A TERCEIRIZAÇÃO NA REALIDADE BRASILEIRA

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Transcrição:

A TERCEIRIZAÇÃO NA REALIDADE BRASILEIRA Adriana Goulart de Sena Juíza do Trabalho Titular da 1 ª Vara de Contagem MG Atuando, por convocação no sistema de mutirão junto à 3 ª Turma do TRT 3 ª Região Autora do livro A Nova Caracterização da Sucessão Trabalhista Editora LTr Professora Assistente Faculdade de Direito da UFMG - Direito e Processo do Trabalho Mestre em Direito pela UFMG Para se falar de terceirização na realidade brasileira, é mister pontuar, inicialmente, o que é terceirização. Para o Direito do Trabalho, terceirização é o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente 1. Por tal fenômeno o trabalhador é inserido no processo produtivo do tomador de serviço, todavia os vínculos jurídico-trabalhistas preservam fixados com a entidade interveniente, desde que, por óbvio, inexista fraude. O modelo trilateral de relação jurídica oriundo da terceirização é efetivamente diverso daquele modelo bilateral clássico que se funda na relação clássica de emprego. Assim, exceto nas hipóteses expressamente previstas ou permitidas pelo Direito pátrio, doutrina e jurisprudência tendem a rejeitar a hipótese terceirizante, porque modalidade excetuativa de contratação de força de trabalho. Interessante verificar que a visão sobre a terceirização, dependendo do observador e de sua origem, tende a se alterar e até, em certos momentos, ser diametralmente oposta. Por 1 DELGADO, Maurício Godinho. Introdução ao Direito do Trabalho. Ltr. P. 375.

exemplo, da ciência administração de empresas temos que a terceirização seria o direito de contratar terceiro para melhor atingir o objetivo social. A terceirização poderia abranger tanto o outsourcing (transferência total de certos setores da empresa a terceiros) como o multisourcing (segmentação de terceirização de um departamento da empresa entre várias empresas ). 2 Para tal segmento, a terceirização tem como escopo a redução de custos, a melhora da qualidade do produto e a ampliação dos benefícios da especialização. E, isso ocorreria porque a empresa passaria a se concentrar em suas atividades essenciais, terceirizando as não essenciais. A terceirização é um fenômeno relativamente recente no Direito do Trabalho brasileiro. A Consolidação das Leis do Trabalho (1943) faz referência à empreitada e subempreitada (art. 451, da CLT), que são figuras civis de subcontratação de mão-de-obra. No final dos anos 60, o Decreto 200/67 faz referência à hipótese terceirizante no segmento estatal. Em 1974, a lei 6019 introduziu no universo privado da economia a terceirização, todavia provisória, regulamentando o chamado trabalho temporário. Em 1983, a Lei 7102 autorizou a terceirização do trabalho de vigilância bancária, que podia ser efetuada em caráter permanente. E, por último, pontue-se que o acréscimo do parágrafo único do art. 442, da CLT feito pela Lei 8949/94, aparentemente introduziu nova hipótese de terceirização a fórmula cooperada. Ao longo dos últimos 25/30 anos, o segmento privado da economia, passou a incorporar, crescentemente, práticas de terceirização da força de trabalho, ao largo de qualquer legislação autorizativa de rompimento do modelo celetista clássico. Trata-se de exemplo marcante de divórcio da ordem jurídica perante os novos fatos sociais, sem que se assista a esforço efetivo para se normatizar tal tema. 2 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. Saraiva. P. 532.

Todavia, diante do fenômeno fático-social, a jurisprudência trabalhista se debruçou sobre a questão tendo o C. Tribunal Superior do Trabalho editado a Súmula 331, sendo minuciosa e compondo-se de quatro incisos que serão oportunamente analisados. Não se pode olvidar que o processo de terceirização tem produzido transformações inúmeras no mercado de trabalho e na própria ordem jurídica pátria. Como salientado pelo Professor Maurício Godinho Delgado, falta, contudo, ao mesmo tempo, a mesma clareza quanto à compreensão da exata dimensão e extensão dessas transformações. Faltam, principalmente, ao ramo justrabalhista e seus operadores os instrumentos analíticos necessários para suplantar a perplexidade e submeter o processo sociojurídico da terceirização às direções essenciais do Direito do Trabalho, de modo a não propiciar que ele se transforme na antítese dos princípios, institutos e normas que sempre foram a marca civilizatória e distintiva desse ramos jurídico no contexto da cultura ocidental. 3 O Enunciado 331 do TST Como salientado acima, observada a multiplicação fática do fenômeno terceirizante, os casos começaram a chegar aos Tribunais, sendo que o Enunciado 331, do Colendo TST balisa o tema em âmbito trabalhista. Do item 1 do referido enunciado depreende-se que é ilegal a contratação por empresa interposta, formando-se o vínculo com o tomador de serviços, exceto na hipótese de trabalho temporário. (Lei 6019/74) A contratação de trabalhadores por empresa 3 DELGADO, Maurício Godinho. Introdução ao Direito do Trabalho. LTr. P. 376.

interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo o caso de trabalho temporário (Lei 6019, de 3.1.74). O item II do referido verbete trata da Administração Pública e, levando em linha de conta o art. 37, II, da CR/88 e a obrigatoriedade do concurso público, impede a formação do vínculo direto, mesmo se irregular a contratação do trabalhador por interposta pessoa. II A contratação irregular de trabalhador, através de empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública Direta, Indireta ou Fundacional (art. 37, II, da Constituição da República). Já o item III limita-se a permitir que o usuário recorra, através de contrato de natureza civil, a empresas de vigilância, conservação e limpeza, ou de serviços especializados, ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistentes a pessoalidade e a subordinação direta, pois nesse caso a relação jurídica se estabelecerá com o tomador dos serviços, em face da presença dos pressupostos do conceito de empregado (arts. 2 º e 3 º da CLT). III Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei 7102, 20.6.83), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e subordinação direta. No último item, o de número IV, há uma reafirmação da responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quando se verificar o inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do empregador, inclusive quanto à Administração Pública, desde que tenha havido a participação na relação processual e constem do título executivo judicial. IV O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica na responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das

empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (artigo 71 da Lei 8666/93) (Alterado pela Res. N. 96, de 11.09.00, DJ 19.09.00). Desta feita, depreende-se que o TST acolheu neste verbete os objetivos teóricos da terceirização, que visa a maximizar a qualidade dos serviços, repudiando a marchandage. Incorporou importante distinção entre atividades-meio e atividades-fim do tomador de serviços no tocante à aferição da licitude ou ilicitude trabalhista da terceirização ocorrida. Segundo o referido verbete, as hipóteses de terceirização lícita são: Trabalho Temporário Lei 6019/74 Item I Atividades de Vigilância Lei 7102/83 Item III Atividades de Conservação e Limpeza Item III Serviços Especializados ligados à Atividade-meio do tomador Item III Como atividades-fim podem ser conceituadas as funções e tarefas empresariais e laborais que se ajustam ao núcleo da dinâmica empresarial do tomador dos serviços, compondo a essência dessa dinâmica e contribuindo inclusive para definição de seu posicionamento e classificação no contexto empresarial e econômico. 4 São as atividades nucleares, aquelas que definem a dinâmica empresarial do tomador de serviços. Já as atividades-meio são aquelas funções e tarefas empresariais e laborais que não se ajustam ao núcleo da dinâmica empresarial do tomador dos serviços nem compõem a essência dessa dinâmica ou contribuem para a definição de seu pertencimento no contexto 4 DELGADO, Maurício Godinho. Introdução ao Direito do Trabalho. LTr. P. 385-386.

empresarial e econômico mais amplo. 5 Assim, são atividades periféricas à essência da dinâmica empresarial do tomador dos serviços, por exemplo, transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas (Lei 5645/70), ou atividades de mero apoio ao empreendimento alimentação aos empregados do estabelecimento, etc. Percebe-se, claramente, que em todas as hipóteses mencionadas no item III do Enunciado 331, do TST, não pode ocorrer a pessoalidade ou a subordinação diretas ao tomador de serviços, porque, assim ocorrendo, o vínculo se forma diretamente com o referido tomador. A única situação de terceirização lícita em que se permite a pessoalidade e a subordinação diretas do trabalhador terceirizado perante o tomador de serviços é a do trabalho temporário que merece referência no item I do citado verbete. Logo, terceirizar, descentralizar, delegar tarefas canalizadas para a atividade-fim do usuário além dos limites mencionados, continua merecendo repulsa dos tribunais, que denunciam as conseqüências anti-sociais dessa contratação, em face do aviltamento das relações laborais. É que, dentre outras conseqüências, os empregados perdem as possibilidades de acesso à carreira, salário de categoria, além de acarretar atomização da categoria profissional. Este é o quadro contemporâneo brasileiro, onde a terceirização vem sendo realizada cada vez mais intensamente, numa tendência de desverticalização. No dia 25 de março deste ano, o Jornal Folha de São Paulo, publicou no caderno Cotidiano reportagem que tratava do recente acidente com a empresa Petrobrás, consignando que o número de terceirizados naquela é de 41 mil, sendo que a relação entre os terceirizados e o pessoal efetivo é de 5 DELGADO, Maurício Godinho. Introdução ao Direito do Trabalho. LTr. P. 386.

