PERCEPÇÃO VISUAL DA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO SOB A ÓTICA DOS EDUCANDOS DO CURSO DE BIBLIOTECONOMIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE: RELATO DE EXPERIÊNCIA DE ATIVIDADE DESENVOLVIDA NA DISCIPLINA SEMIÓTICA E CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO Fabiano Couto Corrêa da Silva 1 Paula Castro Almeida 2 RESUMO Devido a sua principal característica essencialmente voltada para o uso das tecnologias informacionais, a Sociedade da Informação tal como conhecemos se faz presente em diversos momentos e circunstâncias do dia a dia de todas as pessoas. A partir do conceito de signo desenvolvido por Charles Sanders Peirce, conciliamos o ensino teórico da disciplina Semiótica e Ciência da Informação com as vivências individuais dos educandos. Os resultados foram demonstrados durante mostra fotográfica apresentadas como atividade final da turma de educandos do Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal do Rio Grande. PALAVRAS-CHAVE Semiótica, Ciência da Informação, Sociedade da Informação. INTRODUÇÃO Durante as aulas da disciplina Semiótica e Ciência da Informação, os discentes são orientados a refletirem sobre suas percepções a respeito dos aspectos que configuram a Sociedade da Informação em torno do cotidiano individual de cada um. Suas impressões são captadas em fotos que ficam expostas em mostra fotográfica que ocorre anualmente na Universidade Federal do Rio Grande, denominada Sociedade da Informação: a realidade em foco. O objetivo principal é demonstrar olhares singulares sobre as inferências das informações impressas e virtuais no dia a dia de pessoas comuns e as transformações 1 Docente do Curso de Biblioteconomia da Universidade Federal do Rio Grande. 2 Licenciada em História pela Universidade Federal do Rio Grande.
urbanas advindas de diferentes tecnologias informacionais, evidenciando a realidade de situações que fazem parte desta organização social que estamos imersos, cercados de tecnologias, assistencialismos governamentais e fontes de informação diversas, considerando que a fotografia faz parte do sistema de linguagem proposto pela ciência geral dos signos. Assim, ao final de cada semestre expomos painéis fotográficos de cenários representativos das percepções individuais sobre a forma como as pessoas e, os cenários que nos cercam fazem parte de uma realidade em que alguns têm muito e outros pouco acesso à informação, seja ela para lazer, negócios, cultura, ou qualquer outra demanda informacional específica. A captação de imagens ocorre em situações que os espectadores percebem uma situação com "significado" próprio ao contexto da presente proposta de atividade. Em suma, as fotos tratam de lugares e pessoas, sob a ótica individual de cada um, sendo evidenciada como parte da coletividade. OBJETIVOS A proposta de levar a campo os conceitos tratados em sala de aula sob a égide da interpretação de signo disposta por Peirce (2008) visa apresentar uma contribuição para a análise da Sociedade da Informação e suas expressões de consumo na contemporaneidade, com foco nas manifestações que fazem parte do cotidiano dos educandos. Objetiva ainda desenvolver as habilidades de observação, análise e interpretação das manifestações da sociedade tecnológica que nos cerca, ampliando o debate sobre temas relacionados, tais como: inclusão x exclusão digital; sociedade de consumo, ansiedade de informação, dentre outros. DESENVOLVIMENTO DO TEMA
A semiótica configura-se como ciência que possibilita analisar a produção de sentidos em diferentes contextos sígnicos, oferecendo um método de análise para compreender as razões do uso de determinada linguagem, seja ela discursiva, visual ou sonora. Assim, a produção de sentidos, segundo a semiótica, abre caminho para o observador avaliar os aspectos e circunstâncias que envolvem um fenômeno de acordo com circunstâncias sociais, econômicas e culturais complexas, tal como se apresenta a organização social que se convencionou denominar Sociedade da Informação. Devido a sua característica de oferecer amplo acesso a informação e em diferentes formatos, a Sociedade da Informação também gera exclusão social aos menos favorecidos tanto economicamente, quanto aos que não possuem acesso à educação de qualidade. Na análise da Sociedade da Informação, lidamos com diferentes percepções sobre o seu real significado, ou seja, a diferença entre o que sabemos a respeito, o que lemos, ouvimos, aprendemos, e o que vivenciamos, observamos de forma concreta em nosso cotidiano. O contexto desta sociedade é amplo e diversificado, congregando uma variedade de elementos que evocam