Diferença salarial. Isonomia. Serviço público. Ilegalidade A Constituição veda vinculação ou equiparação de vencimentos para fins de remuneração de pessoal do serviço público (art. 37, XIII). Se o fundamento do pedido é a concessão de aumento ilegal a apadrinhados da administração, inadmissível a pretensão de estender a ilegalidade a todos, o que contraria o princípio da moralidade na administração pública, imposto pelo art. 37 da CF. Vistos, relatados e discutidos estes autos de recurso ordinário em que são partes, como recorrente, ALMIR GOMES e, como recorrida, COMPANHIA ESTADUAL DE ENGENHARIA DE TRANSPORTES E LOGÍSTICA - CENTRAL. Irresignado com a decisão da 42ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, a fls. 166/170, da lavra da juíza Michelle Adriane Rosário Arruda Araldi, que acolheu a prejudicial de prescrição quinquenal e, no mérito, julgou improcedente o pedido, recorre ordinariamente o reclamante a fls. 174/180. Alega que há decisão da 10ª Turma deste TRT, em caso idêntico ao seu, reconhecendo o direito; que faz jus ao pagamento do adicional de projeto especial a partir de 11/2002, no valor de R$ 350,00 mensais (parcelas vencidas) e seus reflexos nas demais parcelas; que impugnou todos os documentos juntados pela reclamada porque representam apenas uma autorização para a criação dos projetos especiais, não havendo comprovação de que tais projetos foram 4841 1
efetivamente criados e implementados; que juntou aos autos depoimentos de prepostos em ações idênticas deixando claro que jamais existiu qualquer projeto especial na empresa e que os empregados que receberam esse adicional jamais executaram qualquer atividade especial que justificasse sua percepção, concedido de forma aleatória; que a reclamada deveria ter trazido aos autos documento hábil que demonstrasse quais seriam os supostos projetos, seus detalhes e o critério de seleção dos empregados que neles trabalhariam, o que não fez; que a reclamada não nega o pagamento do adicional de projetos especiais, alegando pagamento apenas a funcionários supostamente qualificados que participavam do projeto especial, não juntando documentos que provassem o alegado; que o referido adicional foi pago com habitualidade, passando a ser considerado obrigação de natureza salarial que integra o salário para todos os efeitos legais, nos termos do art. 457, 1º, da CLT; que a concessão do referido adicional a vários empregados em detrimento de outros, caracteriza ato discriminatório, violando os princípios constitucionais da moralidade, legalidade, igualdade e isonomia; que é público e notório que a administração da recorrida sempre foi entregue a pessoas nomeadas por políticos, que obviamente colocam seus apadrinhados para laborar na empresa ou beneficiam uns em detrimento dos outros; que a concessão aleatória do adicional, criou de forma mascarada, sob a rubrica de adicional de projetos especiais, um aumento salarial para beneficiar os apadrinhados. Pede a reforma do julgado, nos termos do recurso. justiça. Custas dispensadas ante o deferimento da gratuidade de Procuração a fls. 12. Contrarrazões da reclamada a fls. 184/188, sem preliminares e no mérito prestigiando o julgado. 4841 2
Manifestação do Ministério Público do Trabalho a fls. 208/209, em parecer da lavra da ilustre Procuradora Valdenice Amália Furtado, pela manutenção do julgado. É o relatório. VOTO I Conhecimento Conheço do recurso, por tempestivo e aviado no feitio legal. II Mérito A questão é de extrema simplicidade. O reclamante acusa a reclamada de haver concedido, de forma ilegal e arbitrária, uma gratificação especial a determinados funcionários, gratificação esta que embora nominalmente se refira à participação em projetos especiais, é em realidade um aumento salarial disfarçado, eis que nenhuma atividade especial é desempenhada. E invoca o princípio da isonomia para forrar-se de igual privilégio. Colocado em termos bem simples, o reclamante acusa a reclamada de haver cometido uma patifaria, e com toda a tranquilidade pede que o Poder Judiciário lhe assegure participar do butim, consumar o saque ao patrimônio público. Com essa colocação fica fácil perceber que não se pode chancelar uma barbaridade dessas. O pleito do reclamante envolve, sem sombra de dúvida, ajuste de salário por isonomia, o que é textualmente indicado quando apresentado o rol de pedidos. Trata-se de um dos mais antigos cânceres da administração pública, ao qual veio a atual Constituição oferecer cura 4841 3
definitiva, vedando vinculação ou equiparação de vencimentos para fins de remuneração de pessoal do serviço público (art. 37, XIII). De modo que, nos termos em que posto o pedido, nada mais precisava ser dito. Mas não posso me esquivar de endossar a expressa indignação manifestada no parecer do i. Procurador do Trabalho MARCELO DE OLIVERIA RAMOS, em pronunciamento no Recurso Ordinário n 01206-2006-056-01-00-0 em caso semelhante, em que com irretocável precisão diz que o que pretende o reclamante é, pura e simplesmente, fazer parte da mesma farra que beneficiou parte dos empregados da CEDAE, que obtiveram decisão judicial favorável em pleito de equiparação salarial a um advogado que fora irregularmente contratado pela empresa, nos idos de 1978,.... E repito o que ali disse, que esse era o mecanismo utilizado na administração pública para forrar os bolsos de servidores e administradores espertos às custas de uma cidadania indefesa, completamente ignorante dessas artimanhas, e à qual nada mais cabia que pagar a farra. Algumas empresas públicas foram levadas à destruição por essas práticas, o que veio a justificar a privatização de muitas das que restaram, em alguns casos com entrega a particulares na bacia das almas, em novo crime de lesa-pátria. Como também dito no mencionado parecer, Não há isonomia na ilegalidade!, e fica o sofrimento de saber que foi isso desconsiderado em decisões judiciais nas quais, data venia, foi ignorada a vedação constitucional mencionada. Se o fundamento do pedido é a concessão de aumento ilegal a apadrinhados da administração, inadmissível a pretensão de estender a ilegalidade a todos, o que contraria o princípio da moralidade na administração pública, imposto pelo art. 37 da CF. Nego provimento. 4841 4
ISTO POSTO NEGO PROVIMENTO ao recurso. Vistos e bem examinados, A C O R D A M os Desembargadores que compõem a Quarta Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Rio de Janeiro, 16 de Novembro de 2010. Desembargador Federal do Trabalho Damir Vrcibradic Relator 4841 5