1,2 para 1. Segundo os sindicatos de petroleiros, a taxa é de 2 terceirizados para cada empregado efetivo. MEIO AMBIENTE DE TRABALHO Mas, o tema da prestação de serviços por terceira empresa não se esgota no exame da possível existência de uma relação de emprego entre o empregado da empresa contratada e a empresa tomadora dos serviços. O meio ambiente do trabalho adequado e seguro é um dos mais importantes e fundamentais direitos do cidadão trabalhador (art. 200, VIII e 225, CR/88), o qual, se desrespeitado, provoca a agressão a toda sociedade, que é quem custeia a Previdência e as ações sociais promovidas pelo Estado. Sabe-se, pelas estatísticas oficiais que os números de acidentes do trabalho e doenças profissionais e do trabalho são assustadores, incidindo, o Brasil, em recordes acidentários nada abonadores. Para obter, efetivamente, qualidade de vida, o homem necessita viver em um ambiente ecologicamente equilibrado, sendo que uma das unidades principais desse conjunto é o meio ambiente do trabalho, onde o homem passa a maior parte do seu dia útil. Assegura a Constituição da República que a saúde é direito de todos e dever do Estado (art. 196). Particularizando esse princípio geral na esfera do Direito do Trabalho, pode-se concluir que a manutenção do ambiente do trabalho saudável é direito do trabalhador e dever do empregador. O empresário tem a prerrogativa da livre iniciativa, da escolha da

atividade econômica e dos equipamentos de trabalho, mas, correlatamente, tem obrigação de manter o ambiente de trabalho saudável. Nos últimos anos, tem merecido destaque o pensamento de que a melhor forma para garantir a efetividade das normas de proteção à saúde é a participação dos trabalhadores, os beneficiários diretos da tutela normativa. Com isso, o trabalhador passou a ter direito à informação sobre os riscos a que está exposto, às formas de prevenção e ao treinamento adequado para o desempenho de suas tarefas. (v.g art. 19, par.3 º, da Lei 8213/91 Portaria 25/94 Mapa de Riscos) Não menos certo que a Constituição de 1988 assegurou a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. A segurança visa à integridade física do trabalhador; a higiene tem por objetivo o controle dos agentes do ambiente do trabalho para a manutenção da saúde no seu sentido amplo. As normas internacionais estão enfatizando que a responsabilidade pela aplicação das normas de segurança e saúde no ambiente do trabalho é do empregador. A atuação dos serviços de saúde e a colaboração dos empregados não eximem o empresário desta obrigação. Em razão da crescente terceirização das atividades das empresas, as normas passaram a atribuir ao beneficiário dos serviços a responsabilidade pela aplicação das regras de segurança e saúde, mesmo que o trabalhador esteja vinculado formalmente a outro empregador. A Convenção da OIT n. 167, adotada em 1988, assegura que a responsabilidade é do contratante principal.

Na Noruega, nos locais em que trabalham dois ou mais empregadores, a responsabilidade da coordenação das questões relacionadas com segurança e meio ambiente de trabalho é da empresa principal. Na Suíça, os empresários que têm trabalhadores atuando no mesmo local deverão estabelecer acordo de cooperação para as questões de higiene no trabalho; entretanto, quando o empregador utiliza serviços contratados, sua responsabilidade estende-se aos trabalhadores da empresa fornecedora. Cotejando-se as diretrizes estrangeiras, podemos concluir que, no ordenamento pátrio, a mesma responsabilidade é outorgada à empresa principal, tomadora dos serviços. É que os serviços executados pelo empregado da empresa prestadora dos serviços (empresa contratada) desenvolvem-se no âmbito da tomadora (empresa contratante). E, nesta empresa são de observância obrigatória as normas que protegem a saúde e a segurança do trabalhador, aplicáveis a todos os prestadores de serviços, sem distinção. Ao cumprirem suas obrigações, os empregados da empresa contratada devem beneficiarse das mesmas conseqüências emergentes da aplicação das normas que protegem a segurança e a saúde do trabalhador. Tais normas são de ordem pública, impostas pelo Estado por motivos superiores de segurança pública. Importam em limitação à garantia de liberdade da empresa e representam emanação do poder de polícia exercido pelo Estado em proveito da coletividade. Portanto, a aplicação de tais normas transcendem o âmbito contratual, no sentido de que não é necessário o suporte de um contrato de trabalho para sua incidência.

Apesar de não estarem vinculados à empresa contratante por uma relação de emprego, os empregados da empresa contratada têm direito às medidas preconizadas pelas normas de saúde e segurança do trabalho. Essas normas são aplicáveis, independentemente da existência de relações contratuais, a quantos prestem serviços no âmbito daquela empresa. Portanto, a empresa contratante deve respeitar as normas de saúde e segurança do trabalhador tanto em relação a seus próprios empregados quanto aos empregados da empresa contratada. O bem jurídico protegido pelas normas de saúde e segurança do trabalho é uno, diz respeito a qualquer empregado, seja da empresa contratante seja da empresa contratada. Portanto, as normas que dispensam proteção ao trabalhador quanto à saúde e à segurança sujeitam a empresa contratante não só em face de seus próprios empregados, mas também perante os empregados da empresa contratada. Por último, saliente-se que a aplicação das normas em apreço por parte da empresa contratante ao empregado da contratada não servirá jamais de argumento em prol do reconhecimento de relação empregatícia entre ambos, porque tal aplicação prescinde da existência de um contrato de trabalho. As normas de saúde e segurança do trabalho não regulam obrigações contratuais: têm em mira interesse maior, que assiste mais à sociedade do que propriamente a cada trabalhador, delas beneficiário.