ANÁLISE DO RISCO DE INCUMPRIMENTO: NA PERSPECTIVA DA SEGURANÇA SOCIAL



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Transcrição:

ANÁLISE DO RISCO DE INCUMPRIMENTO: NA PERSPECTIVA DA SEGURANÇA SOCIAL João Carvalho das Neves (Professor associado em gestão, ISEG) João Andrade e Silva, (Professor Associado em Matemática, ISEG). Projecto financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia e da Segurança Social 1

Índice ANÁLISE DO RISCO DE INCUMPRIMENTO: NA PERSPECTIVA DA SEGURANÇA SOCIAL 1 1. Introdução... 4 2. Técnicas de análise de risco de capital alheio... 7 2.1 Sistemas de rating... 7 2.2 Os sistemas de scoring... 8 2.2.1 Análise univariada... 9 2.2.2 Análise multivariada... 11 2.2.3 Modelos não paramétricos... 12 2.3 Modelos de inteligência artificial... 13 2.4 Modelos de mercado... 16 2.4.1 Spread da taxa de juro... 16 2.4.2 Taxas de mortalidade e migração do crédito... 17 2.5 Modelo das opções na avaliação do risco de crédito... 19 2.6 Justificação dos modelos a serem utilizados no estudo... 22 3. Introdução à análise discriminante e ao logit... 22 3.1 A análise discriminante... 23 3.1.1 Estimação da função discriminante... 23 3.1.2 Critérios de avaliação da qualidade do ajustamento... 25 3.1.3 A violação das hipóteses... 29 3.2 Modelo logit... 31 3.3 Análise discriminante e modelo logit... 35 3.4 Processo de amostragem... 38 4. O Processo de pesquisa de informação... 39 4.1 IGFSS - Instituto da Gestão Financeira e da Segurança Social... 40 4.2 GACRE - Gabinete de Apoio para a Coordenação da Recuperação de Empresas... 41 4.3 IAPMEI - Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento... 42 4.4 MOPE - Informação para Gestão de Empresas... 42 5. Análise da informação obtida... 44 5.1 Definição de empresa em insolvência... 45 5.2 Definição da amostra... 47 5.3 Escolha dos rácios utilizados... 49 5.4 A escolha do ano de 1994 como ano base... 50 5.5 Tratamento preliminar da informação... 50 5.6 Tratamento da informação por cada uma das sub-populações... 53 6. Análise dos resultados... 55 6.1 A estimação de um modelo clássico e sua análise: o modelo de Altman... 56 6.2 A construção de um modelo optimizado... 59 6.3 A consideração de uma zona cinzenta... 62 6.3.1 Algumas reflexões sobre os erros de classificação... 63 6.3.2 A construção de zonas simétricas... 65 6.4 O ensaio do modelo para a informação de 1995... 69 7. Conclusão... 71 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 75 ANEXO I - Notação da Standard & Poor's... 79 ANEXO II - Taxas de mortalidade do rating original - todas as obrigações de empresa (1971-1996)*.. 81 ANEXO III - Estimativa do risco de crédito de uma obrigação BBB... 82 ANEXO IV - Rácios utilizados... 84 ANEXO V Caracterização sumária dos rácios... 86 1 João Carvalho das Neves (Professor associado em gestão, ISEG) e João Andrade e Silva, (Professor Associado em Matemática, ISEG). Os autores agradecem o financiamento obtido da Fundação para a Ciência e Tecnologia e da Segurança Social. 2

ANEXO VI Coeficientes de correlação entre rácios... 93 ANEXO VII Comparação das duas sub-populações... 105 ANEXO VIII Modelo baseado em Altman (1968)... 110 Modelo 1 Rácios de Altman e análise discriminante... 110 7.1 Modelo 2 Análise discriminante e rácios corrigidos... 114 Modelo 3 Rácios de Altman e modelo logit... 117 Modelo 4 - Rácios de Altman corrigidos e logit... 118 ANEXO IX Modelo seleccionado... 119 Modelo 1 Ajustamento pelo logit... 119 Modelo 2 Análise dicriminante... 120 ANEXO X Teste de Lo (1986) Análise discriminante versus logit... 123 ANEXO XI Aplicação do modelo para 1995... 126 Modelo 1 Ajustamento pelo logit... 126 Modelo 2 Análise discriminante... 127 3