questionamentos sobre a universalidade de uma sociedade ampla e difusa. Talvez ainda estejamos vivenciando uma Pré-Sociedade da Informação ou então estamos percorrendo este caminho a passos largos. As estatísticas são um parâmetro que mostra muito. Muito? De qual lado? De qual maioria? Estes questionamentos contemplam a construção do pensamento crítico desenvolvido ao longo da disciplina Semiótica e Ciência da Informação, preparando os discentes para uma visão crítica da Sociedade da Informação, demonstrada em imagens. De acordo com SMIT (1996), para se pensar a representação e a consequente recuperação da informação iconográfica, os sistemas de informação devem centrar suas ações no rol de necessidades apresentados por seus usuários. No
uso e nas percepções da informação nas imagens, alguns conceitos são preconizados: Ícones: não há diferença entre representante e o objeto representado, ou seja, o objeto possuiu uma representação consensual pelo que é de fato, confundindo-se com o próprio objeto. Índices: Representam algo que não está presente e esta representação decorre de sugestões sobre a denominação de um objeto. Uma das caracterizações que Peirce (2008) faz do símbolo é descrita como aquele signo cuja relação com o objeto consiste numa relação com o interpretante. Essa definição não é tão enigmática quanto parece, pois, como uma terceiridade (o símbolo é o terceiro termo da segunda tricotomia dos signos; o primeiro é o ícone e o segundo o índice), essa função sígnica dirige-se para o futuro em termos de regularidade ou lei. Isso que dizer que o símbolo é aquele signo que será representado em seu interpretante como signo de seu objeto. Dito de outro modo, o interpretante de um símbolo é previsível porque seu objeto já é conhecido, corroborando com essa interpretação dos símbolos temos François Laplantine, oferecendo a antropologia simbólica 3 e suas mais variadas percepções da construção de imagem, ideia e símbolos. Para a semiótica um signo em que o objeto é conhecido e o interpretante pode ser facilmente alcançado, é um signo que representa uma convenção ou conceitos similares. Desse modo, a representação do objeto não se faz no símbolo, já que o signo seria um índice. Conceituar um signo de símbolo significa que seu interpretante refletirá seu objeto. Isto representa a identificação do conceito de símbolo com os 3 Laplantine afirma que o objeto da Antropologia simbólica é essa região da linguagem que chamamos de símbolo e que é o lugar de múltiplas significações. LAPLANTINE, François. Aprender Antropologia. Tradução: Marie- Agnès Chauvel; prefácio Maria Isaura Pereira Queiroz. São Paulo: Brasiliense, 2003.
convencionais, de senso comum. Todavia, o símbolo não reflete esses conceitos, ou seja, ele não se conforma a uma prática ou segue uma regra. Laplantine (2003) descreve que o símbolo e seus significados são polissemânticos e polivalentes, permitindo variadas concepções, considerando as condições históricas e culturais pré-determinadas. Assim, outra caracterização de símbolo poderia ser a de que seu caráter representativo consiste precisamente no fato de que ele é uma regra que vai determinar seu interpretante, representando que qualquer símbolo controla seu significado. Desse modo, qualquer substantivo comum é simbólico, enquanto que um nome próprio é indicial relativamente ao substantivo comum. O nome próprio simplesmente aponta para seu portador (um singular dentro daquela espécie), mas o substantivo comum nomeia coletivamente todos os seres daquela espécie e ao mesmo tempo exclui os não pertencentes àquela espécie. Um intérprete sabe que a palavra sociedade denota diversos tipos de organizações sociais e somente isso. De maneira equivalente, os chamados símbolos sociais exercem a função de controlar o comportamento dos cidadãos, na medida em que seus interpretantes são previsíveis. Nesta classe encontram-se o dinheiro, os rituais sociais/religiosos, os adereços, a vestimenta, as bandeiras nacionais, a sinalização de trânsito, por exemplo. De um modo geral, seria possível dizer que a cultura é simbólica, na medida em que ela dita e é responsável por certos padrões comportamentais, sociais, intelectuais e ideológicos de uma determinada comunidade. Desta maneira o aprendizado desenvolvido durante a mostra fotográfica evidencia a percepção de mundo de cada educando, aprimorando-a no momento em que se aguça essa depreensão através da análise de como as pessoas lidam com a informação no seu cotidiano. Esses processos semióticos peirceanos pensados juntamente com o estudo da antropologia simbólica, evidencia a importância da rede simbólica na vida social.
