OBESIDADE E CIRURGIA PLÁSTICA A obesidade é uma doença crônica caracterizada pelo acúmulo excessivo de tecido adiposo no organismo. A prevalência da obesidade tem crescido rapidamente e representa um dos principais desafios de saúde pública neste início de século. Pela primeira vez na história da humanidade o número de pessoas com sobrepeso está aumentando mais rapidamente que o número de pessoas abaixo do peso ideal em todo o planeta. Existe no mundo todo mais de 1 bilhão de adultos com sobrepeso, sendo que pelo menos 300 milhões são obesos. A etiologia da obesidade é complexa, multifatorial, resultante da interação de genes, ambiente, estilos de vida e fatores emocionais. Estima-se que os fatores genéticos possam responder por 24% a 40% da variância no IMC (Índice de Massa Corporal). Acredita-se que as mudanças de comportamento alimentar e dos hábitos de vida atuem sobre genes determinantes no crescimento da obesidade no mundo. Sabe-se, atualmente, que o adipócito, além do seu papel no armazenamento de gordura, desempenha um importante papel endócrino, produzindo hormônios que influenciam os centros de regulação de energia no hipotálamo. A leptina, secretada pelo adipócito, atua a nível hipotalâmico estimulando as vias neurais anorexigênicas, diminuindo o apetite e a ingesta alimentar. O mapa gênico da obesidade humana continua se desenvolvendo rapidamente a cada ano. Atualmente, mais de 430 genes, marcadores e regiões cromossômicas associadas com fenótipos de obesidade humana já foram descritos. É altamente provável herança poligênica como determinante da obesidade, o risco de obesidade quando nenhum dos pais é obeso é de 9%, enquanto que, quando um dos genitores é obeso sobe a 50%, atingindo 80% quando ambos são
obesos. O fato de termos forte influência genética na obesidade não indica que a mesma seja inevitável e todos os esforços devem ser postos em prática para tentarmos adequar o peso. A influência dos fatores ambientais tem exercido um agravamento progressivo das altas taxas de prevalência da obesidade na maioria das populações. Sintomas de estresse, tais como ansiedade, depressão, nervosismo e o hábito de se alimentar quando problemas emocionais estão presentes, são comuns em pacientes com sobrepeso ou obesidade, sugerindo uma relação entre estresse e obesidade. O estresse pode ser uma conseqüência da obesidade devido a fatores sociais, à discriminação e, alternativamente, pode ser a causa da obesidade. É descrita hiperatividade do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal e seu progressivo desequilíbrio está associado a maior acúmulo de gordura visceral. Vários medicamentos podem ter um efeito adverso no peso corporal por influenciarem, tanto a ingesta alimentar, quanto o gasto calórico/energético (benzodiazepínicos, corticosteróides, antipsicóticos, antidepressivos tricíclicos, antiepiléticos, sulfoniluréias e a insulina). Nestes casos, medicamentos alternativos com menos impacto no ganho de peso devem ser considerados. Existem indícios de que a cada parto sucessivo há um aumento de cerca de 1 kg acima do peso normalmente adquirido com o aumento da idade. Ganho de peso excessivo durante a gestação e falta de perda de peso após o parto são importantes preditores de obesidade a longo prazo. O maior ganho de peso após a menopausa está relacionado à idade e ao estilo de vida. Em relação à terapia de reposição hormonal, vários estudos têm demonstrado que, quando comparado ao placebo, ela não afeta o peso corporal, e pode até reduzir a gordura central.
Estudo sobre tabagismo e ganho de peso demonstrou que, em média, os indivíduos que abandonam o tabagismo ganham 5 a 6 kg. O ganho de peso pode ser moderado pela terapia com bupropiona, em alguns pacientes. O abandono do tabagismo e a perda de peso podem ser mais efetivamente alcançados se programas visando estes dois objetivos forem oferecidos concomitantemente Parada na prática de esportes e a diminuição no gasto energético diário são mecanismos para ganho de peso. Os países ocidentais ou com hábitos de vida ocidentalizados caracterizam-se por oferta ilimitada de alimentos baratos, palatáveis, práticos e de alta concentração energética. Aliado a isso, o sedentarismo crescente, com a prática de atividades físicas cada vez mais dificultadas, principalmente nas grandes cidades, tem colaborado em muito no crescimento da obesidade no mundo. Nos Estados Unidos, estima-se que nos últimos 100 anos o consumo de gorduras tenha aumentado em 67% e o de açúcar em 64%. Já o consumo de verduras e legumes diminuiu 26% e o de fibras 18%. No Brasil, Sichieri e colaboradores relataram uma redução do consumo de arroz com feijão de 30%, enquanto o consumo de refrigerantes aumentou em 268%. A escalada do sedentarismo, observada nas últimas décadas, caracteriza-se como uma epidemia global. Os níveis de atividade física reduziram-se drasticamente nos últimos anos. Com um modelo urbano favorecendo principalmente o tráfego de automóveis, aliado à falta de segurança dos bairros e a intensa atividade profissional, a importância da atividade física tem sido minimizada pela população. Diversos itens de conforto parecem também contribuir de forma significativa para a diminuição do gasto energético, como os controles remotos e os telefones celulares, que se tornam cada vez mais presentes no estilo de vida moderno. O hábito de ver
televisão também parece desempenhar um papel importante na etiologia da obesidade. Alguns estudos com crianças relataram uma média de 28 horas de televisão por semana, demonstrando uma relação direta com o risco de obesidade. O balanço energético pode ser alterado por aumento do consumo calórico, pela diminuição do gasto energético, ou por ambos. O aumento do consumo calórico pode ser avaliado por meio do hábito alimentar usando diários alimentares ou listas de checagem de alimentos, mas a interpretação das informações precisa ser cuidadosamente analisada devido a uma subestimação regular. O gasto energético diário é determinado pela taxa metabólica basal (60% a 70%), pelo efeito térmico dos alimentos (10%) e pelo gasto de energia com atividade física. Atividade física é o mais importante componente variável, representando cerca de 20% a 30 % do gasto energético total em adultos. O resultado de uma cirurgia plástica é inversamente proporcional ao sobrepeso, ou seja, quanto mais próxima do peso ideal estiver a paciente, melhor será o resultado cirúrgico. Pacientes com excesso de peso devem procurar perdê-lo antes de realizar a cirurgia proposta. BOUCHARD C. Genetics of obesity: overview and research direction. In: Bouchard C, ed. The Genetics of Obesity. Boca Raton; 1994:223 233. CRAIG PL, TRUSWELL AS. Dynamics of food habits of newly married couples: weight and exercise patterns. Aust J Nutr Dietet 1990;47:42-6. EPEL ES, McEWEN B, SEEMAN T, MATTHEUS K, CASTELLAZZO G, BROWNELL KD, et al. Stress and body shape: stress induced cortisol secretion is consistently greater among women with central fat. Psychosom Med 2000;62:623-32. EWING R, CERVERO R. Travel and the Built Environment: A Synthesis. Transportation Research Record 1780; 2001. FOREYT J, GOODRICK K. The ultimate triumph of obesity. Lancet. 1995;346:134 135. GORTMAKER SL, MUST A, PERRIN JM, et al. Social and economic consequences of overweight in adolescence and young adulthood. N Engl J Med. 1993;329:1008 1012. GORTMAKER SL, MUST A, SOBOL AM, et al. Television viewing as a cause of increasing obesity among children in the United States, 1986 1990. Arch Pediatr Adolesc Med. 1996;150:356 362.
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