1. Introdução A presente investigação foi financiada pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e pelo Instituto da Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS) com vista a dar um contributo, no mercado português, para o desenvolvimento de sinais de alerta sobre o risco de crédito das empresas. Tem-se verificado em Portugal, nos últimos anos, um número de falências elevado. Neves (1997b) evidencia que o número de processos especiais de recuperação da empresa e da falência entrados em Tribunal e o número de declarações de falência aumentou de forma significativa de 1992 a 1996. Em 1994 quase que duplicam os processos entrados em Juízo e o número de falências declaradas, mantendo-se a um nível elevado desde essa data. Quadro 1 - Número de processos e de falências Processo apresentados 1992 1993 1994 1995 1996 Total % do total Processos de recuperação 25 626 973 871 704 3199 55,3% Processos de falência 3 61 135 167 148 514 8,9% Requerimentos de falência 16 109 447 653 842 2067 35,8% Total 44 796 1555 1691 1694 5780 100,0% Declarações de falências 202 269 404 525 522 1922 33,3% Fonte: MOPE Esta situação foi determinante para a Resolução de Conselho de Ministros nº 100/96 de 4 de Julho onde se definia um quadro de apoio à recuperação de empresas em situação difícil. Esta Resolução de Conselho de Ministros e os diplomas a ela associados deram origem à designação de "Plano Mateus" 2. Este plano não conseguiu, no entanto, os resultados desejados, tendo sido recentemente extinto o Gabinete de Coordenação para a Recuperação de Empresas (GACRE) então criado para coordenar esta actividade de recuperação de empresas. O actual Ministro da Economia, Dr. Pina Moura pretende agora introduzir uma nova filosofia de actuação nesta área económica. 4

Esta preocupação política pela situação económico financeira das empresas tem a ver com as repercussões sociais resultantes de um elevado número de falências no aumento do desemprego e nos efeitos de marginalização e exclusão social que lhes estão associados. Para além dos efeitos sociais da falência, os custos directos e indirectos são muito elevados, embora não se conheça o seu valor para o caso Português. Altman (1984) estimou que esses custos nos EUA seriam de cerca de 20% do valor dos activos da empresa. Acresce ainda que, quando uma empresa entra em falência ou mesmo em processo judicial de recuperação, os credores para além dos custos legais e administrativos perdem, sistematicamente, uma parte substancial do crédito (capital e juros), chegando estes valores a representar mais de 50% do valor nominal do crédito e os titulares do capital social (sócios ou accionistas) vêem o seu capital sistematicamente diluído, senão mesmo totalmente perdido. Por todas estas razões, tem-se produzido bastante investigação sobre a utilização dos rácios financeiros na previsão de falências e de incumprimentos de dívida, sobretudo nos EUA, no Reino Unido e, de forma mais moderada, em França e na Alemanha. Pretendese com estes estudos identificar uma função estatística (v.g. discriminante, logit ou probit ) que classifique as empresas em função do seu grau de risco de falência ou de incumprimento. O método dos rácios é utilizado com diversas finalidades, nomeadamente, na análise da capacidade de endividamento e da empresa em solver as suas dívidas, na apreciação do desempenho económico-financeiro da gestão, etc. Não deve surpreender ninguém o facto da informação financeira actual das empresas ser uma das bases utilizadas para a previsão de situações financeiras difíceis em futuro próximo. Os rácios são instrumentos utilizados pelos analistas, entre outros, precisamente para esse efeito. Empresas que evidenciem falta de liquidez, alto grau de 2 Entre outros diplomas os mais relevantes foram a Resolução de Conselho de Ministros nº 100/96 de 4 de Julho; Dec.Lei nº 124/96 de 10 de Agosto; Dec.Lei nº 125/96 de 10 de Agosto e Dec.Lei nº 127/96 de 10 de Agosto. 5

