Nota Técnica. Alteração do marco regulatório do setor de telecomunicações viabilizará novos investimentos. 1. Introdução



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Transcrição:

Nota Técnica Maio 2016 Alteração do marco regulatório do setor de telecomunicações viabilizará novos investimentos 1. Introdução O setor de telecomunicações tem passado por um conjunto amplo de avanços tecnológicos que contribuiu de forma significativa para as mudanças na forma como a sociedade se relaciona, presta serviços e produz. Esse ciclo de inovações resultou em uma série de mudanças tecnológicas ocorridas desde a segunda metade da década de 1990, que criaram o último grande ciclo de expansão da produtividade e prosperidade econômica que durou até a primeira metade dos anos 2000 1. Esse período foi chamado à época de The New Economy e criou uma série de implicações para a sociedade e a economia 2. No Brasil, o setor de telecomunicações passou por um grande desenvolvimento desde o final dos anos 1990 quando o mercado foi aberto à iniciativa privada. Desde àquela época, foi possível expandir investimentos relevantes no setor e rapidamente o Brasil pôde acessar tecnologias que antes não estavam disponíveis para a maior parte da população. Segundo dados da PNAD, o acesso à telefonia aumentou de 27,9% em 1997 para 94% em 2014. O acesso à internet aumentou de 8,5% em 2001 para 42,7% em 2014. 1 Ver, Jorgenson, D., Ho, M. e Stiroh, K. (2005). Productivity vol. 3: Information Technology and the American Growth Resurgence. The MIT Press. 2 Sobre algumas implicações de política econômica, ver Ball, L. e Tchaidze, R. (2002). The FED and the New Economy. American Economic Review, 92 (2): 108-114. 1

Desde então, esse setor passou por duas amplas transformações. A primeira se refere às tecnologias disponíveis para a sociedade. Nos anos 1990, o foco principal estava na universalização da telefonia fixa. Hoje, o interesse pela expansão se dá na banda larga e a fronteira a ser desenvolvida está na internet das coisas (IOT do inglês - internet of things), em que se massifica a utilização dos mecanismos de transmissão de dados para possibilitar a comunicação entre máquinas, sem a intermediação humana, favorecendo uma melhor prestação de serviços e a facilitação do dia a dia das pessoas. A segunda transformação refere-se à necessidade de mudança do atual modelo regulatório em funcionamento. Naquela época, o modelo básico consistia na prestação de serviços via concessões caracterizadas pela regulação de preços e metas de universalização de telefonia fixa com prestação de políticas públicas. Além disso, o modelo de concessão em telecomunicações utiliza o instituto da reversibilidade no qual os bens necessários para a prestação do serviço devem ser revertidos para o governo ao final do período de concessão. A reversibilidade é um instituto importante quando existe pouca competição. Nesse caso, se a empresa devolver a concessão, o Estado deve manter a continuidade do serviço. Ocorre que no setor de telecomunicações, à medida em que se multiplicaram as autorizações, no mesmo serviço ou em serviços substitutos, esse risco ficou muito pequeno e hoje é praticamente inexistente. Assim, o modelo regulatório deve ser revisto para equilibrar a competição no mercado entre as empresas que atuam sob regime de concessão e aquelas que atuam sob regime de autorização. Com isso, os bens reversíveis podem ser integralizados pelas empresas que podem investir mais na expansão da oferta de redes, o que viabilizará uma nova onda de investimentos no setor. 2

