilia/zoofilia (insetos, morcegos e outros)? condições climáticas/ hora do dia/ duração da disponibilidade/ variabilidade entre árvores; distância de vôo (anemofilia)/ autonomia de vôo dos vetores; viabilidade do pólen em condições naturais e em laboratório; outros... b) sementes: ortodoxas/recalcitrantes?/ quantidade produzida/ viabilidade em condições naturais? dispersores/ predadores/ ciclos de produção/ condições climáticas e produção; variações temporais e espaciais na produção; variabilidade genética em populações naturais com a idade; condições requeridas para regeneração natural; requisitos para armazenamento; distância de disseminação natural; outros... 2) Distância física máxima entre matrizes a partir da qual começa a ocorrer redução na viabilidade das progênies estudos básicos de biologia reprodutiva (fenologia, coleta e preservação do pólen, polinização controlada); cruzamentos controlados entre árvores localizadas a variadas distâncias;

avaliação em termos de quantidade de sementes produzida por fruto, número de frutos férteis, número de frutos férteis/número de flores polinizadas, tamanho das sementes, porcentagem de germinação e vigor das mudas. 3) Endogamia e declínio na viabilidade das progênies estudos básicos de reprodução por meio de cruzamentos controlados; polinizações controladas usando-se pólen de árvores com variados graus (conhecidos) de parentesco; avaliação em termos de quantidade de sementes produzida por fruto, número de frutos férteis, número de frutos férteis/número de flores polinizadas, tamanho das sementes, porcentagem de germinação e vigor das mudas. 4) Estrutura genética das populações variabilidade genética entre populações, entre árvores dentro de populações e, na mesma árvore, entre e dentro de frutos. 5) Periodicidade e intensidade dos eventos reprodutivos Análise de eventos históricos registrados e por entrevista; Relação com ciclos climáticos e/ou bióticos. 6) Estratégia da espécie para seu estabelecimento Dormência; Grande número de sementes e mudas germinadas; Necessidade de clareiras; Dependência de distúrbios ambientais; Intervenção da fauna. 7) Requisitos silviculturais para estabelecimento em plantios Tratamentos pré-germinativos;

Plantio por semeadura direta ou por mudas; Critérios de seleção no viveiro; Tratos especiais no viveiro; Preparo do terreno (solo e dossel); Correção/adubação do solo; Densidade de plantio/raleios (intensidade, freqüência, idades); 8) Dinâmica populacional ao longo dos estágios de ocupação da área Variação na densidade das mudas ao longo das idades; Tendências na variabilidade genética na população de mudas ao longo das idades; 9) Fatores determinantes da extensão do domínio de amostragem Topografia; Barreiras físicas; Variação climática; Fatores bióticos; Fatores antrópicos. 10) Componentes socio-econômicos Custos da implantação e manutenção de povoamentos florestais nativos vs benefícios (econômicos, ambientais, sociais e legais); Novos produtos oriundos dos plantios de espécies florestais nativas; Mercado de produtos madeireiros e não madeireiros; Conservação de recursos florestais nativos e qualidade de vida; Produção em regime sustentável; Engajamento de todo o setor agropecuário e florestal.

Referências CASCANTE, A.; QUESADA, M.; LOBO, J. J.; FUCHS, E. A. Effects of dry tropical forest fragmentation on the reproductive success and genetic structure of the tree Samanea saman. Conservation Biology, n. 16, p. 137-147, 2002. FUCHS, E. A.; LOBO, J. A.; QUESADA, M. Effects of forest fragmentation and flowering phenology on the reproductive success and mating patterns of the tropical dry forest tree Pachira quinata. Conservation Biology, n. 17, p. 149-157, 2003 GLOBAL environment outlook: GEO4 environment for development. Nairobi: United Nations Envirmonment Programme, 2007. 572 p. Disponível em: <http://www.unep.org/geo/geo4/report/ GEO-4_Report_Full_en2.pdf>. Acesso em: 1 mar. 2007. HALL, P.; WALKER, S.; BAWA, K. Effect of forest fragmentation on genetic diversity and mating system in a tropical tree, Pithecellobium elegans. Conservation Biology, n. 10, p. 757-768, 1996. LOWE, A. J.; BOSHIER, D.; WARD, M.; BACLES, C. F. E.; NAVARRO, C. Genetic resources impacts of habitat loss and degradation: reconciling empirical evidence and predicted theory for neotropical trees. Heredity, n. 95, p. 255-273, 2005. QUESADA, M.; STONER, K. E.; LOBO, J. A.; HERRERÍAS-DIEGO, Y.; GUEVARA, C. P.; MUGUÍA-ROSAS, M. A.; SALAZAR, K. A. O.; ROSAS-GUERRERO, V. Effects of forest fragmentation on pollinator activity and consequences for plant reproductive success and mating patterns in bat-pollinated Bombacaceous trees. Biotropica, n. 36, p. 131-138, 2004. SEBBENN, A. M.; SEOANE, C. E. S.; KAGEYAMA, P. Y.; LACERDA, C. M. B. Estrutura genética em populações de Tabebuia cassinoides: implicações para o manejo florestal e a conservação genética. Revista do Instituto Florestal, n. 13, p. 93-113, 2001. SHIMIZUJ, J. Y. Estratégia complementar para conservação de espécies florestais nativas: resgate e conservação de ecótipos ameaçados. Pesq. Flor. Bras., Colombo, n. 54, p. 7-35, jan./jun. 2007. SRIKWAN, S.; WOODRUFF, D. S. Genetic erosion in isolated small mammal populations following rainforest fragmentation. In: YOUNG, A. G.; CLARKE, G. M. Genetics, demography and variability of fragmented populations. Cambridge: Cambridge University Press, 2003. p. 149-172.