endividamento, fraca rendibilidade e dificuldade de transformar lucros em fluxos de caixa são candidatas a insolventes. Muitos dos estudos empíricos neste domínio utilizam listas de rácios, sem se basearem em qualquer teoria e, por via de métodos estatísticos, procuram seleccionar os que melhor se adaptam às respectivas amostras. Whittington (1980) classifica a utilização dos rácios da seguinte forma: a) Tradicional ou normativa - a evolução dos rácios da empresa são comparados com a evolução dos rácios do sector ou da concorrência mais directa; b) Positivista - os rácios são utilizados para estimar relações empíricas entre valores e são utilizados como meio de previsão. A análise tradicional ou normativa é muito utilizada para análise da gestão de uma empresa específica, nomeadamente, integradas em diagnósticos estratégicos da empresa. Os rácios económico financeiros, na perspectiva positivista, são utilizados pelos analistas financeiros para fazer previsões sobre variáveis financeiras, tais como, a rendibilidade dos capitais e os lucros. Mais recentemente, os investigadores têm vindo a recorrer à aplicação de modelos estatísticos sobre diversos tipos de rácios, tendo em vista, por exemplo, a previsão de falência, a previsão do rating do crédito, a avaliação do risco e o teste de diversas hipóteses económicas. Os estudos pioneiros na utilização dos rácios como forma de prever a falência são de Beaver (1966) com análise univariada e de Altman (1968) com análise multivariada. Diversos estudos posteriores vieram utilizar, como Altman, a análise discriminante. De entre esses estudos iniciais salientam-se, nos EUA, Meyer e Pifer (1970), Deakin (1972), Edminster (1973) e Blum (1974) e, no Reino Unido, Taffler (1982) e Barnes (1983), entre outros. 6

O número de empresas com dívidas em mora à Segurança Social, a situação de risco de grande número dessas empresas e os resultados conseguidos, em outros países, com a utilização dos rácios financeiros na previsão de falência, foram os principais motivadores para o desenvolvimento da sua aplicação em Portugal. 2. Técnicas de análise de risco de capital alheio Neves (1997a) classificou os sistemas clássicos de análise do risco de crédito em sistemas de "scoring" (pontuação) e sistemas de "rating" (notação crédito). Mais recentemente 3 têm-se desenvolvidos outros modelos de análise de risco de crédito, tendo por base, nomeadamente: a) modelos que utilizam a inteligência artificial, como sejam os expert systems e as redes neuronais; b) modelos que utilizam informação de mercado, como seja a estrutura temporal da taxa de juro e as taxas de mortalidade e migração do crédito; c) modelos que utilizam a teoria das opções na avaliação do risco de incumprimento. 2.1 Sistemas de rating Os sistemas tipo "rating" visam classificar uma emissão obrigacionista ou outros títulos de dívida numa escala de notação de risco e reflectem um juízo de valor sobre a capacidade de pagamento atempado do serviço da dívida da operação em análise. Desse modo, o processo de "rating" além de ser orientado para o futuro proporciona também, um indicador da probabilidade de o emissor pagar, dentro dos prazos, o capital e os juros da emissão. As agências de "rating" não atribuem "rating" a empresas mas a títulos de dívida de uma empresa. De facto, dois títulos de uma mesma empresa podem oferecer riscos diferentes ao detentor do título, dependendo das garantias inerentes ao crédito em 3 Documentação dos seminários realizados pela Stern School of Business, New York University, "Credit Risk Management with Special Reference to Credits Metrics" animado por E. Altman e A. Saunders, Janeiro 1998 e "Advanced Topics in Market Risk Measurement and Management" animado por J. Boudoukh e A. Saunders, Fevereiro 1998. 7

caso de falência. O "rating" trata, por isso, de medir o risco de um capital alheio específico. Mas é evidente que a análise se faz sobre a empresa emitente. A classificação final depende da percepção que o analista tenha sobre a situação global da empresa e da sua capacidade de cumprimento da dívida em causa. A banca também pratica o "rating" na concessão de crédito, através de metodologias desenvolvidas pelos analistas dos seus departamentos de risco de crédito. Essas metodologias pretendem definir procedimentos que conduzam à recolha de informação sobre as variáveis relevantes do risco de crédito e que sejam analisadas e ponderadas de forma consistente. Uma das metodologias mais conhecidas é a do sistema dos 6 C's: a) Carácter do devedor no que se refere ao seu empenhamento em cumprir os compromissos assumidos; b) Capacidade legal do devedor em assumir os compromissos financeiros; c) Capital refere-se à capacidade de endividamento e flexibilidade financeira do devedor; d) Condições que respeita aos factores do meio ambiente que podem afectar a capacidade do devedor em cumprir com os compromissos financeiros assumidos; e) Colateral que especificamente considera o valor dos activos que garantem o pagamento da dívida; f) Controlo que respeita ao sistema de informação do devedor na sua gestão financeira e operacional. No "rating" a informação qualitativa e quantitativa é tratada de forma a produzir no analista a percepção de qual o grupo de risco a que a empresa em causa pertence, a partir de uma definição prévia de tipos de grupos de risco. Por exemplo, a Standard & Poors classifica o crédito em 10 graus diferentes (Anexo I). 2.2 Os sistemas de scoring 8