Desenvolvimento do Setor de Telecomunicações no Brasil O regime de monopólio estatal vigorou nesse setor, no Brasil, até 1997, quando então houve o processo de privatização, que resultou: (i) na venda de 51% das ações ONs (1/3 do capital total) das quatro holdings de telefonia fixa em regime de concessão e; (ii) na autorização das oito holdings para prestação de serviços de telefonia móvel. O modelo de regulação da telefonia no Brasil foi elaborado em uma lógica de monopólio natural e de elevadas economias de escala, tendo como princípio a necessidade de continuidade de prestação dos serviços. Com isso, veio atrelado o instituto da reversibilidade, segundo o qual os bens essenciais à prestação do serviço devem ser reversíveis ao Poder Público. Ao mesmo tempo, o Poder Público ficou incumbido de adotar medidas que promovam a competição e a diversidade dos serviços, incrementem sua oferta e propiciem padrões de qualidade compatíveis com a exigência dos usuários. A tecnologia preponderante naquele momento era a telefonia fixa, de tal modo que o objeto de concessão foi o sistema de telefonia fixa comutado (STFC). Com as rápidas mudanças tecnológicas ocorridas neste setor, alguns aperfeiçoamentos regulatórios se fazem necessários. Primeiro, as inovações tecnológicas imprimiram uma rápida redução das economias de escala e redução das barreiras à entrada, o que permite caracterizar esse setor muito mais como um ambiente competitivo do que como um monopólio natural 3. Segundo, as mesmas inovações tornaram o objeto da política pública obsoleto. A telefonia fixa está entrando em desuso frente às novas tecnologias de informação e comunicação (telefonia móvel, banda larga e serviços associados), que já nascem num ambiente competitivo e cujos 3 Ver, OCDE, A new economy? The changing role of innovation and information technology in growth, 2000. 3

regimes de autorização se configuram mais adequados a esse ambiente. Dessa forma, considerando o modelo regulatório, verifica-se ser difícil manter o atual regime de concessão para telefonia fixa, particularmente para as áreas geográficas em que essas novas tecnologias se caracterizam por um ambiente competitivo. Para ilustrar a evolução do marco regulatório, a Figura 1 apresenta a transição das etapas do modelo de regulação no setor de telecomunicações. No Brasil, o marco regulatório dos anos 1990, consubstanciado na Lei Geral de Telecomunicações (LGT, Lei nº 9.472, de 1997) permitiu passar do monopólio público para o monopólio privado, tendo em vista as características de rede do setor e as economias de escala do sistema. Ainda na LGT, o estado ficou encarregado de estimular o ambiente competitivo, chegando à etapa de competição parcial existente na Figura 1. O Brasil encontra-se, atualmente, no estágio de competição parcial em que a regulação deve ser aperfeiçoada para desenvolver um novo modelo 4. 4 Atualmente existem substitutos do STFC, como o sistema móvel celular (SMC) e, mais recentemente, os over the top, surgidos no sistema de comunicação multimídia (SCM). Os over the top, referem-se à entrega de algum serviço (por exemplo, vídeo, áudio e mensagem) sobre a internet sem que o operador desta tenha o controle sobre a distribuição do conteúdo. Exemplos de OTT: Netflix e WhatsApp. 4

Figura 1: Etapas do modelo regulatório no setor de telecomunicações Fonte: Telecommunications Regulation Handbook, The World Bank, 2011. O relatório final do grupo de trabalho entre o Ministério das Comunicações e a Anatel mostra o nível de competição por município, considerando os três sistemas para voz e dados. Para serem considerados minimamente competitivos, os municípios precisam atender concomitantemente a três condições: (i) HHI 5 4.400; (ii) ter no mínimo três prestadoras de STFC Local ou SMP com acessos ativos, tendo em vista que há quatro grandes players; e (iii) que estes três prestadores possuam pelo menos 20% de market share de acessos no município. A Figura 2 mostra que as novas tecnologias operam em ambiente mais competitivo em relação ao STFC. Ao mesmo tempo, o STFC está presente na maior parte dos municípios enquanto a expansão dessas novas 5 O índice de Herfindahl-Hirschman (HHI) é usado para avaliação do grau de concentração num mercado, usado normalmente pelas agências reguladoras. Ele é definido como a soma dos quadrados do market share das empresas do setor em determinado ano. Este índice pode assumir valores entre 0 e 10.000, sendo que quanto menor o índice, menor a concentração de mercado. 5

tecnologias permanece sendo um desafio, cuja superação deve ser um princípio importante do novo modelo regulatório. Figura 2 - Distribuição dos municípios por nível competitivo Fonte: Anatel. Observando a distribuição geográfica do número de prestadoras de voz por município, verifica-se que, por esse critério, há expansão no nível de competição. Conforme se observa, há um número grande de municípios que contam com 4 ou mais prestadoras o que, segundo os critérios adotados pela ANATEL, indicam um bom nível de competição no setor. 6

