Órgão : SEXTA TURMA CÍVEL Classe : APC APELAÇÃO CÍVEL Nº. Processo : 2005.01.1.147796-6 Apelante : MADEIREIRA PAU BRASIL LTDA. Apelada : DIMENSÃO FACTORING FOMENTO MERCANTIL LTDA. Relator Des. : SILVÂNIO BARBOSA DOS SANTOS Revisora Desª : SANDRA DE SANTIS EMENTA COMERCIAL. CHEQUE. AÇÃO DE COBRANÇA. FACTORING. ATIVIDADE LEGAL. DEMANDA PROPOSTA CONTRA ENDOSSANTE. GARANTE LEGAL. DESNECESSIDADE DE DISCUSSÃO RESPEITO DE CAUSA DEBENDI E DO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. RECURSO DESPROVIDO. 1. A atividade de factoring encontra-se respaldada em lei, portanto, ao receber cheque de credor originário, mediante endosso, e proposta ação de cobrança contra este, indevido ao mesmo (ao credor originário) pretender abrir discussão a respeito de causa debendi ou de comprovação do enriquecimento ilícito, pois, na espécie, incide o disposto no art. 21, da Lei Federal 7.357/85, ou seja, o endossante assume a figura do garante legal. 2. Os temas propostos pela apelante, na verdade, são da alçada do emitente do cheque, e não de sua pessoa, conforme pontificado, simples endossante. 3. Recurso desprovido. ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores da SEXTA TURMA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, SILVÂNIO BARBOSA DOS SANTOS - Relator, SANDRA DE SANTIS Revisora e JAIR SOARES Vogal, sob a presidência do Desembargador JAIR SOARES, em CONHECER. NEGAR PROVIMENTO. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas. Brasília-DF, 18 de outubro de 2006. Desembargador SILVÂNIO BARBOSA DOS SANTOS Relator
RELATÓRIO Cuida-se de demanda proposta por DIMENSÃO FACTORING FOMENTO MERCANTIL LTDA. em face de MARIA IVALDINA DA SILVA e MADEIREIRA PAU BRASIL LTDA., objetivando ser ressarcida na quantia de R$ 4.121,76 (quatro mil, cento e vinte e um reais e setenta e seis centavos), com fundamento na emissão, por aquela, de três cheques, e por esta, no seu endosso, os quais não foram pagos pelo Banco, com fundamento na alínea 20 (cheques cancelados). Desistiu-se da ação em relação a primeira ré (fl. 117). Acrescento que, pela r. sentença de fls. 122-125, cujo relatório se adota como complemento, a ilustre autoridade judiciária da 5ª Vara Cível de Brasília (Doutora Joelci Araújo Diniz) julgou parcialmente procedente a pretensão autoral. Recorre tempestivamente a ré MADEIREIRA PAU BRASIL LTDA., aduzindo, em resumo e repisando teses (fls. 134-144), que: a) tratando-se de demanda ancorada em cheques prescritos, induvidosamente deveria a autora ter comprovado, além do seu enriquecimento ilícito (da ré), também a causa debendi; b) farta jurisprudência desta egrégia Corte; c) a r. sentença deve ser reformada. Recurso recebido (fl. 149), preparado (fl. 145) e respondido (fls. 154-163), com preliminar de não conhecimento por ser aquele intempestivo. É o relatório do necessário. 2
VOTOS O Senhor Desembargador SILVÂNIO BARBOSA DOS SANTOS Relator II Fundamentação: Conheço do recurso eis que, conforme certidão de fl. 148, a petição recursal foi recebida em cartório na data de 20-julho-2006, inclusive, data do preparo (fl.145). Quanto ao mérito, em que pesem as extensas razões recursais, as mesmas não servem para desconstituir a diretiva estabelecida na r. sentença, haja vista que, iniludivelmente, as teses evocadas no recurso são próprias do emitente de cheque, e não daquele credor originário e endossante das cártulas, pois, aí, prevalece o comando do art. 21, da Lei Federal 7.357/85 (Lei do Cheque), onde dogmatiza que este, o endossante, continua garante pelo pagamento. Para que não fique dúvida, confira-se trecho das razões recursais, onde repousa toda a tese defensória: (...) No caso em tela, além de ter que se provar o enriquecimento ilícito, também há necessidade de provar a causa debendi, ônus este que a apelada não desincumbiu de provar. Assim, não sendo provado qualquer uma das exigências anteriores, não há como julgar procedente o pleito da apelada. (fl. 140). Com efeito, repita-se, tais teses são exclusivas do emitente do cheque, e não do recebedor originário das cártulas, ora endossante, pois, (...) O endosso é uma forma de transmissão dos títulos de crédito. O proprietário do título faz o endosso lançando a sua assinatura no verso ou no dorso do documento... O endosso tem duplo efeito: Transmite a propriedade do título e gera uma nova garantia para ele, pois o endossante é fiador da solvabilidade do devedor do título, bem como dos endossantes anteriores. ( MAXIMILIANUS CLÁUDIO AMÉRICO FÜHRER, in Resumo de Direito Comercial, Editora RT, 7ª edição, pág. 94). Grifei. 3