Os sistemas de "scoring" (ou de pontuação do risco de crédito) aplicam rácios e outros indicadores para classificar, de forma automatizada, as empresas por grau de risco e baseiam-se, normalmente, em informações históricas. Os modelos de "scoring" podem ser teóricos ou empíricos com desenvolvimentos mais ou menos sofisticados do ponto de vista técnico. Os modelos teóricos são os mais utilizados na prática e baseiam-se na sensibilidade, experiência e conhecimento teórico do analista financeiro. Estes métodos têm a vantagem de fácil e rápida concepção mas, porque a realidade é complexa, a percepção teórica e a sensibilidade do analista pode conduzir a um modelo ineficaz na selecção e classificação das empresas no seu grau de risco. Pior ainda quando, na prática, raramente existe controlo "a posteriori" da eficiência do sistema. Os modelos empíricos utilizam técnicas estatísticas para seleccionar os rácios e a ponderação dos mesmos numa função que conduza a uma melhor classificação da empresa no seu grupo de risco. Estas técnicas estatísticas podem ser paramétricas ou não paramétricas. Das técnicas paramétricas destacam-se as análises univariadas e multivariadas. Na análise multivariada as mais utilizadas na análise do risco de crédito são a análise discriminante, o logit e o probit. 2.2.1 Análise univariada Beaver (1966) foi um dos pioneiros na investigação da insolvência através de rácios financeiros, concebendo de forma descritiva o seguinte modelo de empresa, numa óptica financeira: A empresa pode ser encarada como um reservatório de activos líquidos, com entradas e saídas de dinheiro. O reservatório serve como segurança contra variações dos fluxos. A solvência da empresa pode ser definida como a probabilidade de o reservatório se esgotar, e nessa altura, a empresa ficará sem condições para pagar as obrigações financeiras que se vencem. 9

Neste seu estudo, Beaver (1966) analisa a tendência de 7 rácios financeiros 4, normalmente usados pelos analistas financeiros à época, durante 5 anos antes da falência, através de uma amostra de 79 empresas insolventes, comparando-os com os de outras 79 empresas em situação considerada normal, tendo estas últimas sido seleccionadas fazendo o "matching" por industria, região e dimensão das empresas insolventes da amostra. Através da distribuição dos valores encontrados para cada rácio procura identificar o ponto de corte ( cut-off point ) e testa, de seguida, esse ponto de corte, com uma amostra de validação. Beaver (1966) chega a resultados bastante encorajadores com apenas 9% de empresas classificadas incorrectamente. Previsto Observado: Falência Não Falência Falência 43% 7% Não Falência 2% 48% Estes resultados embora interessantes têm uma série de problemas que convém realçar: a) Como veremos adiante os erros de previsão tipo I e tipo II não têm o mesmo custo para o decisor (Altman, Haldeman e Narayanan, 1977). Para a generalidade dos credores é mais oneroso ocorrer a falência quando estes a não previam (Erro tipo I), que é precisamente onde a previsão de Beaver mais falha; b) A amostra de Beaver subdivide-se em partes iguais de empresas falidas e não falidas. No universo o número de empresas não falidas é maior do que o número de empresas falidas e o erro de previsão tende a ser maior na prática do que o estimado pelo modelo; c) A selecção dos rácios não se baseou em qualquer teoria da falência, mas por serem bastante utilizados na prática. Um dos inconvenientes é que, por serem Cash flow Re sultados Liquidos Passivo Fundo Maneio 4 ; ; ; ; Passivo Activos Activos Activos Liquidez geral; Intervalo de segurança; Acivos. 10