Figura 3 Número de prestadoras por município Fonte: Anatel A convivência entre concessionárias e autorizatárias cria um descasamento regulatório a partir da distância que se criou entre a regulação existente e o ambiente regulado e um desequilíbrio concorrencial na medida em que duas prestadoras de serviços equivalentes atuam a partir regras distintas. Do ponto de vista do descasamento regulatório, a questão fica evidente a partir do fato de que a regulação não se adaptou às novas tecnologias. Do ponto de vista do desequilíbrio concorrencial, enquanto as autorizatárias possuem maior liberdade de atuação, as concessionárias possuem custos mais elevados para prestar serviços públicos e devem cumprir metas de universalização (Figura 4). A Figura 4 resume as principais diferenças entre o regime público e o regime privado no sistema de telecomunicações brasileiro. Na análise comparativa, verifica-se que o regime privado possui maior liberdade, redundando em condições assimétricas de concorrência com as concessionárias. 7

A concessão é restrita ao STFC (quatro grandes áreas definidas no Plano Geral de Outorgas), que coexiste com autorizações (tanto para o STFC, após a antecipação de metas de universalização, quanto para o SMC e SCM). Dada a convergência tecnológica inerente ao setor, essas tecnologias disputam um mesmo público-alvo em condições assimétricas. Entre as assimetrias regulatórias desfavoráveis às concessões, há a regulação tarifária, o atendimento ao plano geral de metas de universalização (PGMU), o pagamento ao fundo de fiscalização de telecomunicações (FISTEL), bienalmente, de 2% da receita líquida do STFC, a oferta de plano básico e o instituto da reversibilidade para o STFC. Nesse sentido, não parece adequado manter um modelo de monopólio natural (concessão) para um ambiente que tem se mostrado cada vez mais competitivo (ao se considerar os três sistemas). Figura 4: Quadro comparativo regime regulatório brasileiro Variáveis Regime Público Regime Privado Preço Tarifa Regulada (+/- 20%) Livre Universalização Obrigatória Livre Outorga Contrato de Concessão: Reversibilidade Fim 2025 Bens Reversibilidade Não Serviços Empresas STFC: Local (4) Longa Distância (1) Oi, Telefônica, Sercomtel, CTBC, Embratel Autorização Sem reversibilidade Metas de qualidade STFC (600) SMP (7) SCM (4000) SeAC (200) Oi, Telefonica/Vivo, Tim, Claro, Net/Embratel, GVT, etc Regiões PGO Região I N/NE/SE Região II N/CO/S Região III SP Região IV Brasil Brasil Fonte: elaboração própria. 8

Relevância do setor para a economia No Brasil, os investimentos no setor de telecomunicações aumentaram significativamente após a quebra do monopólio estatal, conforme pode ser observado na Figura 5. Após o pico de investimento em 2001, devido à antecipação de metas, a participação média do setor na formação bruta de capital fixo foi de 3,1%. Figura 5: Evolução do investimento no setor de telecomunicações e % FBKF 35 12 30 25 20 15 10 5 10 8 6 4 2 0 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 % FBKF (lado direito) Investimento R$ bi (lado esquerdo) 0 Fonte: Telebrasil. Em termos de importância do setor para economia, ressalta-se que sua participação no PIB encontra-se em um dos patamares mais elevados do mundo. Observa-se na Figura 6 que, desde a antecipação de metas, a participação média do faturamento no PIB foi de 5%. Historicamente esse patamar está bem acima dos países da OCDE 6 (Figura 7). 6 Ver OECD Communications Oullook, 2013. 9