Veja ainda o mesmo doutrinador: (...) 1. A investigação da causa debendi O devedor pode discutir a origem da dívida, ou a causa debendi, quando o título ainda se encontra em poder do beneficiário originário da transação ou de terceiro de má-fé (RT 376/208, 385/185, 461/246, 462/205, 468/186, 491/118, 534/185...) Considera-se terceiro de má-fé o portador que conhecia o negócio subjacente, a quem o título foi transferido apenas para dificultar a defesa do devedor... (mesma obra, pág. 107). Confira-se ainda precedente do colendo STJ, que aponta para o emitente do cheque a discussão da causa debendi: EMENTA: COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. CHEQUE. ABSTRAÇÃO E AUTONOMIA. CAUSA DEBENDI. DISCUSSÃO. REEXAME DE PROVAS. ENUNCIADO Nº 7 DA SÚMULA/STJ. RECURSO NÃO CONHECIDO. I A discussão da relação jurídica subjacente à emissão de cheque é permitida se houver sérios indícios de que a obrigação foi constituída em flagrante desrespeito à ordem jurídica ou se configurando a máfé do possuidor do título. II A falta de causa que justifique a exigência do título pode ser alegada e provada pelo devedor que participou do negócio jurídico realizado com o credor. III Tendo o acórdão de origem concluído que o cheque não era exigível, com base nas provas produzidas, é vedado o reexame da matéria nesta instância, a teor do enunciado nº 7 da Súmula/STJ. (REsp. N. 122.088 SP, Relator Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, DJ de 24-maio-99, pág. 171). No que pertine ao enriquecimento sem causa, tratandose de cobrança em face do endossante, e não do emitente da cártula, despicienda discussão a respeito, todavia, apenas a título de ilustração, o descumprimento do garante resultante de lei (art. 21, Lei Federal 7.357/85) é o suficiente para caracterizálo, ainda mais que o portador trata-se de uma factoring, atividade permitida por lei. 4
Os precedentes evocados nas razões recursais não se aplicam ao presente caso, pois, neles, figuram os emitentes dos cheques, e não credor endossante. III Dispositivo: ISTO POSTO, nego provimento ao recurso. É o voto. A Senhora Desembargadora SANDRA DE SANTIS Revisora Recurso tempestivo, cabível e regularmente processado. Dele conheço. Trata-se de apelação contra sentença que julgou parcialmente procedente a ação de enriquecimento ilícito, para condenar a ré ao pagamento de R$ 3.600,00 (três mil e seiscentos reais). A apelante afirma que a autora não se desincumbiu de provar o alegado enriquecimento ilícito, bem como a causa debendi. Não obstante os argumentos expendidos pela apelante, a sentença deve ser mantida. As cártulas de cheque juntadas às fls. 24, 27 e 30 foram emitidas respectivamente em 28/02/2005, 30/01/2005 e 30/03/2005. Deste modo, quando do ajuizamento da presente ação a autora detinha o direito subjetivo à ação cambiária prevista no artigo 61 da lei 7.357/85. A apelada demonstrou a causa debendi do cheque prescrito que juntou aos autos, por meio do endosso em seu favor, tendo em vista o interregno inferior a dois anos, desde o decurso do prazo prescricional. No que concerne à exigência de declinação da causa debendi, a jurisprudência tem entendido que basta a juntada do próprio cheque. Neste sentido os seguintes precedentes deste TJDFT: PROCESSO CIVIL E COMERCIAL. MONITÓRIA. 5
AÇÃO DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. CAUSA DEBENDI. INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO. CHEQUES FURTADOS. ÔNUS PROBATÓRIO. I - A espécie cuida de ação de enriquecimento ilícito, nos moldes do art. 61 da Lei 7.357/85, pois a ação foi proposta antes dos dois anos do decurso do prazo previsto no art. 59, caput, da mesma lei. Desnecessidade de declinação da causa de pedir, sendo os cheques prescritos documentos suficientes para embasar a ação. II - Resposta com fato modificativo impõe os ônus probatórios à embargante. III - Não produzidas as provas, prevalece o fato constitutivo alegado. IV - Apelação conhecida, provida e pedido monitório julgado procedente. (APC 20000110457726, Relator VERA ANDRIGHI, 4ª Turma Cível, julgado em 26/08/2004, DJ 30/09/2004 p. 34) AÇÃO MONITÓRIA EMBARGOS CHEQUES PRESCRITOS AÇÃO DE ENRIQUECIMENTO CAUSA DEBENDI ÔNUS DA PROVA. Escolhendo o credor, para a satisfação de seu crédito, o caminho do procedimento injuntivo, estará dispensado de deduzir a causa debendi do cheque prescrito, se a ação vier a ser proposta até dois anos após o decurso do prazo previsto no art. 59 da lei 7.357/85 ( Ação de Enriquecimento (art. 61), sob o rito previsto no artigo 1.102a do CPC) se decorridos esses dois anos, intentar, para o mesmo fim, também a ação monitória, aí sim, a respectiva inicial deverá narrar a origem do título, que, neste caso, constitui apenas começo de prova escrita da ação de cobrança proposta nos termos do art. 1.102a do CPC. Apresentando o autor prova formal de seu crédito (cheques prescritos), ao réu é que incumbe demonstrar a ocorrência de qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito incorporado naqueles títulos. (APC 19980110526997, Relator SÉRGIO BITTENCOURT, 4ª Turma Cível, julgado em 28/06/2001, DJ 03/10/2001, p. 86). Ademais, a atividade de factoring é lícita. A razoabilidade impõe reconhecer que a empresa não pode ter conhecimento do negócio jurídico que embasou o desconto da cártula a ela regularmente endossada. 6
Quanto ao enriquecimento sem causa, a apelada, como endossante, responsabilizou-se solidariamente pelo o pagamento da dívida. Por esta razão, o descumprimento é suficiente para caracterizá-lo. Ante o exposto, nego provimento ao apelo. É o voto. O Senhor Desembargador JAIR SOARES Presidente e Vogal Com a Turma. DECISÃO Conhecido. Negou-se provimento. Unânime. 7