muito utilizados por analistas, são também aqueles que os processos de contabilidade criativas procuram mascarar (Zavgren, 1983); d) O teste utiliza separadamente os rácios quando, na produção dos relatórios de análise financeira o analista procura interligá-los para compreender a evolução e a situação financeira da empresa. De facto, um rácio apenas, num determinado momento, diz muito pouco ao analista financeiro. Daí o interesse da análise multivariada. 2.2.2 Análise multivariada A análise discriminante linear, apesar das insuficiências técnicas referidas em vários estudos de aplicação às finanças - como seja o pressuposto de que as variáveis utilizadas para caracterizar os grupos têm distribuição normal, que as matrizes de dispersão (variância-covariância) são iguais para todos os grupos, ou o pressuposto de que os grupos são discretos e identificáveis - é a mais utilizada neste tipo de trabalhos de investigação empírica e a que tem maior utilização na prática, em consequência de três referências fundamentais: i) os trabalhos de Altman nos EUA enquanto percursor na investigação do risco de falência e, posteriormente, pela comercialização deste tipo de informação; ii) Taffler publicou diversas investigações efectuadas no Reino Unido com base nesta mesma técnica e também este tipo de informação passou a ser comercializada; iii) O Banco Central Francês que produz informação sobre o risco das empresas francesas, por sectores de actividade com base na análise discriminante. Enquanto a análise discriminante procura, dentro de um conjunto de características, a melhor forma de discriminar os grupos de risco (normalmente dois ou três), os modelos logit e probit, que se baseiam, respectivamente, numa função logística e numa função normal, procedem de forma dual, ao abordarem esta problemática de uma 11

forma semelhante ao modelo de regressão linear, isto é, ao partirem da definição das subpopulações para obterem a função que permite efectuar a discriminação. Esta análise será retomada de forma mais clara e aprofundada na secção 3. 2.2.3 Modelos não paramétricos Mais recentemente, tem-se estudado a eficiência de técnicas não paramétricas na classificação das empresas por grau de risco, nomeadamente, através de métodos da vizinhança mais próxima como o de de Fix-Hodges ou o de Loftsgaarden-Quesenberry ou ainda o "algoritmo de partição recursiva", o algoritmo de Quinlan e a programação multi-objectivo. A investigação empírica evidencia que os modelos não paramétricos apresentam uma maior eficiência na classificação de empresas em grupos de risco por comparação com a análise discriminante, nomeadamente o modelo de Fix-Hodges (Stein e Ziegler, 1984). Numa abordagem mais geral onde se compara a análise discriminante linear e quadrática, o logit, a programação matemática, a partição recursiva e um modelo teórico com atributos múltiplos de uma instituição bancária americana Srinivasan e Kim (1987) tiram conclusões semelhantes. Apesar destas conclusões, estes modelos são, na generalidade, desconhecidos no mundo empresarial, quer porque estes algoritmos não integram os packages de maior divulgação quer também porque os estudos comparativos que se referiram (e alguns outros que também se poderiam citar) evidenciam, em termos metodológicos, algumas lacunas significativas. A primeira limitação será, sem qualquer dúvida, o facto de apenas se tratarem casos de pequenas amostras particulares (e portanto de difícil generalização) mas também não deixa de ser importante assinalar que nalguns casos a definição das subpopulações não é feita com base num critério objectivo. Paradigmático desta situação é o trabalho de Srinivasan e Kim (1987) onde, para além das limitações amostrais referidas, o critério de correcta classificação é a opinião de um perito, com todas as limitações que daí advêm. 12