A Antropologia simbólica de Laplantine (2003) aponta justamente nesta direção, trabalhando as representações sociais, dentre esses os significados de imagens e, todas as propriedades sensoriais, físicas e psíquicas para adquirir status semiótico (FONTANILLE, 2011). A partir das lentes destas teorias, pensamos a prática de capturar e analisar imagens, expondo o acesso à informação no cotidiano contemporâneo, desenvolvendo uma análise a partir da percepção diferenciada dos estudantes da área. A cena de um senhor(a) utilizando um notebook, acessando a internet e seus mais variados conteúdos, ou a de um morador de rua lendo o jornal de ontem no afã de se informar sobre o que ocorre no mundo, corresponde, quando observado sob a luz da Ciência da Informação, a um fenômeno rico de significados e, que simbolicamente evidencia a abundancia de representações sociais sobre a temática em questão. Avaliamos igualmente, o discurso contido nessas imagens representativas, levando em consideração o contexto de cada fotografia. Por exemplo, ao ver uma pessoa de idade avançada acessando a web, logo julgamos que a mesma provém de uma realidade outra, na qual a internet não faz parte, portanto as vivencias dela são destoantes de quem vive ou nasceu na era da informação ao alcance de um click. Por isso, essas imagens podem ser compreendidas como uma representação das transformações geradas pela ampliação do acesso à informação. A mostra fotográfica, realizada pelos alunos da disciplina de Semiótica e Ciência da Informação expõe tal fenômeno, mostrando por meio da apreensão de imagens, novas concepções de mundo. Esse novo paradigma que rompe com ideias preconcebidas, democratizando e socializando a informação, atenuando a linha entre os ditos incluídos e excluídos digitais. Assim os símbolos e seus significados, historicamente constituídos, denotam mudanças significativas, constituindo outros cenários percebidos nos mais variados grupos, transformando dialeticamente os símbolos e seus significados. Laplantine legitima, afirmando a versatilidade e a importância desses conceitos para a sociedade:
Enquanto os signos estão diretamente referidos aos objetos, formas, imagens concretas ou abstratas que apontam para uma direção única e conhecida, os símbolos são polissemânticos e polivalentes, aparando-se também no referencial significante que lhes propicia os sentidos, os quais contêm significações afetivas e são mobilizadores dos comportamentos sociais. A eficácia dos símbolos consiste nesse caráter mobílizador e promotor das experiências cotidianas: os símbolos permitem a cura de doenças psicossomáticas e fazem emergir emoções como raiva, violência, nostalgia e euforia. (LAPLANTINE, 2003, p.6) Assim, utilizar a fotografia como sistema de linguagem, permite que os educandos ampliem e adquiram um olhar mais crítico em relação ao seu próprio contexto, enriquecendo a sua compreensão sobre os fenômenos culturais, também denominados sistemas sígnicos pela semiótica. RESULTADOS As imagens registradas pelos estudantes demonstraram uma percepção visual da Sociedade da Informação, direcionada para o confronto entre os suportes impresso e virtual. Selecionamos duas imagens da mostra fotográfica como exemplo desse contraponto, acompanhadas das legendas apresentadas pelas alunas: Fotografia 1: Jovens buscam diversão através da informação, mesmo numa sociedade onde o meio digital supera o impresso,eles provam que a banca de revistas ainda tem seu valor.
Diversas imagens também representaram a relação homem-computador sob diferentes aspectos, destacando-se principalmente imagens simbolizando a ausência de barreiras para o acesso à informação, abrangendo pessoas de todas as idades, como pode ser verificado na imagem a seguir: Fotografia 2: Utilizando acesso à Internet como forma de lazer e busca de informação, idoso demonstra que não precisa ser jovem para seguir tendências. A apresentação das imagens foi acompanhada de debates acerca das conexões entre as representações sígnicas apresentadas por Peirce (2008) e o olhar do fotógrafo, ou seja, suas intenções ao captar a imagem e a aproximação consensual com seu público apreciador. Como resultado da atividade, ficou claro que o processo reflexivo dos educandos foi acentuado quando representaram a fundamentação teórica discutida em sala de aula por meio de imagens. CONCLUSÕES Ao adotar uma abordagem semiótica para incentivar que os alunos exercitassem análise crítica das suas experiências pessoais registrando momentos representativos da Sociedade da informação que cercam a todos, foi possível reunir diferentes olhares sobre um fenômeno tão representativo no campo teórico que estudam. A junção entre texto (referencial teórico do campo da Ciência da Informação) e o seu contexto (teoria
na prática) elevou a receptividade dos alunos para cumprir esta atividade, sendo encarada com entusiasmo ao passo que foi aberta oportunidade para representar de forma sígnica o que pensam, veem e percebem do seu próprio contexto, ultrapassando e enriquecendo as representações até então sistematizadas socialmente por estes estudantes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. Trad. José Teixeira Coelho Neto. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2008. SANTAELLA, Lucia. O que é Semiótica: São Paulo: Brasiliense, 1992. SMIT, Johanna. A representação da imagem. INFORMARE, Rio de Janeiro, v. 2, n. 2, p. 28-36, jan./dez. 1996. FERRARA, Lucrécia D'Aléssio. A estratégia dos signos linguagem, espaço, ambiente urbano. : linguagem, espaço, ambiente urbano. São Paulo: Perspectiva,1981.. AQUINO, M. de A. (Org.). O campo da Ciência da Informação: gênese, conexões e especificidade. UFPB: Editora Universitária, 2002. LAPLANTINE, François. Aprender Antropologia. Tradução: Marie- Agnès Chauvel; prefácio Maria Isaura Pereira Queiroz. São Paulo: Brasiliense, 2003. LAPLANTINE, François; TRINDADE, Liana S. O que é Imaginário. 1ª reimpreesão da 1ª edição de 1996. São Paulo: Ed. Brasiliense, 2003. Coleção. Primeiros Passos. FONTANILLE, Jacques. Semiótica. Tradução: Jean Cristtus Portela. Ed. Contexto, 2011.