Figura 6: Receita bruta do setor de telecomunicações e % PIB Fonte: Telebrasil 7. Figura 7: Receita bruta do setor de telecomunicações em relação do PIB 7 6 5 4 3 2 1 0 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Fonte: Telebrasil 8. Brasil EUA Reino Unido Espanha OCDE 7 http://www.telebrasil.org.br/panorama-do-setor/consulta-a-base-de-dados. 8 http://www.telebrasil.org.br/panorama-do-setor/consulta-a-base-de-dados. 10

Em relação à importância do setor no mercado de trabalho, o mercado de telecomunicações é responsável pela geração de 500 mil empregos diretos e indiretos (indústria, serviços e Call Center) 9. Dada essa relevância do setor e seu papel estratégico para a economia como um todo, é importante ajustar o aparato regulatório, seguindo a tendência mundial para o setor. Principais Desafios Regulatórios do Setor Além do desequilíbrio competitivo, o instituto da concessão traz em si um problema relacionado à reversibilidade. Atualmente, existe insegurança jurídica a respeito da identificação e do valor dos bens reversíveis, pois esse setor é caracterizado pela convergência tecnológica (usam a mesma infraestrutura para diversos serviços). Os serviços de telefonia fixa, móvel e banda larga podem trafegar pela mesma via, mas o que está sob concessão é a telefonia fixa (bens reversíveis), enquanto a telefonia móvel e banda larga estão sob a autorização (bens não reversíveis). Assim, não se sabe ao certo qual a parte da infraestrutura de telecomunicações será reversível em 2025, quando vencerão os atuais contratos de concessão. Os seguintes problemas têm emergido atualmente dessa situação: - Inibição de investimentos: algumas concessionárias fazem menos investimentos devido à possibilidade de reversão dos novos ativos em 2025, assim como também enfrentam dificuldades para atrair investidores. - Duplicação de infraestrutura: a insegurança tem levado as empresas a instalarem cabos de fibras paralelos aos cabos de cobre, 9 Ver Telebrasil, http://www.telebrasil.org.br/panorama-do-setor/consulta-a-base-de-dados. 11

havendo perda de eficiência dos investimentos realizados e aumento do custo do capital. - Subutilização de ativos: os cabos de cobre poderiam ter a vida útil prolongada com a utilização de novas tecnologias (encurtamento de redes), podendo ser utilizados, por exemplo, para levar serviços de banda larga, limitados à tecnologia. - Imóveis: quaisquer terrenos e benfeitorias utilizados para a prestação de qualquer serviço são considerados bens reversíveis, ficando impossibilitados de serem alienados, gerando custo de manutenção. - Judicialização: disputa entre as concessionárias, agências reguladoras e sociedade civil organizada sobre os bens reversíveis. - Custo de controle: Controle e fiscalização dos ativos e de inventários reversíveis, tanto pela agência reguladora quanto pelas operadoras, gera ineficiências econômicas. Parte da incerteza decorrente da reversibilidade ocorre por haver visões distintas sobre o tema. Na primeira visão, a reversibilidade se limita aos aspectos funcionais, ou seja, estão relacionados a sua importância em relação à prestação de serviço de telefonia fixa. Na segunda visão, a reversibilidade está relacionada aos bens originariamente transferidos quando da quebra do monopólio estatal em 1997, conhecida como abordagem patrimonialista. 10 Por exemplo, um prédio que abrigou as antigas centrais telefônicas, que pelo volume, ocupava quase sua totalidade, será sempre reversível pela tese patrimonialista, independente da essencialidade do prédio para a prestação do serviço, atualmente. Já pela tese funcionalista, o prédio pode deixar de ser reversível, caso já não seja mais essencial para a prestação do 10 Ver http://www.anatel.gov.br/portal/verificadocumentos/documento.asp?numeropublicacao=324951. 12