2.3 Modelos de inteligência artificial Nos anos 90 começaram a surgir, como em muitos outros campos da estatística, metodologias baseadas na aplicação de redes neuronais, um dos domínios em que a inteligência artificial se tem mostrado mais fecunda em produzir modelos teoricamente aplicáveis. Trata-se de um campo de investigação fora do domínio de especialização dos autores o que conduzirá a que apenas se proceda a um breve survey das aplicações mais significativas destas metodologias aos problemas de classificação de empresas (ou mais genericamente de crédito, uma vez que boa parte destas aplicações estão viradas para auxiliar os bancos na concessão, ou não, de crédito sob as suas mais variadas formas), procurando-se não só referir a visão dos autores oriundos deste domínio científico como, também, sublinhar a visão têm mostrado autores mais virados para os problemas financeiros. Nas pesquisas bibliográficas feitas, a referência mais completa às aplicações das redes neuronais a problemas de finanças que se encontrou foi o excelente livro de readings editado por Trippi e Turban (1993) muito embora se tenham, naturalmente, obtido referências a trabalhos mais recentes como por exemplo Altmam et al. (1994) ou Bardos e Zhu (1997). Em termos muito genéricos, uma rede neuronal mais não é do que uma tecnologia de processamento da informação que se inspira no funcionamento do cérebro humano, isto é, que se baseia numa rede de unidades base, designadas por neurónios, que reagem a estímulos, produzindo assim um determinado output. Cada um destes neurónios recebe como estímulo determinada informação primária e/ou output originado por outros elementos da rede. No caso presente espera-se que, ao input originalmente introduzido e que corresponde à informação primária (embora esta tenha de ser calibrada para ser aceitável em termos de rede neuronal), corresponda uma classificação das unidades estatísticas consideradas. 13

Klimasaukas (1993) apresenta, em termos particularmente simples e claros, as fases necessárias à implementação de uma rede neuronal e que se podem traduzir por: 1. Organizar uma base de dados com toda a informação relevante disponível; 2. Separar esta informação em dois grupos, destinando-se o primeiro à fase de aprendizagem da rede, enquanto o segundo será utilizado na fase de teste; 3. Transformar a informação primária referida na alínea 1 por forma a poder servir de input à rede; 4. Seleccionar, treinar e testar a rede; Esta fase bem como a eventual reformulação das anteriores deve ser repetida até que os resultados sejam considerados adequados; 5. Aplicar a rede que se acabou de desenvolver à realidade económica. Este autor descreve depois, de uma forma mais detalhada, cada uma das fases, ilustrando a exposição com um exemplo baseado na atribuição ou não de cartões de crédito por parte de uma entidade bancária. Não sendo nosso propósito construir uma rede neuronal, como se explicará na secção 2.6, apenas se farão alguns comentários genéricos a esta metodologia tendo presentes quer os problemas de âmbito mais técnico, que desde logo se podem assinalar, quer os problemas de índole prática, que surgem quando se pretende aplicar esta metodologia no mundo empresarial. Enquanto as duas primeiras fases que se referiram não são, em rigor, específicas da aplicação de redes neuronais, sendo recomendadas para qualquer modelização estatística, nomeadamente, a aplicação da análise discriminante ou do modelo logit, existe, no entanto, tanto quanto nos é possível perceber, uma dependência acrescida das redes neuronais em relação à dimensão das amostras disponíveis, uma vez que se tem necessariamente de considerar uma primeira sub-amostra para aprendizagem e uma segunda para teste. Em termos quantitativos, Klimasaukas (1993) aponta para dimensões da ordem das 30 a 40 mil observações para a fase de aprendizagem, reduzindo esta dimensão para cerca de uma centena de observações nos casos em que o input é constituído por pouca informação e em que se trata de problemáticas bem conhecidas. A fase de transformação da informação é algo heterogénea, uma vez que integra, não só a transformação de variáveis qualitativas em variáveis dummies, procedimento habitual 14

para qualquer econometrista, como uma calibração das variáveis quantitativas que devem ser postas numa escala de 0 a 1. Este último tipo de transformação pode revestirse de mais alguma complexidade, recorrendo-se a vários de tipos de transformações, sendo talavez o mais corrente o recurso à logística. A fase 4 referida por Klimasaukas (1993) constitui o ponto chave. Trata-se de seleccionar uma arquitectura para a rede, com toda a complexidade envolvida e depois iniciar a fase de aprendizagem. Este é, certamente, o ponto mais controverso das metodologias baseadas em redes neuronais. Por um lado, esta fase apresenta dificuldades práticas de implementação quer em termos do software quer do tempo necessário para a aprendizagem embora esta última característica seja particularmente interessante. Finalmente a fase de aplicação, é, para os agentes económicos envolvidos a mais importante. Para o investigador, constructor da rede, ela funcionará apenas para avaliação do trabalho feito. Dos estudos comparando estas novas metodologias com as abordagens mais tradicionais, nomeadamente os modelos logit e a análise discriminante, existem basicamente dois tipos de perspectivas. A primeira corresponde aos autores que desenvolvem as redes neuronais e costumam apresentar vantagens destas metodologias em termos do número de casos bem classificados, sendo este o critério escolhido como determinante. Bardos e Zhu (1997) ilustram esta concepção, trabalhando com uma amostra com mais de 2000 observações, obtendo melhores resultados com as redes neuronais (estes autores discutem várias soluções dentro desta família), mas como os próprios implicitamente reconhecem ainda se está mais numa fase de investigação do que de aplicação prática. Outros analistas como Altman et al. (1994) partem mais duma visão económica e, embora reconheçam as potencialidades destas novas ferramentas, não deixam de as considerar em termos complementares sublinhando dois pontos a que os economistas não podem deixar de se mostrar particularmente sensíveis. Por um lado, os resultados são de muito difícil interpretação à luz dos diferentes rácios introduzidos, tornando-se 15

quase impossível validar, em termos económicos, o modelo obtido, o que levantará certamente muitas dificuldades à implementação prática de tais sistemas. Por outro lado, também se deve realçar a quantidade de informação necessária que, muitas vezes, não se encontra disponível para o analista (como é o nosso caso), e o facto de não haver uma percepção de como o sistema poderá reagir a alterações estruturais. Naturalmente que esta última crítica também é extensível às metodologias tradicionais, mas o facto de se conseguir interpretar economicamente as estimativas obtidas para os parâmetros permitirá sempre alguma flexibilidade a este nível. Em suma, é nossa opinião que se está perante uma metodologia nova e promissora mas em termos complementares às ferramentas estatísticas existentes que, já por si, deverão sempre ser sujeitas ao crivo de uma análise individualizada para os casos mais sensíveis. 2.4 Modelos de mercado 2.4.1 Spread da taxa de juro Este modelo utiliza os prémios de risco inerentes às taxas de rendibilidade até à maturidade (yield) das obrigações das empresas para avaliar o risco de crédito e a probabilidade de incumprimento. Como se disse anteriormente, as agências de rating classificam as empresas por grupos de risco. AAA, AA, A e BBB são créditos considerados de qualidade, BB, B e CCC são categorias de crédito já consideradas em risco e CC, C e D são considerados créditos especulativos e, portanto, de alto risco. O princípio desta análise passa por construir curvas de rendibilidade até à maturidade para as obrigações do tesouro e para as obrigações das empresas classificadas nestes grupos de rating. A diferença (spread) entre as taxas de rendimento (yield) das obrigações em causa e das obrigações do tesouro evidenciam o prémio de risco que o mercado atribui a essas obrigações. Se se considerar as seguintes variáveis: p probabilidade de a empresa cumprir integralmente com os pagamentos de reembolsos e juros; 16

k d taxa de rendimento da obrigação da empresa; r f taxa de juro sem risco, equivalente à taxa de rendibilidade até à maturidade das obrigações do tesouro. O obrigacionista estaria numa situação de indiferença no seguinte caso: ( d ) p 1+ k = 1+ r f o que implica que a probabilidade de solvência no período será: p 1 = + 1+ r k f d o que equivale a dizer que o prémio de risco Φ é de Φ = k d rf e a probabilidade de imcumprimento de 1-p. Este tipo de análise pode ser facilmente desenvolvida para situações mais realistas, nomeadamente, em que exista mais do que um período (Litterman e Iben, 1989; Fons, 1994) e o credor espera perder apenas parcialmente o crédito e não a totalidade (Yawitz, 1977; Altman, 1989). 2.4.2 Taxas de mortalidade e migração do crédito Neste método, em vez de estimar as taxas de incumprimento a partir da estrutura temporal das taxas de juro, o analista vai ter em conta os dados históricos de incumprimento e as taxas de mortalidade do crédito de idêntica qualidade. A taxa de mortalidade marginal no primeiro ano é a probabilidade de incumprimento do devedor durante o primeiro ano do período de reembolso. A taxa de mortalidade marginal no segundo ano é a probabilidade de incumprimento do devedor neste ano, dado que cumpriu as suas obrigações financeiras no primeiro ano. Assim, para uma obrigação classificada pela agência de rating como BBB tem-se: 17