serviço. Essas diferentes visões geram grande indefinição acerca dos bens reversíveis e de seu valor. Concentrando a discussão agora sobre o objeto da política pública, a experiência internacional mostra que a concessão para a telefonia fixa tem se configurado numa exceção (Figura 8). Isso se deve à perda de essencialidade que o STFC apresenta atualmente. A telefonia fixa tem perdido crescentemente market share para os serviços móveis e de dados. Assim, mostra-se cada vez mais inadequado manter o STFC como centro da política pública. Ademais, com todas as suas obrigações regulatórias, num ambiente de aumento da competição, perda de essencialidade do serviço e o surgimento de tecnologias substitutas. Há perdas de eficiência de investimento e, no limite, poderá haver problemas de sustentabilidade das concessionárias. Figura 8: Controle da prestação de serviço de telefonia fixa Fonte: estudo realizado pela Oliver Wyman e NERA 11. Em acordo com esse diagnóstico, o Ministério das Comunicações publicou a Portaria 1.455/2016 que delega para a Anatel a elaboração, nos termos da LGT, de propostas de mecanismos para possibilitar a migração das atuais concessões de STFC para regimes de maior liberdade, com 11 Documento disponível na audiência pública realizada pelo Ministério das Comunicações para revisão do modelo: http://www.participa.br/revisaodomodelo/oi.pdf. 13

eliminação da reversibilidade o que indica um caminho regulatório para o setor com grande potencial de viabilização de novos investimentos. Assim, a resolução desse impasse regulatório tem um potencial de viabilizar novos investimentos, tanto pela via dos recursos oriundos dos bens reversíveis, mas, principalmente, pelo destravamento de incertezas quantos aos aspectos do modelo regulatório. Vale ressaltar que uma regulação pró-competição em nada se incompatibiliza com a política pública de acesso à banda larga, mas se complementam, com áreas geográficas sendo reguladas para regras de mercado e outras reguladas com regras de política pública 12. Essas alterações poderão garantir um investimento adicional para a expansão da capacidade de transporte em banda larga nas áreas menos competitivas, contribuindo para ampliar o acesso da população. O potencial de investimento adicional advém de duas frentes: 1) o equivalente ao valor dos bens reversíveis, estimado em torno de R$ 17,7 bilhões 13 ; 2) o equivalente aos investimentos que se encontram represados em função do descasamento regulatório. O potencial referente aos bens reversíveis corresponde a 63% do investimento médio do setor no período de 2010 a 2015 e a 1,7% do investimento médio de toda a economia nesse período. Conclusões Em função dos descasamentos regulatórios e dos desequilíbrios concorrenciais, uma reforma na regulação do setor de telecomunicações 12 Ver Navas-Sabater, J., Dymond, A. & Juntumen, N. Telecommunications and information services for the poor, The World Bank, 2002 13 Ver http://portal.tcu.gov.br/lumis/portal/file/filedownload.jsp?fileid=8a8182a2513578de0151921c2605080 A&inline=1. Nesse parecer, o TCU comenta: cabe ressaltar que foram identificadas inconsistências nas RBR e no tratamento dado pela Anatel a esses valores depreciados, as quais podem comprometer a confiabilidade, a atualidade e fidedignidade desses números (p. 7). Assim, o valor contido nas Relações de Bens Reversíveis (RBR) pode sofrer variações. 14

possui elevado potencial de criação de novas oportunidades de desenvolvimento e de viabilização de investimentos no Brasil. Ao permitir a migração das concessões para autorizações nos ambientes já competitivos, as atuais concessionárias poderão reduzir seus custos e, com maior liberdade tarifária, poderão competir de maneira equilibrada com seus concorrentes. Ao mesmo tempo, a migração para o regime de autorização poderá reduzir a incerteza atual relacionada aos bens reversíveis, reduzindo o custo de capital das empresas e rentabilizando novos investimentos que podem chegar a valores de até R$ 17 bilhões a depender da forma em que a reversibilidade desses bens será revista. Em paralelo, essas medidas também viabilizarão a expansão da banda larga no país em localidades que hoje o sistema não consegue prestar serviços de forma adequada, e tal como insumo básico que é hoje, essa expansão permitirá a elevação da produtividade e do crescimento de longo prazo do Brasil. 15