TMM i = VI V ( BBB) i ( BBB) i em que: TMM i é a taxa de mortalidade marginal no ano i; VI (BBB)i é o valor das obrigações BBB que entraram em incumprimento no ano i de vida; V (BBB)i é o valor das obrigações BBB em cumprimento no início do ano i. A partir desta informação podem calcular-se as taxas de mortalidade acumulada (TMA) num determinado periodo (1,2,3,,n anos) subtraindo à unidade o produto das taxas de sobrevivência da população: n TMA i = 1 (1 TMM i ) i= 1 A Stern School of Business produz anualmente o quadro das taxas de mortalidade marginal das obrigações nos EUA, tendo por base as classificações de rating da Standard & Poor s (anexo II). Para além disso é utilizado o conceito de migração que evidencia a mudança de classificação de rating das obrigações de ano para ano. Actualmente a Standard & Poors e a Moody s produzem matrizes de transição que evidenciam a probabilidade de migração do crédito entre diferentes ratings (ver passo 1 do anexo III). Com este tipo de informação é possível estimar o risco de crédito (anexo III). A dificuldade de aplicação desta metodologia ao mercado português resulta do número limitado de emissões obrigacionistas e do número de empréstimos obrigacionistas com atribuição de rating. 18

2.5 Modelo das opções na avaliação do risco de crédito Na sequência dos trabalhos pioneiros de Black e Scholes (1973) e Merton (1974), o crédito da empresa passa a ser visto como uma put sobre os activos da empresa. Os credores detêm uma opção (put) sobre os activos que a podem exercer em caso de incumprimento por parte do devedor. No caso de o valor dos activos ser superior ao valor da dívida, a administração da empresa pagará normalmente o capital e os juros. Mas no caso de o valor dos activos cair abaixo do valor do passivo a empresa entra em insolvência e os credores têm o direito de pôr a empresa em falência recuperando o crédito através da liquidação dos activos da empresa. Na situação extrema em que os activos não têm valor os credores perderão integralmente o valor do capital em dívida e respectivos juros. Valor do C. Alheio (D) Assim o valor do crédito será D MAX ( D ) V=D Valor da Empresa (V) =,0. Merton (1974) demonstrou como calcular o valor de mercado da dívida em risco: F r ( ) Be f τ τ = [( 1 d ) N( h ) + N( h )] 1 em que: τ - período de tempo que decorre até à maturidade da dívida; r f - taxa de juro sem risco do empréstimo com idêntica maturidade; 2 d - grau de endividamento da empresa medido pela seguinte formula Be r f τ A ; A - valor actual dos activos; B - valor do reembolso na maturidade; 19

N(h) - valor calculado a partir de uma distribuição normal estandardizada que se refere à probabilidade de o valor exceder o valor h; 2 h [ ( d ) 1 = 1 2σ τ ln ] σ τ h 2 [ 1 2σ τ ln( d )] σ τ 2 = + 2 σ - variância da taxa de variação do valor dos activos da empresa, como forma de medida do risco do credor. Utilizando a noção de "yield spread" pode determinar-se a taxa de prémio de risco da dívida: k ( 1 ) ln[ N( h ) ( d ) N( h )] d rf = τ 2 + 1 1 em que kd é, como já se referiu, a rendibilidade exigida pelo credor em risco. Merton (1974) demonstrou que o credor deveria ajustar o prémio de risco em função das 2 variações do endividamento(d) e do risco inerente ao valor dos activos ( σ ): [ k r ] d d f > 0 e [ k d r ] σ f > 0. Como se depreende das desigualdades, quanto maior for o d e o σ de um devedor, maior o risco de crédito. Esta ideia, relativamente simples, foi utilizada pela KMV Corporation para criar um modelo de monitorização do crédito. De acordo com Saunders (1997), Boudoukh e Saunders (1998) muitos dos bancos americanos de maior dimensão utilizam este modelo para analisar as frequências das expectativas de risco de incumprimento (EDF - expected default risk frequency). A EDF está concebida para converter a informação contida na evolução dos preços de cotação em medidas de risco de incumprimento, pressupondo uma relação directa entre as seguintes variáveis: a) o valor de mercado das acções e o valor de mercado do activo da empresa devedora; 20